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Acompanhando esta inovação da área editorial, na oferta de possibilidades de criação e edição, surge o segundo momento de influência da nova tecnologia no livro de fo- tografia contemporâneo – a produção/publicação – com os avanços significativos das técnicas de impressão e com o aparecimento das novas formas de publicar.

Até aos anos 199o a grande maioria dos livros impressos, utilizava a técnica da litografia offset (descoberta em 19o4 e atríbuida a Ira Washington Rubel, EUA), uma técnica de impressão muito popular já que é aquela que permite a impressão sobre papel em grande quantidade e ao mais baixo custo por unidade. Trata-se de um processo planográfico em que as zonas de imagem e sem imagem se encontram ao mesmo nível na chapa de alumínio. A litografia é o único processo conhecido em que não há contacto directo entre a chapa e o suporte a imprimir, dado que entre o cilin- dro da chapa e o cilindro da impressão existe um outro cilindro, revestido a cauchu. O cilindro da chapa transfere primeiro a imagem para o cauchu e este transfere-a depois para o papel. A matéria do cauchu, ajusta-se à irregularidade da superfície do papel, suavizando-se a transferência da tinta. Ao iniciar-se a impressão o cilindro que contém a chapa roda primeiro na molha e só depois na tinta, a água vai humedecer toda a área da chapa onde esta não tem imagem gravada e, quando passa pelo tinteiro, esta zona repele a tinta. A unidade básica de impressão em offset é assim constituída

por três cilindros. As máquinas de impressão offset podem ter vários corpos, dado que cada um é responsável pela impressão de uma cor (variando entre duas e quatro cores, podendo chegar às cinco cores, com a introdução de um verniz, por exemplo.) De cada vez que o papel passa por uma unidade de impressão é impressa uma cor, e a operação repete-se tantas vezes quantas as cores do trabalho. O papel pode ser introduzido na máquina em rolo (máquina rotativa – destina-se a tiragens superiores a 25 ooo exem- plares) ou em plano, e neste caso têm os seus formatos associados aos formatos do próprio papel (Barbosa, 2oo5:77).

Os custos fixos iniciais desta técnica de impressão são elevados, já que está implí- cita a produção dos fotolitos, a gravação das chapas, a preparação da máquina, os acertos de início de tiragem, bem como as habituais provas de cor. As tintas utilizadas devem ser à base de óleo, com viscosidade elevada, para permitir a relação de repulsa com a água. Uma das grandes vantagens desta técnica de impressão é que se conseguem obter resultados muito satisfatórios mesmo em papéis de menor qualidade. É reconhecida a boa qualidade de reprodução da fotografia e das cores, por isso tem uma gama de aplica- ções variada, sendo muito utilizada em brochuras, folhetos, catálogos, revistas, jornais, material de estacionário, packaging e claro está em publicações, como a obra-livro.

A descoberta da impressão digital e a sua crescente popularização durante a dé- cada de 9o do séc. XX fez nascer um novo paradigma – “Mais do que imprimir, os sistemas de impressão digital representam uma nova forma de criar e de comunicar. Com prazos cada vez mais apertados e tiragens reduzidas a impressão digital tem ganho cada vez mais adeptos” (ibid: 86). Esta nova técnica de impressão elimina os tempos de pré-impressão e parte dos custos fixos do offset, aumentando a velocidade do processo de impressão na sua totalidade – a rapidez e o baixo custo são as suas mais valias. O baixo custo deste processo prende-se com a eliminação dos chamados “custos fixos”, que no caso do offset se diluiam no número de exemplares impressos, o que só se mostra vantajoso em tiragens médias (entre 5oo e 1 ooo exemplares) e gran- des (mais de 1 ooo exemplares), mas muito pouco competitivo se estivermos a falar de uma pequena tiragem (até 5oo exemplares), situação em que a impressão digital é a opção mais competitiva a nível económico.

Pode ainda ser a opção mais adaptada à realidade do mercado potencial deste tipo de livro, sobretudo para aqueles fotógrafos que ainda estão em início de carreira ou que ainda não têm construída uma audiência capaz de adquirir uma tiragem média- -grande do livro – “No mundo da publicação dos livros de arte e fotografia, a maioria dos editores vêem três mil cópias como sendo o limite máximo do potencial mercado de um livro, e o espectro de quantidades varia largamente e depende de vários facto- res, incluindo o potencial de cross-marketing, reconhecimento do nome do fotógrafo, e actividades associadas, tais como exposições ou patrocínio corporativo”84 (Himes e Swanson, 2o11:32).

