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Cametá é um município situado na Região Geográfica Intermediária do Nordeste Paraense e na Região Geográfica Imediata de Cametá159. Está localizado a 147

159 Em 2017, o IBGE lançou um novo recorte das regiões geográficas brasileiras, já que a divisão territorial do país se

complexificou nos últimos anos e exigiu novas formas de leitura dos espaços geográficos e sobretudo dos fluxos/relações tecidas entre os municípios. O que antes se chamava de Mesorregiões e Microrregiões Geográficas, agora são identificadas, respectivamente, como Regiões Geográficas Intermediárias e as Regiões Geográficas Imediatas. No caso de Cametá, esta pertence à Região Geográfica Intermediária de Belém e é município sede de sua Região Geográfica Imediata. Vale ressaltar que não altere a divisão político-administrativa do território em municípios, Unidades da Federação e Grandes Regiões, o novo recorte está baseado em uma nova proposta de leitura geográfica dos espaços, esta “delineada pela dinâmica dos processos de transformação ocorridos recentemente e operacionalizada a partir de elementos como rede urbana e fluxos de gestão, entre outros” (IBGE, 2017, p. 18).

quilômetros em linha reta de Belém, capital do Estado do Pará, mas o percurso entre as duas cidades pode levar em torno de sete horas, visto que demanda percorrer um trecho via terrestre e outro necessariamente via fluvial (por balsa ou lancha/barco).

O território de Cametá abrange uma área de 3.081.367 km², abarcando o centro urbano e nove distritos: Areião, Carapajó, Curuçambaba, Joaba, Janua Coeli, Porto Grande, São Benedito de Moiraba, Torres de Cupijó e Vila do Carmo do Tocantins. Na Figura 40, é possível visualizar as localidades onde nasceram e/ou residem os jovens participantes da pesquisa, bem como os municípios vizinhos ao território de Cametá. Figura 40 – Mapa do território de Cametá (PA) e municípios vizinhos Fonte: Elaborada a partir de dados de IBGE (2016). Fundada em 1616, Cametá origina-se do trabalho de catequese da Igreja Católica junto às populações tradicionais160, nesse caso desenvolvido pelo frade capuchinho Frei Cristóvão de São José com os indígenas da tribo dos Camutás. A este religioso foi atribuída a fundação, por volta do ano de 1620, do sítio Camutá Tapera, considerado o primeiro povoado daquela região (MALCHER et al., 2017).

160 No caso de Cametá, tratam-se de comunidades ribeirinhas, extrativistas, quilombolas e camponesas que vivem em

localidades próximas e outras bem afastadas do centro urbano, sendo acessadas por via terrestre ou fluvial (MALCHER et al., 2017).

De acordo com o censo demográfico do IBGE (2010), a população de Cametá é de 120.896 habitantes, dos quais 52.838 (43,7%) residem em área urbana e 68.058 (56,3%) em área rural161. Essa característica de uma população rural maior do que a urbana é comum em 77 (53,4%) dos 144 municípios do Pará.

Considerando a divisão da população em faixas etárias, o município possuía, em 2010, 42.952 crianças (35,5%), 26.172 jovens (21,6%), 42.683 adultos (35,3%), 9.089 idosos (7,5%). Em relação à raça ou cor, são 26.477 brancos (21,9%), 7.060 pretos (5,8%), 860 amarelos (0,7%), 86.485 pardos (71,5%), 14 indígenas (que equivale a 0,011%).

Os dados de 2010 sobre religião revelaram o predomínio (82%) de católicos, seguido por 13,48% de evangélicos, número que provavelmente aumentou tendo em vista a quantidade de igrejas evangélicas encontradas durante nossas visitas ao município e às comunidades mais remotas.

Apesar de ser o 8o dos 144 municípios paraenses em termos populacionais, o nível de escolaridade revelado no Censo 2010 era baixo, sendo a faixa de Ensino Fundamental incompleto e/ou sem instrução a realidade de 67,4% dos habitantes. Aproximadamente 16% apresentava o Ensino Fundamental completo e/ou Ensino Médio incompleto. Já as pessoas que tinham Ensino Médio completo ou Ensino Superior incompleto equivaliam a 14,57% da população. Por sua vez, a porcentagem daqueles que apresentam Ensino Superior completo era de 1,95% (IBGE, 2010).

Apesar disso, a taxa de escolarização de crianças de 6 a 14 anos de idade no município é alta, de 96,7%. Até 2017, segundo IBGE Cidades (2018), existiam 213 estabelecimentos de Ensino Fundamental e 12 de Ensino Médio em Cametá.

