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qualquer coisa que castiga; castigo, pena, punição Ex.: seria esta doença uma v por suas crueldades

Esquema 2: Semântico – atemporal

2 qualquer coisa que castiga; castigo, pena, punição Ex.: seria esta doença uma v por suas crueldades

Sinônimos / Variantes:

desforço, desforra, desforro, despique, represália, retaliação, revindita, saldo, vendeta, vindita; (cog.) vingação

Note-se que aquele que sente raiva do outro não irá necessariamente prejudicar esse outro ou causar-lhe algum dano; sendo assim, podemos pressupor que a raiva é um sentimento susceptível de autocontrole e isto quer dizer que o sujeito que sente raiva pode ser uma pessoa equilibrada e comedida.

Não podemos afirmar o mesmo daquele que se deixa dominar pela ira, pois, estando ira e vingança no mesmo campo semântico, necessariamente estará presente o descontrole emocional, descontrole esse tão intenso que chega a lesar o outro; no contexto que estamos analisando, esse “outro” são os egípcios, que serão efetivamente lesados pela ira divina. Temos, portanto, por associação de campos semânticos, mais um “atributo” com que brindar Deus, qual seja o de “desequilibrado” e ressalte-se que os próximos três verbetes coroam o descontrole emocional divino, afinal, o que pode ser mais danoso para o outro que matá-lo, destruí-lo e acabar com os seus sonhos e as suas esperanças? Uma vez mais, ao referirem-se aos atos divinos, as escolhas lexicais do padre vão esculpindo nas entrelinhas uma imagem surrealista de Deus.

Em um tal contexto, falar, por exemplo, de “perdão” chega a ser uma heresia. Recordemos as palavras da Bíblia:

Felizes os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. (S. MATEUS, cap. 5, v. 7) (BÍBLIA de Jerusalém, 2003, p. 1710).

Pois, se perdoardes aos homens os seus delitos, também vosso Pai celeste vos perdoará; mas se não perdoardes aos homens, vosso Pai também não perdoará vossos delitos. (S. MATEUS, cap. 6, v. 14 -15) (BÍBLIA de Jerusalém, 2003, p. 1714).

Se contra o teu irmão pecar, vai corrigi-lo a sós. Se ele te ouvir, ganhaste o teu irmão. – Então Pedro chegando-se a ele, perguntou-lhe: “Senhor, quantas vezes devo perdoar ao irmão que pecar contra mim? Até sete vezes?” Jesus respondeu-lhe: “Não te digo até sete, mas até setenta vezes sete.” (S. MATEUS, cap. 18, v. 15, 21-22) (BÍBLIA de Jerusalém, 2003, p. 1737).

Sabemos que as Sagradas Escrituras expressam-se predominantemente por meio de alegorias, de modo que perdoar “setenta vezes sete vezes” é uma fala que não pode ser interpretada literalmente, até porque ninguém vai se dar o trabalho de contar o número de perdões que irá ofertar a outrem até chegar ao número quatrocentos e noventa. Contudo, suponhamos a hipótese absurda de

que uma determinada pessoa tenha resolvido fazer esse cálculo; convenhamos que, pior do que fazer a conta, é pressupor que uma única pessoa tenha conseguido, sozinha, cometer quatrocentos e noventa erros com outra, sendo essa outra não dez ou vinte pessoas diferentes, mas a mesma pessoa; tal hipótese chega a ser surrealista, além de desconsiderar completamente a simples idéia de que um homem é capaz de aprender com seus próprios erros sem precisar chegar a cometer com a mesma pessoa um número de erros que se opõe à razão e ao bom senso.

Naturalmente que, ao dizer que uma pessoa deve perdoar ao seu irmão “setenta vezes sete vezes”, Jesus quis com isso nos mostrar que o perdão deve ser infinito; entretanto, o perdão de um homem para seu irmão é condição para que esse mesmo homem seja brindado com o perdão do Pai para seus erros (cf. “o paradoxo do perdão”, p. 200-202).

Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço. O Filho fala a voz do Pai, mas o próprio Pai não segue os ensinamentos que transmitiu ao Filho, afinal, Deus, lembremo-nos, dissimula a sua ira para poder vingar-se do povo egípcio. Nesse caso, então, Deus não perdoou aos egípcios, ao contrário, pois, além de não ter perdoado, ainda cultivou Sua vingança secreta por meio da dissimulação. E se o próprio Deus não “dá” o exemplo, como crer em Suas palavras? Levar a análise por esse caminho nos conduz a interpretações que não são condizentes com a realidade; contudo, é o que se pode depreender do discurso de Vieira, cujas palavras esculpem nas entrelinhas uma imagem de Deus verdadeiramente degradante e indigna.

Segue que, se Deus não segue os próprios ensinamentos, julgamos lógico afirmar novamente que Ele tem “dois pesos e duas medidas”, pois ensina a perdoar, mas não perdoa; ensina a ser misericordioso, mas não tem misericórdia; diante disso, também seria lógico afirmar que Deus “mente”, já que Suas palavras sem o exemplo que dignifica não passam de palavras vãs e mentirosas; mais uma vez aqui a roda argumentativa revela-se, pois, já vimos anteriormente, um Deus justo e bom não pode ter “dois pesos e duas medidas” e tampouco ser “mentiroso”.

