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Primeiro colocado nas eleições para Deputado Constituinte em 1986, por Zona Eleitoral.

Com o crescimento da face pública do partido, a organização se estruturou melhor. Nacionalmente o partido dobrou o número de Deputados Federais, que passou a a 16, com presença de bancadas de cinco estados (SP, MG, RS, RJ e ES). Nas Assembleias Legislativas o número de parlamentares petistas chegou a 37, em 12 estados (SP, MG, RS, RJ, ES, CE, GO, PA, RO, SC e SE). Esse aumento da face pública do partido ajudou a consolidar a estrutura burocrática do partido. Em 1985, 57% da receita do partido foi proveniente desse tipo de arrecadação (RIBEIRO, 2010:105)

Secco (2011), ao se referir ao surgimento do PT, aponta, tratando do plano nacional, que “[...] o partido nasceu num solo histórico caracterizado pela dispersão, pelas lonjuras fatigantes, pelas dificuldades de comunicação e por violências assustadoras. Impor uma direção política coerente e única foi uma tarefa difícil e incompleta. [...]” (2011:96). Observando seu epicentro organizacional, a metrópole paulistana, a realidade não era diferente. As características metropolitanas de São Paulo, diversa, dispersa, populosa e desigual, favoreceram a emergência de um partido com uma configuração organizacional democrática, com mecanismos que permitissem ampla participação das mais diversas lideranças da cidade, para além dos grupos estruturados, e em múltiplas frentes de atuação, já que muitos núcleos eram setoriais, temáticos e ligados a demandas específicas, como Habitação, Cultura, Saúde, Direitos Humanos, entre outros.

O formato adotado pelo partido em seu momento fundacional, com ampla desagregação espacial e temática, permitia a convivência de diferentes lideranças com escassos incentivos seletivos. E diversos grupos e núcleos funcionavam à sua forma, desvinculados, a priori, de qualquer tendência ou corrente formal. Cada tema que demandasse decisão gerava uma reunião para o posicionamento. Esse processo de convivência democrática entre os grupos constituiu uma cultura interna à estrutura partidária. E por haver a participação efetiva dos ativistas a legitimação dos processos, o engajamento das lideranças era mais simples, pois a derrota em um processo deliberativo não devia implicar no rompimento com a estrutura, mas na construção argumentativa e de ação para uma nova deliberação. Essa cultura democrática é uma das marcas constitutivas do PT.

No capítulo apresentamos o momento fundacional do partido focando dois aspectos em relação à metrópole. O primeiro deles é sua distribuição territorial em diversos lugares, cada um com seu contexto (AGNEW, 1986). Ainda que o povoamento da metrópole tenha constituído uma dualidade entre a região central, com boa infraestrutura, presença de serviços públicos, e habitada pelos estratos mais ricos da população, em contraposição às periferias, com pouca infraestrutura, carência de serviços públicos e habitada pela população mais pobre, muitas vezes em condição irregular, regiões socioeconomicamente semelhantes têm comportamento político diferente em virtude de suas histórias locais. As regiões da Zona Norte, como Santana, Vila Maria, e dos bairros que compreendem as regiões da Zona Leste mais próxima ao centro, como Mooca, Tatuapé, e áreas como o Ipiranga ou a Vila Prudente, foram regiões das primeiras levas de imigração para a cidade e se consolidaram durante a década de 1950, sob os governos de Jânio Quadros. O voto nessas regiões é conservador (PIERUCCI, 1993) e o PT não conseguiu constituir lideranças fortes. O povoamento mais intenso das regiões Sudeste, Noroeste, Leste e Sul ocorreu nas décadas de 1960/70, sob o período da ditadura militar. As lideranças destas regiões, desprovidas de serviços públicos, tiveram o apoio do MDB para suas reivindicações e, posteriormente, com a abertura democrática, do PT.

O PT constituiu diretórios tanto no centro expandido, em Zonas Eleitorais como Pinheiros, Perdizes, como em bairros periféricos, como Campo Limpo, Pirituba e Itaquera. Enquanto nos bairros centrais o conjunto da militância tinha como perfil profissionais liberais, em grande medida oriundos dos movimentos da esquerda organizada contra a ditadura, e tinham como base social principalmente o movimento estudantil, nas regiões periféricas o Partido se constituiu a partir de grupos organizados em função de demandas por políticas públicas, muitos deles ligados à Igreja católica.

