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Outro termo recorrente para caracterizar a presença é a existência (l’existence). Analisaremos vinte e seis aparecimentos da presença como existência, ressaltando, primeiramente, a relação (de harmonia) da presença com o discurso da visão mediante o contato com a pedagogia da visão e a estrutura de argumentação da constatação da visão, a seguir, a relação (de harmonia) da presença com o espaço (indissociabilidade) e a especificidade, e com a relação, a multiplicidade e o tempo (relação de conflito com o discurso da miscigenação).

O primeiro aparecimento da presença como existência está localizado no décimo parágrafo do primeiro capítulo, “As unidades do discurso”, da segunda parte, “As regularidades discursivas”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a análise da oposição entre descrição do discurso e história do pensamento (ver AS, p. 31-2).

A descrição do discurso, ao contrário da história do pensamento, que é sempre alegoria269, é imanência:

(...) trata-se de compreender o enunciado na estreiteza e singularidade de sua situação [sic]; de determinar as condições de sua existência, de fixar seus limites da forma mais justa, de estabelecer suas correlações com os outros enunciados a que pode estar ligado, de mostrar que outras formas de enunciação exclui. (...) deve-se mostrar por que não poderia ser outro [discurso], como exclui qualquer outro, como ocupa, no meio dos outros e relacionado a eles, um lugar que nenhum outro poderia ocupar. (AS, p. 31, grifo nosso)270

A presença é o acontecimento e a existência (do enunciado). Há relação entre presença, especificidade e espaço: singularidade de acontecimento ou de existência (do enunciado), lugar que nenhum outro (discurso) poderia ocupar (exclusão). “A questão pertinente a uma tal análise poderia ser assim formulada: que singular existência é esta que vem à tona no que se

269 Ver supra no “Capítulo 1 – Epistemologia da percepção: relação entre os sentidos” o primeiro aparecimento

da relação entre invisível e inaudível (sobre o funcionamento da história do pensamento como dominação da aliança entre invisível e inaudível em relação à subordinação do visível audível) e no “Capítulo 2 – Epistemologia da percepção: relação entre visível e invisível” o terceiro aparecimento da estrutura de argumentação da constatação da visão (sobre o funcionamento da história do pensamento como dominação do invisível em relação à subordinação do visível).

diz e em nenhuma outra parte [sic]?” (AS, p. 31-2, grifo nosso)271 A presença é a existência (do dito). Existe relação entre presença, especificidade e espaço: singular existência (a presença é sempre específica) do dito como lugar (a presença é sempre espacial) – a permanência no visível é assegurada pela presença (e pela presença no espaço: indissociabilidade entre presença e espaço) como especificidade, quer dizer, procura da visão específica como minúcia272.

O segundo aparecimento da presença como existência está situado no décimo-segundo parágrafo do segundo capítulo, “As formações discursivas”, da segunda parte, “As regularidades discursivas”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a definição de formação discursiva e de regras de formação (ver AS, p. 43-4).

A formação discursiva, como descrição da regularidade entre objetos, tipos de enunciação, conceitos e escolhas temáticas, está relacionada à definição de regras de formação: “As regras de formação são condições de existência (mas também de coexistência, de manutenção, de modificação e de desaparecimento) em uma dada repartição discursiva [objetos, modalidade de enunciação, conceitos, escolhas temáticas].” (AS, p. 43-4, grifo nosso) A presença é a existência (dos objetos, das modalidades de enunciação, dos conceitos e das escolhas temáticas enquanto formação discursiva).

O terceiro aparecimento da presença como existência está localizado no sétimo parágrafo do sétimo capítulo, “Observações e consequências”, da segunda parte, “As regularidades discursivas”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a análise da individualização de um sistema de formação como caracterização de um discurso ou de um grupo de enunciados pela regularidade de uma prática (ver AS, p. 81-2).

Os sistemas de formação são imanentes ao discurso:

Esses sistemas [de formação] (...) residem no próprio discurso; ou antes (já que não se trata de sua interioridade e do que ela pode conter, mas de sua existência específica e de suas condições) em suas fronteiras, nesse limite em que se definem as regras específicas que fazem com que exista como tal. (AS, p. 81-2, grifo nosso)

A presença é a existência (do discurso). Há relação entre presença e especificidade: existência específica (do discurso). A presença (como existência) está em oposição à ausência (como interioridade) – é a permanência no visível como visão específica que recusa o recurso ao invisível.

