• Nenhum resultado encontrado

Conforme vimos afirmando, enquanto instituto jurídico diferenciado, a EDH possui métodos, objeto, princípios e metodologias próprias. Por ora, entendemos analisar os decorrentes da normativa internacional e da prática acadêmica e social, apresentados por autores que se dedicam a pesquisa do tema.

Silveira; Nader; Dias; (2007), propõem, entre outros, um conjunto de princípios que, grosso modo, devem ser levados em consideração. São eles:

a) Princípios éticos – baseados na concepção da dignidade humana, de toda a pessoa humana sem distinção. Porém, um ser humano em concreto, interdependente e conectado a determinado referencial histórico;

b) Princípios políticos – toda pessoa é um ser em relação com a sociedade, na vivência coletiva, que pressupõe regras de convivência definidas pelo Estado com fundamento/pressuposto na cidadania;

c) Princípios educacionais – de acordo com a diversidade cultural dinâmica, pois, como conjunto de práticas de socialização da cultura, a educação deve propiciar o acesso à mesma a todos os membros da espécie humana.

Toda e qualquer ação de ensino dos direitos humanos, enquanto promotora destes, tem de, necessariamente, atender a estes critérios que, de modo geral, exigem um conceito de igualdade baseada na dignidade, leis coerentes e o respeito à diversidade cultural. A contrário

senso, não se educa em direitos humanos promovendo atitudes como o racismo, o machismo,

a xenofobia, a homofobia, a pedofilia, o nacionalismo exacerbado, ou outro qualquer tipo de violência, como a fome, a corrupção, o comodismo etc.

Para além de princípios, a educação em direitos humanos desenvolve-se grosso modo em três dimensões: a formal, a não formal e a informal.

A educação formal refere-se à estrutura normalmente tripartite de ensino fundamental, médio e superior, pela qual os governos em geral têm a responsabilidade principal. Ou ainda ao sistema de ensino estruturado que vai desde o primário ao ensino superior, e pode também incluir programas especiais para formação técnica e profissional.

A educação não-formal é entendida como qualquer atividade educacional, sistemática, realizada fora do sistema formal, para oferecer tipos específicos de ensino a

subgrupos particulares da população, adultos ou crianças. Ou ainda qualquer programa intencional, voluntário e planejado de educação pessoal ou social que visa transmitir e praticar os valores e desenvolver uma ampla gama de habilidades e competências para a vida democrática.

A educação não – formal para crianças pode incluir instâncias fora da escola, atividades extra-curriculares em escolas, acampamentos de verão e centros de lazer. A educação não – formal enfatiza uma abordagem participativa para a aprendizagem/ou de aprendizagem (ONU/CE, 2010).120 A educação informal, por sua vez, pode ser ou não organizada, e normalmente é uma educação não sistemática, que tem impacto sobre os processos ao longo da vida, por meio dos quais cada pessoa adquire ou acumula conhecimentos, habilidades, atitudes e percepções sobre a vida a partir de experiências e exposições quotidianas a órgãos tais como, por exemplo, o rádio, a televisão, ou a mídia impressa.121

A educação informal pode ainda referir-se aos processos involuntários, ao longo da vida, pelo qual todo o ser humano adquire atitudes, valores, habilidades e conhecimentos a partir das influências e recursos educativos em seu próprio ambiente e da experiência quotidianas (por exemplo: família, vizinhos, biblioteca, meios de comunicação social, trabalho, lazer).

No âmbito formal, a concepção de políticas educacionais voltada aos direitos humanos pode contar com a participação de vários setores da sociedade, porém, a responsabilidade última vai recair sobre as entidades governamentais, encarregadas de efetivá-las.

Ao passo que a educação não-formal pode dar-se com ou sem o concurso das entidades governamentais e, ao contrário do rigor exigido na educação formal, em termos metodológicos, esta dimensão da EDH privilegia a participação livre de todas/os, além do que ela pode abarcar grupos sociais que estejam à margem do sistema formal de ensino. É a instrução do público em geral, não especializado acerca dos direitos que têm, e dos mecanismos existentes para exercê-los, por meio de publicações, reuniões, exposições, tradução para os idiomas nacionais dos instrumentos (nacionais, regionais e internacionais) de proteção de direitos humanos, contacto com ONG e comunitárias.

