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Promoção e prevenção em saúde

No documento Download/Open (páginas 97-104)

CAPÍTULO 3. A DETERMINAÇÃO SOCIAL DO PROCESSO SAÚDE-DOENÇA:

3.2. Promoção e prevenção em saúde

Conforme mencionado anteriormente, o acesso aos serviços de saúde não acontece de maneira igual para toda a população por motivos de ordem econômica e política, e isso se reflete sobre os grupos que mais necessitam desses serviços, dentre eles, os pacientes acometidos por doenças crônicas que se submetem a tratamentos contínuos.

Discute-se a promoção e prevenção em saúde no Brasil cujo intuito é destacar que a promoção em saúde precisa acontecer em níveis conceituais e metodológicos, ou seja, os serviços precisam ser ofertados de modo a atender as necessidades dos cidadãos que procuram o sistema público de saúde.

A promoção em saúde envolve, segundo Sícolli e Nascimento (2003), duas dimensões: a conceitual – princípios, premissas e conceitos que sustentam o discurso da promoção de saúde; e a segunda dimensão que é a metodológica – se refere às práticas, planos de ação, estratégias, formas de intervenção e instrumental metodológico.

Os primeiros conceitos de promoção da saúde, conforme Buss (2003) foram definidos por Winslow, em 1920 e Sigerist, em 1946 como as quatro tarefas essenciais da medicina: a promoção da saúde, a prevenção das doenças, a recuperação e a reabilitação. Mais tarde, em 1965, Leavell e Clark descrevem o modelo da história natural das doenças, pautadas em três níveis de prevenção: primária, secundária e terciária. As medidas para a promoção da saúde, em nível de prevenção primário, não são voltadas para determinada doença, mas destinadas a aumentar a saúde e o bem-estar gerais.

Buss (2003) cita que o movimento de promoção da saúde veio surgir somente no ano de 1974 no Canadá, quando da divulgação do documento “A new perspective on the health of canadians”35, que também é conhecido como Informe

Lalonde. Segundo o autor, a realização desse estudo teve como condicionante os

altos custos da assistência à saúde, bem como, o modelo centrado no médico, no manejo das doenças crônicas, bastante questionado, já que não apresentava resultados significativos.

Os conceitos de promoção da saúde são frutos dos estudos e discussões ocorridos na I Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde realizada em 1986. Desta I Conferência, origina a Carta de Ottawa, este documento define promoção da saúde como sendo:

O nome dado ao processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no controle desse processo. Para atingir um estado de completo bem-estar físico, mental e social [...] Nesse sentido, a saúde é um conceito positivo, que ENFATIZA os recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas. Assim, a promoção da saúde não é responsabilidade exclusiva do setor saúde, e vai para além de um estilo de vida saudável, na direção de um bem-estar global (BASIL, 2002, p.19).

Esta I Conferência Internacional de Promoção da Saúde enfatizou a importância da Atenção Primária em Saúde, defendida pela OMS como chave para uma promoção da saúde em caráter universal.

A partir desta conceituação, Farinatti e Ferreira (2006), enfatizam que os aspectos socioculturais, econômicos e ecológicos ganham a mesma importância para a saúde quanto os aspectos biológicos.

Nesta I Conferência, em decorrência dos progressos alcançados após a Declaração de Alma-Ata36 para a Atenção Primária à Saúde, que aconteceu em

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A primeira Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, organizada pela OMS e UNICEF em Alma-Ata – Kazaquistão foi realizada em setembro de 1978. Esta resultou na adoção de uma Declaração que reafirmou o significado da saúde como um direito humano fundamental e uma das mais importantes metas sociais mundiais, com intuito de atingir saúde para todos até o ano 2000, reduzindo-se a lacuna existente entre o estado de saúde dos países em desenvolvimento e desenvolvidos. Naquela ocasião, chegou-se ao consenso de que a promoção e proteção da saúde dos povos é essencial para o contínuo desenvolvimento econômico e social e, consequentemente, condição única para a melhoria da qualidade de vida dos homens e para a paz mundial. O apelo lançado em Alma-Ata foi um marco fundamental e representou o ponto de partida para outras iniciativas. Apesar da importância desta Declaração para a saúde mundial não nos aprofundaremos no tema (MENDES, 2004).

1978 e a partir do documento da OMS “As Metas da Saúde para Todos”, foi elaborada a Carta de Ottawa, que passou a ser uma referência permanente na reflexão sobre os determinantes sociais em saúde em todas as conferências que se seguiram e na evolução conceitual da promoção da saúde (BRASIL, 2011).

De acordo com Sícolli e Nascimento (2003), dentre os campos de ação da promoção de saúde mencionados na Carta de Ottawa (1986) estão: o estabelecimento de políticas públicas favoráveis à saúde; a criação de ambientes propícios; o fortalecimento da ação comunitária; o desenvolvimento de habilidades pessoais e a reorientação dos serviços sanitários.