Ainda de acordo com o IBGE (2010), a taxa de urbanização das vias públicas162 era de 15,4%. Apesar de dispor de coleta de lixo, quase metade dos domicílios (49,2%) descartava o lixo a partir de queimas improvisadas feitas na área da própria propriedade.

No que tange a saneamento básico, dentre os mais de 23 mil domicílios 62,1% dispunham de banheiro de uso exclusivo, mas apenas 10,1% desses tinham esgotamento sanitário adequado, o que equivaleria dizer que 108.685 pessoas viviam sem condições mínimas de saneamento em suas habitações163. Este aspecto pode estar relacionado ao fato de que 60,3% das habitações de Cametá eram feitas de madeira, o 161 Para 2018, o IBGE Cidades (2018) estima contingente populacional de 136.390 pessoas. 162 Isso significa para o IBGE que a cidade dispõe de bueiro, calçada, pavimentação e meio-fio. 163 No Brasil esse ainda é um problema sério e está relacionado à precariedade da saúde pública. Segundo dados do PNAD Contínua 2017 (IBGE, 2018b), “apenas 66% dos domicílios brasileiros são ligados à rede geral ou fossa ligada à rede” (PARADELLA, 2018).

que equivalia a mais de 14 mil lares. Na sede do município, 43,1% das casas eram de alvenaria com revestimento e 36,6% de madeira. Já nas localidades rurais, 80,9% das habitações eram feitas de madeira.

O acesso à energia elétrica também não era para todos, 85,7%, mesmo tendo sido o município ambientalmente afetado pela construção da Usina Hidroelétrica de Tucuruí164. Desse total de casas que tem energia elétrica, apenas 65% recebem a ligação de uma companhia de energia com fornecimento regular. O restante utilizava outras fontes de energia entre as quais estavam o gerador elétrico e as baterias automotivas, especialmente nas localidades rurais.

O acesso à água tratada era para 50,1% dos domicílios de Cametá, advinda da rede geral de distribuição. Uma parte significativa das casas (31,4%), porém, não tinha acesso à água tratada, tendo que fazer uso dos recursos naturais como rios, açudes, lagos ou igarapés. Na sequência, apareceram 12% de domicílios que contavam com poços ou nascente de água na propriedade.

Quanto aos aspectos econômicos, o município possui um Produto Interno Bruto (PIB) em reais de R$ 379.606,00 e PIB per capita de R$ 2.417,00165. O valor médio do rendimento mensal dos moradores em 2010 era de R$ 291,55 (equivalente a pouco mais de 68,00€), abaixo do valor do salário mínimo no Brasil na época. Considerável parcela da população de Cametá (18,15%) vive apenas com meio salário mínimo.

Na economia do município se destacam atividades relativas ao setor de construção, comércio, reparação de veículos automotores e motocicletas, transporte, armazenagem e correio, alojamento e alimentação, que correspondem a 61,84%. As atividades de agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura, indústrias extrativas, indústrias de transformação, eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos e descontaminação contribuem com apenas 4,22% na economia cametaense. As produções agrícolas mais comuns eram, em 2010, o cacau em amêndoa,

164 As obras da UHE Tucuruí foram iniciadas em 24 de novembro de 1975, durante o regime militar no Brasil, e a

usina foi inaugurada, oficialmente, em 22 de novembro de 1984. O objetivo era produzir energia para o Programa Grande Carajás [...], além de pretender integrar a Amazônia ao restante do país. Cabe destacar que a implementação de grandes projetos na Amazônia foi resultado da política de integração desse vasto território, patrocinada pelo Governo Federal. Para o governo, a energia era estratégica e decisiva para a ocupação espacial. Ressaltamos, também, que a implantação desses projetos, como o da hidrelétrica, incentivaram a migração de contingentes populacionais de outras regiões em busca de melhores condições de vida (SILVA, 2013, p. 48). Apesar dos objetivos previstos, a energia produzida pela hidroelétrica não necessariamente atendeu a todos de seu entorno, especialmente os que tiveram suas vidas diretamente afetadas pelos impactos ambientais provocados pela construção da usina. Esta abastece grandes metrópoles como São Paulo, mas não atende às comunidades que vivem nas margens do rio que teve o fluxo alterado. Evidências próprias de países subdesenvolvidos como o Brasil, em que as politicas de desenvolvimento são iniciadas mas não finalizadas e/ou descontinuadas por problemas que vão de corrupção e desvio de recursos ou por desconsiderarem na sua base a necessidade de atender contingentes populacionais mais pobres e que residem em áreas remotas do país.