120 Disponível em:

<http://daccess-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/GEN/G08/456/13/PDF/G0845613.pdf?OpenElement>. Acesso em: 12 mar.2009.

121 Richarde Claude In: Andreopoulos; Claude, 2008, p. 566. Vide ainda o texto elaborado pela European Youth

Centre Budapest. Disponível em:

Quanto à educação informal, entendemos que os órgãos de comunicação social podem (e devem) ser autênticos veículos de promoção de divulgação de valores e princípios de direitos humanos. A mídia é um “espaço de força, poder e sociabilidade capaz de atuar na formação da opinião pública em relação a valores, crenças e atitudes” (PNEDH, Brasil, 2004, p.45).

Dada sua extensão em termos de cobertura, a mídia atinge segmentos sociais que, por exemplo, a educação formal e/ou não formal ainda não alcançou e, principalmente nestes termos, ela é de todo relevante.122 Portanto, a educação em direitos humanos não se restringe a “quatro paredes” [quando as têm] de uma sala de aulas; pelo contrário, ela se desenvolve, sobretudo, no contexto não-formal com destaque para as ações levadas a cabo por associações e ONG em todo o mundo, e especial realce para contextos com histórico de exclusão e violências graves.

Portanto, o trabalho da EDH é o de procurar permear todas as áreas onde se verifica o processo de socialização, com enfoque para a família, a comunidade, a mídia, as escolas e as universidades.

Estas dimensões da EDH não se excluem, podem (ou não) ser cumulativas, complementares, em que se articulam mutuamente elementos dos processos de aprendizagem. Elas também não são exaustivas, à semelhança dos princípios a rigor, as necessidades concretas vão definir (ou poderão definir) casuisticamente outras dimensões ou outros princípios da educação em direitos humanos.123

Por conseguinte, a EDH é um sistema de criar (ou produzir) pessoas com autonomia suficiente para darem seu contributo na melhoria dos direitos humanos, no respeito aos princípios republicanos e na efetivação da cidadania.

Tudo isto demanda ações governamentais que em termos de política pública – na visão da ONU – assumem a dimensão de Planos Nacionais de Educação em Direitos Humanos, conforme vimos no segundo item deste capítulo.

Porém, é fundamental reforçar que a concepção, elaboração e execução de um Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos deve ser levada a cabo pelo Estado, prima facie, em colaboração com os demais atores sociais.

122 Comunicação feita por meio de órgãos públicos e/ou privados como rádio, televisão, internet, outdoors,

revistas, folhetos, filmes, documentários, vídeos, media bus, etc.

123 Aguirre avança cinco notas do processo educativo em direitos humanos sobre: a complexidade da noção de

direitos humanos, dinâmica e dialética; 2ª a concepção escolar dos direitos humanos; 3ª o que deve prevalecer? O texto, a declaração, o vivido e sentido?; 4ª os progressos realizados pelos Direitos Humanos na Educação são frágeis e lentos; 5ª a educação em prol dos direitos humanos é um projeto utópico, ilusório? (1997, p. 3)

Este plano precisa levar em consideração aspectos como a diversidade étnica e cultural, no caso, de Angola, isto é, o caráter multiétnico das diferentes sociedades e o respeito à identidade e às necessidades de grupos, como menores, mulheres, indígenas, minorias raciais etc.124

Referimo-nos ao estudo exaustivo dos distintos contextos políticos, culturais e sociais, com o intuito de assegurar que a EDH se ajustará às necessidades concretas dos distintos países – incluindo Angola.

