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Primeira parada Caruaru (PE): A Onça de Vitalino

3.1 ENSAIO 1 – DOS TRILHOS ÀS TRILHAS DA INVENÇÃO, DA MÚSICA E DAS ARTES VISUAIS: SYLVIA ORTHOF E TATO GOST EM DIÁLOGOS

3.1.2 Primeira parada Caruaru (PE): A Onça de Vitalino

Figura 3 – Salvador-BA / Caruaru-PE

Miauuuuuuuuu! O miado da Onça anuncia que chegamos em Caruaru. O vento traz a voz marcante do Rei do Baião, Luiz Gonzaga que canta os versos de Onildo Almeida:

A Feira de Caruaru, /Faz gosto a gente vê./ De tudo que há no mundo,/Nela tem pra vendê,/ Na feira de Caruaru./ Tem loiça, tem ferro véio,/ Sorvete de raspa que faz jaú,/ Gelada, cardo de cana,/ Fruta de paima e mandacaru./ Bunecos de Vitalino,/ Que são cunhecidos inté no Sul,/ De tudo que há no mundo,/Tem na Feira de Caruaru. (ALMEIDA, 1972)

Nosso guia, a Onça de Vitalino, trata logo de falar sobre a riqueza da feira da Capital do Agreste. É pela felina que ficamos sabendo que a Feira de Caruaru, no ano

de 2006, recebeu do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN)20 o título de Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro e foi registrada no Livro de Registros de Lugares. Toda orgulhosa de sua cidade, a Onça vai nos mostrando pontos turísticos de Caruaru. Vemos o Museu do Barro Espaço Zé Caboclo – MUBAC, conhecido por suas coleções que apresentam os principais polos de cerâmica popular da região21.

Para descansarmos e apreciarmos as belezas naturais da cidade, a Onça nos leva ao Parque Municipal Ambientalista Severino Montenegro, uma área de 4 hectares, com muitas árvores e plantas ornamentais, um lago com cascata, anfiteatro, banheiros e estacionamento. No meio da conversa, a Onça nos convida para o São João da cidade que, segundo ela, é o maior do Brasil e nem quis conversa quando eu falei sobre o São João de Campina Grande. Bem, com Onça não se discute! Decidimos ir ao Museu do Cordel Olegário Fernandes, que recebe o nome de Olegário Fernandes, cordelista pernambucano que escreveu cerca de duzentas histórias.

A Onça, percebendo nossa ansiedade para saber mais sobre Mestre Vitalino, começa a caminhar conosco para o Alto do Moura, mas nos fazendo prometer que visitaremos, no futuro, o Memorial da Cidade de Caruaru, o Parque Ecológico João Vasconcelos Sobrinho – Serra dos Cavalos, o Parque Drayton Nejaim, o Parque do São Francisco, o Parque das Rendeiras, o Parque das Baraúnas, o Palácio Episcopal, o Monte Bom Jesus, a Praça do Rosário, a Igreja da Nossa Senhora da Conceição, e, é claro, a Academia Caruaruense de Cultura, Ciências e Letras – ACACCIL. Promessa feita, vamos ao Alto do Moura!

No Alto do Moura, conhecemos o Memorial Mestre Galdino em que estão expostas peças de barro, além de poesias, fotografias e textos acerca da vida e da obra de Galdino22 que, contemporâneo de Vitalino, também foi um artista criador de obras de arte com o barro.

20 Mais informações sobre a feira podem ser encontradas no dossiê elaborado pelo IPHAN. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Dossie_feira_de_caruaru.pdf> Acesso em: 01 de mar. de 2017.

21 As informações sobre os pontos turísticas presentes nesta subseção foram coletadas da página da Prefeitura de Caruaru. Disponível em: <

http://www.cultura.pe.gov.br/pagina/espacosculturais/museu-do-barro-de-caruaru-mubac/> Acesso em: 01 de mar. de 2017.

22 Informações sobre o Mestre Galdino e o museu dedicado a ele estão disponíveis na página: <http://museusdecaruaru.blogspot.com.br/p/memorial-mestre-galdino.html> Acesso em: 01 de mar. De 2017.

Figura 4 – Andanças por Caruaru

Enquanto caminhamos para a Casa Museu Mestre Vitalino, a Onça, emocionada, nos conta que Vitalino Pereira dos Santos, o Mestre Vitalino, viveu desde a infância em Pernambuco, ali mesmo, em Caruaru. Desde criança, ele gostava de modelar figuras de barro; os bonecos eram os brinquedos do menino Vitalino.

