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A prática compartilhada de leitura e a ampliação dos conhecimentos prévios das

7 RELAÇÃO ENTRE AS PRÁTICAS DE LEITURA COMPARTILHADAS NA

7.3 A prática compartilhada de leitura e a ampliação dos conhecimentos prévios das

A interação das crianças deste estudo com impressos da literatura infantil contribuiu para a ampliação de seus conhecimentos prévios. Esse fato foi constatado por meio do diagnóstico da leitura e da compreensão textual, realizado com as doze crianças que compuseram o GS e com as doze do GC, antes e após a intervenção.

Mercedes (1998) também identificou resultado similar no estudo realizado no Maranhão envolvendo pais como leitores-tutores de crianças repetentes. A pesquisadora concluiu que as crianças progrediram na fluência e na compreensão do texto, melhoraram a autoconfiança e apresentaram evolução nas estratégias de leitura.

Nos Gráficos 6.1 e 6.2, a seguir, apresentamos os resultados da Provinha Brasil (aplicada em março de 2008) e da Prova PAIC (aplicada em dezembro de 2008). Entendendo que só podemos considerar leitura quando acompanhada da compreensão, além da avaliação da competência para decifrar texto, avaliamos três aspectos globais da compreensão leitora. São eles: identificação do assunto do texto (questão 23 da Provinha Brasil e 18 da Prova PAIC), identificação de informação explícita no texto (questão 20 da Provinha Brasil e 17 da Prova PAIC) e identificação da capacidade de fazer inferências com base em diferentes elementos textuais (questão 24 da Provinha Brasil e 20 da Prova PAIC).

Gráfico 6.1 – Leitura e compreensão GS

Nossa intenção com os dados supracitados foi a análise comparativa da evolução das habilidades adquiridas, no decorrer da intervenção, tanto pelas crianças do GS como do GC.

7.3.1 Leitura de texto

Na primeira avaliação, 67% do GS (8 crianças) demonstraram saber ler e, na segunda avaliação, o índice chegou a 92% (11 crianças); ou seja, quatro crianças não liam texto na primeira avaliação, e, na segunda, apenas uma continuou sem construir essa habilidade. Quanto ao GC, a evolução se deu de 67% (8 crianças) para 83% (10 crianças); ou seja, na primeira avaliação, quatro crianças não liam texto e, na segunda avaliação, duas continuaram sem desenvolver essa habilidade.

7.3.2 Compreensão textual

Em relação à compreensão textual, observa-se que o GS teve avanço mais expressivo no quesito em que avaliou a identificação do assunto do texto. Ainda que o grau de dificuldade da segunda avaliação tenha sido superior ao da primeira (o texto não apresentava gravura e também era mais extenso), a diferença entre o número de crianças do GS que obteve mais êxito foi superior ao de crianças do GC: o GS evoluiu de 58% (7 crianças), na primeira avaliação, para 92% (11crianças), na segunda, e o GC evoluiu de 58% (7 crianças) para 75% (9 crianças) respectivamente.

7.3.3 Informação explícita no texto

Quanto à identificação de informação explícita no texto, houve avanço nos dois grupos, porém maior expressividade foi observada no GS. Nesse grupo, a evolução foi de 67 % (8 crianças), na primeira avaliação, passando para 92 % (11 crianças), na segunda; enquanto no GC a evolução foi de 67 % (8 crianças), na primeira avaliação, passando para 75 % (9 crianças), na segunda.

7.3.4 Inferência

A respeito da habilidade para inferir informação, os dois grupos mantiveram-se equilibrados em relação ao número de crianças que construiu essa habilidade, pois em cada um deles duas crianças construíram essa habilidade na segunda avaliação. A evolução do

GS foi de 58 % (7 crianças), na primeira avaliação, passando para 75 % (9 crianças), na segunda; enquanto no GC, a evolução foi de 67 % (8 crianças), na primeira avaliação passando para 83% (10 crianças), na segunda.

Resumindo, houve avanço nas habilidades avaliadas tanto no GS quanto no GC. No entanto, o número de crianças que obteve melhores resultados nos quesitos que avaliam a leitura, a identificação do assunto principal do texto e a informação explícita foi superior no GS. Quanto à capacidade de associar elementos presentes no texto ou que se relacionem com a vivência da criança para compreender informação não explícita, ou seja, fazer inferências, os dois grupos tiveram a mesma evolução.

Porém, todas as crianças do GC, identificadas como leitoras de texto demonstraram ter desenvolvido habilidade para fazer inferência, embora nem todas tenham obtido êxito nos quesitos que avaliaram as habilidades de compreensão textual mais elementar, como identificação do assunto e identificação de ideia explicita no texto. Esse fato pode ser explicado pelo tipo de texto utilizado na questão. Como se tratava de tirinhas de História em Quadrinhos, a inferência pode ter-se dado pela leitura das imagens e não pela leitura do texto. Dessa forma, o GC pode ter tido mais experiência com este gênero textual que permite dois tipos de leitura: a textual e a imagética.

