• Nenhum resultado encontrado

Qual é a fonte da redenção para Rousseau?

No documento nancy-pearcey-verdade-absoluta.pdf (páginas 106-108)

ESPIRITUALMENTE ESTÉRIL

P: Qual é a fonte da redenção para Rousseau?

R: O Estado.

A idéia de que o Estado pudesse ser libertador era de todo inédita. Na experiência real, claro que o Estado é um lócus de poder, autoridade e coerção. Ninguém jamais havia sugerido que poderia ser um libertador. Certo teorista político cristão diz que Rousseau gerou "as políticas de redenção"."

Os historiadores falam que o século XX foi o mais sangrento de todos, mas o problema não é que grande número de pessoas subitamente sofreu alguma degeneração moral misteriosa. O problema é que as pessoas adotaram cosmovisões baseadas em definições equivocadas da criação, queda e redenção.34

Talvez seja paradoxal que uma filosofia de individualismo radical desemboque em estatismo radical. Mas como Hannah Arendt ressalta em Origens do Totalitarismo, indivíduos isolados e sem ligações são os mais vulneráveis a controle totalitário, porque não têm identidade ou lealdade concorrente.35 É por isso que uma das melhores maneiras de proteger os direitos individuais é proteger os direitos de grupos como famílias, igrejas, escolas, negócios e associações voluntárias. Classes sociais fortes e independentes na verdade ajudam a limitar o Estado, porque cada uma reivindica sua própria esfera de responsabilidade e jurisdição, desta forma obstando que o Estado controle cada aspecto da vida. A filosofia política neocalvinista descreve a independência das esferas sociais usando o termo soberania de esfera, que significa o direito de cada uma ter sua própria jurisdição limitada em oposição às outras esferas.36 O pensamento social católico usa o termo

subsidiaridade para expressar quase a mesma idéia. Ao contrário de Rousseau, proteger os

laços morais, sociais e de parentesco na verdade protege a liberdade individual.

Infelizmente, a maioria do pensamento americano político, tanto liberal quanto conservador, continua baseando-se na visão atomística de que a sociedade é composta de indivíduos autônomos. Esta é a suposição inconsciente que os estudantes levam para a sala de aula hoje, diz um professor cristão:"Sem nunca terem lido uma palavra sequer de Locke, eles conseguem reproduzir sem titubear a noção de contrato social no mundo".37

Em minha opinião, a suposição de individualismo autônomo é um fator central no desarranjo da sociedade americana de hoje. Considere a política pública: Em Democracy's

Discontent (Descontentamento da Democracia), Michael Sandel afirma que a crença

subjacente no liberalismo moderno é o conceito do "eu desimpedido", com o que ele quer dizer "desimpedido de laços morais ou cívicos que não escolheram".38 No liberalismo, o indivíduo existe antes de associar-se em comunidades morais como casamento, família, igreja e política. O "eu" é até anterior a qualquer definição de sua própria natureza. Assim, para o liberalismo, o cerne de nossa personalidade é a habilidade de escolher nossa própria identidade — de criar a nós mesmos. E por isso que as relações e responsabilidades são consideradas separadas, e até contraditórias, de nossa identidade essencial, pois os indivíduos sentem que precisam se libertar dos seus papéis sociais (como marido, esposa ou

pai) para encontrar o seu "verdadeiro eu". 9 E Rousseau trazido de volta.

Ou consideremos a filosofia legal: Em Rights Talk (Conversa sobre Direitos), MaryAnn Glendon afirma que é típico a lei americana hodierna descrever a pessoa humana "natural" como indivíduo solitário. A lei americana está "baseada na imagem de que o portador de direitos é indivíduo auto-determinado e desimpedido, um ser ligado aos outros só por escolha".40 Em outras palavras, as relações não são constituintes de nossa identidade, mas são criações de escolha individual — um eco direto da teoria de estado da natureza de Rousseau.

