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CAPÍTULO V: A PROVA NO ATUAL CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL EM FACE ÀS

3. PROVA E ÔNUS PROBATÓRIO

Tratando do assunto, o magistério de Cândido Dinamarco é o de que “o ônus da prova é o encargo, atribuído pela lei a cada uma das partes, de demonstrar a ocorrência dos fatos de seu próprio interesse para as decisões a serem proferidas no processo.”140

O vocábulo, originário do latim ônus (carga, peso, obrigação), “na significação técnico-jurídica, entende-se todo encargo, dever ou obrigação que pesa sobre uma coisa ou uma pessoa, a que se atender.”141

137 DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. Pág. 48.

138 GÓES, Ricardo Tinoco de. Efetividade do Processo e Cognição Sumária. São Paulo: MP Editora. 2008. Pág. 128

139 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Poderes Instrutórios do Juiz. 2. ed. São Paulo: RT, 1994. Pág. 90.

140 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros. Pág. 70. 3v.

141 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 28. ed. Rio de Janeiro: GEN – Forense. 2009. Vocábulo ÔNUS. Pág. 978.

Apesar da sinonímia que acima se fez referência, o ônus probatório não é considerado obrigação de provar. O ônus probatório é o encargo que se atribui às partes do processo, de apresentar provas dos fatos articulados e que são considerados os fundamentos que alicerçam a pretensão deduzida em juízo. Não é demais repetir a máxima de que: onus probandi incumbit qui dicit.142

“O conceito de ônus probatório desenvolveu-se, inicialmente, na Alemanha e na Áustria, em razão de os doutrinadores destes países haverem percebido a incompatibilidade entre a noção de ônus da prova herdada do direito romano (identificado como a obrigação de provar para obter êxito no processo) e sua aproximação com os poderes instrutórios e de critérios de valoração de prova pelo juiz.”143

Para que a parte seja beneficiada com os efeitos decorrentes da aplicação da norma jurídica, deve fazer prova dos argumentos fáticos deduzidos. Ao fim da instrução probatória, o magistrado, destinatário da prova, deve analisar se o resultado da instrução resultou completo ou incompleto. Se se resultou completa, não há que se prender ao aspecto subjetivo do ônus probatório. Não importando se a prova foi produzida pelo autor ou pelo réu (princípio da comunhão das provas). Entretanto, se decorrida a instrução, o resultado for incompleto, o aspecto objetivo deve ser posto em evidência, na investigação de qual das partes contendoras não se desincumbiu do ônus probatório.

O art. 373 do CPC (Lei nº 13.105/2015) mantém a distribuição estática do ônus da prova da forma seguinte: Ao autor, incumbe a prova dos fatos constitutivos do direito invocado; e ao réu cabe a prova de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. A inovação do dispositivo está no §1º144do citado artigo, que disciplina a distribuição dinâmica do ônus da prova, o que não acontecia no Código de 73, uma vez que possuía uma distribuição estática do onus probandi. Na distribuição dinâmica, o juiz avalia as

142 O ônus da prova incumbe a quem a afirma.

143 BORGES, Fernanda Gomes e Souza. A Prova no Processo Civil Democrático. Curitiba: Juruá. 2013. Pág.186.

144Art. 373. §1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibi- lidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de ob- tenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o fa- ça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.

circunstâncias de produção das provas, e identifica qual das partes terá maior facilidade para efetivar a demonstração da prova determinada, devendo incidir sobre ela os efeitos da não produção.

O § 2º do mesmo art. 373 faz restrição à distribuição dinâmica do ônus da prova nos casos em que a obtenção das provas pela parte seja impossível ou excessivamente difícil. É a hipótese das chamadas “provas diabólicas” (probatio diabolica).

O Código de Processo Civil de 2015 não adotou em seu art. 373 a regra da distribuição dinâmica do ônus da prova, mas trouxe em seus parágrafos 1º e 2º a previsão da inversão, ressaltando a ideia da carga dinâmica do ônus da prova.

Resta claro que a distribuição estática do ônus probatório, em situações que impossibilitem o exercício do direito probatório, poderá ser revista pelo magistrado, até mesmo porque “não se afasta a ocorrência de situações em que a aplicação das regras sobre o ônus da prova flerta, perigosamente, com a impossibilidade de provar, beirando a inutilidade da ação judiciária, com a vedação oculta de acesso efetivo à justiça”.145

Em que pese ser o ônus dinâmico uma forma de tratar igualmente as partes, possibilitando assim, o efetivo acesso à justiça, não se pode olvidar que essa aplicação não servirá “para simplesmente compensar a inércia ou a inatividade processual do litigante”146, mas para que seja evitada que a prova diabólica recaia sobre uma das partes contendoras.

No cotejo probatório dos autos, faz-se imprescindível não apenas as alegações, mas a comprovação dessas alegações, até mesmo porque quem alega estará mais afeito aos fatos articulados e ao tipo de prova que poderá produzir. É evidente que a preocupação com a atividade probatória condizente com os preceitos constitucionais, certamente revela a preocupação com a realização do efetivo acesso à justiça, pois o direito ao processo justo é

145 KNIJNIK, Danilo. Processo e Constituição: estudos em homenagem ao professor José Carlos Barbo-

sa Moreira. Coordenação: Fux, Luiz, Nery Jr., Nelson e Wambier, Teresa Arruda Alvim. São Paulo: RT. 2006. Pág. 944.

146 KNIJNIK, Danilo. Processo e Constituição: estudos em homenagem ao professor José Carlos Barbo-

sa Moreira. Coordenação: Fux, Luiz, Nery Jr., Nelson e Wambier, Teresa Arruda Alvim. São Paulo: RT. 2006. Pág. 947.

garantia constitucional, que não pode ser deixada de lado nesse estágio de evolução constitucional. Os fatos controversos geram a necessidade de produção mais acurada de prova. Além do que não é demasiado dizer que fato não provado equivale a fato não alegado. A regra do ônus da prova tem estreita relação na condução da formação do convencimento do julgador na valoração da prova. O ônus da prova não conduzirá invariavelmente, a um resultado favorável, mas trará elementos que formarão o convencimento do magistrado, podendo ser até mesmo desfavorável à parte que produziu a prova.

O ônus da prova, em sua roupagem mais atual, reclama uma postura mais ativa do juiz, e essa postura mais ativa do magistrado na colheita de provas sempre foi uma preocupação dos doutrinadores. No código de 1973 (art. 130), já havia a preocupação do legislador. Doutrina e legislação sempre estiveram afinadas para que a iniciativa probatória fosse realizada de forma mais intensa, pelo juiz.

“A doutrina moderna busca ampliar os poderes do juiz na ins- trução da causa, sob a bandeira de que o processo é instru- mento público e que deve buscar a verdade sobre os fatos in- vestigados. Ao se autorizar que o juiz possa determinar, de ofí- cio, a produção de provas — suprindo, pois, a atividade que competiria primariamente às partes — novamente pretende-se dar ênfase à busca da verdade substancial, trazida como ver- dadeiro dogma para o direito processual.” 147

A atividade do juiz na distribuição do ônus probatório, ou mesmo na condução da colheita de provas não substitui, em absoluto, o encargo das par- tes de provar o alegado. O dever das partes de cumprir com o ônus que lhes foi atribuído concorre para a busca da verdade buscada no processo.