271 Problema de tradução: ao invés de (em nenhuma outra parte” deveria ser “em nenhum outro lugar”.

272 Ver supra complementarmente no “Capítulo 2 – Epistemologia da percepção: relação entre visível e

O quarto aparecimento da presença como existência está situado no décimo-segundo parágrafo do primeiro capítulo, “Definir o enunciado”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a análise crítica do limiar do enunciado como limiar de existência dos signos (ver AS, p. 96).

O questionamento do enunciado é o de seu limiar como existência dos signos:

(...) seria necessário admitir que há enunciado desde que existam vários signos justapostos – e por que não, talvez? – desde que exista um e somente um. O limiar do enunciado seria o limiar de existência dos signos. Entretanto, (...) as coisas não são tão simples, e o sentido que é preciso dar a uma expressão como “a existência dos signos” precisa ser elucidado. Que queremos dizer quando afirmamos que há signos, e que basta que haja signos para que haja enunciado? Que status singular atribuir a esse “há”? (AS, p. 96, sublinhado nosso)

A presença é a existência (verbo haver) - dos signos, do enunciado. Há relação entre presença e especificidade: a singularidade da existência (verbo haver) é o enunciado.

O quinto aparecimento da presença como existência está localizado no décimo-quinto parágrafo do primeiro capítulo, “Definir o enunciado”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a análise do enunciado como função vertical de existência (ver AS, p. 98-9)273.

A definição do enunciado implica presença: “O enunciado (...) é uma função de existência que pertence, exclusivamente, aos signos...” (AS, p. 98-9, grifo nosso) A presença é a existência (dos signos como enunciado) – permanência no visível assegurada pela necessidade da presença274.

O sexto aparecimento da presença como existência está situado no sétimo parágrafo do segundo capítulo, “A função enunciativa”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A

arqueologia do saber. Seu contexto é análise do referencial do enunciado (ver AS, p. 103-5).

O referencial do enunciado implica presença:

Está (...) [um enunciado] ligado a um “referencial” que não é constituído de “coisas”, de “fatos”, de “realidades”, ou de “seres”, mas de leis de possibilidade, de regras de existência para os objetos que aí se encontram nomeados, designados ou descritos, para as relações que aí se encontram afirmadas ou negadas. O referencial do enunciado forma o lugar, a condição, o campo de emergência, a instância de diferenciação dos indivíduos ou dos objetos, dos estados de coisas e das relações que são postas em jogo pelo próprio enunciado; define as possibilidades de aparecimento e de delimitação do que dá à frase seu sentido, à proposição seu valor de verdade. (AS, p. 104, grifo nosso)

273 Ver supra comparativamente o décimo surgimento da presença como aparecimento.

274 Sobre a presença (do enunciado) como visível ou audível (formulação escrita ou oral), ver supra no “Capítulo

1 – Epistemologia da percepção: relação entre os sentidos” o sétimo aparecimento da relação entre visível e audível.

A presença é a existência, a emergência, o aparecimento. Há relação entre presença e espaço: referencial do enunciado como lugar ou campo de emergência (do que é posto em jogo pelo próprio enunciado) – espaço da presença, presença no espaço, indissociabilidade entre presença e espaço.

O sétimo aparecimento da presença como existência está localizado no décimo-quinto parágrafo do segundo capítulo, “A função enunciativa”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a apresentação da terceira característica da função enunciativa, a existência de um domínio associado (ver AS, p. 109-10).

A apresentação da terceira característica da função enunciativa expõe a necessidade da presença: “Terceira característica da função enunciativa: ela não pode se exercer sem a existência de um domínio associado.” (AS, p. 109, grifo nosso) A presença é justamente a existência (de um domínio associado)275. Há relação entre presença e espaço: existência de domínio associado (presença do espaço – indissociabilidade entre presença e espaço).

O oitavo aparecimento da presença como existência está situado no vigésimo-segundo parágrafo do segundo capítulo, “A função enunciativa”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a apresentação da quarta condição para que uma sequência de elementos linguísticos possa ser considerada e analisada como um enunciado, a existência material (ver AS, p. 115).

