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5. ANÁLISE DA COSTURA

5.5. Análise dos nossos questionamentos

5.5.3. Práticas educativas

Quanto mais conscientização, mais se ‘desvela’ a realidade, mais se penetra na essência fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-lo. Por essa mesma razão a conscientização não consiste em ‘estar frente a realidade’ assumindo uma posição falsamente intelectual. A conscientização não pode existir fora da “práxis”, ou melhor, sem o ato ação- reflexão (FREIRE, 1979, p. 15).

É esse ato de agir/refletir/agir, pois é durante o agir que precisa ser estimulado em nós docentes e nas/nos discentes para que se possa esperançar em ter mundo cada vez melhor.

Colchete pontua os momentos de reflexão nas rodas de conversa, fala que esse racismo ainda está presente em nossas vidas, no que ela/ele está coberta/coberto de razão. O racismo está na estrutura de nossa sociedade (ALMEIDA, 2019). Vamos recorrer mais uma vez a Djamila Ribeiro, quando ela afirma:

Movimentos de pessoas negras há anos debatem o racismo como estrutura fundamental das relações sociais, criando desigualdades e abismos. O racismo é, portanto, um sistema de opressão que nega direitos, e não um simples ato da vontade de um indivíduo. Reconhecer o caráter estrutural do racismo pode ser paralisante. Afinal, como enfrentar um monstro tão grande? No entanto, não devemos nos intimidar. A prática antirracista é urgente e se dá nas atitudes mais cotidianas (RIBEIRO, 2019. p. 8).

Sejamos antirracistas, tenhamos a preocupação de analisar nossas atitudes, por mais simples que elas sejam.

Extrato das narrativas de Máquina Overloque Sim é muito importante para o designer ter conhecimento da cultura e de todos os problemas sociais da sociedade na qual ele atua, devemos estar abertos para obter conhecimentos.

A/o designer de moda é aquela/aquele profissional que idealiza peças passíveis de serialização, ou seja, é aquela/aquele profissional preparada/preparado para trabalhar na indústria. Assim:

O entendimento sobre a palavra design parece estar vinculado à questão da indústria e, consequentemente de todos os fatores que envolvem a produção de um objeto que está inserido no contexto do mercado. Isto nos levaria a entender o design como algo relacionado à produção em série (CHRISTO, 2008, p. 30).

Como ninguém é capaz de produzir com tranquilidade algo para quem não se conhece, principalmente quando esse alguém é um determinado grupo social, Máquina Overloque está correta/correto quando afirma que é necessário ao designer conhecer a cultura e os problemas sociais que afetam o grupo com o qual vamos trabalhar.

Extrato das narrativas de Máquina Overloque O povo brasileiro é muito racista, não só racista, mas preconceituoso com relação às questões de gênero e classe social e outros. Muitas pessoas dizem que não são racistas, mas quando se veem em determinada situação é que vão demonstrar o quanto o racismo está impregnado.

Importante a observação de Máquina Overloque, a respeito do racismo impregnado no povo brasileiro. “É impossível não ser racista tendo sido criado numa sociedade racista. É algo que está em nós é contra o que devemos lutar sempre” (RIBEIRO, 2019, p. 19). Com relação às questões de gênero e classe social, é uma outra observação extremamente pertinente. Djamila Ribeiro nos convida a:

Estar sempre atento às nossas próprias atitudes e disposto a enxergar privilégios. Isso significa muitas vezes ser tachado de “o chato”, “aquele que não vira o disco”. Significa entender que a linguagem também é carregada de valores sociais, e que por isso é preciso utilizá-la de maneira crítica deixando de lado expressões racistas como “ela é negra, mas é bonita” — que coloca uma preposição adversativa ao elogiar uma pessoa negra, como se um adjetivo positivo fosse o contrário de ser negra —, usar “o negão” para se referir a homens negros — não se usa “o brancão” para falar de homens brancos —ou elogiar alguém dizendo “negro de alma branca”, sem perceber que a frase coloca “ser branco” como sinônimo de característica positiva (RIBEIRO, 2019, p. 20).

