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Mapa 11 – Parcelamento do solo em Macaíba entre 1958 e 2017

3 MACAIBA: EVOLUÇÃO URBANA E SUA INSERÇÃO NO

3.2 MACAÍBA: MUNICÍPIO DA REGIÃO METROPOLITANA DE NATAL

3.2.1 O processo de urbanização brasileiro

Desde o início, o propósito desta pesquisa está voltado para a compreensão da urbanização como um processo social, isto é, de como as mudanças ocorridas na sociedade se refletem sobre as maneiras como o espaço das cidades é produzido, dando origem a padrões de organização espacial que, mesmo não suprimindo totalmente aqueles previamente existentes, contribuem para a conformação de novas dinâmicas no espaço urbano.

Na medida em que reconhecemos que a formação socioespacial brasileira é prenhe de contradições, em que a produção do espaço revela-se constantemente como um jogo dialético

entre diversidade e singularidade, sincronias e diacronias, entendemos que dois aspectos são fundamentais para a análise do seu processo de urbanização.

O primeiro se refere ao reconhecimento de que as regiões brasileiras se inserem de forma diferenciada, do ponto de vista temporal, no processo de desenvolvimento econômico do país, o que revela o caráter multifacetado do seu processo de urbanização. Neste sentido, ainda que seja um consenso afirmar-se que “o Brasil é um país urbanizado”, não podemos deixar de considerar que uma análise mais detida acerca das diversas realidades irá apontar as diferentes intensidades com que o processo de urbanização se materializa no país. O segundo aspecto diz respeito ao fato de que a compreensão dos diversos movimentos e vetores que definem a organização das cidades no contexto do processo de urbanização atual não se constitui em tarefa simples, principalmente quando se considera a realidade das cidades de um país subdesenvolvido, como é o caso do Brasil, fortemente marcadas pelas desigualdades socioespaciais.

O processo de urbanização brasileiro se intensificou ainda na primeira metade do século XX, momento em que se observa uma acentuação do processo de integração do território nacional. Neste sentido, Brito e Pinho (2012, p. 6) afirmam:

As mudanças profundas que passaram a sociedade e a economia brasileira, a partir dos anos trinta do século passado só se consolidaram com o acelerado processo de crescimento da economia urbano-industrial e com a expansão dos sistemas de transporte e comunicações, que tem início na década de cinquenta, em especial, na sua segunda metade, com o Plano de Metas, no governo Juscelino Kubistchek (1956-1961).

Trata-se, portanto, de um processo que se consolida ao longo da segunda metade do século XX como parte de um conjunto maior de mudanças econômicas e sociais, decorrentes do processo de industrialização, das transformações ocorridas no campo e das transformações ocorridas na dinâmica demográfica do país, elas próprias resultantes de um maior crescimento vegetativo e dos movimentos migratórios entre as áreas rurais e urbanas.

Nas primeiras linhas introdutórias do livro A urbanização brasileira, Santos, M. (2009, p. 9) expõe os termos das mudanças que se verificaram nesse processo ao considerar que a realidade brasileira passou de um período marcado por uma “urbanização social e territorialmente seletiva” para outro caracterizado pela “urbanização da sociedade e a urbanização do território”. Neste sentido, a urbanização “tornou-se praticamente generalizada a partir do terceiro terço do século XX, evolução quase contemporânea da fase atual da macrourbanização e metropolização”.

Assim sendo, o referido autor ressalta que a década de 1970 marcou uma mudança de patamar não apenas quantitativa, mas também qualitativa, na urbanização brasileira.

Desde a revolução urbana brasileira, consecutiva à revolução demográfica dos anos 1950, tivemos, primeiro, uma urbanização aglomerada, com aumento do número – e da população respectiva – dos núcleos com mais de 20 mil habitantes e, em seguida, uma urbanização concentrada, com a multiplicação de cidades de tamanho intermédio, para alcançarmos, depois, o estágio da metropolização, com aumento considerável do número de cidades milionárias e de grandes cidades médias (em torno do meio milhão de habitantes) (SANTOS, M., 2009, p. 77).

