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2 CONSTRUÇÃO DO CAMINHO DA PESQUISA

2.4 Procedimentos empregados para a coleta de dados

De acordo com Minayo (2012), a entrada no campo aproxima o pesquisador da realidade sobre a qual se problematizou, mas também estabelece uma interação com os “atores” que conformam a realidade. Assim sendo, constitui um conhecimento empírico importantíssimo.

Para essa autora, o campo é entendido como o recorte espacial que se refere à abrangência, em termo empírico, do recorte teórico correspondente ao objeto da investigação. Assim, a pesquisa social trabalha – como ela mesma afirma – com gente e com suas relações: primeiramente constrói-se o subsídio teórico – objeto de estudo –, e no campo eles realizam uma interação social com o pesquisador.

Diante desse cenário, faz-se necessário um maior cuidado e preocupação científica por parte dos pesquisadores ao colher os dados, tanto os observados quanto os coletados, bem como na escolha das técnicas/ instrumentos para realizar o trabalho de campo. Neste trabalho, optamos por dois principais instrumentos: a observação participante e o questionário.

A coleta de dados ocorreu principalmente através da observação participante dos encontros de formação e das ações de intervenção no Sítio Veiga, nos seus enfoques teórico e prático, além dos registros fotográficos e videográficos produzidos nas intervenções no quilombo, principalmente. Minayo (2012, p. 70) define observação participante como

[u]m processo pelo qual o pesquisador se coloca como observador de uma situação social, com a finalidade de realizar uma investigação científica. O observador, no caso, fica em relação direta com seus interlocutores no espaço social da pesquisa, na medida do possível, participando da vida social deles, no seu cenário cultural, mas com a finalidade de colher dados e compreender o contexto da pesquisa. Por isso, o

observador faz parte do contexto sob sua observação e, sem dúvida, modifica esse contexto, pois interfere nele, assim como é modificado pessoalmente.

Por isso, e com base na observação participante, procuramos obter indícios que direcionassem o nosso olhar para responder de modo mais fidedigno às problemáticas desta pesquisa. O Numeq, a partir da sua articulação com o quilombo através das vivências, possibilitou aos/às participantes importantes trocas de visões de mundo e construção de saberes, provocando a transformação dos sujeitos, corroborando com um dos objetivos principais da pesquisa-intervenção, que é a intervenção na realidade social e a transformação da realidade.

O Numeq teve a contribuição dos/as professores/as dos cursos de Arquitetura e Urbanismo, Direito, Educação Física, Fisioterapia, Odontologia e Psicologia durante o período de execução do projeto de extensão entre 2015.1 e 2015.2. Os/as professores/as dos cursos de Farmácia e Sistema de Informação ficaram muito interessados em participar, mas o excesso de atividades no Centro Universitário impossibilitou a participação no Numeq.

A observação participante permitiu-me analisar o silenciamento e apagamento das relações raciais no currículo no ensino superior privado. Considerei-a importante e relevante à proposta do Numeq, visto que os dispositivos de intervenção construídos para a realização da análise das demandas, implicações e da transversalidade em relação à questão racial foram restritos a dois segmentos: primeiro a intervenção juntos aos/às professores/as e estudantes/as – debates em grupo acerca da temática racial, vídeos para a discussão do racismo, reuniões semanais, planejamento e avaliação das ações realizadas no Quilombo Sítio Veiga e articulação de cada curso com a temática racial.

Segundo, a intervenção junto à comunidade quilombola do Sítio Veiga, com debates organizados em pequenos grupos de crianças, adolescentes e adultos com realização de oficinas por segmentos específicos. Tais atividades têm como objetivo analisar coletivamente a relação com o trato racial no Quilombo Sítio Veiga, estabelecendo o fortalecimento de vínculos comunidade/universidade e contribuindo para o empoderamento local e valorização da cultura africana e afro-brasileira.

Importantes destacar que o Numeq, como um projeto de extensão, seguiu a legalidade institucional com os trâmites burocráticos necessários para ser aprovado pela Coordenação de Extensão com aval da Direção Geral do Centro Universitário. Dito isso, o projeto ora proposto tinha a duração semestral – dessa forma, era necessário submetê-lo semestralmente para a aprovação. Havia um cronograma prévio de solicitações e aquisições contidas no projeto para

serem autorizadas: por exemplo, transporte para o quilombo com as datas prévias das intervenções, materiais de consumo que seriam utilizados nas oficinas, entre outros.

Organizei encontros de formação semanais, com duração de duas horas, no horário da tarde, em geral, na sala de aula do bloco do curso de Educação Física. Inicialmente foram dois por semana, às terças-feiras e sextas-feiras, durante dois meses e meio (março a meados de maio), pois os horários e dias dos/as professores/as participantes do projeto não se conciliavam – e, nesse primeiro momento, que era de chegada tanto dos/as professores/as quanto dos/as estudantes, houve essa flexibilidade de dias. Passado esse período, diminuímos as reuniões, e os encontros permaneceram apenas às quartas-feiras, onde estudamos temáticas referentes às questões raciais e fazíamos o planejamento coletivo para as intervenções no Sítio Veiga. O registro deu-se por meio de atas e gravação de áudio dos encontros, que foram transcritos e que serviram como diário de campo.

Figura 4 – Encontro de formação/ Figura 5 – Estudantes em encontro de formação

Fonte: Acervo Numeq, 2015.