Quando adulto, Vitalino se destacou como artista do barro, pois as suas peças retratavam figuras do cotidiano da cidade e do universo cultural do Nordeste do país. Em meio as suas criações, estavam presentes as representações das festas populares, com os violeiros e os tocadores de pífano. Vitalino era um amante da música, tocava pífano, e, em 1920, participou de algumas bandas, entre elas uma chamada Zabumba Vitalino. Entre as obras do artista pernambucano, também figuram casais de noivos, pessoas em cerimônias religiosas (procissões, batizados, casamentos, enterros), pessoas em atividades profissionais (vaqueiros, agricultores, soldados, dentistas), os cangaceiros do bando de Lampião, e, evidentemente, os animais. O boi foi um dos primeiros animais a ser representado e ao qual ele mais se dedicou.

Somente em 1947, as obras de Vitalino começaram a se popularizar no Brasil, em virtude da organização da 1ª Exposição de Cerâmica Pernambucana no Rio de

Janeiro pelo desenhista e educador Augusto Rodrigues. Após essa exposição, Vitalino começou a ser conhecido no Brasil, pois ele estampou matérias de muitos jornais do nosso país, a citar, o Jornal de Letras e a Revista Esso. Vitalino também participou da exposição Arte Primitiva e Moderna Brasileiras, em Neuchatel, na Suíça. Mas foi somente após a sua morte que o artista alcançou uma maior notoriedade, tanto no cenário nacional quanto internacional.23

O Mestre Vitalino deixou o nosso planeta em 1963 e foi morar nas estrelas, onde talvez esteja tocando uma seresta para Dona Noite, pois a Sylvia e o Tato já contaram no livro Dona Noite Doidona, que Dona Noite gosta de ouvir seresta. Apesar disso, a obra do Mestre permanece conosco, seja pela sua presença em muitos museus do Brasil; a Casa-Museu Mestre Vitalino, no Alto do Moura, o Museu do Barro de Caruaru, o Museu Casa do Pontal, no Rio de Janeiro, e do mundo, o Museu do Louvre, em Paris; ou pelos seus muitos aprendizes, inclusive seus filhos, em especial Severino Vitalino, que coordena a Casa-Museu, seus netos e até bisnetos que continuam criando com o barro peças que retratam o cotidiano e a cultura do povo de Caruaru. Em 1971 a casa de Vitalino foi transformada em museu.

Hoje, ao olharmos pela porta da Casa-Museu Mestre Vitalino, vemos Severino Vitalino, filho do Mestre Vitalino, modelando algumas peças. Ao voltarmos o nosso olhar para Onça, a pintada deu um pulo e virou livro. Na capa nós lemos A Onça de Vitalino. Sorridente, a felina nos convida a entrar no livro, como se a capa fosse uma porta. Vamos lá?

Ao entrarmos no livro, vemos o Mestre Vitalino em sua mesa de trabalho, dando forma aos seus bonecos. De repente, do meio do barro, surge uma onça, a nossa velha amiga. Como já suspeitávamos, a onça é uma mistura de barro e fantasia, e, em um pulo, viaja no tempo e encontra com o bando de Lampião. A Onça prega uma peça no chefe do bando, foge e acaba parando num consultório de um dentista. Ao vir a Onça, o cliente cai assustado e perde o dente que seria arrancado. Saindo do consultório, a Onça continua a causar confusão. Encontra um casamento e, ao resolver soltar um miado, a noiva, o noivo, os violeiros e os convidados fugiram

23 Informações sobre a vida e a obra do Mestre Vitalino, incluindo as que cito, podem ser encontradas na Enciclopédia do Itaú Cultural, em séries de documentários como o intitulado “Mestre Vitalino” produzidos pela TV Brasil em homenagem ao centenário de nascimento do artista, em livros, como Vitalino: um ceramista popular do Nordeste, de René Ribeiro, além de revistas e jornais físicos e virtuais, como a edição 102 Revista Continente do ano de 2009. Os documentos que consultei para a escrita deste texto constam na seção referências.

assustados. O padre, em meio à correria, declara que os noivos já estavam casados. A Onça sai zangada, pois sua voz não agradara. Vai parar em uma festa e resolve entrar na dança. Por fim, chega o Mestre Vitalino com um monte de oncinhas que a dona Onça decide adotar. (ORTHOF, 1994) E como conclui Sylvia: “Saiu do barro inventado, entrou na boca do forno, pintou onça na história, quem quiser, pinte de novo!” (ORTHOF, 1994, p.31)

