CAPÍTULO 1 TEORIA GERAL DO DIREITO ELEITORAL
1.2 Direito Eleitoral
1.2.4 Princípios de Direito Eleitoral
1.2.4.4 Princípio da soberania popular
Nota-se que, historicamente, o princípio da soberania popular abarca várias
dimensões. Em primeiro lugar, aparece o domínio público, representado pelo "domínio do
homem pelo homem". Essa ideia, apesar de aparentemente bem aceita, não é natural e carece,
por isso, de legitimação. Em segundo lugar, a noção de que esse domínio político, uma vez
aceito, só pode advir do próprio povo. Por isso, afastam-se qualquer tentativa de poder
oriundo de divindades, de ordem natural ou hereditária. Além disso, a dimensão de que o
povo é, ele mesmo, o titular da soberania, que significa, nas palavras de Gomes Canotilho:
"(i) de forma negativa, o poder do povo distingue-se de outras formas de domínio 'não populares' (monarca, classe, casta); (ii) de forma positiva, a necessidade de uma legitimação democrática efectiva para o exercício do poder (o poder e o exercício do poder derivam concretamente do povo), pois o povo é o titular e o ponto de referência dessa mesma legitimação - ela vem do povo e a este se deve reconduzir. A soberania popular - o povo, a vontade do povo e a formação da vontade política do povo - existe, é eficaz e vinculativa no âmbito de uma ordem constitucional materialmente informada pelos princípios da liberdade política, da igualdade dos cidadãos, de organização plural de interesses politicamente relevantes, e procedimentalmente dotada de instrumentos garantidores da operacionalidade prática deste princípio (cfr. CRP, art. 2º e 10º); a constituição, material, formal e procedimentalmente legitimada, fornece o plano da construção organizatória da democracia, pois é ela que determina os pressupostos e os procedimentos segundo os quais 'decisões' e as 'manifestações de vontade do povo' são juridica e politicamente relevantes” 79.
Nesse contexto, o poder pode ser entendido por uma das expressões dinâmicas do
Estado, por meio do qual ele desenvolve suas atividades e políticas públicas que deseja
implementar. Assim, a palavra soberania aparece como forma de caracterizar um superpoder,
63
ou seja, um poder que controla outros poderes e, em tese, não é controlado. Pode dizer-se, por
isso, que a soberania é um elemento adjetivo do poder, dando-lhe o caráter de destaque.
Ser soberano, por si só, não concede às pessoas que compõe o Estado quaisquer
garantias. É preciso, por isso, que, aliado à ideia de poder soberano, apareça o segundo
adjetivo popular. Isso significa dizer que esse poder, além de supremo, é, também,
democrático, advém do povo e não é, pois, arbitrário. Não por outro motivo, a soberania
popular é elemento essencial de manutenção de direitos, garantias e deveres fundamentais de
uma sociedade.
Na Constituição Federal brasileira, o princípio da soberania popular está
consagrado na célebre expressão "todo poder emana do povo”
80. Na Constituição da
República de Portugal, por sua vez, está expresso no art. 3º, in verbis:
"Soberania e legalidade. 1. A soberania, una e indivisível, reside no povo, que exerce segundo as formas previstas na Constituição. 2. O Estado subordina-se à Constituição e funda-se na legalidade democrática. 3. A validade das leis e dos demais actos do Estado, das regiões autónomas, do poder local e de quaisquer outras entidades públicas depende da sua conformidade com a Constituição"81.
Daí depreende-se que o princípio da soberania popular
82é, sobretudo,
multifacetado, uma vez que seu exercício se dá por meio de uma série de institutos
80 “Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do
Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político. Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição". BRASIL, Constituição Da República Federativa Do
Brasil De 1988. [Consult 14 Jun.2017]. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm.
81 PORTUGAL, Constituição da República Portuguesa de 1976. [Consult 14 Jun.2017]. Disponível em:
http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx.
82 “AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA
ELEITORAL EXTEMPORÂNEA. IMPRENSA ESCRITA. 1. Para que o agravo lançado contra a decisão denegatória do recurso especial, que assentou a impossibilidade de reexame de provas em sede de recurso especial (Súmulas 279/STF e 7/STJ), tenha êxito, é necessário que tal fundamento seja infirmado. Incidência, na espécie, da Súmula 182 do Superior Tribunal de Justiça, em face da ausência de irresignação objetiva, nas razões do agravo em recurso especial, contra o principal fundamento da decisão proferida pela Presidência do Tribunal a quo. 2. Na linha da jurisprudência desta Corte Superior, "as restrições impostas à propaganda eleitoral não causam prejuízo aos direitos constitucionais de livre manifestação do pensamento e de liberdade de comunicação e informação (artigo 220 da Constituição Federal), os quais devem ser interpretados em conformidade com os preceitos da soberania popular e da garantia do sufrágio" (AgR-REspe nº 163-94, rel. Min. Laurita Vaz, DJe de 4.2.2014). Agravo regimental a que se nega provimento. (TSE - AgR-AI: 13145 SP, Relator: Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Data de Julgamento: 09/06/2015, Data de Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 187, Data 01/10/2015, Página 95)”. [Consult 22 Jun.2017]. Disponível em:
https://tse.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/239012043/agravo-regimental-em-agravo-de-instrumento-agr-ai- 13145-sp?ref=juris-tabs.
“MANDADO DE SEGURANÇA. CANDIDATO ORIGINALMENTE REGISTRADO PARA CONCORRER À ELEIÇÃO SUPLEMENTAR NA MODALIDADE DIRETA. LEGITIMIDADE ATIVA. ART. 81, § 1º, CF/88.