Extrato das narrativas de Bobina Esses primeiros encontros foram de suma importância porque nos remeteram à temática, fazendo uma reflexão profunda sobre o tema África e afrodescendentes, sim, me fez conhecer mais da história e da realidade atual desse povo.

Bobina fala da importância dos primeiros encontros, quando estudamos a temática do desfile, pois: “A concepção do desfile vai além de vender uma marca, tem como objetivo chamar a atenção sobre o tema e narrativa construída e despertar sensações no público”.

(GOMES; CAMPBELL, 2017, p. 5). Como nossa temática era a vinda de africanas/africanos escravizadas/escravizados para o Brasil, suas heranças e como se encontram hoje as/os afrodescendentes brasileiras/brasileiros – nossa finalidade: construir um desfile de moda afro – partimos do estudo aprofundado da temática. “O desfile de moda como ferramenta de comunicação, poderá dar visibilidade ao fato chamando atenção do público para o acontecimento através dos signos e seus significados”. (GOMES; CAMPBELL, 2017, p. 2). É um caminho disponível para se trabalhar certas temáticas em um curso superior de moda, com o intuito de provocar docentes e discentes para essa reflexão.

Extrato das narrativas de Miçanga

Mudou sim, por ignorar muitos fatos não tinha interesse em conhecer mais as questões sociais e políticas, hoje tenho buscado mais informações a respeito afinal é minha história também sim.

A fala de Miçanga complementa o dito acima a respeito da fala de Bobina. A prática educativa de construção de um desfile, no caso, um desfile de moda afro – uma prática educativa que abarca muitas outras, trabalhadas num Curso Superior em Tecnologia do Design de Moda – Estamos comprovando, por intermédio da fala da/do discente, que é capaz de despertar, de provocar, de estimular a conscientização dessa/desse discente. Paulo Freire nos diz:

Num primeiro momento a realidade não se dá aos homens como objeto cognoscível por sua consciência crítica. Noutros termos, na aproximação espontânea que o homem faz do mundo, a posição normal fundamental não é uma posição crítica, mas uma posição ingênua. A este nível espontâneo, o homem ao aproximar-se da realidade faz simplesmente a experiência da realidade na qual ele está e procura (FREIRE, 1997, p. 26).

O simples contato do homem com a realidade não é suficiente para que o processo de conscientização se estabeleça, ele tem conhecimento, no entanto ainda não refletiu sobre o assunto, é o que Freire chama de consciência ingênua; só depois desse refletir, desse escarafunchar na problemática, é que começa a se processar a conscientização.

Extrato das narrativas de Esquadro Muito bom os momentos de contar nossas experiências nesse projeto, orgulho por participar do grupo, gratidão aos professores que nos ajudaram, sim, pois é uma história de sofrimento e discriminação e que precisamos mudar, lutar para mudar.

Por fim, Esquadro agradece por esses momentos de comunhão, quando todas/todos contavam suas histórias, agradece ao grupo que ajudou nessa intervenção, e pontua o sofrimento das/dos africanos escravizados que vieram para o Brasil e aqui deixaram suas marcas culturais e suas/seus descendentes, as/os afrodescendentes brasileiras/brasileiros, que até hoje amarguram o resultado dessa diáspora forçada, que Abdias Nascimento, falando da discriminação racial, aponta:

Outra manifestação da “perfeita assimilação dos negros nos standards da sociedade próspera” pode ser vista nas condições de vida dos afro- brasileiros ocupando os pardieiros – ou guetos – do país. No Nordeste – Recife e outras cidades da área – a moradia de negro é mocambo, geralmente infestado de germes e mosquitos das águas poluídas e estagnadas em cujo meio ou vizinhanças se localizam. Em São Paulo, a moradia mais comum era o porão e, mais recentemente, as zonas chamadas de favela. O retrato de corpo inteiro da favela paulista, está no livro de Carolina Maria de Jesus, Quarto de Despejo, um terrível testemunho da vida da autora na favela. (NASCIMENTO, 2016, p. 99).