165 Valores que se calculados em euro (cotação de 20 de novembro de 2018, de R$ 4,28 para 1,00€) equivalem a

a pimenta do reino, a laranja, a banana, o café e o coco. Quanto à pecuária, segundo dados do IBGE (2012), os bovinos, suínos, ovinos, galinhas, frango e vacas ordenhadas eram os de maior produção.

Cametá também possui um vasto e rico patrimônio cultural, composto por bens representativos, patrimônios tombados e áreas naturais conservadas. Entre as áreas naturais destaca-se a “região das ilhas”, com aproximadamente noventa ilhas, distribuídas ao longo da região do Baixo-Tocantins. Entre os rios destacam-se o Mupi, o Cupijó e o Anauerá, este determinando o limite natural, a Oeste, entre Cametá e o município de Oeiras do Pará.

Entre as edificações mais antigas do município, consideradas bens culturais e religiosos de Cametá, se destacam a Catedral de São João Batista, na Praça dos Notáveis, construída em 1757; a Catedral de Nossa Senhora das Mercês, na Praça Joaquim Siqueira; A Capela de Bom Jesus dos Aflitos, na Rua 24 de Outubro, construída em 1825; e a Igreja de São Benedito, construída em 1872. Entre as manifestações culturais marcantes da identidade do município estão a festividade de São João Batista, padroeiro da cidade e o carnaval de rua (MALCHER et al., 2016b, no prelo).

Em relação ao cenário midiático, segundo informações do site Donos da Mídia, em 2015, o município de Cametá possui duas emissoras de TV (TV Cametá166 e TV Tocantina167) e duas de rádio (Cametá FM168 e Rádio Tocantins AM169). O percentual de posse de tecnologia nos domicílios varia bastante entre as mídias tradicionais e as TICs, conforme Tabela 21.

Tabela 21 – Penetração de tecnologia em Cametá (PA) (Ano base 2010)

Tecnologia/Localidade Total (%) Urbana (%) Rural (%)

Número absoluto de municípios 23 642 10 990 12 652 Televisão 77,4 93,2 63,7 Rádio 63,2 62,8 63,5 Telefone celular 60,2 74,7 47,6 Telefone fixo 3,6 7,1 0,5 Microcomputador 7,8 15,5 1,1 166 Afiliada à RecordTV e mantida pelo Sistema Vale do Tocantins de Comunicações, uma das empresas do radialista

José Adão Costa, que acumula 22 retransmissoras de TV distribuídas no estado (LOBATO, 2016). A emissora não consta no Sistema de Informações dos Serviços de Comunicação de Massa (Siscom), mantido pela Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL). É importante destacar ainda que, mesmo sendo retransmissora, pelo fato de estar localizada na Amazônia Legal, ela tem autorização para produzir até 210 minutos de programação local diária, conforme Portaria n. 93, de 19 de julho de 1989 do Ministério das Comunicações.

167 Afiliada à BandTV e pertencente à Prefeitura Municipal de Cametá. Por conta da legislação anteriormente citada,

esse tipo de associação entre poder public e privado acaba sendo comum, já que os concessionários de outorgas de TV tercerizam sua exploração comercial, alterando assim a finalidade para qual aquela faixa de sinal teve funcionamento autorizado.

168 De cunho comercial e mantida pela Empresa de Radiodifusão Miracatu. 169 De cunho comercial e mantida pela empresa Rádio Tocantins.

Com acesso à internet 3,1 6,5 0,1

Fonte: Elaborada pela autora a partir de dados do Censo Demográfico 2010 (IBGE, 2010).

Dos 23.642 domicílios contabilizados pelo Censo 2010, 77,4% tinham TV, 63,2% rádio e 60,2% aparelho de telefone celular. O número de linhas fixas era reduzido de forma geral no município, chegando a 3,6%. No caso do microcomputador, apenas 7,8% dispunham do aparelho em Cametá. Ao observamos os dados dos domicílios localizados na área rural, do total de 12.652 lares, mesmo a penetração de mídias consideradas tradicionais, como TV e rádio, era realidade para pouco mais da metade da população, totalizando 63,7% e 63,5% das casas. Interessante observar que os meios têm penetração praticamente idêntica na zona rural, enquanto na cidade a diferença entre posse de TV e rádio é de mais de 30 pontos percentuais. Possivelmente, isso se deve às limitações de acesso à energia elétrica ainda hoje encontradas nas localidades do interior de Cametá. Nesse caso, os domicílios que dispõem das mídias são os que tem energia ou os que os moradores fazem uso de gerador ou bateria automotiva para ligar e/ou carregar seus dispositivos, ainda que por apenas algumas horas por dia. Mesmo com essas dificuldades, a penetração de telefone celular alcançava praticamente metade dos domicílios da área rural (47,6%). No caso da cidade, os aparelhos de celular estavam presentes em 74,7% dos lares, percentual acima do rádio, disponível em 62,8%.