Apreciaremos agora os verbos matar, destruir e acabar nesse contexto; antes, porém, observemos o que nos dizem as Sagradas Escrituras:

Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas. Não vim revogá-los, mas dar- lhes pleno cumprimento, porque em verdade vos digo que, até que passem o céu e a terra, não será omitido nem um só i, uma só vírgula da Lei, sem que tudo seja realizado. (S. MATEUS, cap. 5, v. 17-18) (BÍBLIA de Jerusalém, 2003, p. 1711).

Não julgueis que vim abolir a lei ou os profetas. Não vim para os abolir, mas sim para levá-los à perfeição. Pois em verdade vos digo: passará o céu e a terra, antes que desapareça um jota, um traço da lei.(S. MATEUS, cap. 5, v. 17-18) († CASTRO, Frei João José Pedreira de; O. F. M. †, 2002, p. 1288).

Convém ainda recordarmos os Dez Mandamentos de Deus:

I. (...) Eu sou Iahweh teu Deus que te fez sair da terra do Egito, da casa da escravidão. Não terás outros deuses diante de mim. Não farás para ti imagem esculpida de nada que se assemelhe ao que existe lá em cima nos céus, ou embaixo na terra, ou nas águas que estão debaixo da terra. Não te prostrarás diante desses deuses e não os servirás, porque eu, Iahweh teu Deus, sou um Deus ciumento, que puno a iniqüidade dos pais sobre os filhos até a terceira e a quarta geração dos que me odeiam, mas que também ajo com amor até a milésima geração para com aqueles que me amam e guardam os meus mandamentos.

II. Não pronunciarás em falso o nome de Iahweh teu Deus, porque Iahweh não deixará impune aquele que pronunciar em falso o seu nome.

III. Lembra-te do dia do sábado para santificá-lo. (...).

IV. Honra teu pai e tua mãe, para que se prolonguem os teus dias na terra que Iahweh teu Deus te dá.

V. Não matarás.

VI. Não cometerás adultério.

VII. Não roubarás.

VIII. Não apresentarás um testemunho mentiroso contra o teu próximo.

IX. (...) Não cobiçarás a mulher de teu próximo. (...).

X. Não cobiçarás a casa do teu próximo (...), nem o seu escravo, nem a sua escrava, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem coisa alguma que pertença a teu próximo. (ÊXODO, cap. 20, v. 3-17, BÍBLIA de Jerusalém, 2003, p. 130- 131).

Os fariseus, ouvindo que ele fechara a boca dos saduceus, reuniram-se em grupo e um deles – a fim de pô-lo à prova – perguntou-lhe: – “Mestre, qual é o mandamento maior da lei?” Ele respondeu: Amarás o Senhor teu Deus de todo o

teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu espírito. Esse é o maior e o

primeiro mandamento. O segundo é semelhante a esse: Amarás o teu próximo

como a ti mesmo. Desses dois mandamentos dependem toda a Lei e os

Profetas. (S. MATEUS, cap. 22, v. 34-40) (BÍBLIA de Jerusalém, 2003, p. 1744).

Tudo aquilo, portanto, que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles, pois esta é a Lei e os Profetas. (Idem, cap. 7, v. 12, 2003, p. 1715)

Como quereis que os outros vos façam, fazei também a eles. (S. LUCAS, cap. 6, v. 31, 2003, p.1799).

“Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo”; estas palavras reúnem, sozinhas, os mandamentos anteriores (à exceção do terceiro, referente ao dia de sábado). É lógico afirmar que aquele que ama a Deus acima de todas as coisas não só não terá outros deuses como também não pronunciará o nome do Senhor em vão. Quanto aos demais mandamentos, aquele que ama o próximo como a si mesmo certamente que honrará não só o pai e a mãe, mas a humanidade inteira.

“Amar ao próximo como a si mesmo” implica tratar os homens do mesmo modo que queremos que eles nos tratem. Sendo assim, um homem não matará, não cometerá adultério nem roubará, pois não deseja que o matem ou matem alguém que ele ama; também não cometerá adultério, pois tal ato carreia dores pungentes para todos os envolvidos e esse homem não quer que um outro cometa adultério contra sua casa; esse homem tampouco roubará, pois não deseja que o roubem ou façam isso com alguém que lhe seja importante.

Aquele que só deseja para o outro o que quer para si próprio não presta falso testemunho contra o seu irmão, pois não deseja que este proceda desse mesmo modo para com ele; também não desejará a mulher do próximo, já que fazê-lo pode levá-lo a trilhar os caminhos tortuosos do adultério, e esse homem não quer que nenhum outro tenha pensamentos contrários ao decoro para com a sua mulher; finalmente, esse homem não cobiçará nada que seja do outro, pois o que é do outro não é seu, mas, como diz o próprio nome, do outro, e esse mesmo homem não desejará, em nenhuma hipótese, que o outro cobice aquilo que é seu;

portanto, podemos afirmar que os dois mandamentos de Jesus abarcam os demais (à exceção do terceiro), recebidos por Moisés.

