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Na primeira parte deste capítulo examin aremos o que foi a Renascença europeia e

No documento História Da Educação e Da Pedagogia.pdf-1 (páginas 195-200)

qual a sua influência nas mudanças no

campo da educação e da reflexão pedagó-

gica. Na segunda parte, encontramos o

Brasil

recém-descoberto

pelos

por-

tugueses. Veremos então os procedimen-

tos para a catequese dos indígenas e a

educação dos filhos de colonos, sem nos

descuidarmos, porém, de examinar a lig-

ação entre essas atividades e os in-

teresses políticos, econômicos e religiosos

da metrópole.

P A R T E I

Renascença europeia

Contexto histórico 1. O humanismo

Durante o Renascimento prevaleceu a tendência um tanto ex- agerada, e até injusta, de considerar a Idade Média, na totalid- ade, como a “idade das trevas” ou “a grande noite de mil anos”. Como vimos no capítulo anterior, esse longo período não foi de total obscuridade. A oposição dos renascentistas devia-se antes à recusa dos valores medievais, respondendo às aspirações dos novos tempos.

O retorno às fontes da cultura greco-latina, sem a intermedi- ação dos comentadores medievais, foi um procedimento que visava também à secularização do saber, isto é, a desvesti-lo da parcialidade religiosa, para torná-lo mais humano. Procurava-se com isso formar o espírito do indivíduo culto mundano, “cortês” (o que frequenta a corte), o gentil-homem.

A negação do ascetismo medieval revela-se na busca de prazeres e alegrias do mundo, desde o luxo na corte, o gosto pela indumentária cuidadosa, até os amenos deleites da vida familiar.

O olhar humano desviava-se do céu para a terra, ocupando-se mais com as questões do cotidiano. A curiosidade, aguçada para a observação direta dos fatos, redobrou o interesse pelo corpo e pela natureza circundante. Nos estudos de medicina ampliaram-se os conhecimentos de anatomia com a prática de dissecação de cadáveres humanos, até então proibida pela Igreja. O sistema heliocêntrico de Copérnico construiu uma nova imagem do mundo.

Nas artes em geral (pintura, arquitetura, escultura e liter- atura) houve criação intensa, e a Itália se destacou como centro irradiador da nova produção cultural. Ainda quando persistiam assuntos religiosos, a visão adquiria um viés humanista, preval- ecendo temas tipicamente burgueses.

Por fim, acentuou-se na Renascença a busca da individualid- ade, caracterizada pela confiança no poder da razão para es- tabelecer os próprios caminhos. O espírito de liberdade e crítica opunha-se ao princípio da autoridade.

2. Ascensão da burguesia

A maneira de pensar do humanismo associa-se às transform- ações econômicas que vinham ocorrendo desde o final da Idade Média, com o desenvolvimento das atividades artesanais e

comerciais dos burgueses, os antigos servos libertos. A Re- volução Comercial do século XVI caracterizou-se pelo novo modo de produção capitalista, acentuando a decadência do feudalismo, cuja riqueza era baseada na posse de terras.

Contrapondo-se aos senhores da nobreza feudal, os burgueses fizeram aliança com os reis, que desejavam fortalecer o poder central contra duques e barões. Essa união levou à consolidação dos Estados nacionais e consequentemente ao fortalecimento das monarquias absolutistas.

Não por acaso, o Renascimento é o período das grandes in- venções e viagens ultramarinas, decorrentes da necessidade de ampliação dos negócios da burguesia. Por exemplo, ao destruir as fortalezas do castelo, a pólvora fragilizou ainda mais a nobreza feudal; a imprensa e o papel ampliaram a difusão da cultura; a bússola permitiu aumentar as distâncias com maior segurança: o caminho para as Índias e a conquista da América no século XV alargaram o horizonte geográfico e comercial e possibilitaram o enriquecimento da burguesia.

3. Reforma e Contrarreforma

O espírito inovador do Renascimento manifestou-se inclusive na religião, com a crítica à estrutura autoritária da Igreja, centrada no poder papal. Interesses políticos nacionalistas e de natureza econômica sustentavam os movimentos de ruptura representados pelo luteranismo, pelo calvinismo e pelo anglicanismo.

Embora a Idade Média se caracterizasse pela unidade da fé, esse consenso esteve ameaçado inúmeras vezes: no século XI houve o Cisma Grego, que resultou na separação entre as igrejas Romana e Ortodoxa; no século XIV, por ocasião do Grande Cisma, foram eleitos dois papas, um em Avinhão, na França, e outro em Roma. Desde o século XII, as heresias se

disseminaram por toda a Europa, quando então foi criada a In- quisição (ou Santo Ofício), como instrumento de combate aos desvios da fé.