A exposição da quarta condição da função enunciativa mostra a importância da presença: “... para que uma sequência de elementos linguísticos possa ser considerada e analisada como um enunciado, é preciso que ela preencha uma quarta condição: deve ter existência material.” (AS, p. 115, grifo nosso) A presença é a existência (material): “Poderíamos falar de enunciado se uma voz não o tivesse enunciado, se uma superfície não registrasse seus signos, se ele não tivesse tomado corpo em um elemento sensível e se não tivesse deixado marca – apenas alguns instantes – em uma memória ou em um espaço?” (AS, p. 115, grifo nosso)276 Há relação entre presença e espaço: superfície de registro dos signos, corpo em um elemento sensível, marca em um espaço: “O enunciado é sempre apresentado através de uma espessura material, mesmo dissimulada, mesmo se, apenas surgida [sic], estiver condenada a se desvanecer.” (AS, p. 115, grifo nosso)277 A presença é o aparecimento,

275 Sobre a presença (existência) como materialidade que remete à indistinção ou indiferenciação entre visível e

audível (à custa, entretanto, da possibilidade do governo da visão), ver supra no “Capítulo 1 – Epistemologia da percepção: relação entre os sentidos” o nono aparecimento da relação entre visível e audível.

276 Ver supra comparativa e complementarmente no “Capítulo 1 – Epistemologia da percepção: relação entre os

sentidos” o décimo aparecimento da relação entre visível e audível (sobre as distintas relações entre visibilidade e auditibilidade).

o espaço é a espessura material: presença (sempre) no espaço ou indissociabilidade entre presença e espaço: “... o enunciado tem necessidade dessa materialidade...” (AS, p. 115, grifo nosso) Quer dizer: “As coordenadas [espaço-temporais] e o status material do enunciado fazem parte de seus caracteres intrínsecos.” (AS, p. 115, sublinhado nosso) A presença (existência) no espaço (material) e o espaço (materialidade) da presença (do aparecimento) são características intrínsecas da permanência no visível.

O nono aparecimento da presença como existência está localizado no segundo parágrafo do terceiro capítulo, “A descrição dos enunciados”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a fixação do vocabulário: definição de enunciado e de discurso (ver AS, p. 123-4)278.

Primeiro, a definição do enunciado:

Chamaremos enunciado a modalidade de existência própria desse conjunto de signos [efetivamente produzidos a partir de uma língua natural ou artificial]: (...) modalidade que lhe permite estar em relação com um domínio de objetos, prescrever uma posição definida a qualquer sujeito possível, estar situado entre outras performances verbais, estar dotado, enfim, de uma materialidade repetível. (AS, p. 123-4, sublinhado nosso)

A presença é a existência (do conjunto de signos efetivamente produzidos). Há relação entre presença e especificidade: existência própria dos signos efetivamente produzidos, quer dizer, presença específica – notemos que a permanência no visível é garantida pela identificação da efetividade, daí a necessidade da presença como visão específica. Segundo, a definição de discurso: “... da maneira mais geral e imprecisa, ele [o discurso] designava um conjunto de performances verbais; e entendia-se então por discurso o que havia sido produzido (eventualmente tudo que havia sido produzido) em matéria de conjunto de signos.” (AS, p. 124, grifo nosso) O discurso, como conjunto de todas as performances verbais, portanto presença de todos os signos produzidos, é a vontade de visibilidade absoluta ou total. Continua a definição de discurso: “Enfim – e este sentido foi finalmente privilegiado (com o primeiro que lhe serve de horizonte) – o discurso é constituído por um conjunto de sequências de signos, enquanto enunciados, isto é, enquanto lhes podemos atribuir modalidades particulares de existência.” (AS, p. 124, grifo nosso) A presença é a existência (de um conjunto de sequências de signos enquanto enunciados). Há relação entre presença e especificidade: existência particular ou específica de um conjunto de sequências de signos como enunciados. O discurso como vontade de visibilidade absoluta ou total (primeiro sentido de discurso) é o horizonte do discurso como presença específica (último sentido,

278 Como a definição de enunciado e de discurso é construída a partir da definição de performance verbal ou

privilegiado, do discurso), quer dizer, o escopo é ver tudo, e isso somente é possível porque tudo está presente (permanência no visível como necessidade da presença), e como cada presença é específica, a visão absoluta ou total é da especificidade279.

O décimo aparecimento da presença como existência está situado no quinto parágrafo do terceiro capítulo, “A descrição dos enunciados”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a análise do enunciado como não visível e não oculto (ver AS, p. 125-6).