A partir de informações coletadas com moradores do município antes de nossa pesquisa de campo exploratória, foi identificado que as operadoras de celular presentes são Tim, Vivo, Claro e Oi, mas não necessariamente o sinal abrange as localidades do interior, como no caso de Rio Furtados.

Conforme descreveremos a seguir, observamos logo na primeira visita exploratória ao município, em 2016, que a dinâmica de vida de Cametá é regida por um permanente trânsito entre urbano e rural. Isso porque as fronteiras entre ambos não são claras, já que um carrega um forte traço do outro. E em ambos os espaços os modos de organização dos lares são comuns, já que na Amazônia, como relatou Pacheco (2006), os modos de vida próprios das populações que residem na floresta, beiras de rio e em constante contato com a natureza, são transferidos para suas habitações na cidade, independente das novas condições de moradia estabelecidas.

Como explicamos em discussões anteriores (MIRANDA, 2013; MIRANDA et al., 2015), pelo processo descontinuado e considerado tardio de urbanização de muitas localidades na região Norte do país, os modos de vida dos sujeitos são resultado de

hibridações170 entre as práticas de vida da floresta e da cidade, do rural e do urbano, já que estes não estão claramente separados. Viver na cidade em um município como Cametá não implica romper os laços com o rural e tampouco cessar a relação de sustento que se mantem com ele171.

Além disso, em decorrência dos investimentos em políticas públicas do Governo Federal brasileiro – tais como o programa Bolsa Família172 –, os moradores que antes residiam na sede da cidade são “obrigados” a retornarem a suas localidades no perímetro rural. Em paralelo, por dispor de condições mais difíceis de estudo, trabalho e acesso a bens básicos, como atendimento médico e fornecimento de energia elétrica, é comum ocorrer a ida para a cidade, sobretudo entre os mais jovens. E como resumiu Pacheco (2006, p. 24), “nesse emaranhado de relações” se estabelecem “modos de viver e sentir misérias e riquezas expressas nesse pedaço da Amazônia”.

Diante dessa relação hibridizada, além do centro urbano de Cametá, optamos por conhecer melhor também uma de suas localidades rurais, denominada São Raimundo de Furtados, com o objetivo de observar e conversar com os jovens e outros moradores acerca das práticas de consumo midiático no cenário em que vivem. 7.1.1 Rio Furtados Rio Furtados é uma comunidade localizada no distrito de Joaba e possuía o nome de São Raimundo de Furtados. Está localizada a três horas de barco do centro urbano sede do município de Cametá.

Segundo um dos líderes da comunidade, entrevistado durante pesquisa exploratória em 2016 – e citado no Capítulo 5, por ser tio de uma de nossas participantes (Any) – a população de Rio Furtados em 2016 era de aproximadamente

170 Partimos da perspectiva de García-Canclini, que faz a opção pelo termo hibridação ao invés de híbrida para se

referir aos processos socioculturais na América Latina, já que o segundo tem origem na biologia e remete a uma integração imune a conflitos e baseada na homogeneização. Para García-Canclini (2003, p. XIX), hibridação “não é sinônimo de fusão sem contradições, mas, sim que pode ajudar a dar conta de formas particulares de conflito geradas na interculturalidade recente em meio à decadência de projetos nacionais de modernização na América Latina”. “Entendo por hibridação processos socioculturais nos quais estruturas ou práticas discretas [leia-se “fontes” não puras que advém de processos anteriores de hibridação], que existiam de forma separada, se combinam para gerar novas estruturas, objetos e práticas” (GARCÍA-CANCLINI, 2003, p. XIX). “Em um mundo tão fluidamente interconectado, as sedimentações identitárias organizadas em conjuntos históricos mais ou menos estáveis (etnias, nações, classes) se reestruturam em meio a conjuntos interétnicos, transclassistas e transnacionais. As diversas formas em que os membros de cada grupo se apropriam dos repertórios heterogêneos de bens e mensagens disponíveis nos circuitos transnacionais geral novos modos de segmentação” (GARCÍA-CANCLINI, 2003, p. XXIII).