O dito acima por Abdias Nascimento se reproduz nos quatro cantos desse país, não é diferente nem no Norte nem no Sul, e as perspectivas de uma rápida mudança não são vislumbradas. É hora de luta, de união de forças, para que o porvir seja um pouco menos sofrido que o passado e o presente.

Nos extratos narrativos acima, fica nítidos que o racismo, para todas/todos as/os partícipes da pesquisa, é algo inaceitável. Reconhecem, entretanto, que por ser o racismo brasileiro algo camuflado, elas/eles nem sempre enxergavam esse racismo em muitas situações.

Estão cientes de que as políticas públicas nem sempre são respeitadas, as leis nem sempre são obedecidas, está na estrutura da sociedade esse desrespeito às normas e aos regramentos sociais.

Estão cientes de que o racismo provoca adoecimentos em quem é vítima dele, e que precisamos gritar bem alto que chega de racismos e preconceitos.

Depois de termos analisado as narrativas dos nossos partícipes, é momento de fazermos uma conclusão. Estamos lidando com seres humanos, cujas opiniões são consequência de várias situações pelas quais ela/ele passa naquele momento, seja situação política, social, emocional, entre outras. Por isso, a nossa opção de afirmarmos que são conclusões provisórias, pois se houver uma modificação de algum desses fatores, a opinião desses partícipes poderá ser outra.

A seguir, nossas conclusões.

IMPRESSÕES SOBRE A COSTURA DA PEÇA: CONCLUSÕES PROVISÓRIAS

Usamos o termo “provisórias” por se tratar de uma pesquisa que envolve o ser humano, cujas impressões são variáveis e dependem de toda uma estrutura do momento, como situação social, política e cultural.

Ao término de uma peça do vestuário, mesmo num sistema fabril, essa peça passa por um olhar para ser averiguada, para se saber se o esperado foi conseguido, e o esperado hoje não será o mesmo esperado amanhã. Da mesma forma, na pesquisa qualitativa, que envolve as subjetividades humanas, não é diferente, daí optarmos pelo termo conclusões provisórias pois, se enviássemos o mesmo questionário hoje, para as mesmas pessoas, talvez as respostas não fossem as mesmas. Até o estado de humor dessas pessoas pode afetar os resultados. O que não será afetado é o caso em si, os resultados de uma prática educativa. Quando começamos a analisar as aprendizagens (des) construídas sobre afrodescendência, ocorridas num curso de extensão com alunas/alunos do Curso Superior em Tecnologia do Design de Moda do IFPI/CTZS, nos perguntávamos a respeito da potência dessa prática e que aprendizagens (des)construídas a respeito de afrodescendência eram essas.

Pontuamos, no início da metodologia, os materiais a serem analisados que já possuíamos e quais ainda iríamos conseguir (cadernos memoriais das/dos discentes, caderno memorial da coordenadora do curso de extensão no qual estavam anotados alguns dados a respeito dos encontros e das rodas de conversa, os croquis das inspirações que foram transformados nas peças que passaram pela passarela, e os questionários enviados às/aos participantes do curso de extensão). São as aprendizagens (des) construídas sobre afrodescendência encontradas nesses materiais que vamos aqui pontuar.

Antes do curso de extensão, por conta de algumas atividades desenvolvidas na escola, dentre elas, uma espécie de grupo focal no qual a coordenadora do curso de extensão questionava sobre os conhecimentos que essas/esses discentes tinham a respeito da África e das/dos afrodescendentes brasileiras/brasileiros, estas/estes responderam quase que por unanimidade que só conheciam o que era apresentado na escola no 13 de maio – um negro sofrido amarrado ao tronco; o que é apresentado pela mídia – a miséria de alguns países africanos, ou a exuberância da fauna e da flora africana – que nos remete de forma inconsciente e errônea à selvageria e nos fazem esquecer nossa própria miséria histórica. Isso que esses discentes absorviam é o que Freire chama de consciência ingênua, elas/eles não questionavam nada a respeito dessas informações. Nem sequer se perguntavam: essa miséria era uma constante em todos os países da África? Não existe em outros países? Essas/esses africanas/africanos

escravizadas/escravizados só apanhavam por não obedecerem às/aos patroas/patrões? Por que não obedeciam? E muitos e muitos outros questionamentos que poderiam ser feitos.