Com a diversidade de grupos que se juntaram à nova sigla, o PT constituiu uma ampla gama de espaços internos de participação, democráticos, que permitiam acolher e administrar suas diferenças. Os militantes podiam se organizar em Núcleos de Base territoriais, por local de trabalho ou temáticos, em Diretórios Distritais e Zonais, possuindo cada uma dessas estruturas

legitimidade do partido. Facilitou este processo a inexistência, em São Paulo, de um Diretório Municipal, que poderia criar uma competição imediata pelo

comando do partido na cidade. Retrospectivamente, a convivência entre grupos

diferentes pode parecer algo corriqueiro, mas os relatos dos militantes que participaram do momento fundacional como Ricardo Azevedo, Irma Passoni, Cláudio Soares, Henrique Pacheco, Cid Barbosa Lima, apontam a novidade (e a dificuldade) representada por grupos, anteriormente divergentes na luta contra a ditadura, convergirem para o debate e a disputa democrática sobre os rumos de um projeto comum. O fato de o partido ter se constituído de forma externa ao parlamento (MENEGUELLO, 1989) e respeitado as pautas específicas dos movimentos que optaram por adentrar (KECK, 1991) era novidade naquele momento de abertura democrática. O projeto era amplo e visava um novo modelo de representação política institucional direta para os trabalhadores. Esse modelo de convivência democrática, necessária para a aproximação das diferentes lideranças, acabou por se mostrar adequado no ajuntamento dos diferentes grupos que compunham o partido no país.

São características que marcam o momento fundacional do Partido dos Trabalhadores na cidade de São Paulo, e que ele carrega desde então, a participação de uma pluralidade de grupos e lideranças e mecanismos democráticos que garantem essa convivência. Elas são forjadas em função do epicentro formativo do PT, a metrópole paulistana, plural e com diversos grupos e lideranças locais, que operam a política em seu cotidiano, e que optaram por construir um partido que os representasse.

Capítulo 3

O desenvolvimento partidário na metrópole paulistana

O período em que a institucionalização do Partido dos Trabalhadores ocorreu mais intensamente foi entre 1989 e 2003, em grande medida em função da expansão de sua face pública. Até então a face pública do partido se limitava a 16 Gabinetes (3,3%) na Câmara dos Deputados e 37 (5%) nas Assembleias Legislativas, além das Câmaras de Vereadores e à administração de uma

cidade, Diadema, no ABCD paulista42. Em 1988, o partido elegeu prefeitos em

36 cidades, três delas capitais estaduais: Porto Alegre (RS), Vitória (ES) e São Paulo (SP); o que exigiu que, no ano seguinte, o partido dispusesse de um grande contingente de pessoas para trabalhar nas administrações municipais. A partir de então, e até 2003, o número de representantes do PT na face pública não parou de crescer.

O crescimento da face pública do PT levou o partido a se institucionalizar (PANEBIANCO, 2005), atuando de forma responsável no Parlamento (NYLEN, 2000; HUNTER, 2010), moderando seu programa (AMARAL 2003; HUNTER, 2010) e seu posicionamento político (SINGER, 2001 e 2010) deslocando-se rumo ao centro no espectro ideológico no sistema partidário. Por outro lado, o

crescimento desta face e o aumento de recursos decorrente desse processo43

permitiram que o partido se estruturasse burocrática e profissionalmente, fortalecendo sua face partidária (Party in the Central Office). Os incentivos seletivos aumentaram de forma substantiva, permitindo a incorporação de um grande contingente de ativistas.

As eleições de 1988 em São Paulo apresentaram elementos deste processo de transformação e das tensões entre as três faces do partido, bem

42 O PT elegeu prefeito em duas cidades: Santa Quitéria do Maranhão e Diadema. Na primeira a

vitória foi circunstancial, em decorrência de brigas entre as elites locais e busca por legenda, mas o prefeito eleito, Manoel da Silva Costa (Manuca), desligou-se do partido em 1983. Em Diadema a vitória parece ter sido resultado da gênese do partido na região. As brigas entre o partido e a administração levaram à expulsão do prefeito, Gilson Menezes, dos quadros do partido em 1984, decisão revertida posteriormente. (Secco:2011:54). Sobre a Administração petista em Diadema, cf. SIMÕES, 1990.

