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Quais limites e possibilidades os sistemas político e partidário colocam para a reforma?

CAPÍTULO 3- MUDANÇA ESTRUTURAL E INSTITUCIONAL NA BOLÍVIA

3.2 Quais limites e possibilidades os sistemas político e partidário colocam para a reforma?

Dadas as peculiaridades do MAS enquanto partido político e movimento que se vale dos espaços institucionais formais e informais para a construção política, nos interessa posicioná- lo no sistema político e partidário boliviano. Isso porque assumimos que o sistema partidário tem reflexos na formação dos governos e na forma pela qual os atores dentro da arena política lidam com as demandas. Sendo assim, têm importância na forma como os governos exercem o poder e em sua capacidade de formular e implementar políticas e, portanto, interessam para a discussão da política de saúde no governo do MAS. No sistema político, o pressuposto da ação dos partidos guarda relação com o nível de institucionalização do sistema partidário. Isso implica, dentre outras, que quanto mais institucionalizado esse sistema, maior a possibilidade de existirem partidos programáticos, com orientação estável e propósitos políticos concretos.

Com relação ao sistema político, até a promulgação da Constituição boliviana de 2009 o formato da eleição presidencial previa que no caso de nenhum candidato alcançar a maioria se daria um segundo turno congressual entre os três candidatos mais votados, do qual participariam os deputados e senadores eleitos (as eleições presidencial e legislativa ocorrem simultaneamente). Em 1994 uma reforma na Constituição de 1967 alterou esse sistema fixando o segundo turno congressual entre os dois candidatos mais votados. Nesse turno os legisladores somente deveriam votar na chapa de cada partido, de forma diferente daquela anterior a essa alteração, na qual os três candidatos à presidência e os respectivos vices participavam de dois turnos: um para a eleição do presidente e outro para a eleição do vice-presidente. Entre 1980 e 2002 nenhum candidato obteve maioria absoluta dos votos nas eleições gerais e o segundo turno congressual foi o processo de definição da presidência e vice-presidência na Bolívia (TORRICO, 2014). Esse procedimento do segundo turno congressual aproximou o presidencialismo boliviano, segundo avalia a literatura, de um regime do tipo parlamentar, no

qual o líder do governo é eleito pelo Poder Legislativo. Já a permanência do presidente e do vice eleitos não dependia da preservação da confiança do Congresso, traço típico de um regime presidencialista, no qual ambos os poderes têm mandatos fixos e independentes em relação ao apoio de um ao outro. A confluência desses dois aspectos – eleição pelo Poder Legislativo e mandatos fixos e independentes –, caracterizou o sistema político boliviano como um “presidencialismo parlamentarizado” (MAYORGA, 2004; TORRICO, 2014; NUNES, 2015).

Esse mecanismo das eleições presidenciais na Bolívia por segundo turno congressual teve, ainda, dois elementos característicos. Primeiro, ao adotar listas fechadas, o sistema delegava maiores poderes ao Legislativo. Segundo, fornecia incentivos aos partidos menores para apresentação de candidatos, pela possibilidade desses aumentarem seu poder na formação de coalizões no segundo turno, favorecendo o multipartidarismo. Esse fato abria a possibilidade de que partidos com baixos níveis de votação conseguissem tomar parte no governo. A Bolívia transitou entre 13 partidos em 1980, 18 em 1985, 14 em 1993 e 11 em 2002. Nas eleições presidenciais de 2005 existiam oito partidos atuantes (NUNES, 2015). O sistema eleitoral de lista fechada com voto único e a alta fragmentação eleitoral e partidária impossibilitavam a formação de maioria legislativa por parte de uma só força. O presidencialismo parlamentarizado na Bolívia esteve, portanto, baseado na lógica de coalizões interpartidárias.