A Onça de Vitalino é um livro que pertence à coleção Toda arte tem história, da editora Salamandra. Sobre ela não encontramos informações nos meios virtuais. Isso se pode dever, talvez, ao fato de a coleção já não fazer mais parte do catálogo da editora. É preciso ressaltar, apesar de a obra surgir mediante uma demanda externa, Sylvia consegue se desvencilhar das armadilhas do didatismo e, junto com Tato, trazer, para a literatura infantil, a herança da cultura popular brasileira, em especial, a pernambucana, representada por Vitalino, sem fazer a literatura parecer lição de casa, como Sylvia sempre reclamava: “o livro não é dever de casa, é um direito. Direito de ler, gostar, não gostar, trocar de autor ou de livro”. (ORTHOF, 2006, p. 174). Talvez pensando justamente na literatura como direito é que Sylvia e Tato criaram a narrativa A Onça de Vitalino, pois as crianças têm direito, direito de conhecer a cultura desse país tão plural que é o Brasil, têm direito de ler um livro de literatura com uma “história bem contada”, em consonância com o canto de Bia Bedran (2004): Uma história bem inventada/ E bem contada por ti/ Vale a vida, vale risada,/Vale a pena existir.

A mesma Sylvia que defendia que livros não eram “dever de casa” também acreditava que, mesmo não sendo dever de casa, com os livros podemos aprender muito (ORTHOF, 2006). O que dialoga com o pensamento já citado na seção Ponto de Pesquisa, do teórico francês Roland Barthes:

A literatura assume muitos saberes. Num romance como Robinson Crusoé, há um saber histórico, geográfico, social (colonial), técnico, botânico, antropológico (Robinson passa da natureza à cultura). Se, por não sei que excesso de socialismo ou barbárie, todas as nossas disciplinas devessem ser expulsas do ensino, exceto uma, é a disciplina literária que deveria ser salva, pois todas as ciências estão presentes no monumento literário. (BARTHES, 2013, p. 18-19)

Sabendo disso, é possível afirmar que, ao ler A Onça de Vitalino, é possível aprender e aprender com alegria, pois, em meio ao quiprocó estabelecido em razão de uma onça à solta no sertão pernambucano, esbarrando em cangaceiros, visitando o consultório de um dentista, estragando festas de casamento e entrando em uma

roda de dança, descobrimos traços da cultura do nordeste, marcada pelas festas populares, sempre coloridas e muito bem representadas através das cores primárias usadas por Tato na criação das ilustrações, pela religiosidade, pelas figuras marcantes, como Lampião e seu bando, e, como não poderia deixar de ser, pela arte.

Sobre a arte, na seção do livro reservada às palavras da autora, Sylvia revela:

Adoro andar em feiras, procurar objetos de arte popular. Em Caruaru, vendo os bonequinhos de barro da linha de Vitalino, tive vontade de comprar tudo. A Onça de Vitalino nasceu dessa paixão por aquilo que é verdadeiro, que nasce da alma do povo, passa para a mão, vira arte. (ORTHOF, 1994, p.35)

A presença de elementos da cultura popular brasileira em muitos de seus livros revela os traços da brasilidade de Sylvia. Em casos como em A Onça de Vitalino e Mula sem cabeça e outras histórias, esses elementos se manifestam em primeiro plano, porém, em outros livros, eles se manifestam de diferentes maneiras. Em Fada Fofa Onça-Fada, o Vento e a Fada Fofa resolvem “bailar uma história de cirandeiro festeiro, um troço bem brasileiro” (ORTHOF, 1998, p.9), revelando as influências da cultura popular no texto. Também em Ervilina e o Princês ou Deu a Louca em Ervilina, o texto que encerra a narrativa remete aos textos da tradição oral brasileira: “O princês ficou sem graça,/ detestou a tal história,/chegou na sua janela,/ botou a língua de fora,/ disse um verso bem bonito,/disse adeus e foi-se embora!.” (ORTHOF, 2009, p. 36) Ou ainda, o fato de a galinha, personagem da narrativa Mudanças no galinheiro mudam as coisas por inteiro, ao se conscientizar da sua condição social e cantar, remete à expressão popular “cantar de galo”.