Com base nos resultados da avaliação da leitura e da compreensão textual, assegura- se que há diferença quantitativa e qualitativa nos resultados obtidos pelos dois grupos. No entanto, embora sutil, observa-se que mais crianças do GS demonstraram ter consolidado habilidades para ler e compreender texto. Esse avanço pode ser atribuído à experiência sistemática com práticas de leitura na família, uma vez que a competência para compreender implica a coordenação de vários conhecimentos. Como diz Kleiman (.2007, p. 13): “a compreensão de um texto é um processo que se caracteriza pela utilização de conhecimento prévio: o leitor utiliza na leitura o que ele já sabe, o conhecimento adquirido ao longo de sua vida” (KLEIMAN, 2007, p. 13).

A interação do leitor com diferentes gêneros e suportes textuais que abrangem temas e estruturas de discursos diversos ajuda na compreensão, pois amplia a possibilidade de a criança encontrar em sua memória de longo prazo (SMITH, 1989) recursos necessários à compreensão leitora, como mostram as falas das crianças ao serem solicitadas a relatar lembranças que as leituras faziam suscitar. Por exemplo: “Lembrei de quando eu brincava de cavalinho.”; “Lembrei do filme do cachorro com o porco espinho.”; “Essa história

lembra o castelo da Rapunzel, é igualzinho.”; “Lembra da mandioca que eu vi na televisão.”; “Lembra das adivinhas que meu pai conta.” etc.

Segundo Smith (1989, p. 39), a “informação não-visual, memória a longo prazo e conhecimento prévio são termos para a descrição da estrutura cognitiva, a teoria de mundo na mente”. A teoria de mundo, essencial à compreensão, é construída pelas experiências do sujeito. Portanto, quanto mais a criança interage com leitores e participa de práticas sociais de leitura que envolvem texto de diversos gêneros e estruturas discursivas, formais ou de circulação do cotidiano, maior será a chance de ampliar os conhecimentos prévios, e mais elementos terá para mobilizá-los em busca da construção do sentido de texto.

Para reconhecermos a infância como uma construção social (ARIÈS, 1973) da qual as crianças participam como atores sociais, devemos, igualmente, considerá-las capazes de interagir com signos da cultura letrada e não somente capazes de se apropriarem dessa cultura, mas também de reconstruí-los, conforme declaram Pinto e Sarmento (1997, p. 22):

As culturas infantis nascem no universo simbólico exclusivo da infância, este universo não é fechado – pelo contrário, é mais que qualquer outro, extremamente permeável – nem é distante do reflexo social global. A interpretação das culturas infantis, em síntese, não pode ser realizada no vazio social, e necessita de se sustentar na análise das condições sociais nas quais as crianças vivem, interagem e dão sentido ao que fazem.

A leitura, entendida como processo interativo, portanto, não depende apenas do texto que o leitor tem diante dos olhos, depende, principalmente, de uma rede de interações envolvendo os vários conhecimentos advindos da experiência do leitor em eventos de leitura próprios de sua cultura e a mobilização de uma série de processos cognitivos. Como dizem Kleiman e Moraes (2006), o significado do texto resulta da intersecção com outros textos, da intertextualidade, propriedade constitutiva do texto.

Assim a intertextualidade refere-se às relações entre diferentes textos que permitem que um texto derive seus significados de outros. Os textos incorporam modelos, vestígios (no caso das paródias) de outros textos e de outros gêneros. Diz-se que todo texto remete a outros textos no passado e aponta para outros no futuro (KLEIMAN e MORAES, 2006, p. 62).

Os conhecimentos do leitor a respeito da língua (conhecimento linguístico), da forma e estrutura que podem apresentar os diversos textos que circulam na sociedade (conhecimento textual) determinam, durante a leitura, as inferências que o leitor fará com

base nas marcas do texto. Por outro lado, a compreensão do texto ficará comprometida se o leitor não possuir conhecimentos a respeito do assunto abordado (conhecimento de mundo). Por exemplo, ao conhecermos o gênero de um texto, de antemão, poderemos antecipar seu conteúdo e sua finalidade, mas se não possuímos conhecimento sobre o tema abordado é impossível compreendê-lo.

Saber ler e compreender o que lê caracteriza a consolidação de uma etapa importante do processo de alfabetização; no entanto, consideramos alfabetizadas as crianças que leem, compreendem e que produzem um pequeno texto escrito. Para explicar mais uma das constatações deste estudo, apropriação do sistema de escrita alfabética, na seção, a seguir, teceremos reflexões sobre as produções escritas das crianças do GS e do GC.

7.4 A prática compartilhada de leitura e a apropriação do sistema de escrita