As causas desses movimentos não eram apenas de natureza religiosa. Ventos novos de rebeldia surgiam nas cidades, que começavam a se libertar dos senhores feudais e das restrições econômicas, como a condenação ao empréstimo a juros feita pela Igreja, por exemplo. Além disso, a teoria da supremacia da autoridade papal era rejeitada porque o universalismo da Igreja contrariava o nascente ideal do nacionalismo, expresso na form- ação das monarquias e no fortalecimento do poder dos reis.

A crise maior da Igreja, no entanto, deu-se no século XVI, com a Reforma Protestante. Contrariando as restrições feitas pelos católicos aos negócios e a condenação ao empréstimo a juros, os protestantes viam no enriquecimento um sinal do favorecimento divino. Lutero recebeu a adesão dos nobres, in- teressados no confisco dos bens do clero, e Calvino teve o apoio da rica burguesia. Portanto, as divergências não eram apenas religiosas, mas sinalizavam as alterações sociais e econômicas, que mergulharam a Europa em sanguinolentas lutas.

À expansão da crença protestante, a Igreja Católica desen- cadeou forte reação, conhecida como Contrarreforma, a fim de recuperar o poder perdido. As novas diretrizes tomadas no Con- cílio de Trento (1545-1563) reafirmaram a supremacia papal e os princípios da fé, além de estimular a criação de seminários, para formar padres. A Inquisição tornou-se mais atuante, sobre- tudo em Portugal e Espanha.

Educação

É impressionante o interesse pela educação no Renascimento — sobretudo se comparado com o manifestado na Idade Média —, principalmente pela proliferação de colégios e manuais para alunos e professores. Educar tornava-se questão de moda e uma exigência, conforme a nova concepção de ser humano.

Em O cortesão, livro publicado em 1528 e muito conhecido na época, o italiano Castiglione fez a síntese do modelo de cortesia do cavaleiro medieval e do ideal da cultura literária tipicamente humanista.

Enquanto os mais ricos ou da alta nobreza continuavam a ser educados por preceptores em seus próprios castelos, a pequena nobreza e a burguesia também queriam educar seus filhos e os encaminhavam para a escola, na esperança de melhor prepará- los para a liderança e a administração da política e dos negócios. Já os interesses pela educação de segmentos populares, em ger- al, não eram levados em conta, restringindo-se à aprendizagem de ofícios.

O aparecimento dos colégios, do século XVI até o XVIII, foi um fenômeno correlato ao surgimento da nova imagem da in- fância e da família. Na Idade Média misturavam-se adultos e crianças de diversas idades na mesma classe, sem uma organiz- ação maior que os separasse em graus de aprendizagem. Foi a partir do Renascimento que esses cuidados começaram a ser to- mados, assumindo contornos mais nítidos apenas no século XVII.

A fim de proteger as crianças de “más influências”, propôs-se uma hierarquia diferente, submetendo-as a severa disciplina, inclusive a castigos corporais. A meta da escola não se restringia à transmissão de conhecimentos, mas à formação moral. O re- gime de estudo era de certo modo rigoroso e extenso. Os progra- mas continuavam a se basear nos clássicos trivium e quadrivi-

um, persistindo, portanto, a educação formal de gramática e

estudo do latim, com frequente descaso pela língua materna. Tal sistema de ensino era duramente criticado pelos humanistas, sobretudo por Erasmo e Montaigne.

As universidades continuavam decadentes, impermeáveis às novidades. Em 1452, ao se reestruturar a Universidade de Paris, a Faculdade de Artes tornou-se propedêutica às outras três (filo- sofia, medicina e leis), lançando-se desse modo a semente do curso colegial, o que favoreceu a separação mais nítida dos graus secundário e superior.

2. Educação leiga

Embora presente em teoria, o ideal de secularização do hu- manismo renascentista nem sempre se cumpria porque a im- plantação da maioria dos colégios continuava por conta das or- dens religiosas. Apesar disso, por iniciativa de particulares lei- gos foram criadas escolas mais bem adaptadas ao espírito do humanismo. Na Alemanha surgiram as Furstenschulen, escolas para príncipes; o mesmo esforço de renovação notava-se na França, nos Países Baixos e na Inglaterra.

Muitas delas proliferaram na Itália, com destaque para o tra- balho de Vittorino da Feltre (1373?-1446), considerado o primeiro grande mestre de feitio humanista. Convidado para ser o preceptor dos filhos de um marquês, em Mântua, Itália, aí fundou uma escola, a Casa Giocosa, cuja divisa era “Vinde, men- inos, aqui se ensina, não se atormenta”. O nome da escola re- flete o novo espírito: giocosa é palavra italiana que significa “alegre” e vem do latim jocus, ou seja, “divertimento, gracejo”, e, daí, “jogo”.

Feltre cuidava não só de recreação e exercício físico, mas do desenvolvimento da sociabilidade e do autodomínio. A sua escola oferecia cursos de equitação, natação, esgrima, música, canto, pintura e jogos em geral. A formação intelectual voltava-

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