No livro A Onça de Vitalino, a presença da cultura popular se manifesta tanto no texto verbal quanto na composição das ilustrações. O texto de Sylvia remete ao universo de criações do Mestre Vitalino, os animais, os cangaceiros, o consultório do dentista, os seresteiros, o casamento, a festa popular, todos os cenários em que a narrativa se desenvolve dialogam com os temas com os quais Vitalino trabalhou para a criação de seus bonecos, o que muito contribuiu com o trabalho de Tato nas ilustrações que apresentam uma releitura das obras de Vitalino. Destaco duas imagens de obras de Vitalino e duas ilustrações de Tato a fim de abonar o que foi posto:

Figura 5 – Cangaceiros (Vitalino) Figura 6 – Cangaceiros (Tato Gost)

Figura 7 – Montaria (Vitalino) Figura 8 – Montaria (Tato Gost)

É importante ressaltar que Tato cria releituras da obra de Vitalino sem abandonar o seu estilo de ilustrar, carregado de traços expressivos (CAMARGO, 1999). Por termos mencionado a expressividade, Luís Camargo, pesquisador brasileiro que se tem dedicado aos estudos da ilustração nos livros infantis, inspirado nas funções de linguagem de Jakobson (função expressiva, função fática, função representativa,

Fonte: Orthof (1994, p.9) Fonte: Museu Casa do Pontal

(http://www.museucasadopontal.com.br/pt- br/mestre-vitalino)

Fonte: Museu Casa do Pontal (http://www.museucasadopontal.com.br

/pt-br/mestre-vitalino)

função conativa, função metalinguística, função lúdica, função narrativa, função de pontuação), pensa em funções para as ilustrações e as explica da forma que segue citada:

A imagem tem função representativa quando imita a aparência do ser ao qual se refere; função descritiva, quando detalha essa aparência; função narrativa, quando situa o ser representado em devir, através de transformações (no estado do ser representado) ou ações (por ele realizadas); função simbólica, quando sugere significados sobrepostos ao seu referente, mesmo que arbitrariamente, como é o caso das bandeiras nacionais; função expressiva, quando revela sentimentos e valores do produtor da imagem, bem como quando ressalta as emoções e sentimentos do ser representado; função estética, quando enfatiza a forma da mensagem visual, ou seja, sua configuração visual; função lúdica, quando orientada para o jogo, incluindo-se o humor como modalidade de jogo; função conativa, quando orientada para o destinatário, visando influenciar seu comportamento, através de procedimentos persuasivos ou normativos; função metalingüística, quando o referente da imagem é a linguagem visual ou a ela diretamente relacionado, como citação de imagens etc.; função fática, quando a imagem enfatiza o papel de seu próprio suporte; função de pontuação, quando orientada para o texto junto ao qual está inserida, sinalizando seu início, seu fim ou suas partes, nele criando pausas ou destacando alguns de seus elementos. (CAMARGO, 1999, p.1)

Se buscarmos entre as funções da ilustração criadas por Luís Camargo, as funções que predominam nas ilustrações de Tato na obra supracitada, a função expressiva se destaca, pois as emoções dos seres representados são colocadas em evidência (figura 9), mas também estão presentes a função representativa, quando Tato faz uma releitura dos bonecos do Mestre Vitalino, a função lúdica, pois as ilustrações têm traços que conduzem ao humor, e a função metalinguística, pois o referente para a composição das ilustrações de Tato são os bonecos de Vitalino que fazem parte da linguagem visual.

Figura 9 – Lampião (traços expressionistas)

Se, por um lado, é possível analisar as ilustrações isoladamente do texto verbal, ou o texto verbal isoladamente das ilustrações, tratando-se de um livro ilustrado em que o texto verbal e as ilustrações estão em simbiose, é interessante que analisemos as articulações entre texto verbal e imagéticos. Sophie Van der Linden, no livro Para ler o livro ilustrado ressalta que (2011, p.87), “[...] o livro ilustrado transcende a questão da copresença por uma necessária interação entre textos e imagens, que o sentido não é veiculado pela imagem e/ou, e, sim, emerge a partir da mútua interação entre ambos.” Tratando-se dessa natureza de livro, é interessante que analisemos as articulações entre texto verbal e ilustrações.