As ações elencadas nesta primeira Conferência serviram de parâmetros para a segunda, que se realizou dois anos depois (1988), conforme aponta Sícolli; Nascimento (2003):

A II Conferência Internacional sobre Promoção de Saúde, realizada em Adelaide (Austrália) em 1988, enfatizou a elaboração de políticas públicas saudáveis, caracterizadas pelo interesse e preocupação explícitos de todas as áreas das políticas públicas em relação à saúde e à equidade, e pelos compromissos com o impacto de tais políticas sobre a saúde da população (Na Declaração é afirmado que o principal propósito das políticas públicas saudáveis é a criação de ambientes físicos e sociais favoráveis à saúde (p. 106).

Em 1991, aconteceu a III Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde, realizada em Sunsdvall (Suécia). Nesta, foram elencados quatro estratégias para o desenvolvimento em saúde: a) reforçar a defesa da proposta através de ações comunitárias, particularmente pelos grupos organizados de mulheres b) capacitar comunidades e indivíduos sobre saúde e meio ambiente c) construir alianças para a saúde e os ambientes favoráveis, de maneira a reforçar a cooperação entre a campanhas e estratégias nas áreas da saúde e do meio ambiente d) mediar interesses conflitantes na sociedade de modo que se possa assegurar o acesso igualitário a ambientes favoráveis à saúde (BRASIL, 2011).

Um ano depois (1992) foi realizado o primeiro Encontro Internacional sobre Promoção da Saúde em Santa Fé - Colômbia. Neste, reuniram-se os representantes de 21 países da América Latina, Canadá e Espanha com o intuito de debater princípios e definir o significado de promoção da saúde na America Latina.

Nesse mesmo ano (1992) no Brasil, a situação da saúde vigente caracterizava-se pela persistência ou ressurgimento de endemias como malária, cólera, tuberculose e desnutrição, pelo aumento de problemas como câncer e doenças cardiovasculares, pelo surgimento de novas enfermidades como AIDS e as resultantes da deterioração ambiental e aumento da violência causando inúmeros problemas psicossociais.

A IV Conferência de Promoção da Saúde foi realizada em 1997, em Jacarta (Indonésia), sendo a primeira Conferência deste porte a acontecer em um país em desenvolvimento e a incluir o setor privado no apoio à promoção da saúde. No ano 2000 foi realizada a V Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde na cidade do México (BRASIL, 2011).

Em 2000, a Conferência Global de Promoção da Saúde detectou que até aquele ano em muitos países havia ocorrido melhoria significativa da saúde, bem como o aumento do acesso aos serviços de saúde em quase todos os países. Contudo a própria OMS recomendou a necessidade de abordar os determinantes sociais, econômicos e ambientais da saúde em todos os setores e níveis da sociedade e colocar a promoção da saúde como prioridade fundamental das políticas e programas locais, regionais, nacionais e internacionais assumindo um papel de liderança e participação ativa de todos os segmentos e da sociedade civil na implementação e ações de promoção que fortaleçam e ampliem as parcerias na área da saúde (BRASIL, 2011).

A VI Conferência Global de Promoção da Saúde, realizada em Bankok (Tailândia) em 2005, apresentou ações que visavam abordar os determinantes sociais por intermédio da promoção da saúde e alguns fatores críticos que influenciam a saúde.

Em 13 de março de 2006, o presidente Lula criou a Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde (CNDSS), sendo o Brasil o primeiro país a implantá-la por meio de Decreto Presidencial. Seu objetivo foi apoiar e articular a atuação do setor público, instituições de pesquisa e da sociedade civil sobre os determinantes sociais relacionados à melhoria da saúde e redução de iniquidades (BRASIL, 2011).

Já em novembro de 2009 aconteceu a VIII Conferência Global de Promoção da Saúde, sob a organização da OMS que reafirmou os compromissos das conferências anteriores. As discussões desenvolveram-se em torno dos seguintes assuntos: empoderamento da comunidade; conhecimento sobre saúde e comportamento; reforço dos sistemas de saúde; parcerias e ação intersetorial e construção e ação intersetorial (BRASIL, 2011).

A realização destas Conferências contribuiu para que o significado do termo Promoção da Saúde fosse sendo transformado ao longo do tempo e, na atualidade este conceito está associado segundo Buss (2003) a valores como:

vida, saúde, solidariedade, equidade, democracia, cidadania, desenvolvimento, participação e parceria. Além disso, está relacionado à ideia de “responsabilização múltipla”, uma vez que envolve as ações do Estado (políticas públicas saudáveis), dos indivíduos e coletividades (desenvolvimento de habilidades pessoais e coletivas), do sistema de saúde (reorientação do sistema de saúde) e das parcerias intersetoriais, na definição de prioridades, planejamento e implementação de estratégias para promover saúde (p.18).

