comunidade de Taganga
4.2. Propósitos e critérios de justificação
O protótipo de intervenção da inovação foi desenvolvido para a unidade didática das “estações do ano”, da 3ª série da educação básica primária, ou qualquer outra série da educação básica em que se estude o clima, o tempo, as estações do ano, os períodos climáticos ou a pesca artesanal, com uma abordagem que comumente envolve uma ênfase excessiva nas condições climáticas e ambientais subtropicais e andinas, ou na pesca
industrial, com menor consideração das condições intertropicais e litorâneas, ou da pesca em pequena escala.
A escolha da unidade das “estações do ano” foi justificada pelo papel que o conhecimento dos pescadores pode ter no estudo e compreensão de variações no tempo e no clima, ou na análise de possíveis impactos da variabilidade climática (e.g. variações extremas ou inesperadas) sobre a navegação, a pesca e o bem-estar das comunidades litorâneas e de pescadores (GÓMEZ-BAGGETHUN et al., 2013). Além disso, trazer esse cenário que é próximo da realidade dos alunos pode constituir possíveis impactos positivos e afetivos nos alunos (LUFT et al., 1999), assim como contribuir à preservação de modos tradicionais de aprendizagem (REYES-GARCÍA et al., 2016) e ao monitoramento de mudanças ambientais e manejo de recursos ambientais (ALESSA et al., 2015).
As interações entre os conhecimentos científicos escolares e os conhecimentos ecológicos tradicionais dos pescadores que foram propostas para serem abordadas durante a intervenção foram as seguintes:
- Explorar representações escolares e experiências e conhecimentos dos alunos para diferenciar as estações climáticas subtropicais das condições climáticas locais e, assim, abordar a ideia escolar sobre os períodos climáticos intertropicais.
- Aproveitar percepções e conhecimentos dos pescadores locais para enriquecer as descrições dos alunos sobre o clima local, assim como as descrições escolares sobre os períodos climáticos intertropicais, explorando possíveis mudanças históricas.
- Compreender e comparar o regime anual de atividades e recursos pesqueiros e fatores de importância ecológica marinha local, como as chuvas e a temperatura da água superficial do mar, explorando relações entre elas, assim como domínios de aplicação.
Assim, os propósitos desse protótipo de intervenção relacionaram-se com a comparação e diferenciação das estações intertropicais e subtropicais, o reconhecimento das variações cíclicas locais no tempo atmosférico, o clima e a pesca, e a valorização do conhecimento tradicional dos pescadores sobre esses assuntos (Quadro 15).
Quadro 15: Matriz com os propósitos do protótipo de intervenção da inovação, especificando seus alcances de ensino e aprendizagem esperados.
Propósitos da intervenção Alcance de ensino Alcance de aprendizagem
1. Espera-se que as crianças aprofundem o reconhecimento e a valoração dos conhecimentos sobre o clima e a pesca
que têm os pescadores de Taganga.
Promover o estudo e a valoração dos conhecimentos dos pescadores sobre o clima e a
pesca.
Reconhecer conhecimentos dos pescadores sobre o clima e
a pesca e valorá-los a partir dos próprios critérios dos pescadores. 2. Espera-se que as crianças reconheçam
mudanças características no clima e na pesca em sua região, assim como possíveis variações ao longo do ano.
Promover o estudo de mudanças características no
clima e na pesca locais, assim como possíveis variações ao longo do ano.
Reconhecer mudanças características do clima e
da pesca na região local, assim como possíveis variações ao longo do ano.
3. Busca-se que as crianças diferenciem as estações do ano subtropicais dos
períodos climáticos intertropicais.
Promover o estudo e a comparação das estações do
ano subtropicais e dos períodos climáticos
intertropicais.
Diferenciar as estações do ano subtropicais dos
períodos climáticos intertropicais.
4. Espera-se que as crianças compreendam a ideia de que as estações do ano e os períodos climáticos ocorrem
ciclicamente ao longo dos anos.
Promover o estudo e a compreensão do ciclo anual que pode apresentar o clima
em distintas regiões.
Compreender a ideia de que as estações do ano e os períodos climáticos ocorrem ciclicamente ao
longo dos anos.
5. Espera-se que a inovação promova a disposição das crianças para escutar,
observar e indagar sobre o clima e a pesca em sua região, de modo que
tenham elementos para formular perguntas, buscar respostas, explorar e
compreender termos e conceitos científicos e culturais locais.
Ajudar a promover a disposição dos alunos por escutar, observar e indagar sobre o clima e a pesca em
sua região.
Promover o uso de termos e conceitos científicos e culturais locais sobre o
clima e a pesca.
Usar elementos científicos e culturais locais para
formular perguntas e buscar respostas sobre o
clima e a pesca em sua região.
Buscar a compreensão de termos e conceitos científicos e culturais locais sobre o clima e a
pesca
Esses propósitos foram justificados com critérios de justificação a priori, discutidos por Méheut (2005), em torno de três dimensões educacionais (epistemológica, cognitiva e didática) (Quadro 16). Estes critérios são discutidos a seguir:
A dimensão epistemológica relaciona-se aos conteúdos a serem aprendidos, aos problemas
que eles podem resolver e à sua gênese histórica. Neste caso, os conteúdos a serem apreendidos se relacionam com a dinâmica climática da zona intertropical, onde se localiza
a Colômbia. Busca-se, assim, promover a superação do uso de descrições sobre as estações climáticas subtropicais para descrever a variação climática local no âmbito escolar, problemática influenciada pelo uso de representações idealizadas das estações do ano no
currículo escolar de ciências (SELLES; FERREIRA, 2004). Deste modo, buscou-se
promover o uso de descrições tradicionais de uso cotidiano na comunidade, incluindo percepções e conhecimentos sobre os períodos climáticos intertropicais, assim como visões sobre influência do clima na forma de vida local e na prática dos pescadores.
A dimensão psicocognitiva analisa as características cognitivas dos estudantes. Neste
caso, o contexto de interação entre o currículo escolar de ciências, as ideias e experiências dos estudantes e o conhecimento etnoecológico dos pescadores locais ajudaram a configurar um diálogo entre modos de conhecer na sala de aula de ciências, tomando-se como base a proposição de que muitas das ideias e experiências que os estudantes trazem para a sala têm como fundamento conhecimentos culturais por eles adquiridos ao longo de seu desenvolvimento nas comunidades das quais fazem parte (BAPTISTA; EL-HANI, 2009).
A dimensão didática analisa as restrições do próprio funcionamento da instituição de
ensino (programas, cronogramas etc.). Neste caso, as poucas oportunidades para a exploração das variações climáticas locais e seu papel na prática da pesca artesanal limitam a relevância e representatividade dos “Projetos Educativos Institucionais” das escolas locais, uma vez que estes são destinados a ser desenhados tendo em conta as condições sociais, econômicas e culturais do seu ambiente (COLOMBIA, 1994).
Quadro 16: Utilização dos critérios de justificação a priori, discutidos por Méheut (2005), em três dimensões educacionais
Dimensão epistemológica Necessidade de enriquecimento das descrições escolares sobre as variações climáticas locais, próprias do Caribe colombiano, e da
zona intertropical.
Dimensão psicocognitiva Possibilidades para a inclusão de vários referentes (empíricos, escolares, pesqueiros) na descrição das variações climáticas locais. Dimensão didática Poucas oportunidades nas disciplinas escolares (p. ex. ciências
naturais, ciências sociais, educação ambiental) para a exploração das variações climáticas locais e seu papel na prática da pesca artesanal.