Em seu livro Para ler o livro ilustrado, Linden (2011) estabelece três categorias para pensarmos as relações entre texto verbal e ilustrações em um livro de literatura infantil, são elas: relações de redundância, em que o texto e as ilustrações não dependem um do outro, por buscarem representar os mesmos elementos, embora Linden alerte que “conteúdos idênticos são impossíveis já que textos e imagens pertencem a linguagens distintas”; relações de colaboração, em que o texto verbal e as ilustrações de maneira imbricada são responsáveis pela construção do sentido; relações de disjunção, que são aquelas em que o texto verbal e a ilustrações podem

contar narrativas paralelas, ou haver entre as duas linguagens uma relação de contradição.

Em A Onça de Vitalino, as relações estabelecidas entre texto verbal e ilustrações são relações de colaboração. A narrativa de Sylvia, em verso, articulada com as ilustrações de Tato, dão o ritmo da narrativa. Fosse uma das linguagens, a verbal ou a imagética, suprimidas, haveria perda na construção de sentido. As ilustrações que Tato cria para o livro podem ser classificadas como “imagens associadas”, Linden (2011, p.45) as descreve como imagens “[...] ligadas, no mínimo, por uma continuidade plástica, ou semântica. Elas podem apresentar uma coerência interna (composição plástica, unidade narrativa...) que as torna independentes das imagens que as cercam.” Esse tipo de ilustração, em que as imagens são associadas, muitas vezes, requer um texto verbal que atue para favorecer a continuidade do discurso e é dessa maneira que atua o texto de Sylvia, exercendo uma função de ligação (Linden, 2011).

Figura 10 – Lampião e a Onça (Tato Gost)

Figura 11 – A Onça no consultório do dentista

Isso posto, podemos concluir que ler um livro ilustrado, categoria em que se inclui A Onça de Vitalino, é, como escreve Linden (2011,p. 9) “[...] afinar a poesia do texto com a poesia da imagem, apreciar os silêncios de uma em relação a outra...”

Por fim, tecidas as reflexões que considerei necessárias da leitura do livro A Onça de Vitalino, acerca das relações entre as diferentes linguagens que compõem o livro ilustrado, é preciso ainda recorrer aos escritos de Sylvia Orthof na página dedicada à história do Mestre Vitalino:

Acho que Vitalino era moleque, brincalhão. Agora mesmo, no instante que quero escrever sobre ele, parece que suas figuras de barro cirandam em volta dos meus pensamentos, dando risadinhas.

A mãe de Vitalino era louceira, fazia potes, panelas e penicos.

Quando eu era criança, eu passava trote pelo telefone e perguntava: - Penico de barro cria ferrugem?

E isso tem a ver com Vitalino? Acho que tem: sua arte não esqueceu sua infância. (ORTHOF, 1994, p.33)

É pensando na infância que vejo o livro A Onça de Vitalino como um convite a brincar de poesia ao modo de José Paulo Paes (2010, p.48), dizendo: “Poesia/ é brincar com palavras/ como se brinca/ com bola, papagaio, pião. [...]” No livro de Sylvia e Tato, o convite se amplia, pois brincamos de poesia, acrescentando os bonecos de barro à brincadeira, brincamos também com as histórias do povo nordestino lá das bandas de Caruaru, brincamos com as possibilidades da literatura.

Ao sairmos do livro, vemos a nossa amiga Onça, num só pulo, deixar de ser livro, virar bicho e nos acompanhar enquanto deixamos o Alto do Moura. Ao longe, Leopoldina apita Píííííííííííí, anunciando que está na hora de seguirmos viagem. Até logo, Caruaru! Foi muito bom conhecer você! Próxima parada, Petrópolis, a cidade imperial!

Figura 12 – Passaporte 2

3.1.2.1 Enquanto isso, No vagão LPT... (01)

Ao sairmos da cidade de Caruaru, um grupo e uma dupla de professores em formação, alunos de EDC 306 – Leitura e Produção de Textos, começaram a conversar sobre as proposições pedagógicas que haviam criado, valorizando o livro A Onça de Vitalino, de forma a fomentar a alegria cultural escolar. O uso do verbo fomentar decorre da nossa consciência de que a alegria cultural escolar não é estabelecida em atividades pontuais e nem é uma conquista estável, pelo contrário, Snyders (1993, p. 49) escreve que “Na realidade, a alegria é conquista instável, a ser arduamente defendida, pois está sempre ameaçada de recair no desespero. É impossível separar a alegria cultural da luta para superar a não-alegria; é preciso participar dessa luta”.

Convocados a participar da luta pela alegria cultural escolar, o grupo e a dupla empenhados em levar à escola o livro A Onça de Vitalino, concordaram que a leitura do texto deveria valorizar a cultura nordestina, mas, para tanto, optaram por