A prática do presidencialismo parlamentarizado e a necessidade de construção de maioria por meio de coalizões interpartidárias responderam de forma eficaz à necessidade na Bolívia de garantir governos fortes, evitando-se o impasse recorrente dos sistemas presidencialistas sustentados por sistemas multipartidários. Isso porque com a fragilidade interna e as discordâncias com o movimento sindical, bem como a oposição parlamentar da ADN e MNR, o governo pós-ditadura da Unidad Democrática y Popular27 (UDP) entre 1982 e 1985, não conseguiu criar bases políticas sólidas para o enfrentamento dos problemas políticos e sócio-econômicos da transição à democracia, culminando, dentre outras, com uma hiperinflação e com a perda de legitimidade do governo. Assim, o acordo entre os principais partidos do país foi considerado um importante passo para garantir o sistema democrático (MAYORGA, 1994, p. 36). Esse acordo consistiu na modificação dos padrões tradicionais de fazer política e na construção de consensos básicos em torno da democracia e da necessidade de desenvolver uma política econômica de mercado, constituindo o que ficou conhecido como uma democracia pactada para o exercício do governo. Esse modelo perdurou até 2002, quando o MAS decidiu não negociar seu apoio (NUNES, 2015; MAYORGA, 2004). Os principais

partidos do sistema político que compuseram esse sistema de pactos foram ADN28, MIR e MNR, ocupando alternadamente a presidência (Quadro 4).

Quadro 4- Partidos e coalizões governantes na Bolívia entre 1985 e 2015.

Mandatos 1985-1989 1989-1993 1993-1997 1997-2002 2003-2005 2006-2010 2010-2015 2015-2020 Partido do

Presidente MNR MIR MNR ADN MNR MAS MAS MAS

Partidos da

coalizão ADN ADN UCS

MIR, UCS, CONDEPA, NFR MIR, UCS, NFR Presidente Paz Estenssoro Paz Zamora Sánchez de Lozada Hugo Bánzer Lozada/Mesa Evo Morales Evo Morales Evo Morales Fonte: Adaptado de Nunes (2015).

O acordo firmado em 1984 entre ADN, MIR e MNR e o processo eleitoral de 1985 se iniciaram com o compromisso de solucionar a crise política por meio de eleições e da formação de um novo governo, e de resolver a crise econômica com uma política orientada a uma economia de mercado. Em 1985 o MNR assumiu a presidência por decisão no segundo turno congressual. Paz Estenssoro havia alcançado o segundo lugar e foi eleito com o apoio do MIR e da ADN (Quadro 4). O plano econômico levado pelo governo foi apoiado por meio do Pacto por la Democracia firmado em 1985 entre o MNR e a ADN, principal partido de oposição. Pelo acordo a ADN se comprometia também a apoiar no Congresso as iniciativas de Executivo para combater a crise econômica. O Pacto por la Democracia foi respeitado até fevereiro de 1989, quando o MNR rompeu unilateralmente o acordo para viabilizar a candidatura de Sánchez de Lozada, sem ter de disputá-la com um candidato da ADN.

Nas eleições de 1989 o cenário de fragmentação política se repetiu e quase por inércia a designação do presidente aconteceu também no âmbito do Congresso, elegendo para o mandato presidencial de 1989-1993, com o apoio da ADN, o antigo adversário político Jaime Paz Zamora, líder do MIR e terceiro candidato mais votado. O acordo pós-eleitoral entre os dois partidos, MIR e ADN – Acuerdo Patriótico – permitiu um diálogo entre essas importantes forças políticas do país.