Os momentos do encontro de formação, de modo geral, seguiam-se dessa maneira: acolhida, apresentação do tema e/ou vídeo em questão, seguida de discussão. O momento seguinte se dava pelo planejamento das ações no Veiga: após a construção das atividades de intervenção, havia a socialização para o grupo. Para finalizar o encontro, nos deliciávamos com um saboroso lanche que era partilhado coletivamente. Os temas escolhidos, bem como os vídeos, a priori, foram escolhidos por mim, visto que a grande maioria tratava das relações raciais, identidade negra, racismo, das legislações vigentes sobre a Lei nº 10.639/03 e requeria um cuidado em sua escolha e seleção – afinal, todos estavam partindo do zero, pois a única

leitura que se tinha era do senso comum e de uma população negra esterotipada pela sociedade racista brasileira.

Tivemos um total de 19 encontros no primeiro semestre, somando-se formação e intervenção. Destes, 14 foram encontros de formação e cinco foram ações de intervenção no Veiga. No segundo semestre daquele mesmo ano, somaram-se 15 encontros, sendo 11 voltados para a formação e quatro para as ações de intervenção no quilombo.

O momento seguinte se caracteriza pela interação teórico-prática com as ações de intervenção no quilombo. Os encontros de formação foram realizadas duas vezes ao mês (março e abril), e posteriormente reduzimos para uma vez ao mês. Com duração de duas horas, em geral, as atividades aconteciam no quilombo, em dois locais distintos, a saber: na casa da liderança comunitária, utilizávamos as dependências da área e da sala de estar. Outro local para realizar as atividades era a Igreja Católica. As intervenções eram construídas nos encontros de formação de forma coletiva, e o desdobramento acontecia como ressaltamos anteriormente, no quilombo, e atendiam aos grupos de crianças, adolescente e mulheres da comunidade. O registro deu-se por meio das produções nas formas de desenho, pintura, colagens, construções, fotografias e vídeos.

Figura 6 – Primeira intervenção no Veiga/ Figura 7 – Primeira intervenção no segundo semestre

Fonte Acervo Numeq, 2015.

Dessa maneira, Lakatos e Marconi apud Mann (2017) afirmam que a observação participante é uma tentativa de colocar o observador e o observado do mesmo lado, tornando-se o observador um membro do grupo. Portanto, os encontros de formação contribuíram para processos dialógicos e reflexivos, não somente para a questão racial, mas também em relação a comunidades quilombolas, territorialidade e identidade negra – temas oriundos das discussões teóricas articuladas com as ações de intervenções no Sítio Veiga.

Oliveira-Formosinho, parafraseando Sousa Santos (2014), reconhece que o conhecimento prático, em diálogo com o conhecimento científico, aumenta a dimensão do conhecimento, dando origem a uma nova racionalidade, mais reflexiva e mais prática.

O segundo instrumento que priorizamos foi o questionário, por compreender, de acordo com Severino (2016), que esse instrumento permite levantar informações escritas por parte dos sujeitos pesquisados, visando a compreender a visão deles sobre o assunto em questão.

Para Tavares e Freitas apud Cervo, Bervian e Silva (2016), o questionário permite uma uniformização das respostas, devendo ter natureza impessoal, garantindo o anonimato dos sujeitos pesquisados, o que possibilita coletar dados mais coerentes e aproximados da realidade. Os/as estudantes e os/as professores/as responderam os questionários tanto presencialmente quanto por e-mail. O questionário continha perguntas abertas e fechadas, totalizando 26 questões, o que possibilitou revelar uma variedade de informações sobre o objeto pesquisado. Na aplicação dos questionários, priorizou o anonimato dos participantes, pois não requereu a identificação deles.

Optamos pela preservação dos nomes dos/as professores/as e estudantes participantes da pesquisa que integraram as ações do Numeq. Isso foi acordado com os/as participantes, que aceitaram sem objeções.

A aplicação dos questionários deu-se após minha saída da instituição, em março de 2016. Previamente fiz o contato com os participantes da pesquisa pelo telefone e/ou por meio de e-mail e combinamos o melhor dia e horário para que o maior número de pessoas pudesse comparecer para aplicação do questionário. No encontro, expliquei pormenorizadamente sobre a pesquisa, bem como os objetivos, procedimento indispensável para a pesquisa qualitativa.

Os participantes receberam todos os esclarecimentos. Assim, a reunião para aplicação dos questionários aconteceu no espaço extra sala de aula: cada um procurou o melhor local para poder responder e marcamos um ponto de encontro para que eles pudessem me devolver o instrumental. Para aqueles que não compareceram, enviamos as devidas informações por e-mail.

Os questionários tinham o intuito de avaliar a visão de estudantes e professores a respeito da questão racial antes e depois da pesquisa-intervenção. Avaliamos quais mudanças qualitativas ocorreram a partir das atividades desenvolvidas pelo Numeq, bem como a mudança de visão em relação aos quilombos.

O questionário continha 26 perguntas, dessas 24 fechadas e duas abertas. No total, foram respondidos 18 questionários, distribuídos pelos/as estudantes dos cursos, a saber:

quatro alunos de Arquitetura e Urbanismo, três do Direito, dois da Educação Física, uma da Fisioterapia, quatro da Odontologia e quatro da Psicologia.

No que diz respeito aos/às professores/as pesquisados, foram respondidos um total de cinco questionários, distribuído da seguinte forma: um de Arquitetura e Urbanismo, uma do Direito, dois da Odontologia e uma da Psicologia.