Monte-Mór (2006) chama a atenção para a existência de uma sociedade virtualmente urbana no Brasil. Neste sentido, o autor observa que a urbanização brasileira se intensifica a partir da segunda metade do século XX, quando “o capitalismo industrial ganhou momento no País e dinamizou a economia a partir da consolidação das grandes cidades industriais, particularmente São Paulo, o grande polo industrial do Brasil” (MONTE-MÓR, 2006, p. 15). As transformações ocorridas no Brasil, relacionadas às mudanças de uma economia agroexportadora para uma economia centrada na substituição de importações para o mercado interno, levaram à redefinição dos papéis desempenhados pelas cidades, que, tendo como base o processo de industrialização, tornaram-se um polo de dinamização e de transformações seletivas no espaço e na sociedade brasileira (MONTE-MÓR, 2006).

A modernização ocorrida na economia do país nesse momento tinha o binômio industrialização/urbanização como um dos seus principais fundamentos. Da mesma forma, as transformações ocorridas no campo, em função dos acréscimos técnicos que passaram a ser incorporados, também foram essenciais para uma maior complexificação na dinâmica dos espaços das cidades. Assim, a “modernização chegou ao campo moldada no padrão urbano- industrial, exigindo máquinas, implementos, componentes, insumos materiais e intelectuais e mão de obra qualificada, indispensáveis à produção agropecuária” (LOCATEL, 2013, p. 90). Como consequência dessa realidade emergente no meio rural, houve a acentuação do fluxo migratório das áreas rurais para as áreas urbanas, evidenciando que o “acelerado processo de urbanização, a construção da sociedade urbana, se articulava com o grande ciclo de expansão das migrações internas, principalmente a rural-urbana” (BRITO; PINHO, 2012, p. 6).

Assumindo a perspectiva da urbanização como um processo que se caracteriza por mudanças na dinâmica social, Costa (2000, p. 95) considera que a “urbanização brasileira, ao longo dos anos, esteve sempre marcada por grandes deslocamentos populacionais para as

grandes cidades, pela expansão e/ou (re)produção do espaço urbano e por transformações marcantes no processo de divisão social do trabalho”.

Foi somente nas três últimas décadas do século XX que a urbanização passou a ganhar contorno mais amplo por todo o território brasileiro. Um dos reflexos disto é que o Brasil viu um significativo aumento da população residente em áreas urbanas no decorrer das últimas décadas o que ocasionou, por consequência, a expansão territorial das cidades e modificações na estruturação dos espaços urbanos.

A partir dos anos setenta, a urbanização estendeu-se virtualmente ao território nacional, integrando os diversos espaços regionais à centralidade urbano- industrial que emanava de São Paulo, desdobrando-se na rede de metrópoles regionais, cidades médias, núcleos urbanos afetados por grandes projetos industriais, atingindo, finalmente, as pequenas cidades nas diversas regiões, em particular onde o processo de modernização ganhou uma dinâmica mais intensa e extensa (MONTE-MÓR, 2006, p. 16).

A partir das considerações de Santos, M. (2009) sobre as mudanças quantitativas e qualitativas da urbanização no Brasil, e com base nos dados aqui apresentados, podemos observar a complexidade que o processo de urbanização assume na realidade nacional. Do ponto de vista quantitativo, tendo como referência as chamadas ‘taxas de urbanização’ ou ‘grau de urbanização’, verificamos como esse processo vem se intensificando pelo território nacional, o que pode, num primeiro olhar, ser constatado pelo progressivo incremento dos percentuais das populações residentes nas áreas urbanas.

Como já destacamos anteriormente, não podemos deixar de considerar que, dada a forma como transcorreu o processo de formação socioespacial brasileiro, cada região vem apresentando uma inserção diferenciada na dinâmica da urbanização. Esta diferenciação, na visão de Santos, M. (2009, p. 67), “está intimamente ligada à forma como, nelas, a divisão do trabalho sucessivamente se deu, ou, em outras palavras, pela maneira diferente como, a cada momento histórico, foram afetadas pela divisão inter-regional do trabalho”.

Os dados dos censos populacionais realizados pelo IBGE demonstram que foi na década de 1970 o momento em que, do ponto de vista demográfico, se deu a inflexão do perfil da população brasileira, passando de predominantemente rural para majoritariamente urbano. Ainda que não deixemos de considerar as dificuldades de se enquadrar a discussão da dinâmica do processo de urbanização e dos próprios conteúdos que caracterizam o urbano numa realidade tão diversa e complexa como a brasileira, entendemos que trazer para a discussão os dados

referentes à população urbana e à população rural é de valia para a compreensão da dimensão do processo de urbanização.