O enunciado é não visível e não oculto devido à sua verticalidade: “A descrição dos enunciados se dirige, segundo uma dimensão de certa forma vertical, às condições de existência dos diferentes conjuntos significantes.” (AS, p. 125, grifo nosso) Dito de outro modo: “Descrever um enunciado (...) significa (...) definir as condições nas quais se realizou a função que deu a uma série de signos (não sendo esta forçosamente gramatical nem logicamente estruturada) uma existência, e uma existência específica.” (AS, p. 125, grifo nosso) A presença é a existência (dos diferentes conjuntos significantes a partir da descrição dos enunciados e/ou de uma série de signos). Existe relação entre presença e especificidade: existência específica (de uma série de signos como enunciado)280.

O décimo-primeiro aparecimento da presença como existência está localizado no sexto parágrafo do terceiro capítulo, “A descrição dos enunciados”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a análise do enunciado como não oculto (ver AS, p. 126)281.

O enunciado é não oculto: “Não oculto, por definição, já que caracteriza as modalidades de existência próprias de um conjunto de signos efetivamente produzidos.” (AS, p. 126, grifo nosso) A presença é a existência (de um conjunto de signos). Há relação entre presença e especificidade: existência própria de um conjunto de signos efetivamente produzidos (a identificação da efetividade é a permanência no visível como especificidade): “A análise enunciativa só pode se referir a coisas ditas, a frases que foram realmente pronunciadas ou escritas, a elementos significantes que foram traçados ou articulados – e, mais precisamente, a essa singularidade que as faz existirem...” (AS, p. 126, grifo nosso) Há relação entre presença e especificidade (como identificação da efetividade): existência

279 Sobre a visão absoluta ou total da especificidade, ou sobre como a visão absoluta ou total é constituída pela

visão específica, ver supra no “Capítulo 2 – Epistemologia da percepção: relação entre visível e invisível” o oitavo e o décimo-sexto aparecimento da estrutura de argumentação da constatação da visão.

280 Ver supra no “Capítulo 2 – Epistemologia da percepção: relação entre visível e invisível” o nono

aparecimento da estrutura de argumentação da constatação da visão (sobre a visão vertical como permanência no visível que é procura da minúcia da visão, busca da visão específica).

281 Ver supra comparativa e complementarmente no “Capítulo 2 – Epistemologia da percepção: relação entre

singular do realmente dito, pronunciado/escrito/traçado ou articulado – audível, visível, tátil282: “Só pode se referir a performances verbais realizadas, já que as analisa ao nível de sua existência: descrição das coisas ditas, precisamente porque foram ditas.” (AS, p. 126, grifo nosso) A presença é a existência (das performances verbais ou das coisas ditas) – a realização das performances verbais é a identificação de sua efetividade que garante a permanência no visível (como especificidade). Neste sentido, a permanência no visível (presença efetiva específica) é um procedimento epistemológico-metodológico da história:

A análise enunciativa é, pois, uma análise histórica (...): às coisas ditas, (...) pergunta (...) de que modo existem, o que significa para elas o fato de se terem manifestado, de terem deixado rastros e, talvez, de permanecerem para uma reutilização eventual; o que é para elas o fato de terem aparecido – e nenhuma outra em seu lugar. (...) aquilo a que nos dirigimos está na evidência da linguagem efetiva. (AS, p. 126, grifo nosso)

A presença é a existência, a manifestação e o aparecimento (das coisas ditas). Há relação entre presença e espaço: aparecimento das coisas ditas em seu lugar como apelo à evidência da linguagem efetiva – quer dizer, presença no espaço, ou indissociabilidade entre presença e espaço, como identificação da efetividade (ou permanência no visível).

O décimo-segundo aparecimento da presença como existência está situado no sétimo parágrafo do terceiro capítulo, “A descrição dos enunciados”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a análise do enunciado como crítica aos efeitos de redobramento ou de desdobramento e de desdobramento ou de recalcamento (ver AS, p. 126-7).

A análise enunciativa é crítica da busca das significações ocultas e da procura das repressões: “... o próprio enunciado não é afetado, pelo desdobramento ou pelo recalcamento [: repressões; e pelo redobramento ou pelo desdobramento: significações ocultas], já que é a modalidade de existência da performance verbal tal como foi efetivada.” (AS, p. 127, grifo nosso) A presença é a existência (da performance verbal). A identificação da efetividade indica a necessidade da presença: existência efetiva da performance verbal (permanência no visível, portanto). Há crítica da ausência como não-dito: o oculto e a repressão são a inexistência e a abstração283.

282 Ver supra no “Capítulo 1 – Epistemologia da percepção: relação entre os sentidos” o décimo-terceiro

aparecimento da relação entre visível e audível (sobre a relação entre audível, tátil e visível como remissão última ao comando ou governo do visível).