Por fim, a filosofia política: Em Modem Liberty and Its Discontents (Liberdade Moderna e seus Descontentamentos), Pierre Manent diz que a doutrina básica do liberalismo é que nenhum indivíduo pode ter uma obrigação com a qual não tenha concordado. Todas as relações humanas tem de ser dissolvidas e depois reconstituídas com base na escolha, ou seja, por contratos. "Pelos contratos que ele faz com seus semelhantes, cada indivíduo é o autor de todas as suas obrigações."4' Agora entendemos por que Ted Peters quis dissolver a base biológica da família para reconstituí-la com base tão-somente na escolha.

Idéias como estas não permanecem puramente abstratas e acadêmicas. Elas passam dos professores para os estudantes, que podem pô-las em prática. Por exemplo, com o casamento reduzido à simples escolha, muito estudantes estão pensando duas vezes antes de dizer "aceito", ou que n|0 é negócio abrir mão de sua autonomia. Certo estudo do Projeto Nacional de Casamento, entidade americana da Universidade Rutgers, demonstrou que os jovens americanos de hoje vêem o casamento "como forma de exposição e risco econômico, em grande parte devido à prevalência do divórcio".Trata-se do fruto mortal da visão atomística da sociedade. Em vez de ser respeitado como bem social, o casamento é temido como risco econômico."A cultura dos solteiros não é orientada ao casamento", diz o estudo. "É mais bem descrita por cultura de baixo compromisso, com 'sexo sem restrições e relacionamento sem anéis'."42 É óbvio que o individualismo ontológico de Hobbes, Locke e Rousseau permanece no âmago da crise social e política dos Estados Unidos. (Para mais informações sobre este assunto, ver Apêndice 1.)

A Religião Sexual de Sanger

Tendo tocado no assunto de "sexo sem restrições", apliquemos uma análise de cosmovisão a algumas questões sociais em voga atualmente. A divisão esquerda/direita na política americana costumava girar em torno de questões econômicas, como a distribuição de renda. Mas hoje, a divisão tende a ser sobre questões sexuais e de reprodução: aborto, direitos homossexuais, divórcio sem culpa, a definição da família, experimentação fetal, pesquisa com células-tronco, clonagem, educação sexual, pornografia.

Há poucos anos, The Boston Globe publicou um artigo relatando que os universitários americanos têm mais uma maneira de colar grau — assistir a filmes pornográficos. Muitas faculdades oferecem cursos nos quais os estudantes analisam pornografia explícita. Como dever de casa, os estudantes têm até de fazer seus próprios filmes explícitos para mostrá-los em sala de aula. E a nova tendência chamada "estudos sobre pornografia".

Como foi que os estudantes americanos deixaram de estudar Homero e passaram a estudar pornochanchada? A resposta é que a liberação sexual tornou-se nada menos que uma ideologia desenvolvida, com todos os elementos de uma cosmovisão.

Preste atenção a alguns dos arquitetos da revolução sexual, como Margaret Sanger, fundadora da Paternidade Planejada. Sanger foi uma das primeiras defensoras do controle de natalidade, mas nem todos sabem que ela também escreveu vários livros que apresentam

uma cosmovisão completa. Sanger era darwinista dedicada, promotora do darwinismo social

e da eugenia, que estavam muito em voga em princípios do século XX. Sua meta era construir uma abordagem "científica" para a sexualidade fundamentada substancialmente no darwinismo.

Sanger retratou o drama da história como luta para livrar o corpo e a mente dos constrangimentos da moralidade, o que denominou a "moralidade cruel da abnegação e do pecado". Ela chegou a elogiar a liberação sexual como "o único método" para encontrar "a paz interior, a segurança e a beleza". Até a ofereceu como meio de vencer as mazelas sociais: "Acabem com os constrangimentos e proibições que impedem a liberação de energias internas [seu eufemismo para referir-se a impulsos sexuais], [e] a maioria dos grandes males da sociedade se extinguira".44

Sanger ofereceu esta promessa messiânica arrebatadora: "Pelo sexo, a humanidade atingirá a grande iluminação espiritual que transformará o mundo, e iluminará o único caminho para um paraíso terreno".45

Claro que esta é perspectiva religiosa, se é que chegou a ser. Analisemos pela grade de três partes:

CRIAÇÃO

No documento nancy-pearcey-verdade-absoluta.pdf (páginas 106-108)