Tomando como base as informações do IBGE, vamos constatar que o censo de 1960 indicava que o perfil da população brasileira era majoritariamente rural, correspondendo a 54,92% ante 45,08% da população urbana. Esta realidade se mostrou modificada a partir do censo demográfico de 1970, que apontou uma concentração de 55,98% da população brasileira nas cidades. A tendência de consolidação desse perfil demográfico se acentuou no decorrer das décadas seguintes, em que as taxas de urbanização apresentaram um aumento sistemático, alcançando o patamar de 67,7%, nos anos 1980, 75,47% em 1991 e ultrapassando o patamar dos 80% nas duas décadas seguintes (Gráfico 1).

Gráfico 1 – Evolução da população urbana e rural no Brasil (1950-2010).

Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1950/2010. Disponível em:

http://seriesestatisticas.ibge.gov.br/series.aspx?no=10&op=0&vcodigo=CD91&t=populacao-situacao-domicilio- populacao-presente-residente.

Como já destacado, a dinâmica da urbanização brasileira é influenciada pelas contradições inerentes ao processo de desenvolvimento socioespacial do país, em que os vetores da modernização econômica não se disseminaram da mesma forma pelo território nacional. Neste sentido, Brito e Pinho (2012, p. 12) ressaltam a existência de uma “forte assimetria entre a distribuição espacial das atividades econômicas, que moviam o capitalismo retardatário, fortemente concentradas em São Paulo e no Rio de Janeiro, e a redistribuição espacial de uma população”, o que levou à intensificação dos fluxos migratórios para esses centros urbanos, conferindo, assim, um caráter mais concentrador à urbanização.

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 1950 1960 1970 1980 1991 2000 2010 Urbana 36,16 45,08 55,98 67,7 75,47 81,23 84,36 Rural 63,84 54,92 44,02 32,3 24,53 18,77 15,64 Urbana Rural

Uma das facetas decorrentes da dinâmica do acelerado processo de urbanização no Brasil é a acentuação do processo de metropolização e a criação das grandes regiões metropolitanas. Essa nova dinâmica emergiu em decorrência da maior concentração populacional nos grandes centros urbanos, o que implicou o crescimento do número das chamadas “cidades milionárias” (SANTOS; SILVEIRA, 2001)92 – ou seja, as cidades com mais de um milhão de habitantes –, da formação de diversas outras aglomerações urbanas de portes diferenciados, bem como do papel polarizador que as cidades, notadamente as capitais, passaram a desempenhar em suas respectivas realidades espaciais.

Urge destacar, portanto, o contexto em que se deu a criação das regiões metropolitanas no Brasil, entendendo, em princípio, que não se trata de algo recente, mas que tem suas primeiras experiências ainda no período dos governos militares (1964-1985). Moura, Libardi e Marion (2006, p. 130) destacam que a criação das regiões metropolitanas no Brasil veio “como uma resposta ao fenômeno da metropolização e suas consequências no que concerne à concentração de população, atividades e renda, agudizando a desigualdade e a segregação em alguns pontos do território nacional”.

O processo de institucionalização das regiões metropolitanas no Brasil se deu em duas fases: a primeira ocorreu na década de 1970, momento em que o governo federal criou as primeiras nove regiões metropolitanas, e a segunda no período após a Constituição de 1988, que passou para as unidades da federação o papel de criação das áreas metropolitanas. Em relação a essa transferência de poderes, Moura, Libardi e Marion (2006, p. 130) afirmam que “findava um modelo considerado autoritário e centralista – que criou regiões sobre as quais os estados federados não tinham autonomia para intervenção – e abriam-se possibilidades de inserção das regiões metropolitanas em processos estaduais de planejamento regional”.

As primeiras nove regiões metropolitanas criadas foram São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, Curitiba, Belém e Fortaleza, em 1973 (BRASIL, 1973), e, em 1974, a Região Metropolitana do Rio de Janeiro, por intermédio da Lei Complementar nº 20 (BRASIL, 1974). Sob a responsabilidade dos estados, outras regiões metropolitanas foram criadas em todo o país, dentre elas a Região Metropolitana de Natal, em 1997.