Em 1993 o MNR alcançou uma importante vitória eleitoral (35,55% dos votos) que conduziram Sánchez de Lozada à presidência para o período, apoiado pela Unión Cívica

28 Acción Democratica Nacionalista, partido de direita fundado em 1979 por Hugo Banzer. Posteriormente incluiu

Solidaridad29 (UCS). Com a aliança do MRTKL com o MNR pela primeira vez a Bolívia teve um vice-presidente de origem indígena, Victor Hugo Cárdenas. Nessa gestão, em 1994 foi aprovada a lei que introduziu as primeiras reformas na Constituição de 1967 que, dentre outras medidas, ao criar circunscrições uninominais e incorporar o procedimento de maioria simples em um sistema eleitoral de tradição proporcional e de circunscrições plurinominais afetou a forma de eleição de metade dos membros da Câmara de Deputados. Essas mudanças permitiram, junto com a promulgação da Ley de Municipalidades (1985), da Ley de Descentralización Administrativa (1995), da Ley de Participación Popular (1994) e diversos regulamentos complementares, a descentralização de funções administrativas para os governos departamentais e municipais, e a ampliação da participação popular no sistema político (CARRAFA, 2007).

Com a reforma na Constituição de 1967 utilizou-se pela primeira vez circunscrições uni e plurinominais nas eleições para os poderes Executivo e Legislativo de 1997 para eleger 130 deputados. Foi uma profunda mudança na origem, legitimidade e funcionamento do Poder Legislativo. No poder Executivo, a aliança entre MIR, CONDEPA30, UCS, NFR e ADN deu a

vitória de Hugo Banzer (ADN), na mesma lógica dos pactos anteriores. Encerrando esse ciclo, nas eleições de 2002 foi novamente eleito Sánchez de Lozada, do MNR, em uma aliança com o MIR, UCS e NFR (CARRAFA, 2007). Nessas eleições o MNR e o MIR, relevantes nos governos desde 1985, assumiram uma coalizão com um poder um tanto debilitado (52,8% dos assentos parlamentares) em relação ao Pacto por la Democracia de 1985 entre MNR e ADN (75% dos assentos) e ao Acuerdo Patriótico de 1989 entre MIR e ADN, pelo qual detinham 60% das cadeiras parlamentares (MAYORGA, 2004).

Vários fatores contribuíram para o enfraquecimento dos partidos tradicionais. Com o surgimento de movimentos políticos de tendência anti-sistêmica – o MAS em 1997, o Movimiento Indígena Pachakuti (MIP) em 2000 e, em certa medida, o neo-populista Nueva Fuerza Republicana (NFR) em 1995 – abriu-se uma nova distância ideológica com os partidos tradicionais. Esses partidos absorveram o descontentamento com a situação de pobreza e exclusão social e com os desacertos do governo de Hugo Banzer (1997-2002). A polarização revelada por propostas de mudanças que, de um lado, defendiam o desmonte radical e a reconstrução do Estado e, de outro, as reformas moderadas, foi também um efeito do ressurgimento de tensões étnico-culturais latentes desde a transição para a democracia. Por sua

29 Partido de centro-direita fundado em 1989.

30 Partido de cunho populista fundado em 1988. Foi o primeiro grande partido a abraçar a identidade cultural

vez, o impulso à territorialização do voto dado pela reforma eleitoral consequente às mudanças constitucionais de 1994, e os novos espaços de competição política nos âmbitos local e municipal criados a partir da aplicação da Ley de Participación Popular provocaram um salto qualitativo nas eleições de 2002. Amplos setores camponeses e indígenas participaram votando por opções próprias como o MAS e o MIP, fortalecendo uma representação político-partidária baseada na identidade étnico-cultural. A aplicação do novo sistema eleitoral para a eleição de mais da metade dos deputados em distritos uninominais fortaleceu a representatividade do sistema político e a permitiu a renovação de 70% da Câmara, embora tenha tido efeitos no nível de profissionalismo dos parlamentares, reduzindo-o (MAYORGA, 2004).

