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CAPÍTULO 2 – PERSONALIZAÇÃO DA POLÍTICA

3.3 Questões Metodológicas

Como premissa inicial, procurou-se definir métodos que possibilitam a coleta de dados objetivos, que assegurassem uma análise clara dos dois perfis no Twitter, oferecendo uma

18 Disponível em: http://www.twimemachine.com/

19 API – Application Programming Interface (ou Interface de Programação de Aplicativos). É através do API do Twitter que outros aplicativos, como o TwimeMachin (que foi utilizado nessa pesquisa), acessam as informações de perfis e têm disponíveis dados como número de tweets, seguidores e hashtags, por exemplo.

abordagem real e resultados concretos. Procurou-se, primeiramente, conhecer recursos metodológicos já utilizados e sugeridos em outras pesquisas.

Contudo, ainda não há nos estudos sobre personalização da política com propostas metodológicas aplicáveis a pesquisas empíricas. Para classificação dos tweets, utilizou-se análise de conteúdo das mensagens na tentativa de dimensionar o teor do discurso ali publicado. A partir de uma análise preliminar dos perfis, já foi possível perceber que as temáticas abordadas pelos parlamentares são bem distintas, ainda que algumas temáticas, como mensagens sobre a vida privada, carreira política e corrupção, sejam recorrentes em todos os perfis a serem analisados.

Por se tratar de uma pesquisa de cunho qualitativo, escolheu-se a análise de conteúdo como metodologia de pesquisa pela necessidade de compreender as características e padrões que estão por trás das mensagens publicadas pelos deputados em seus perfis no Twitter. Segundo Bardin (2011), a análise de conteúdo auxilia nesse processo pois utiliza

um conjunto de técnicas de análise das comunicações visnado a obter, por prodecimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BARDIN, 2011, p. 47).

Esse tipo de análise também favorece a pesquisa no sentido de que se exige um esforço duplo do pesquisador: de compreender o sentido do conteúdo a ser analisado, colocando-se na posição de um receptor normal, e de procurar também outra significação, aplando o olhar a fim de perceber outras mensagens naquele enunciado (GODOY, 1995).

A análise de conteúdo dos tweets se deu através da adaptação do modelo de gestão de imagem de Pittman e Jones (1982) com adaptações de Schutz (1997) e Lilleker e Jackson (2011), visualizados na Tabela 3. Nessa metodologia, os autores dividem as mensagens com base em condutas adotadas pelo emissor da indormação. As condutas são: Bajulação, Autopromoção Suplicação, Exemplificação e Intimidação. Essas condutas norteariam a maneira como o emissor estaria fazendo a gestão da própria imagem a partir do que expõe ao público.

Schutz (1997) utilizou-se desse modelo para analisar 42 talk-shows na TV alemã. Tratavam-se de programas televisivos de entrevistas que convidavam políticos, especialistas e celebridades do showbiz. A autora encontrou nessa pesquisa, que os políticos analisados, estavam mais inclinados a utilizar condutas de Exemplificação e Autopromoção, e não

encontrou envidências de Suplicação ou Intimidação na fala desses agentes durante suas entrevistas.

Lilleker e Jackson (2011) são os primeiros que vão utilizar esse método de análise para estudar o uso do Twitter por agentes políticos. Esses autores perceberam que atentar para os mecanismos de gestão de imagem pode favorecer na explicação de que tipo de político está de apropriando do Twitter e qual a finalidade. Utiliza-se nesta pesquisa o mesmo modelo para perceber se há características de personalização da política através da comunicação online via Twitter. Acrescentou-se para essa pesquisa a conduta “Informação” tendo em vista que políticos têm uma tendência em compartilhar links de notícias de grandes e pequenos portais e sites informativos e a categoria “Outros” para designar os tweets que não se encaixavam em nenhuma das outras condutas. Esses tweets tornaram-se difíceis de classificar nas outras condutas, pois não era possível perceber uma opinião dos políticos, eles apenas divulgavam o link. A segunda folha de codificação se concentra na identificação da expressão de características pessoais (Tabela 3). Acrescentou-se a essa tabela a categoria de “promoção do partido” para analisar como o partido aparece nos perfis pessoais dos deputados.

Tabela 3 – Tipologia de Gestão de Imagem Conduta Características Indicadores

Bajulação Para parecer simpático Mencionar que tem ajudado as pessoas ou organizações

Fazer piadas

Responder ou concordar com outros usuários Autopromoção Para parecer competente Referindo-se a suas habilidades

Referindo-se a realizações pessoais

Referindo-se a qualificações ou posições detidas no campo político

Suplicação Para ser visto como necessitado

Solicitação de ajuda por causa da falta de habilidades ou conhecimento

Destacando suas próprias falhas Exemplificação Ações para aparecer

exemplar e digno

Alegando atributos dignos Alegando valores morais Intimidação Para aparecer perigoso

ou ameaçador

Expressões de poder Sugerindo ações punitivas Informação Para parecer informado Linkar notícias de seu interesse Outros

Fonte: Adaptado de Lilleker e Jackson (2011)

A classificação dos tweets de ambos os deputados foi feita com base na tabela acima. Procurou-se perceber, através da análise do conteúdo das mensagens, em que conduta e em que indicador cada mensagem seria enquadrada. Foram categorizados, com base nos

indicadores, todos os tweets de ambos os deputados nos meses de setembro, outubro e novembro de 2013. Nos casos em que o deputado deu um retweet na mensagem de outro usuário, essas publicações foram enquadradas no indicador “Responder ou concordar com outros usuários”, tendo em vista que, ao retuítar, o parlamentar está de acordo com aquela mensagem ou faz uma resposta direta ao autor daquele tweet.

Vale ressaltar que, pelo fato da análise ter sido realizada por apenas um pesquisador, reconhece-se as fragilidades de uma classificação cair em uma certa dose de subjetividade, o que, em certa medida, mostra-se inviável em uma pesquisa qualitativa. Para evitar isso, a análise dos tweets foi feita em dois momentos. A primeira foi realizada após o fim da coleta do material através do TwimeMachin, em setembro de 2014. A segunda análise foi feita no momento de produção do texto final para o capítulo de análise, em dezembro de 2014. Fez-se o confrontamento das duas versões e e reavaliou-se os tweets que obtiveram classificações diferentes. Quando ouve dúvida em relação a que conduta ou indicador o tweet pertencia, optou-se por consedirar o maior ênfase da mensagem que melhor se encaixava em um indicador específico. A análise final, com a categorização na íntegra das mensagens, pode ser conferida nos anexos A e B desta disseratação.

A seguir, descreve-se cada um dos indicadores utilizados na análise dos tweets de Marco Feliciano e Jean Wyllys. Para deixar mais clara a forma de categorização dos tweets, após a explicação de cada indicador, há um exemplo para ilustrar como a categoria se manifesta em um tweet.

a) A primeira conduta, Bajulação, possui três indicadores. No indicador “Mencionar que tem ajudado pessoas e organizações” traz tweets com realizações dos deputados que já foram concluídas e que, de alguma forma, ajudou no bem-estar de pessoas ou no desenvolvimento de organizações.

Exemplo: RT @ascomjeanwyllys: Parecer de @jeanwyllys_real sobre regras para exibição de áudio e vídeo em ônibus interestaduais é aprovado na CCult h…

Jean Wyllys (@jeanwyllys_real) – 24 de setembro de 2013

“Fazer piadas” são mensagens que mostram o senso de humor dos parlamentares, seja na hora de responder críticas feitas por outros usuários ou apenas para descontrair.

Exemplo: ahahaha Amo trollar esses linchadores virtuais estúpidos que não suportam que questionemos suas “certezas” sobre política e “mensalão” ahaha

Jean Wyllys (@jeanwyllys_real) – 16 de novembro de 2013

“Responder ou concordar com outros usuários” mostra mensagens em que os deputados respondem algum questionamento de outro usuário ou concordam com um tweet de outro perfil.

Exemplo: @willgomes @repimlins Eu concordo contigo que certos "protestos" são contraproducentes. Só pedi que não minimize o papel do dep. na prisão.

Jean Wyllys (@jeanwyllys_real) – 17 de setembro de 2013

b) A segunda conduta, Autopromoção, divide-se em três indicadores. No indicador “Referindo-se a suas habilidades” estão as mensagens que se aludem a atributos e habilidades pessoais dos parlamentares, que os apresentam com capacidade para exercer seu trabalho. Exemplo: #Assessoria Uma Multidão aguardando o profeta @marcofeliciano como uma poderosa palavra de Deus http://t.co/EERMrjphti

Marco Feliciano (@marcofeliciano) – 08 de setembro de 2013

“Referindo-se a relações pessoais” estão os tweets que dizem respeito à vida pessoal do parlamentar, atuações fora da Câmara dos Deputados. São mensagens sobre o cotidiano do parlamentar fora do campo da política.

Exemplo: Encerrei agora a participação na Expo Money e já estou a postos para assistir o #TheVoiceBrasil recreio!