Resgatar, ainda que sumariamente, a trajetória de criação das regiões metropolitanas não significa, contudo, que estamos reduzindo-a ao mero aspecto da sua existência legal, mas que consideramos que elas resultam de um conjunto de processos sociais, econômicos e políticos que ajudaram a moldar a realidade da própria urbanização brasileira. Lencione (2017,

92 “As cidades milionárias, que eram duas em 1960 (São Paulo e Rio de Janeiro) são cinco em 1970, dez em 1980

p. 204) ressalta que a “metropolização dos espaços não é um processo isolado. Ele condiciona e produz a história urbana atual e se constitui numa determinação do momento histórico contemporâneo, comumente referido como globalização”. Assim, a partir do último quarto do século XX, o processo de metropolização tornou-se a tônica da dinâmica da urbanização brasileira, apresentando-se como consequência de uma concentração cada vez maior da população nas áreas urbanas, da extensão do crescimento das cidades para as periferias e da expansão das atividades produtivas, o que resultou na formação dos grandes áreas metropolitanas.

Com efeito, também é importante apontar para o fato de que não são apenas as áreas metropolitanas que vêm apresentando tendência de crescimento ao longo dos últimos anos, mas igualmente centros urbanos de porte médio e até mesmo pequenas cidades93, tendência esta que assume escalas e temporalidades bastante diversas pelo país. Sobre essas mudanças na dinâmica do processo de urbanização, Santos, M. (2009, p. 138) afirma:

Estaríamos, agora, deixando a fase da mera urbanização da sociedade, para entrar em outra, na qual defrontamos a urbanização do território. A chamada urbanização da sociedade foi o resultado da difusão, na sociedade, de variáveis e nexos relativos à modernidade do presente, com reflexos na cidade. A urbanização do território é a difusão mais ampla no espaço das variáveis e dos nexos modernos.

Monte-Mór (2006, p. 16-17), por sua vez, considera que “ao final do século XX, o urbano se fazia presente por todo o território nacional”. Do ponto de vista demográfico, as informações dos censos populacionais de 2000 e 2010, contidas no gráfico 1, confirmam a curva ascendente desse processo, quando o percentual de urbanização atingiu 81,23% e 84,36%, respectivamente, da população total. Assim, é possível observar que o processo de urbanização alcançou, nas últimas décadas, a escala nacional, constituindo-se num “determinante estrutural da moderna sociedade brasileira: não é só o território que acelera o seu processo de urbanização, mas é a própria sociedade brasileira que se transforma cada vez mais em urbana” (BRITO; PINHO, 2012, p. 6-7).

Monte-Mór (2004; 2006) utiliza o termo “urbanização extensiva” para compreender a realidade emergente do processo de urbanização em curso no Brasil, referindo-se a um processo que “nasce nas áreas metropolitanas e nas cidades grandes, transborda sobre seu espaço

93 Estamos cientes de que a utilização desse tipo de adjetivação (centro urbano de pequeno, médio ou grande porte)

pode representar alguns riscos se não considerarmos as diversas realidades existentes no contexto brasileiro. Contudo, para efeito de nossa comparação, optamos pela sua utilização.

imediato, mas se estende (virtualmente) pelo espaço regional e nacional como um todo, todo ele cortado e integrado a essa centralidade urbano industrial” (MONTE-MÓR, 2004, p. 16). Esse processo vem se efetivando como realidade por todas as regiões do país, e se caracteriza por uma dinâmica que vai “além das cidades, integrando espaços rurais e regionais ao espaço urbanoindustrial mediante a expansão da base material requerida pela sociedade e pela economia contemporâneas” (MONTE-MÓR, 2006, p. 17), levando, em consequência, a um contexto em que “multiplicam-se as fronteiras (urbanas), tanto internamente e nas franjas das aglomerações quanto nos espaços regionais e rurais incorporados à lógica urbano-industrial dominante” (MONTE-MÓR, 2006, p. 17).

Assim, não é apenas no aspecto quantitativo que o processo de urbanização deve ser compreendido, mas igualmente, em seus aspectos qualitativos. Como uma realidade definidora do mundo contemporâneo, a urbanização se constitui num processo histórico, e é resultante das transformações na dinâmica da sociedade, além de estar na base das transformações ocorridas na forma como o espaço é produzido. Portanto, a urbanização se traduz como um processo cuja natureza está diretamente relacionada à forma como as relações sociais se estruturaram ao longo do tempo, possuindo profundas implicações espaciais, que tem na cidade e na rede urbana suas maiores expressões.

Seus fundamentos não se assentam exclusivamente na percepção e aferição estatística do crescimento da população nas áreas consideradas urbanas e na constatação do crescimento físico da cidade, mas, também, de mudanças mais profundas na forma como a sociedade vem produzindo o espaço urbano sob os ditames do modo de produção capitalista. Para Carlos (2015, p. 26), “a extensão do capitalismo tomou o espaço, fez dele sua condição de produção, primeiro como recurso, depois como força produtiva e, finalmente, mercadoria reprodutível, o que abriu perspectiva para um novo ciclo de acumulação”.