Ao contrário do que acontece na impressão convencional, na impressão digital é possível criar uma imagem diferente de cada vez que se imprime, o que pode ser uma grande mais valia quando falamos de projectos com grande grau de personalização. Porém, não é unânime a opinião sobre a qualidade de impressão da tecnologia digital comparativamente à litografia offset. Muitos defendem que não é comparável – “Con- tudo, ainda existe um estigma associado à impressão digital, com a qualidade de im- pressão a ser considerada inferior por alguns.”85 (Leclair, 2o11:44) e “A luminosidade das imagens resultantes da impressão offset não pode ser alcançada pela impressão digital, não existe um sentido de existência de camadas e camadas de tinta sobre a pá- gina”86 (Mack apud Forester, 2oo7:45). Outros falam de uma espécie de preciosismo, considerando que quase se confundem os resultados impressos finais dada a crescen- te melhoria da tecnologia digital – “A qualidade de impressão é absolutamente similar nas impressões digitais, como se estas tivessem sido impressas em offset. O print on demand é muito adequado aos livros de artista, porque o mercado é especializado e as vendas são muito limitadas. Infelizmente a arte é um assunto de especialistas”87 (Boutin apud Forester, 2oo7:44).

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Máquina de impressão digital – HP Índigo

Mas, à parte de algumas divergências sobre a qualidade da reprodução fotográ- fica, a tecnologia digital é, cada vez mais, uma opção que viabiliza a edição – “É pre- ferível ter uma impressão mais barata e um papel menos bom do que tornar o livro acessível a um preço muito elevado”88 (Michals apud Forester, 2oo7:45). É inegável que o risco para os editores é substancialmente diminuído, já que os custos de produção e armazenamento (de uma tiragem inferior) permitidos pela impressão digital são me- nores, podendo atingir um patamar acessível ao próprio autor/fotógrafo que, a título individual, está cada vez mais disponível a investir por sua conta e risco, auto-editando o seu trabalho fora dos circuitos de edição tradicionais.

A par da crescente utilização da técnica de impressão digital, surge a tecnologia POD considerada – “A ferramenta mais revolucionária à disposição dos fotografias (e de todos os aspirantes a autores) nos últimos anos”89 (Himes e Swanson, 2o11:74). Como o próprio nome indica, POD refere-se a algo impresso a pedido, o que pode significar, a impressão de um exemplar quando este é preciso ou encomendado. Utilizando a tec- nologia de impressão digital várias foram as empresas, com lojas online, e programas online de paginação, que se especializaram na oferta deste tipo de serviços, (rondando as cinquenta, segundo o estudo de Louise Forester, datado de 2oo7), sendo que as mais conhecidas são: Blurb, Fastback, Momento Pro, Creative Books, Lulu, iPhoto-Apple, Editions One, Frogprints, Shutterfly, Photobox, Snapfish e MagCloud. Todas elas têm procedimentos de encomenda muito semelhantes: ao utilizador é disponibilizado um programa de pa- ginação, este faz o upload das fotografias, cria a sua sequência, adiciona o texto, quando desejado, selecciona o formato do livro (conforme os formatos standard opcionais), esco- lhe o material da capa, termina o processo de “construção” do livro e, por fim, efectua o pagamento; uma semana volvida e já terá o seu livro de fotografias na caixa do correio. Es- te tipo de empresas e serviços são criados numa lógica comercial onde o objectivo é criar o máximo de rentabilidade económica e chegar ao maior número possível de clientes. A especialização e a qualidade são, portanto, algo discutíveis, já que tudo depende do grau de profissionalismo que cada cliente possa exigir e, também, conhecer.

Outras empresas, por sua vez, especializaram-se na produção de livros de artista, fanzines, catálogos de exposição ou livros de fotografia, aumentando o apoio ao cliente. Normalmente, mais exigente nos desafios técnicos e conceptuais, como as americanas Conveyor Arts e Asuka Book, a francesa Onestar Pressou a inglesa Book Works Studio.

