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Práticas de gestão e organização e incidência política

7.2 A BIBLIOTECA COMO ARTESÃ: costurando as histórias de leitura

7.2.1 Práticas de gestão e organização e incidência política

Uma das preocupações que as bibliotecas sempre demonstraram ter e sempre se esforçaram para buscar novas alternativas para melhoria foi com relação à maneira de gerir seus espaços, seja enquanto bibliotecas individuais ou enquanto Releitura. No início, cada biblioteca tentava fazer os serviços da melhor da maneira possível, mas elas não tinham uma prática de gestão estruturada. Ao passo que elas foram adquirindo conhecimento da existência de outras bibliotecas comunitárias e foram se articulando, passaram a trocar informações sobre como cada uma atuava, chegando, assim, a se organizar em Rede e a manter muitos procedimentos em comum.

Essas práticas de gestão incluíam tanto o estudo de teóricos para pensar suas práticas como se começava a pensar em formas de capacitação da equipe para a melhoria da gestão pedagógica, financeira e estrutural do espaço. A ideia era criar vínculos entre elas para que houvesse interação e permuta de ações e conhecimento, e que elas pudessem ser revigoradas pedagógica e politicamente, já que a “dimensão política sempre foi o fator preponderante nas bibliotecas, [pois] elas surgem por uma incitação política no contexto de carência, carência de

acesso a livro, carência afetiva, carência de falta de reconhecimento, carência de visibilidade”, explica Leonardo.

O resultado dessa cumplicidade foi a formação pioneira de uma Releitura que influenciou a construção de outras, conforme esclarece Conceição. Influenciou inclusive o programa Prazer em Ler, que, ao repensar sua prática de apoio e tendo em vista a diminuição de recursos, decidiu como uma das alternativas, o financiamento de projetos coletivos ao invés de projetos individuais, sobretudo por entender que, por meio das redes, a força de negociação política aumenta, continuou a entrevistada. O financiamento de ações por meios dos chamados polos de leitura foi algo que trouxe mais sustentabilidade para as bibliotecas em diversos âmbitos.

A partir da articulação da Releitura, portanto, as bibliotecas deixaram de fazer apenas ações isoladas de cada biblioteca e passaram a realizar também práticas conjuntas de criação de eventos; classificação e automação de acervo; articulação para captação de recursos; gestão pedagógica e financeira; formação e capacitação da equipe e comunicação e incidência política na proposta, acompanhamento e controle das políticas públicas para o setor do livro, leitura e biblioteca. Além disso, começou-se a desenvolver uma dinâmica de ação baseada em Grupos de Trabalhos, na qual deixa de existir a figura do coordenador e a gestão passa a ser feita de forma compartilhada.

Basicamente as três entidades que mais se relacionam com a Releitura no que tange ao apoio pedagógico e/ou financeiro são o CCLF, o Instituto C&A e o CEEL, bem como são consideradas igualmente instituições parceiras. Por isso, estão entrelaçadas tanto com as práticas de gestão e incidência política como com as práticas de formação e capacitação da equipe.

A relação entre as bibliotecas e o CCLF é bem antiga, quando ainda não existia a Releitura de Bibliotecas. Na verdade, esta última surgiu a partir de uma proposta e de uma reflexão junto ao Centro, o qual possui uma filosofia institucional que prefere apoiar coletivos a instituições individuais, por acreditar que a força de luta aumenta.

O Centro de Cultura Luiz Freire é uma ONG que atua há quase cinco décadas na luta pelos direitos humanos e surgiu “a partir de um grupo que buscava a restauração da democracia, através de atividades culturais e projetos de desenvolvimento comunitário, durante o período autoritário da Ditadura Militar brasileira” (SOBRE [CCLF], 2016, on-line).

Sempre teve foco no fortalecimento de organizações populares e comunitárias, bem como na defesa e promoção dos direitos humanos, políticos, econômicos, sociais e culturais, tratando-se transversalmente as questões de gênero, raça, etnia, geração, orientação sexual e

das pessoas com deficiência. Além disso, prioriza a incorporação e participação de grupos excluídos, em especial povos indígenas, comunidades quilombolas, ribeirinhas, assentados e organizações populares (SOBRE [CCLF], 2016, on-line).