43 Em relação às finanças, Ribeiro (2010:105ss) apresenta as fontes de recursos do Diretório

Nacional entre 1983 e 2004, onde fica clara a dependência, até 1995, da contribuição compulsória dos filiados em cargos públicos que só diminui a partir de 1996 pelo aumento da verba proveniente do Fundo Partidário, que passa a compor cerca de 70% da receita do PT.

como expuseram o funcionamento dos mecanismos da democracia interna do partido. O processo de seleção da candidatura majoritária colocou a direção em conflito com a base partidária (COUTO, 1995:104ss). Enquanto um grupo ligado à direção propunha a candidatura do Deputado Federal Plínio de Arruda Sampaio, outro grupo, com apoio de lideranças de base, propôs o nome da Deputada Estadual Luiza Erundina. A disputa foi resolvida com o emprego de um dos mecanismos democráticos do partido, as prévias, em que o conjunto de filiados deveria selecionar o candidato mediante o voto direto.

O candidato do grupo dirigente participou a contragosto da disputa e, confiante da influência das lideranças que o apoiavam, entre elas o Lula, não se dedicou à candidatura interna. Erundina, ao contrário, sabendo da necessidade de conquistar os votos de um grande número de filiados, por não ter o apoio das lideranças com maior expressão, dedicou-se intensamente à sua candidatura e se sagrou vitoriosa, obtendo 5.044 votos (54,9%) contra 3.982 votos (43,3%) do Plínio de Arruda Sampaio. Os votos brancos e os nulos somaram apenas 168 (1,8%). A eleição interna do partido teve grande participação dos filiados e foi acompanhada com algum destaque pela grande mídia (COUTO, 1995:105), inclusive com um debate transmitido ao vivo por um canal de televisão, a TV Gazeta (Anexo III), o que demostra a sua importância à época. Escolhida a

candidata, trabalhou-se a unidade do partido para a campanha, mas houve

grande esvaziamento por parte das lideranças partidárias apoiadoras do candidato derrotado. Um exemplo deste movimento foi o deslocamento de Rui Falcão, que viria a ser, posteriormente, presidente municipal do PT em São Paulo, para a campanha do município São Bernardo do Campo, além da abertura para que a candidata escolhesse seu staff, sem que houvesse disputa das correntes por espaço (COUTO, 1995:105). Coordenada pelo PT Vivo, grupo paulistano formado por jovens ativistas da classe média intelectualizada, reconhecidos em suas áreas profissionais, mas movimentistas, ou seja, que viam o protagonismo das ações transformadoras nos movimentos sociais

organizados44, a campanha teve grande presença da base do partido,

necessária tanto pela falta de apoio da direção quanto para o alcance do maior

44 Faziam parte do PT Vivo José Eduardo Cardoso, procurador municipal; Pedro Dallari e Amir

Khair, economistas; Silvio Caccia Bava e Daniel Annenberg, sociólogos; Ermínia Maricato, Nabil Bonduki e Raquel Rolnik, arquitetos/urbanistas. Os nomes foram coletados no livro de Couto (1995:102).

número de regiões. O episódio demonstra que as estruturas democráticas estabelecidas pelo partido em sua fundação com o objetivo de evitar a oligarquização e de valorizar a participação dos ativistas da base funcionavam, ao menos naquele momento.

Participaram da eleição de 1988 14 candidatos, entre eles Paulo Maluf, do PDS, que obteve 25% dos votos; João Leiva, pelo PMDB, com 14% dos votos;

José Serra, que concorreu pelo recém-criado PSDB45 e obteve 6% dos votos e;

com a primeira dissidência petista na cidade, Airton Soares, que concorreu pelo

PDT46. Erundina conquistou a eleição, de turno único, com pouco menos de 30%

dos votos, mesmo sem o apoio da máquina partidária. Ela teve o maior número de votos em 22 das 35 Zonas Eleitorais: todas as da Leste 2, Sul 2 e Noroeste, bem periféricas, bem como na região Sudeste, próxima ao ABCD paulista. Também liderou nas zonas eleitorais mais periféricas e pobres da região norte. Na região central, na maioria das zonas do centro expandido, nas zonas mais centrais das regiões Leste e Sul e na região Norte o líder foi Paulo Maluf. Essa dualidade entre o PT e um partido da direita permaneceu até 2014, com o eleitorado paulistano apresentando considerável estabilidade em suas opções (LIMONGI E MESQUITA, 2011:209). E se delineia territorialmente, com uma maior propensão ao voto no PT nas zonas Leste 2, Sul 2 e Noroeste, e maior

45 O Partido da Social Democracia Brasileira – PSDB, com perfil progressista e intelectualizado, foi

criado a partir de uma cisão do PMDB. Contava com nomes como o de Franco Montoro, que havia sido o primeiro governador eleito de forma direta no estado de São Paulo, Mário Covas, prefeito indicado por Montoro para São Paulo, Fernando Henrique Cardoso, Senador por São Paulo, e José Serra, Deputado Federal paulista. A escolha do candidato majoritário do PSDB em 1988 foi um tanto conturbada: o partido lançou Franco Montoro como candidato a prefeito, mas ele foi acometido por problemas de saúde. Serra era candidato a vice-prefeito na chapa e passou a concorrer como candidato a prefeito. Essas mudanças podem ter ajudado a diminuir a votação no partido.