A tecnologia POD pode ser utilizada, fundamentalmente, de duas formas – para a criação de uma maqueta de alta qualidade, passível de submissão a um editor, concurso ou festival, ou como um produto acabado duma pequena edição, vendida ou oferecida pelo autor. Nesta matéria, como de resto é habitual, também é complicado encontrar- mos consensos. Existem autores que fazem uso deste tipo de serviços auto-publicando os seus livros de fotografia exclusivamente por esta via, considerando-a, portanto, uma solução satisfatória. Porém, outros não parecem satisfeitos com as ofertas disponíveis,

afirmando a preferência por soluções à medida, possibilitadas por um budget mais gene- roso – “Não acho que as empresas de livros de fotografia [empresas com serviços POD] tenham qualquer relação com o livro de fotografia, elas não podem competir com as editoras tradicionais”90 (Mack apud Forester, 2oo7:58).

É evidente que o leque de opções oferecidas – acabamentos, tipos de papel, tipo- logia de encadernação, formato, etc. – tem uma parca diversidade, o que é um facto compreensível, já que nem tudo é viável ao nível da produção, ainda por cima quando podemos estar a falar da produção de um único exemplar – “Infelizmente o custo de impressão uma única cópia de um livro é muito maior do que o preço à unidade de uma tiragem de vários milhares”91 (Stewart apud Forester, 2oo7:48).

Depois de conhecidas as vantagens e as limitações oferecidas pela nova tecnologia – no que à produção e publicação concerne – somos obrigados a concordar com a afir- mação de Lesley Martin: “Fazer um livro é mais fácil e mais acessível monetariamente. A impressão digital através de grupos como a Conveyor Arts, Paper Chase Press e a Editions One permitem tiragens pequenas. Até mesmo a Blurb tem boas opções para customização”92 (apud Brook, 2o13).

Outra forma de produção que também tem ganho algum terreno é a In-store prin- ting.93 Como o próprio nome indicia, trata-se de uma impressão produzida em loja, através de uma máquina tipo Xerox, que pode imprimir uma cópia de um livro a par- tir de um ficheiro digital enquanto os utilizadores aguardam alguns instantes. Este formato tem sido implementado em livrarias nos EUA e Inglaterra, assim como em alguns locais públicos como, por exemplo, o New York Public Library. Esta solução po- de ser muito interessante no caso das publicações auto-editadas, normalmente com uma audiência limitada e que não auguram a produção de uma grande tiragem. Como grandes desvantagens, encontramos a qualidade da própria impressão, vulgarmente disponível apenas em grayscale, as limitações ao nível dos acabamentos e os papéis disponíveis. Pensa-se que o contínuo desenvolvimento deste tipo de solução (máqui- nas e tecnologia que lhes está associada), aumente a qualidade do seu resultado final, ampliando também a sua procura.

Resta-nos reconhecer que todas as opções de produção têm as suas qualidades e limitações. Cabe-nos a nós enquanto autores e por vezes editores, confrontar as suas diferenças e fazer uma escolha informada daquela que melhor serve o nosso propósi- to, ou até, porque não, uma combinação das diferentes soluções, como nos sugere Di Bello: “Hoje em dia os computadores, leitores de e-books e iPad parecem prometer a imaterialização do livro em favor de fluxos fragmentados de textos digitais e imagens a surgir por breves momentos em ecrãs diferentes. Contudo, indiscutivelmente, tais tecnologias têm revitalizado a produção e disseminação dos livros de fotografia em papel. Num sentido mais geral, a última desencarnação do livro de fotografia em in- formação para ser re-materializada por meio de uma variedade de dispositivos – todos

imbuídos com os seus prazeres e frustrações tácteis específicos – não é senão a última demonstração da natureza, dos fotógrafos e dos livros, de ‘múltiplas instâncias ou obra-tipo’, que está mais próxima das peças, músicas ou guiões do que da obra de arte única ou ‘ontologicamente singular’, como é o caso da pintura”94 (2o12:11).

As grandes possibilidades permitidas pelos avanços mais recentes – das artes gráficas à digital publishing – intervêm na forma como produzimos e como podemos publicar o livro de fotografia na contemporaneidade, um espaço cada vez mais plural e experimental. Como refere Adam Verity, “É o território entre o digital e o analógico que oferece tanto o potencial criativo e, através de uma rápida progressão e fluidez, como os desafios aos que estão envolvidos na colecção e na preservação”95 (2o12:1o2).