Para os três principais partidos no cenário político desde a redemocratização – ADN, MNR e MIR – as eleições de 2002 significaram uma queda de difícil recuperação (Gráfico 1). Entre seus efeitos destacamos a significativa reconfiguração dos partidos relevantes para a arena política, a forte polarização entre os partidos tradicionais e as novas foças políticas, o avanço qualitativo da representação política – no sentido de sua diversidade – e uma importante redistribuição territorial do voto. Os novos movimentos campesinos haviam se transformado em movimentos políticos e alcançaram uma representação de caráter histórico. O MAS alcançou 20,94% dos votos, ficando em terceiro lugar, com 35 cadeiras no parlamento, e o MIP alcançou 6,09% dos votos e seis cadeiras. Os dois juntos totalizaram 27% (41) do total de cadeiras no parlamento (CARRAFA, 2007).

Na Bolívia a competição eleitoral entre os partidos, a alternância no poder e as coalizões governamentais foram necessárias para fazer funcionar a democracia, mas não suficientes para ampliar o horizonte do sistema político até a economia ou a inclusão da base social étnica e alcançar, com isso, maior adesão social, melhor estabilidade e maior governabilidade. Carrafa (2007) destaca como ponto negativo dos pactos políticos a utilização instrumental dos recursos do Estado no benefício de minorias. Os partidos tradicionais envolvidos nesses pactos – ADN, MIR e MNR – teriam desenvolvido condutas perversas e os mecanismos de controle social não foram eficientes para deter a utilização corrupta do Estado ou a apropriação de seus recursos. A isso se somou a adoção de uma economia liberal de mercado a partir de 1985 e seu amplo e controverso processo de venda do patrimônio estatal ao capital privado. Os partidos políticos, por sua vez, não aperfeiçoaram sua democracia interna, e a decisão de implantar um modelo de livre mercado com um Estado desarticulado e cada vez com menor autoridade não contribuiu para revigorar a democracia, mas para empurrá-la a reiteradas crises e um déficit de governabilidade. A sociedade civil, nesse cenário, desenvolveu organizações à margem dos partidos, bem como novos canais de comunicação e redes de mobilização cada vez mais

eficientes para incidir na política (CARRAFA, 2007, p. 83). Com efeito, como destacamos na seção anterior, esses fatores concorreram para a organização dos movimentos sociais e suas manifestações contrárias à política dos governos principalmente a partir de 2000, e para a consolidação de partidos com alternativas políticas mais inclusivas, como o MAS.

Gráfico 1- Proporção de votos nas eleições presidenciais na Bolívia entre 1993 e 2014, por partido.

Fonte: Adaptado de Mendieta, 2010.

Em 2005 o MAS teve a maioria dos votos no primeiro turno e converteu-se no partido dominante do país. Essas eleições de certa forma extinguiram o tradicional sistema de partidos: enquanto no passado ADN, MIR e MNR concentravam cerca de 60% dos votos no país, em 2005 apenas o MNR teve alguma representação, com 6,47% dos votos. Esse resultado teve

35,6 21 14,3 13,7 5,4 10

1993

MNR ADN CONDEPA UCS MBL Outros 18,2 22,3 16,8 17,2 16,1 3 2,7

1997

MNR ADN MIR CONDEPA UCS MBL Outros 22,5 3,4 16,3 5,5 20,9 6,1 20,9 4,4 2002 MNR ADN MIR UCS NFR MIP MAS Outros 6,5 53,7 28,6 7,8 3,4