46 Airton Soares foi Deputado Federal eleito pelo MDB em 1974 e 1978, com destaque na Câmara

dos Deputados (em sua segunda legislatura foi vice-líder do partido naquela Casa). Trocou de legenda com a fundação do PT, em 1980, e foi reeleito deputado federal em 1982 pelo novo partido. Em 1984, com a derrota da “Emenda Dante de Oliveira” (PEC 05/1983) que propunha eleições diretas para todos os cargos, o PT decidiu que sua bancada não deveria participar do Colégio Eleitoral que escolheria indiretamente o presidente. Três deputados do partido, José Eudes (RJ), Bete Mendes (SP) e Airton Soares (SP) compareceram à sessão para votar no candidato do PMDB, Tancredo Neves, que concorria contra Paulo Maluf, descumprindo a decisão partidária. Com a possibilidade de serem expulsos do partido, os três preferiram se desligar do PT. Airton Soares filiou-se ao PMDB, mas não foi reeleito em 1986. Em 1987 sai do PMDB por conta da saída de Bresser Pereira, a quem assessorou na Ministério da Fazenda, mas não constitui o grupo que forma o PSDB. Filia-se ao PDT, em uma estratégia de fazer oposição à esquerda no partido, dominado em São Paulo por um grupo conservador, liderado por Ademar de Barros Filho, e fortalecendo o papel seu trabalhista, alinhado com Brizola. É pelo PDT que disputa as eleições municipais em 1988, mas desiste do pleito pelo mesmo motivo que custou sua saída do PT, ajudar a evitar a vitória de Paulo Maluf.

propensão ao voto no partido da direita no Centro Expandido, Zona Norte, notadamente em Santana e Vila Maria, e na parte mais próxima ao centro da Zona Leste, como Mooca, Penha e Tatuapé (Mapa 3.1).

Naquele ano a bancada de vereadores do PT partido ampliou, passando de cinco (15%) para 16 (31%) representantes da Casa Legislativa. Além dos eleitos, tiveram votação local expressiva outros 12 suplentes, listados entre os dez mais votados de alguma Zona Eleitoral. Entre os eleitos o destaque foi Eduardo Suplicy que, depois de ser candidato a prefeito em 1985 e a governador em 1986, foi o vereador mais votado na cidade, que recebeu votos em todas as zonas eleitorais e liderou em 18 delas, notadamente naquelas em que seu partido foi menos votado, as do centro expandido. Candidatos do PT lideraram a votação em mais quatro Zonas Eleitorais: Sapopemba, com Adriano Diogo, que teve boa votação na Zona Leste; Pirituba, com Henrique Pacheco; Campo Limpo, com João Carlos Alves, que se reelegeu; e Arselino Tatto, líder na Capela do Socorro.

A análise da distribuição dos votos dos vereadores47, tanto os eleitos

quanto aqueles que estiveram entre os mais votados em alguma zona eleitoral, apontava para a territorialização da atuação. Com a exceção do Suplicy, os candidatos tiveram a votação expressiva em uma região circunscrita, no lugar que representava. João Carlos Alves foi líder do partido na Câmara, mas seus votos permaneceram ligados à Zona Sul, onde realizava seu trabalho pastoral nas Comunidades Eclesiais de Base. Dois outros candidatos se elegeram com votos na região. Arselino Tatto, cuja família vinha se destacando em ações políticas locais com o PT. Leonide, seu irmão, era o presidente zonal do Partido. Ítalo Cardoso, ligado à Democracia Socialista e do Sindicato dos Químicos também se destacou. Não se elegeram, mas tiveram votação expressiva na Zona Sul Armelindo Passoni, marido da Deputada Irma Passoni, e Eustáquio

Vital Nolasco48, sindicalista que trabalhou em indústrias da região.

47 Os resultados por zona eleitoral dos candidatos a vereador que ficaram entre os dez mais

votados em 1988 pode ser consultada no anexo I.14, pág. 183.

48 Ex militante da Ação Popular, o sindicalista se notabilizou pela militância no PCdoB, mas consta