171 Ainda que reconheçamos a contribuição do conceito de rurbano (CIMADEVILLA, 2010; GALIMBERTI &

CIMADEVILLA, 2016), não consideramos pertinente trazê-la para a discussão no âmbito da tese, considerando que este versa sobre novos processos de interpenetração entre urbano-rural, mas dessa vez, ligado a ruralização do urbano. Aspecto não identificado nos municípios onde realizamos a pesquisa.

172 Tendo sido um dos principais programas de combate à pobreza do mundo, em 2015, o Bolsa Família tinha como

valor médio do benefício R$ 176,00 mensais, equivalente a aproximadamente 41€ (cotação de 20 de novembro de 2018, de R$ 4,28 para 1,00€), sendo R$ 35,00 o valor da menor parcela mensal, equivalente a aproximadamente 8,17€.

438 pessoas, que constituíam 110 famílias distribuídas por 72 casas. Na Figura 41, é possível visualizar uma parte da comunidade e como se dá a disposição das casas, sempre localizadas na beira do rio e geralmente agrupadas por proximidade de parentesco. Figura 41 – Exemplos de casa na comunidade de Rio Furtados, Cametá (PA) Fonte: Acervo de pesquisa do projeto PROCAD. Conforme explicou o líder comunitário, em um passeio de barco de no máximo 15 minutos é possível percorrer todo o território da comunidade. A população em 2016, segundo o líder comunitário, estava dividida entre as seguintes faixas etárias: de 0 a 6 (40 crianças); de 7 a 15 (64 crianças); de 16 a 25 (85 jovens). Os 249 moradores restantes são compostos por adultos e idosos (MALCHER et al., 2017).

Entre os moradores da comunidade, a religião católica é predominante, mas há os que frequentam a igreja evangélica Assembleia de Deus. A comunidade conta com uma escola de Ensino Fundamental – mantida pela Prefeitura Municipal de Cametá –, que atende crianças e jovens desta e de outras localidades do entorno, incluindo do município vizinho, Mocajuba. Na comunidade, mais especificamente no barracão173 (na lateral esquerda da Igreja que aparece na Figura 42), é ofertada formação em Ensino Médio, de 1o a 3o ano, a partir da ida de professores vinculados ao Sistema Modular de Ensino Médio da Secretaria de Educação do Pará (SEDUC).

173 Espaço aberto e geralmente coberto mantido pela comunidade para realização de atividades diversas, indo de

festas religiosas e/ou eventos sociais de membros da comunidade. Como uma área comum aos moradores, este costuma estar localizado nas proximidades da igreja e escola da comunidade.

Figura 42 – Igreja Católica (edificação antiga)174 e barracão da comunidade de Rio Furtados, Cametá (PA) Fonte: Acervo de pesquisa do projeto PROCAD. Devido à construção da Hidrelétrica de Tucuruí, segundo o líder comunitário, uma série de mudanças ocorreram na comunidade de Rio Furtados. Ele contou que muitos rapazes saíram da comunidade para trabalhar na construção da usina e, com esse trabalho, puderam melhorar a vida de suas famílias, mesmo quando não voltavam mais. Por outro lado, muitos foram os impactos ambientais: poluição do rio e alteração do nível da água, cada vez mais reduzido e agora regulado também pela movimentação de abertura e fechamento das comportas da usina. Isso causou ainda a diminuição do volume de peixes bem como o desaparecimento de aves que eram próprias daquela área.

Na visão do líder comunitário, a construção da barragem deve ser compreendida como a necessidade do homem de “tirar da natureza” (LÍDER COMUNITÁRIO, 2016) algo além do que é necessário para a sua própria sobrevivência, e não preservá-la. O senso de preservação, para ele, foi se perdendo com o tempo, e isso alterou por completo a relação dos moradores de Rio Furtados com os recursos naturais disponíveis.

Por isso, de acordo com nosso entrevistado, “tudo está acabando” (LÍDER COMUNITÁRIO, 2016) na comunidade e, hoje, alguns moradores precisam comprar açaí, um dos principais frutos disponíveis na região, pois as árvores estão morrendo em consequência da mudança do ecossistema. O mesmo aconteceu com a disponibilidade de pescado. Se antes os moradores tinham como principal atividade a pesca, atualmente

174 No período da pesquisa exploratória (Etapa 2) visitamos as obras da nova igreja que estava sendo construída

pelos próprios moradores. Durante pesquisa de campo (Etapa 8), participamos de celebração religiosa realizada na nova edificação.

precisam comprar, pois o pouco que há disponível é vendido para os frigoríficos que atuam na sede de Cametá e de Mocajuba pelos pescadores175 que restaram.

Nesse sentido, cabe destacar a explicação dos avós paternos de Any, uma de nossas entrevistadas, em entrevista conjunta: