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A questão habitacional no Brasil

2. Habitação de Baixa Renda: situação e legislação recente

2.1. A questão habitacional no Brasil

Os principais movimentos populares organizados de nosso país, sob as palavras “Lutar, resistir, construir, morar”, ocuparam diversos terrenos, prédios públicos e privados, em São Paulo. Estas ocupações, em 2005, tinham o objetivo de alertar os governos federal, estaduais e municipais para o problema da moradia, e a necessidade premente de implementação de uma Política Nacional de Habitação.

Três anos depois não temos mais as ocupações. O que temos é a atualização de uma Política Habitacional de Habitação, que continua em estudos no Ministério das Cidades. Enquanto isto, o Governo Federal, de modo extemporâneo, vem aproveitando este vácuo. Colocou junto ao PAC - Plano de Aceleração do Crescimento- planos de reurbanização de favelas – como o exemplo apresentado em Abril de 2008, para o “Complexo do Alemão” no Rio de Janeiro, e a destinação de verbas, para o município de Santo André.

A professora Dra. Ermínia Maricato, em 2005, no seminário do Plano Diretor na FAU USP, exortou “A luta continua! Isto não se resolve com a racionalização do processo decisório, resolve-se com luta política.” A professora Raquel Rolnik, nesta mesma ocasião, falou: “Temos que instituir um pacto social, do diagnóstico até o fim, trazendo o debate para o setor excluído, através da capacitação dos mesmos, pela mobilização da cidade, pela pactuação e deliberação, para que o espaço seja legitimado pelo coletivo”.

Pergunta-se: considerando-se o efeito da segregação social, teria validade para as camadas de baixa renda? Ou esta questão deve ser resolvida nas camadas de baixa renda,

53 assim como Marx ditou, pela revolução: “necessitamos da intervenção”. Ou solução melhor, seria criar junto ao interessado a oportunidade de, junto com os organismos do Estado e organismos privados, resolver este problema? Como atacar esta questão?

O escritor inglês David Harvey que escreveu o livro “Condição Pós- Moderna” diz “Os ricos podem comandar o espaço, os pobres são prisioneiros dele”. Entendemos que os cidadãos que têm bens, administram como querem seu espaço, enquanto os pobres estão ali porque não têm para onde ir. Estão trancafiados, sem ter outra opção. E, realmente pergunta- se se devem ser retirados, mudados, promovidos deste seu local onde têm suas relações sociais, econômicas e de pátria.

Em notícia recente, o diretor do SECOVI12 imagina ser possível, estando à disposição os recursos de financiamento, que o pobre se coloque numa fila, peça o seu dinheiro financiado e aí vai construir a sua casa. O local, o mesmo em que ele mora, sem infra- estrutura nem saneamento? Viabilizar esta questão de forma digna, decente e sustentável, demonstra-se mais complexa do que parece.

De fato, o modelo de gestão pública vigente até o final da década de 70, estruturava-se em uma forte concentração dos processos decisórios e administrativos na esfera federal, conferindo peso insignificante às administrações locais, tanto na definição de políticas, quanto na gestão dos recursos públicos.

Com a democratização da sociedade brasileira, iniciada nos anos 80, teve início um crescente e generalizado processo de descentralização administrativa e municipalização das políticas públicas, impulsionado, sobretudo, pela promulgação da Constituição Federal de 1988, levando, teoricamente, às transformações e ao fortalecimento das instituições do governo local.

12 Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis Residenciais e Comerciais

54 A descentralização envolve, essencialmente, uma redistribuição de poder e de deslocamento de centros decisórios. Implica em aumentar a autonomia da decisão e dos controles dos recursos, as responsabilidades e as competências das coletividades, em detrimento do órgão do Estado Central. Rebeca Scherer, em 1996, concorda “Só tem sentido falar de descentralização quando ocorre uma efetiva atribuição de autoridade à unidade descentralizada, bem como autonomia jurídica e financeira que lhe permita operar com independência no âmbito do território físico a ele consignado”13.

Este movimento, em direção ao local, foi acompanhado, no Brasil, pela disseminação da agenda da reforma urbana, que procurou buscar novos padrões de gestão local democrática. Tal fato, combinado à descentralização fiscal e à redemocratização do país, tornou o município uma esfera que assume o papel mais importante dos sistemas nacionais de políticas urbanas.

Desde o ano de 2001, a lei conhecida como “Estatuto da Cidade” constitui, a ferramenta mais adequada de enfocar a cidade, a vivência urbana, onde as alternativas mais exponenciais, complexas e antagônicas precisam coexistir.

Na lei referida acima, encontramos a aplicação de técnicas, ferramentas e instrumentos de política urbana, como os planos diretores, os direitos jurídicos do cidadão, os princípios básicos do CIAM. No Manual de Implantação do Estatuto da Cidade há esta afirmação: “O município é responsável pelo planejamento, financiamento, gestão, execução e fiscalização das ações do desenvolvimento urbano, com apoio e ação subsidiária dos estados e da União.”

A não disponibilidade de terras é o grande entrave para a produção de Habitação de Interesse Social. Uma das soluções possíveis é formar um banco de terras. Mas, de que modo formar um estoque de terras, utilizando-se dos instrumentos previstos na Lei nº 10.257, de 10

13 SCHERER, Rebeca – “O Planejamento como Questão”, palestra anexada à memória técnica do seminário: “Instrumentos de Gestão Urbana”, São Paulo, FUSP-SEMPLA, março de 1996

55 de Julho de 2001, Estatuto da Cidade? Se desenharmos uma linha de tempo para o parcelamento, edificação ou utilização compulsória, IPTU progressivo no tempo e desapropriação com pagamento em títulos da dívida pública. E ainda com tempo para avisos, decisões, projetos, podendo ser necessários mais de 10 anos, para um imóvel que teve sua Utilidade Social reconhecida, estar disponível para uso público de construção. Quem garantirá a seqüência de observação destes planos, quando a cada quatro anos, processa-se a troca de governo? O governo que assume, revê prioridades, troca os planos, procurando a solução pontual. Há incompatibilidade deste modo de agir com a realização de planos de longo prazo. As soluções de montagens de estoque de terras, por exemplo, necessitam de parcelamento, notificação e consórcios imobiliários. Aqui a gestão deve ser contínua, com planos e ações operacionais para um espaço de seis a dez anos. Só então irão produzir resultados visíveis.

O governo federal e estadual deverá cobrar dos municípios, como condição para o repasse de investimentos, a racionalização, o controle do uso e da ocupação do solo, de modo a cumprir a função social da cidade e da propriedade prevista no Estatuto da Cidade. Em especial, no que diz respeito à inclusão territorial dos pobres na malha urbanizada - e tornar o desenvolvimento urbano mais econômico e menos especulativo, garantindo terra ou imóveis mais baratos.

2.2. A situação quantitativa da habitação de baixa renda