Sendo assim, o espaço urbano – a cidade – se constitui não apenas como produto, mas igualmente como condição essencial para a própria reprodução capitalista, por ser o lócus de concentração de uma série de elementos necessários a dinâmica das relações sociais de produção (força de trabalho, infraestrutura, mercado de consumo, indústrias, atividades de comércio e de serviços, os centros de comando econômicos etc.). Como nos lembra Lefebvre, 2004, p. 111):

A cidade atrai para si tudo o que nasce, da natureza e do trabalho, noutros lugares: frutos e objetos, produtos e produtores, obras e criações, atividades e situações. O que ela cria? Nada. Ela centraliza as criações. E, no entanto, ela cria tudo. Nada existe sem troca, sem aproximação, sem proximidade, isto é,

sem relações. Ela cria uma situação, a situação urbana, onde as coisas diferentes advêm umas das outras e não existem separadamente, mas segundo as diferenças (grifos do autor).

Como vimos, o processo de urbanização vem se generalizando no Brasil nas últimas décadas como decorrência da modernização econômica, das mudanças ocorridas na dinâmica da sociedade brasileira e da forma como ela se organiza espacialmente. Um dos efeitos desse processo é o fato de que ele não apenas desencadeia dinâmicas relacionadas ao crescimento das cidades do ponto de vista populacional e territorial – desde as grandes metrópoles até os centros urbanos de médio e pequeno porte – mas também provoca transformações socioespaciais, que se expressam no surgimento e/ou modificações das formas espaciais, das suas funções e dos seus conteúdos, abrindo, assim, outras possibilidades de interpretações sobre o fenômeno urbano.

Não é de hoje que as transformações nas formas como as cidades vêm se (re)estruturando – decorrentes da extensão do processo de urbanização – têm levado ao surgimento de novos conceitos que possibilitem compreender as complexidades que lhe são inerentes. Desta forma, conceitos como urbanização e cidades dispersas, urbanização e cidades difusas, difusão reticular, rururbanização, cidade informacional, megalópolis, metápolis, edge

cities, cidades-região, pós-metrópoles e exópolis, tecnópolis, e-topia, dentre outros, vêm sendo

trabalhados por diversos autores como possibilidade de interpretação acerca das novas realidades advindas do atual processo de urbanização (CHATEL; SPÓSITO, 2015).

Do ponto de vista das formas e dos conteúdos, essas transformações implicam uma mudança significativa na escala em que se realiza a reprodução das cidades. Conforme assevera Limonad (2006, p. 33):

Enquanto a cidade compacta de períodos precedentes apresentava uma estrutura simples com zonas bem definidas, essa estrutura se diversifica e complexifica conformando um tecido urbano que ultrapassa os limites da cidade [...]. A urbanização na atual etapa, por conseguinte, é entendida, aqui, como um processo que não está mais restrito à cidade, que extravasa os limites da aglomeração física de edificações, infraestruturas e atividades, de fixos e fluxos, através das diversas práticas, táticas e estratégias dos distintos capitais e do trabalho para garantir sua reprodução.

É importante destacar que, mesmo com as mudanças ocorridas nos padrões de crescimento, as cidades brasileiras também refletem o contexto social do país, com a persistência de processos e de realidades urbanas que evidenciam as profundas desigualdades que, historicamente, marcam sua sociedade. Santos, M. (2009, p. 195) afirma que, mesmo

possuindo “diferença de grau e de intensidade, todas as cidades brasileiras exibem problemáticas parecidas. [...]. Quanto maior a cidade, mais visíveis se tornam essas mazelas. Mas essas chagas estão em toda parte”. Sendo assim, temos uma realidade em que as cidades se constituem como expressão das inúmeras contradições que marcam a sociedade brasileira. Do ponto de vista da dinâmica intraurbana, essa realidade se apresenta de forma bastante complexa, na medida em que a cidade resulta da articulação entre os processos sociais levados a efeitos pelos diversos agentes sociais e as formas espaciais resultantes, formas estas que podem apresentar tanto características diversas como similaridades. Nesse sentido, concordamos com Barbosa (2005, p. 29), que afirma:

[...] a cidade é a somatória de um conjunto de ações individuais e coletivas dos agentes que a produzem. Essas ações ora se combinam ora se conflitam, envolvendo uma contínua mobilização de esforços dos citadinos para o