283 Ver supra no “Capítulo 2 – Epistemologia da percepção: relação entre visível e invisível” o nono

aparecimento da estrutura de argumentação da constatação da visão (sobre como a identificação da efetividade garante a permanência no visível através da necessidade da presença e autoriza a vontade de visibilidade absoluta ou total, e sobre como o não-dito como oculto ou repressão está associado ao jogo de dominação do invisível em relação à subordinação do visível).

O décimo-terceiro aparecimento da presença como existência está localizado no oitavo parágrafo do terceiro capítulo, “A descrição dos enunciados”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a análise da diferença entre a ausência característica de uma regularidade enunciativa e as modalidades diversas do não-dito (ver AS, p. 127-8).

Há uma diferença entre a ausência e a ocultação: a primeira é exterior ao enunciado, a segunda é interior a ele284:

(...) a todas essas modalidades diversas do não-dito [redobramento ou desdobramento: oculto, e desdobramento e recalcamento: repressão] que podem ser demarcadas sobre o campo enunciativo, é necessário, sem dúvida, acrescentar uma ausência, que, ao invés de ser interior, seria correlativa a esse campo e teria um papel na determinação de sua própria existência. (AS, p. 127, sublinhado nosso)

A presença é a existência (do enunciado). Há relação entre presença e espaço: existência do campo enunciativo (presença do espaço – indissociabilidade entre presença e espaço). A ausência é constitutiva do enunciado: “Pode haver – e, sem dúvida, sempre há – nas condições de emergência dos enunciados, exclusões, limites ou lacunas que delineiam seu referencial, validam uma única série de modalidades, cercam e englobam grupos de coexistência, impedem certas formas de utilização.” (AS, p. 127-8, grifo nosso) A presença é a emergência (dos enunciados).

O décimo-quarto aparecimento da presença como existência está situado no décimo parágrafo do terceiro capítulo, “A descrição dos enunciados”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a apresentação da primeira razão do nível enunciativo como proximidade, a quase-invisibilidade do “há” (ver AS, p. 128).

O nível enunciativo se esboça em sua própria proximidade: “Ele [o enunciado] tem essa quase-invisibilidade do ‘há’, que se apaga naquilo mesmo do qual se pode dizer: ‘há tal ou tal coisa’.” (AS, p. 128, grifo nosso) A presença é a existência (verbo haver) – do enunciado. Esta necessidade da presença garante a permanência no visível285.

O décimo-quinto aparecimento da presença como existência está localizado no décimo-primeiro parágrafo do terceiro capítulo, “A descrição dos enunciados”, da terceira parte, “O enunciado e o arquivo”, de A arqueologia do saber. Seu contexto é a apresentação

284 Sobre o não-dito como possibilidade e infinito ou ilimitado, daí dominação do invisível, oposto à ausência

como efetividade, daí permanência no visível como visão solitária e soberana, e finitude ou limite, daí visão absoluta ou total, ver supra no “Capítulo 2 – Epistemologia da percepção: relação entre visível e invisível” o nono aparecimento da estrutura de argumentação da constatação da visão.

285 E indica a busca da visão diferente como minúcia. Ver supra comparativamente no “Capítulo 2 –

Epistemologia da percepção: relação entre visível e invisível” o nono aparecimento da estrutura de argumentação da constatação da visão.

da segunda razão do nível enunciativo como proximidade, a remissão da estrutura significante da linguagem sempre a outra coisa (ver AS, p. 128-9).

A estrutura significante da linguagem remete sempre a outra coisa: “Não é ela [a linguagem] o lugar de aparecimento de algo diferente de si e, nessa função, sua própria existência não parece se dissipar?” (AS, p. 128, grifo nosso)286 A presença é justamente o aparecimento e a existência (da linguagem). Há relação entre presença e espaço: linguagem como lugar de aparecimento (espaço da presença, indissociabilidade entre presença e espaço).

Ora, se queremos descrever o nível enunciativo, é preciso levar em consideração justamente essa existência; interrogar a linguagem, não na direção a que ela remete, mas na dimensão que a produz; (...) se deter no momento (...) que determina sua existência singular e limitada. (AS, p. 128- 9, grifo nosso)

A presença é a existência (como produção da linguagem). Há relação entre presença e especificidade: existência singular e limitada (da linguagem). O reconhecimento do limite é a