Devem ser programas devidamente contextualizados, guiados, designadamente, pelos supremos interesses inerentes à proteção da dignidade humana, da comunidade, do direito internacional, mormente a Carta Internacional de Direitos Humanos, fundada na necessidade de promoção e respeito aos direitos humanos e de incorporação de valores democráticos como a solidariedade, o respeito à diversidade cultural, étnica, político-partidária e religiosa, à paz etc. 125

É uma conjugação da função descritiva e persuasiva de expressões como liberdade, igualdade, democracia, pessoa etc., como leciona Arzabe e Graciano, retiradas da linguagem política (imprecisas na linguagem jurídica, convertendo-se, assim, num meio para a compreensão, a modificação e a transformação das pautas valorativas, em função das alterações socioeconômicas e possibilitando, deste modo, a formação de hábitos, a indução de comportamentos e a consolidação de crenças [1998?].126

A disseminação de informação, neste contexto, deve ser sempre efetuada a partir de uma visão crítica da realidade e dos próprios direitos humanos, desde o seu contexto histórico à fundamentação etc. Em síntese, trata-se de vislumbrar a EDH como um instrumento de prevenção às violações aos direitos humanos, promotora de novos valores ético-sociais, e como mecanismo de proteção e de alívio às injustiças. Assim, precisamos nos conscientizar de

que a educação em direitos humanos significa que pessoas, individualmente e em grupo, estão adquirindo o conhecimento e as perspectivas para se protegerem de violações dos direitos humanos e para corrigir os danos que eles sofrem (KOENIG, 2007, p.20)

124 Por isso, a ONU atribuiu aos estados a obrigação de elaborar planos de ação nacionais em relação à EDH;

planos nacionais de ação, conforme a resolução A/52/469/Add.1 da sua Assembléia-Geral.

125 Os valores e princípios democráticos e de direitos humanos devem se refletir nas normas em vigor, por isso, a

educação em direitos humanos deverá não só propiciar aos sujeitos de direitos meio de reivindicarem por efetivação daquelas, como os dotará de conhecimentos necessários para a participação em processos legislativos, particularmente os que tenham impacto sobre direitos humanos fundamentais.

126 Disponível em: < http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/direitos/tratado4.htm >. Acesso

Em sociedades em que houve a naturalização da violência e o desrespeito constante às normas instituídas, o engajamento num processo de planificação e implementação de um Plano de Educação Nacional, à semelhança das diretrizes da ONU, pode funcionar como um mecanismo de construção de uma nova cultura social.

Neste sentido, a EDH, enquanto processo de socialização em uma cultura de direitos humanos, levando em consideração as culturas identitárias que formam cada pessoa ou grupo, devem assumir uma ‘postura compreensiva das diversidades socioculturais, propiciando uma aprendizagem de convivência na tolerância, no que significa bem comum aos sujeitos e grupos que compõem as coletividades sociais’ (SILVEIRA; NADER; DIAS;, 2007, p.7).

Assim, de acordo com a DUDH, a educação assume importância fulcral a partir do momento em que a mesma se orienta para o pleno desenvolvimento humano. À educação se deve enquadrar ou integrar a temática de direitos humanos.

Um modelo de educação direcionado ao crescimento das potencialidades e elevação da auto-estima dos grupos sociais excluídos, tendo em vista a efetivação da autonomia plena para a construção de conhecimentos e desenvolvimento de valores, crenças e atitudes em favor dos direitos humanos (MENDES, 2007, p. 58).

Esta educação, voltada à cidadania, à democracia e aos direitos humanos, enquadra-se no âmbito da educação em direitos humanos, que, em nosso entender, é um direito humano fundamental, sem o qual o exercício dos demais direitos é colocado em causa.

É indispensável que os titulares de direitos tenham conhecimento dos seus direitos e meios de garantia e defesa. Que de modo crítico saibam contribuir para a promoção da dignidade da pessoa.

Este conhecimento deve ter por corolário a conversão de todo ser humano em educador que promove direitos humanos, sujeitos com clareza crítica e equilibrada tanto para questionar costumes como comportamentos pessoais e coletivos (AGUIRRE, 1997, p. 2). É um conhecimento resultante de um conjunto de ações concertadas, com princípios e metodologias próprias.

São medidas e projetos que auxiliam no processo de divulgação dos direitos, independentemente do contexto em que as pessoas se encontrem, independentemente do seu estatuto jurídico, raça, religião, situação econômica, orientação sexual, etnia ou, ainda, grau de instrução.