Olhando as observações feitas nos cadernos memoriais, encontramos respostas como a de Cola, quando esta/este fala do preconceito racial, camuflado na maioria das vezes, mas que se torna escancarado quando dados do IBGE mostram que são as/os negros (preferimos afrodescendentes) as/os que conseguem menor escolaridade, são as/os que mais morrem assassinadas/assinados, são as maiores vítimas da violência policial.

Imaginem o nível de conscientização de uma/um discente desta/deste, que, ao fim de uma formação, depois de algumas discussões, é capaz de enxergar esse racismo nem sempre explícito, e a situação na qual se encontra uma parcela significativa da população brasileira, as/os afrodescendentes brasileiras/brasileiros. Mais que isso, enxergar que esse conhecimento sobre a maior parcela da população é falha, e que é um saber necessário para o seu bom desempenho profissional. Dando continuidade às categorias trabalhadas nas rodas de conversa, essa pessoa participante da pesquisa é um corpo de conscientização, ou, melhor dizendo, em processo de conscientização.

Trabalhando as narrativas das rodas de conversa de Esquadro e Miçanga, que são um resumo das falas do grupo, além dos recortes das duas histórias acima trabalhadas, percebeu-se a conscientização acerca do tratamento racista a elas/eles dispensado de forma tão sutil que passava desapercebido, olhares atravessados que muitas vezes as/os levavam a afirmar: “está me tratando assim e ou me olhando assim porque sou pobre”, e hoje elas/eles afirmam categoricamente que não era apenas por serem pobres, mas, antes de tudo, por serem afrodescendentes.

Um outro depoimento, contado não para o grupo como um todo, mas no pé do ouvido da coordenadora e que precisa aqui ser pontuado: “Professora, a senhora acha que pelo fato de eu ter essa pele clara e esse cabelo liso eu sou branca? Sou não professora, meu cabelo é alisado desde que eu era muito pequena, gasto boa parte do meu salário alisando e tratando esse cabelo, só para manter essa aparência que é mais aceita pela sociedade” (Colchete, 2019). Imaginem a força deste depoimento.

Que categoria poderíamos criar para esse corpo? Corpo desfigurado? Corpo não aceitação? Não quero aqui entrar na seara da psicologia, até porque não é objetivo do nosso trabalho, nosso intuito é apenas pontuar que um corpo que verbaliza isso está passando por um processo de conscientização, como fala a música de Jorge Portugal e Lazzo Matumbi: “Eu sou o que sou, pois agora eu sei quem sou eu”.

Este processo de embranquecimento é muito forte no Brasil, não estamos aqui questionando o direito de você cuidar da sua aparência da forma que bem lhe aprouver, o que estamos aqui questionando é a imposição social infligida por uma sociedade racista que valoriza os traços dos chamados brancos e desvaloriza os traços de nossas/nossos ancestrais africanas/africanos. Impossível aqui não ir buscar no pensamento de Edson Bomfim dos Santos (2015), quando este fala da autonegação para uma sobrevivência inclusiva, quando ele diz que a nossa sociedade nega a si própria quando nega a nossa multiculturalidade, quando assoberba o sentimento de europeização e sufoca os valores da nossa ancestralidade africana, o que nos coloca na condição de afirmação do não ser; ele pontua que não somos cidadãs/cidadãos de nossa própria origem étnica, por ela ser negada e desconsiderada por toda sociedade e até por nós mesmos, e, isso se dá por desconhecimento, acomodação ou alienação.

Entretanto, o sentimento de pertencimento é muito potente e precisa ser melhor trabalhado, estudado. Imaginem uma menina que cresceu alisando os cabelos, aprendendo desde a mais tenra idade a negar sua etnicidade, sua/seu mãe/pai assim o fizeram com o intuito de lhe proteger de uma sociedade racista. Entretanto, bastou um curso de extensão para lhe cutucar devagarinho que o vulcão de sua etnicidade reprimida foi capaz de soltar essas lavas tão avassaladoras. Esse não foi o único momento em que essa etnicidade falou mais alto. Vamos agora pontuar algumas aprendizagens sobre afrodescendência (des) construídas nos croquis.

Cumpre pontuar que logo no final da apresentação de cada uma/um delas/deles, fizemos uma breve e suscinta análise. Retornemos a algumas delas e vamos tentar acrescentar um pouco mais.

Quando uma/um discente, que no início da empreitada só conhecia a respeito das/dos nossas/nossos ancestrais africanas/africanos o sofrimento, a miséria e a errônea selvageria, ao final cria uma peça colorida homenageando todas as orixás femininas, isso demonstra que essa/esse estudante deu algumas braçadas no sentido de entender um pouco mais a cultura de nossas/nossos ancestrais africanas/africanos, homenagear as ayabás, como são chamadas em iorubá, começando por Nanã, a mais velha, a avó; seguida por Iemanjá a rainha das águas; por Iansã, a deusa das alturas, da tempestade, dos ventos; por Obá; por Ewá e por Oxum, a deusa da beleza, da riqueza da faceirice e do dengo, foi o que fez Alfinete. Adentrar nessa ceifa significa tentar entender pelo menos um pouco de toda a cosmologia afro-iorubana que levou essas/esses africanas/africanos escravizadas/escravizados a criarem, em terras brasileiras, um culto totalmente distinto que resultou em muitas religiões hoje cultuadas no Brasil, as quais denominamos religiões afro-brasileiras (candomblé, umbanda, xangô, jurema, babaçuê, mina, terecô entre outras). Fez também com que essas/esses africanas/africanos

escravizadas/escravizados e suas/seus descendentes se apossassem de um sincretismo religioso que até hoje confunde muita gente. Você nunca vai saber quem realmente aquelas baianas, que lavam as escadarias do Bomfim, estão homenageando, se o Senhor do Bomfim ou Oxalá. Para elas, os dois são a mesma entidade.

Um outro trabalho que não podemos deixar de pontuar, a belíssima peça que abriu o desfile, idealizada por Furador. A inspiração veio a partir das belíssimas joias Ashanti.

Imaginem uma/um discente, que no início do trabalho achava que nossas/nossos ancestrais africanas/africanos eram homens que se deixaram escravizar e vieram para essas terras onde por qualquer motivo eram espancadas/espancados, pois foi dito pela maioria delas/deles que essa sempre foi a imagem passada no dia 13 de maio nas escolas onde estudaram, dia da libertação dos escravos, dia da promulgação pela Princesa Isabel da famosa Lei Áurea. A outra imagem que tinham era a usada abusivamente pela mídia – a miséria e a fome de alguns países africanos. Ou uma última, a exuberância da fauna e da flora africana, na qual a forma como o processo natural é divulgado nos remete, sem sombra de dúvidas, a uma falsa selvageria.

Agora raciocinem comigo, essa/esse discente, ao término do curso de extensão, se conscientiza de que as/os nossas/nossos ancestrais africanas/africanos não eram essas/esses mulheres/homens sem conhecimento que querem a todo custo nos fazer acreditar, àquela época já detinham total conhecimento dos metais, já fabricavam belíssimas joias em ouro. Vejam a mudança pela qual passou essa/esse estudante. Vejam que as impressões dela/dele a respeito das/dos seus ancestrais africanas/africanos é uma outra completamente diferente da que ela/ele tinha no início dos trabalhos. Esse sentimento também está expresso nos questionamentos, e é o que vamos pontuar a seguir.