Acrescente-se que, nas próprias palavras de Jesus, Ele não veio para revogar a lei, mas para cumpri-la; se veio para cumpri-la, é porque a reconhece como legítima, pois legítima é a fonte que a originou; tanto isto é verdade que, ao enunciar os dois mandamentos maiores, afirma que toda a lei [entenda-se a lei inteira, isto é, os Dez Mandamentos, embora o terceiro não pareça estar incluído aqui] e os profetas se acham contidos nesses dois mandamentos; como entender, então, que Deus possa querer matar, destruir, acabar com os egípcios se Ele próprio instituiu leis contrárias a qualquer tipo de ato menos digno?

Uma leitura mais atenta das Sagradas Escrituras revela-nos que as contradições dissimuladas nas palavras de Vieira estão presentes nos próprios Evangelhos, pois o mesmo evangelho [S. MATEUS] que afirma que devemos amar e perdoar incondicionalmente também assevera:

Parábola do devedor implacável – Eis porque o Reino dos Céus é semelhante a um rei que resolveu acertar contas com os seus servos. Ao começar o acerto, trouxeram-lhe um que devia dez mil talentos. Não tendo este com que pagar, o senhor ordenou que o vendessem, juntamente com a mulher e com os filhos e todos os seus bens, para o pagamento da dívida. O servo, porém, caiu aos seus pés e, prostrado, suplicava-lhe: ‘Dá-me um prazo e eu te pagarei tudo’.

Diante disso, o senhor, compadecendo-se do servo, soltou-o e perdoou-lhe a dívida. Mas, quando saiu dali, esse servo encontrou um dos seus companheiros de servidão, que lhe devia cem denários e, agarrando-o pelo pescoço, pôs-se a sufocá-lo e a insistir: ‘Paga-me o que me deves’. O companheiro, caindo a seus pés, rogava-lhe: ‘Dá-me um prazo e eu te pagarei’.

Mas ele não quis ouvi-lo; antes, retirou-se e mandou lançá-lo na prisão até que pagasse o que devia.

Entretanto, a atitude desse servidor não passou despercebida:

Vendo os companheiros de serviço o que acontecera, ficaram muito penalizados e, procurando o senhor, contaram-lhe todo o acontecido. Então o senhor mandou chamar aquele servo e lhe disse: ‘Servo mau, eu te perdoei toda a tua dívida, porque me rogaste. Não devias, também tu, ter compaixão do teu companheiro, como eu tive compaixão de ti?’ Assim, encolerizado, o seu senhor o entregou aos verdugos, até que pagasse toda a sua dívida.

Segundo S. Mateus, Deus nos tratará da mesma forma que o senhor tratou o mau servo:

Eis como meu Pai celeste agirá convosco, se cada um de vós não perdoar, de coração, ao seu irmão. (S. MATEUS, cap. 18, v. 23-35) (BÍBLIA de Jerusalém, 2003, p. 1737).

O último parágrafo do texto transcrito deveria ser um “fecho com chave de ouro”, afinal, trata-se da conclusão da história contada por Jesus e, assim como todas as outras, há um ensinamento a ser ministrado; todavia, a “chave de ouro”, a uma análise mais acurada, revela-se um engano; vejamos as palavras de Watzlawick, Beavin e Jackson (1967, p. 180):

(...) Exemplo 3: Talvez a mais freqüente forma em que o paradoxo intervém na pragmática da comunicação humana é através de uma injunção que exige um comportamento específico, que por sua própria natureza só pode ser espontâneo. O protótipo dessa mensagem é, portanto, “Seja espontâneo!” Qualquer pessoa que se defronte com essa intimação fica numa posição insustentável, visto que, para obedecer, teria de ser espontâneo dentro de um quadro de submissão, de não-espontaneidade. (...).

Para que um irmão perdoe ao outro do fundo do coração, é preciso que esse comportamento específico – o ato de perdoar – seja espontâneo! Todavia, a exigência do perdão vem acompanhada de uma ameaça explícita, qual seja a do modo como será tratado por Deus aquele que não perdoar; naturalmente que esse modo não será dos melhores, afinal, essas palavras coroam a atitude do senhor que mandou prender o servidor depois de tê-lo perdoado – o que é muito estranho, pois, segundo a mesma fonte – os Evangelhos Sagrados –, o senhor devia ter perdoado não só pela segunda vez, mas por mais quatrocentas e oitenta e oito vezes; contudo, ele não conseguiu sequer perdoar por uma simples segunda vez...

O exemplo que o evangelho de S. MATEUS utiliza para “ensinar” o perdão aos homens é exatamente o mesmo em que, confrontado pela segunda vez com o servo pecador, o senhor não consegue perdoar. Portanto, se o exemplo dado para um homem aprender a perdoar é não perdoar, podemos concluir que um homem