2005

MNR MAS PODEMOS UN Outros 64,2 26,5 5,7 3,6

2009

MAS PPB- Convergencia UN Outros 61 24,4 2,7 9,1 2,7

2014

MAS UD MSM PDC PV

como antecedentes as eleições gerais de 2002, quando surgiram no cenário os novos partidos (MAS, NFR e MIP) que, juntos, tiveram cerca de metade dos votos (Gráfico 1). O discurso contestatório ao neoliberalismo e à democracia pactada debilitou a tendência anteriormente observada em torno dos partidos tradicionais e a polarização no sistema partidário alimentou a crise política que em 2003 e 2005 resultou na renúncia de dois presidentes no mesmo mandato e na convocação de novas eleições. Em 2005 a NFR e o MIP desapareceram da cena parlamentar e foram substituídos por novas forças de oposição: o movimento Poder Democrático Social (PODEMOS) – partido de direita fundado em 2005 por ex-dirigentes da ADN31 –, a Unidad Nacional (UN)32 e o único sobrevivente dos partidos tradicionais, o MNR. O PODEMOS obteve 28,69% dos votos nas eleições gerais; a UN cerca de 8% e o MNR, 7%. Portanto, somente o MAS e o PODEMOS tinham presença nacional. O PODEMOS foi um fenômeno eleitoral naquele momento, mas não conseguiu chegar às eleições de 2009 (CARRAFA, 2007; MAYORGA, 2008; ÁLVAREZ, 2011).

Esse novo sistema partidário esteve marcado pela polarização, com o MAS frente a uma gama fragmentada de políticos tradicionais e líderes regionais. Essa reconstrução histórica é importante para entendermos o cenário a partir do qual a esquerda chega ao poder na Bolívia. Ou seja, a esquerda assume o poder não como um corpo orgânico, mas em um cenário volátil.

Não restam dúvidas de que, mesmo com os conflitos entre o governo e a sociedade civil e os movimentos sociais, a liderança do MAS foi reforçada nas eleições de 2009, frente a uma oposição dispersa e sem organização. O MSM (Movimento sin Miedo) conseguiu resultados expressivos nessas eleições, mas restritos ao nível municipal e entre alguns setores indígenas. A maior expressão da oposição veio do Plan Progreso para Bolívia-Convergencia Nacional (PPB-CN), coalizão de direita e centro-direita entre os partidos NFR, MNR, PPB (Plan Progreso para Bolívia), e os pequenos partidos APB (Autonomia para Bolívia) e PP (Partido Popular). O PPB-CN se constituiu em um partido em 2009 para concorrer às eleições presidenciais daquele ano, obtendo 27% dos votos nas eleições gerais. Contudo, não sobreviveu a um segundo ciclo eleitoral (CENTELLAS, 2014).

No nível nacional o sistema de partidos em 2009 estava representado por quatro principais forças: o MAS, o MSM à esquerda, o PPB-CN e a UN à direita. A oposição nas autonomias regionais produziu uma dispersão de votos e uma fragmentação que, de certa forma,

31 Em 2008 o PODEMOS foi questionado pela Corte Eleitoral acerca do registro de seus militantes e da necessidade

de nova tramitação de sua inscrição. Somou-se a esse o fato de perder várias lideranças. Em 2009 o partido foi dissolvido.

favoreceram o governo (NUNES, 2015). Um componente importante para essa dispersão dos votos foi a ampliação da representação política para os agrupamentos cidadãos e povos indígenas. Enquanto os partidos políticos são de caráter nacional e se relacionam com as organizações sociais sob o critério convencional de células ou comandos por setores ou territórios, os agrupamentos cidadãos são menos estáveis e adquirem fisionomia própria somente no âmbito local. Seus critérios de recrutamento são menos exigentes e mais conjunturais, apelando, sobretudo, à personalidade. No caso dos povos indígenas as pautas culturais das comunidades definem a seleção de candidatos (MAYORGA, 2012).

No cenário em 2013, véspera de um ano eleitoral, a oposição partidária ao MAS ainda se encontrava dispersa e ideologicamente frágil. A maior força de oposição estava concentrada na Frente Amplio, aglutinando vários setores majoritariamente de esquerda cuja liderança era exercida pela Unidad Nacional. A Frente incluía também nas suas lideranças ex-deputados do MAS e ex-dirigentes da CONAMAQ. O MSM seguiu também como força opositora de esquerda ao MAS, com seu viés intelectual e uma forte influência em La Paz, maior município do país. Contudo, o MSM tinha uma projeção nacional limitada. Em 2013 foi também criado o Partido de los Trabajadores de Bolívia (PT) que objetivou converter-se no braço político da COB, mas a aproximação entre a cúpula do sindicato e o governo colocou-o na sombra (MENDOZA-BOTELHO, 2014). Do outro lado, na oposição à direita do MAS encontrava-se a Convergencia Nacional (PPB-CN), um remanescente do PODEMOS que embora mantivesse vários deputados, não tinha uma liderança clara. Próximo à PPB-CN encontrava-se o Movimiento Social Democrata (MSD).