Falando de inspirações para construção da peça, Esquadro verbaliza que foi muito construtivo para ela/ele o entusiasmo criador baseado na história de nossas/nossos ancestrais africanas/africanos e que ela/ele usou os símbolos Adinkras. Máquina Galoneira pontuou a importância de mergulharmos fundo na temática. Barbante pontua a falta dessas discussões na escola e afirma que o curso de extensão abriu sua visão e despertou o seu lado humano e também o seu direcionamento profissional. Cola nos disse que o curso lhe proporcionou uma visão dos motivos pelos quais o racismo existe e persiste no Brasil e o quanto esse conhecimento instigou seu processo criativo. Calcador fala desse racismo disfarçado que adoece as pessoas e acreditamos que essa temática deva ser mais trabalhada nos cursos de moda, pois essas/esses futuras/futuros profissionais irão trabalhar para uma população majoritariamente afrodescendente (negros e pardos na linguagem do IBGE).

Falando em racismo, Alfinete fala dos reflexos de uma cultura preconceituosa como a nossa, que valoriza apenas nossas origens europeias, deixando de lado as nossas origens africanas e indígenas. Máquina Galoneira elogia o curso e diz nunca ter participado de algo que a/o impactasse tanto e afirma que o racismo já não cabe, já não tem espaço nesse mundo. Linha nos diz que hoje, depois do curso, consegue visualizar melhor, consegue enxergar o racismo onde antes não conseguia avistar. Barbante afirma que o racismo é cruel e provoca nas pessoas que sofrem esse processo de segregação dores profundas, afirma que ele oportuniza baixa autoestima, abre feridas que deixam cicatrizes para toda uma vida. Cordão vai mais adiante, pontua que o racismo adoece as pessoas ao ponto de ser capaz de leva-las ao suicídio.

Depois de algum tempo estudando a temática do racismo, suporte do sistema capitalista, temos consciência de que tudo que foi verbalizado por nossas/nossos partícipes até o presente é real, verdadeiro. Ficamos satisfeitas/satisfeitos com o que elas/eles conseguiram absorver e, para finalizar, vamos pontuar algumas falas a respeito das práticas educativas desenvolvidas nesse curso de extensão que objetivava a (des) construção de aprendizagens sobre afrodescendência, tornando essas/esses futuras/futuros designers pessoas mais críticas, especialmente no que tange ao seu futuro desempenho profissional.

Lápis pontua a importância do curso na construção do desfile, fala de sua indignação pelo desprezo que é dispensado a uma cultura tão rica como a cultura africana. Mais que isso, demonstra o seu estarrecimento pela postura falsa da sociedade brasileira, que usa e abusa dessa herança cultural (culinária, música, dança, moda entre outras) e não lhe dispensa os créditos devidos. Colchete fala dos momentos de reflexão durante essas práticas, a respeito dos preconceitos enraizados na estrutura de nossa sociedade e da importância dessas reflexões na formação de uma/um cidadã/cidadão consciente.

Máquina Overloque fala do quão importante é para uma/um futura/futuro designer de moda o conhecimento de todos os problemas da sociedade na qual ela/ele irá atuar. Afirma que a cantilena de que somos uma sociedade não racista não se sustenta, pois essa se desfaz quando a primeira oportunidade aparece e o racismo se apresenta com todas as suas garras.

Miçanga pontua sua mudança durante e depois do curso, afirma que passou a se interessar mais pelas questões sociais e políticas, e que hoje tem consciência que essa história é a sua história sim.

Por tudo o que foi dito acima, fruto das narrativas expressas nos cadernos memorias, nas rodas de conversa, nos croquis representativos das peças que foram para passarela e, nas respostas aos questionamentos, transformados em 131 segmentos de textos pelo programa de computação de nome IRaMuTeQ, dos quais 103 foram aproveitados, representando um