De acordo com Conceição, o apoio dado pelo Centro às bibliotecas é bem amplo e se estende desde uma formação e participação política até uma formação no âmbito da educação, cultura e direitos humanos. No que se refere à incidência política, o Centro atua numa parceria com as bibliotecas comunitárias tanto no Conselho Nacional e Estadual de Políticas Culturais como no Fórum Pernambucano em Defesa das Bibliotecas Livro, Leitura e Literatura.

Sobre o Instituto C&A, algumas bibliotecas já recebiam apoio dessa instituição de forma individual pelo desenvolvimento de atividades culturais, até aproximadamente o ano de 2006, quando esta instituição tinha esse foco. Depois que o foco passou a ser o financiamento de projetos de leitura, por meio do Programa Prazer em Ler, e posteriormente a projetos coletivos de leitura, todas as bibliotecas conseguiram respaldo de tal instituição (PRAZER EM LER..., 2016).

O Programa, que tem como objetivo contribuir para a efetivação do direito à leitura por meio da formação de leitores e da formulação e aperfeiçoamento de políticas públicas, investiu recurso para o fortalecimento de quatro eixos gerais: espaço, acervo, mediação e gestão, sendo posteriormente complementados com mais três eixos: gestão compartilhada, comunicação e incidência política (PRAZER EM LER..., 2016).

As orientações pedagógicas e gerenciais, sobretudo no que se refere ao espaço, acervo, mediação e gestão, foram passos essenciais para a apuração dos serviços oferecidos nas bibliotecas comunitárias. Isto incluiu a requalificação dos espaços para torná-los mais convidativos e propícios à leitura, bem como para valorizar a autonomia do leitor; as revisões do acervo quanto à diversidade temática e de gêneros, seguidos de discussões sobre qualidade literária e aquisição de novos títulos; as noções de mediação de leitura no que se refere às possibilidades de realizá-la e a interação com os leitores, e, por fim, o planejamento e avaliação sistemática das ações coletivas, a exemplo da automação e classificação do acervo, gestão compartilhada, dentre outras práticas (PRAZER EM LER..., 2016).

Durante esses dez anos, cujo desenvolvimento ocorreu em ciclos trienais (estando atualmente no 4º ciclo), o Programa articulou e agenciou diversas ações de apoio às bibliotecas. Destacamos como algumas de suas marcas, além da formulação dos eixos:

 A estruturação de uma equipe de assessores e consultores (ligados ao Instituto), mediadores e gestores (ligados às bibliotecas) e posteriormente bibliotecários ligados

aos polos, que fornecem um potencial humano fundamental para o desenvolvimento das ações;

 O engajamento e intervenção no debate e articulação das políticas públicas do livro, leitura e biblioteca com foco no Plano Nacional e nos Planos Estaduais e Municipais de cada localidade;

 O incentivo à construção de projetos coletivos, como os polos e a Rede Nacional de Bibliotecas Comunitárias, visando a maior consistência nas ações de incidência política, comunicação e visibilidade, gestão e enraizamento comunitário.

No que se refere às políticas públicas, além da presença e intervenção nos debates para a formulação do PELL, a Releitura também é atuante no Fórum Pernambucano em Defesa das Bibliotecas, Livro, Leitura e Literatura, ambos já apresentados no Capítulo 4, buscamdo justamente a participação no debate, a formulação e o monitoramento dessas políticas tanto no âmbito nacional como nos estaduais e municipais (PRAZER EM LER..., 2016).

Para este ciclo que se inicia e segue até o ano de 2018, a proposta do Programa mantém o foco no fortalecimento dos parceiros para o avanço e mobilização de novas estratégias de sustentabilidade para que eles possam continuar o trabalho da forma mais autônoma e coletiva possível (PRAZER EM LER..., 2016).

Dessa maneira, o impacto dessas ações nas comunidades é evidente. Sem dúvida, a parceria com todas essas instituições trouxe para as bibliotecas um aperfeiçoamento na forma de gerência dos espaços perceptível no relato de todos os sujeitos. Ressaltamos que o respaldo das parcerias é indispensável para essas práticas. No entanto, o esforço e dedicação dos gestores e mediadores é que fazem a diferença na execução e nos resultados alcançados. Sem eles e sem o apoio da comunidade, isso não seria possível. A síntese das práticas de gestão, organização e incidência política, resultaram no Quadro 9.

Quadro 9 -Práticas de gestão e organização e incidência política