Nas eleições presidenciais de 2014 competiram o MAS, a UD, o MSM, o PDC33 (Partido Demócrata Cristiano) e o PVB34 (fundado em 2007). O MAS venceu com 61% dos votos, com Doria Medina da UD no segundo lugar (24%), em uma distância maior do que previam as pesquisas eleitorais (Gráfico 1). O MAS continuou como o partido nacional dominante, com vitória no parlamento (maioria nas duas casas), mas com perdas e ganhos nas diversas regiões.

33 O PDC foi fundado em 1954 (segundo partido mais antigo do país, depois do MNR). Não apresentava candidato

próprio desde 1985 e, durante sua existência esteve apoiando os partidos na democracia pactada. É um partido de centro, de oposição ao MAS.

34 O PVB construiu uma aliança entre CONAMAQ, o Colectivo Manifiesto de la Ciudad de Cochabamba, a

agrupação política do TIPNIS e a Confederación de Pueblos Indígenas de Bolivia para concorrer às eleições de 2014 de forma independe do MAS e de outros partidos.

Entre as eleições de 2005 e 2009 o MAS aumentou sua proporção de votos em todos Departamentos, o que se tornou mais significativo na região da media luna35, onde tinha maior oposição (Gráfico 2). Nas eleições de 2014 a maior perda de votos ocorreu em La Paz, Oruro e Potosi, onde tradicionalmente sua votação foi mais alta. A hipótese para o crescimento da votação na media luna é que a polarização regional está diminuindo, em parte por causa do esforço do MAS em recrutar candidatos da região e conquistar seus eleitores.

Gráfico 2 – Proporção de votos do MAS nas eleições presidenciais de 2005, 2009 e 2014, por Departamento da Bolívia.

Fonte: elaboração própria a partir de dados do Tribunal Supremo Eleitoral disponíveis em http://www.oep.org.bo/index.php/procesos-electorales/elecciones-generales-2014.

Por sua vez, a oposição ao governo na região da media luna diminuiu principalmente após a resolução dos conflitos no processo constituinte e as conquistas dos Departamentos em relação às autonomias, com a Ley de Autonomias y Descentralización de 2010. Em relação à oposição, a UD emergiu como o maior bloco, em segundo lugar em todos os departamentos bolivianos. A UD derrotou candidatos uninominais nos departamentos e venceu a única disputa ocorrida para a cadeira reservada aos indígenas, em Potosi. O MSM teve bons resultados nos municípios, alcançando o segundo maior número de eleitos. Contudo, o fato de não ter alcançado 3% dos votos na eleição presidencial fez com que perdesse seu registro legal como partido (CENTELLAS, 2015).

35 A media luna é a denominação informal da região localizada a leste do país. Uma de suas características

marcantes é o fato de sua população não ser majoritariamente indígena, ao contrário do restante dos departamentos bolivianos. Tem uma grande importância política e econômica no país. Os Departamentos que a compõem são Pando, Beni, Santa Cruz e Tarija.

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 2005 2009 2014

Como vemos da análise das eleições presidenciais na Bolívia a partir de 1985, o sistema partidário do país teve seu formato alterado, com uma drástica diminuição da presença dos partidos tradicionais no cenário político – ADN, MNR e MIR – e novos partidos surgindo. Essa alteração no sistema partidário pode ser analisada por sua volatilidade, ou seja, a rotatividade