No Brasil, o conceito ampliado de saúde, a partir da associação com os determinantes sociais e condições básicas de vida tiveram avanço quando do início do Movimento de Reforma Sanitária, e assumiu maior proporção na VIII Conferência Nacional de Saúde em 1986, na qual foram debatidas várias questões como: gerenciamento, controle e administração da saúde da população brasileira com envolvimento de toda a sociedade brasileira (AMORIM, 2009).

Estas discussões contribuíram para que a partir do ano 2000, vários atos normativos precedessem a aprovação da Política Nacional de Redução de Acidentes e violências em 2001 com ênfase na promoção da adoção de

comportamentos e ambientes seguros e saudáveis. Em novembro de 2003 no segundo seminário do Conselho Nacional de Secretários da Saúde (CONASS) realizado em Salvador-Bahia, os secretários reafirmaram a priorização da saúde na consolidação da integralidade da atenção à saúde visando o estímulo e valorização de práticas intersetoriais como sendo uma ação transversal coordenada pela Ação Primária (BUSS, 2003).

Em 2004, foram estabelecidos convênios com 40 entes federados visando a implementação de Núcleos de Prevenção, Violências e Promoção da Saúde (NPVPS) e, a partir de 2005, foram transferidos outros recursos financeiros a estados e capitais a fim de desenvolver ações voltadas para estratégia global de alimentação saudável, a prática de atividades físicas e fomento a ambientes livres de tabaco. Entre 2009 e 2010 por meio das Portarias SVS/MS n. 139 e n. 184 ficou estabelecido o repasse financeiro para ações específicas da Política Nacional de Promoção da Saúde com foco na integração das ações de Vigilância em Saúde, Promoção da Saúde e Prevenção de Doenças e Agravos não Transmissíveis com a Estratégia de Saúde da Família (BUSS, 2003).

Ainda em 2010 foi realizado o II Seminário Nacional de Promoção da Saúde promovido pelo Ministério da Saúde, com o intuito de atualizar a elaboração de novas estratégias e ações que promovam maior articulação da rede de promoção da saúde no país, institucionalização e financiamento permanente voltado as principais estruturas de promoção da saúde. (BERBEL & RIGOLIN, 2011)

Estes mesmos autores evidenciam, ainda, que a partir de então, a estrutura institucional legal das políticas de saúde se propõe a atuar com redes públicas de acesso a direitos sociais, tendo os princípios de equidade e universalidade como eixos basilares da promoção a saúde no país. A promoção da saúde na atualidade possui caráter mais humanitário no que tange a abordagem junto ao cidadão, ou seja, além de informações sobre os cuidados com a própria saúde, tenha também conhecimento das estruturas que garantem seus direitos previstos na Constituição Federal de 1988 (BERBEL & RIGOLIN, 2011).

Nesse sentido, a melhoria da promoção da saúde no país mesmo que apresentando muitas lacunas devido à falta de um maior investimento na área, pode ser visualizada em diferentes momentos como campanhas públicas de prevenção de doenças desde a infância até a velhice, visando oferecer melhor qualidade de vida a população de um modo geral.

Por isso, os princípios do SUS precisam ser garantidos conforme preconizado neste documento, a saúde é um direito social e que, portanto, precisa ser garantido à população.

Nesse sentido, Carvalho (2004) afirma que:

O caráter progressista da Nova Promoção à Saúde representa um esforço de atualização dos compromissos com o bem comum, a equidade social e os princípios democráticos da tradição da Saúde Pública. Este modo de ver considera que a promoção à saúde procura articular o tema da saúde com os temas da condição e qualidade de vida. Este ideário representa uma estratégia promissora para enfrentar os múltiplos problemas de saúde que afetam as populações humanas e seus entornos, estando associada a valores como qualidade de vida, saúde, solidariedade, equidade, democracia, cidadania, desenvolvimento, participação e parceria, entre outros (p.3).

A promoção da saúde pensada nessa perspectiva considera tanto as doenças crônicas como aquelas cujo tratamento não é prolongado ou contínuo. A prevenção de doenças crônicas é um dos objetivos do SUS previsto pelo Ministério da Saúde no Eixo “Atenção à Saúde”. Esta atenção consiste na perspectiva ampla adotada por um vasto conjunto de ações que envolvem a promoção, a prevenção e os serviços de saúde nos diferentes níveis de complexidade, abarcando a Vigilância em Saúde e a assistência prestada no âmbito do SUS e da Saúde Suplementar (BRASIL, 2011).

Apesar da promoção da saúde ser pensada nesta perspectiva ela precisa ser gestada de maneira particular para aquelas pessoas com doenças crônicas que realizam tratamentos contínuos, como aqueles pacientes diagnosticados com glaucoma, conforme se discute a seguir.

3.3. A problemática dos colírios de uso contínuo para a pessoa com

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