Jean Wyllys (@jeanwyllys_real) – 15 de novembro de 2013

“Referindo-se a qualificações e posições de tidas no campo político” são os tweets que se referem atuação dos deputados no exercício do parlamento e na participação das decisões políticas. São posicionamentos e o cotidiano na Câmara dos Deputados.

Exemplo: Reunião da CDHM, Frente Evangélica e Sen Magno Malta com o Ministro Marco Aurélio http://t.co/0fjOZUC3bL

Marco Feliciano (@marcofeliciano) – 02 de novembro de 2013

c) A terceira conduta, Suplicação, traz mais dois indicadores. No indicador “Solicitação de ajuda pela falta de habilidades ou conhecimento” estão categorizados os tweets onde os deputados pedem o auxílio de outros usuários do Twitter, seja para divulgação de uma campanha ou dúvidas sobre o funcionamento do microblog.

Exemplo: Vamos colaborar, galera! A causa é nobre, as artistas merecem e a cultura alternativa e o cinema indep. agradecem http://t.co/W9bxMwScb2

Jean Wyllys (@jeanwyllys_real) – 17 de setembro de 2013

“Destacando suas próprias falhas” indica mensagens onde os parlamentares comentariam sobre erros cometidos e posturas equivocadas, mostrando que, como ser humano, também pode cometer deslizes. Não houve exemplos dessa conduta durante o período de análise.

d) A quarta conduta, Exemplificação, traz dois indicadores. “Alegando atributos dignos” trazem mensagens onde os deputados enaltecem aspectos de suas próprias dignidades, oferendo uma imagem deles como “pessoas de bem”, como uma pessoa exemplar. Exemplo: E qto + me xingam c palavrões, ameaçam, + me convenço de que estou no caminho certo! Tem algum servo do Altíssimo q pode dar Glória a Deus?

Marco Feliciano (@marcofeliciano) – 03 de outubro de 2013

O indicador “Alegando valores morais” diz respeito aos tweets de conteúdo que orientam os outros usuários a seguir uma conduta que, segundo o parlamentar, está dentro dos padrões sociais de bom comportamento.

Exemplo: Provérbios 22:6 - Educa a criança no caminho em que deve andar; e até quando envelhecer não se desviará dele.

e) A quinta conduta Intimidação, possui dois indicadores. “Expressão de poder” traz os tweets em que os deputados se mostram numa posição superior aos outros usuários do Twitter, no que tange ao processo de decisão política.

Exemplo: 14. Vamos tomar providências legais e cabíveis contra essa violência! Estenderei isso à esfera nacional e às comissões de Educação ...

Marco Feliciano (@marcofeliciano) – 30 de setembro de 2013

O indicador “Sugerindo ações punitivas” traz mensagens em que os parlamentares clamam por punições a ações que vão de encontro com seus ideais e que merecem receber medidas repressivas jurídicas e/ou sociais.

Exemplo: O descaso do governo brasileiro para com o caso do Sen Boliviano Roger Molina ñ pode ser tolerado. http://t.co/E7WsuYkgvp

Marco Feliciano (@marcofeliciano) – 16 de outubro de 2013

f) Por fim, a conduta Informação traz um único indicador. O indicador “Linkar notícias de seu interesse” é autoexplicativo, tratam-se de tweets que “linkam” para outras páginas da Web, ou seja, tratam-se de conteúdos externos ao Twitter.

Exemplo: Conf. Livre de Educação e Cultura LGBT acontece hoje na UnB. Confira a programação! http://t.co/A7f0J2v0yB (ASCOM) http://t.co/pkwQjcszyh

Jean Wyllys (@jeanwyllys_real) – 01 de outubro de 2013

Em “Outros” foram separados os tweets que não se encaixavam em nenhuma das outras categorias. Alguns tratavam de dificuldades técnicas em outras redes online ou divulgavam perfis para serem seguidos.

Exemplo: Por algum problema com nosso canal do Youtube, nossos vídeos estão fora do ar. Estamos correndo para resolver! (ASCOM)

A utilização de tais indicadores, apesar de não serem específicos para realizar uma análise de personalização da política, ajuda a mensurar que aspectos da personalidade dos agentes políticos estão sendo destacados através da comunicação política online com os cidadãos via Twitter.

Com base em estudos anteriores (HEAL e PISKORSKI, 2009; LILLEKER e JACKSON, 2011), já se esperava que a conduta de “Autopromoção” ganhasse destaque durante análise dos tweets dos dois parlamentares escolhidos para essa pesquisa. Logo, viu-se necessário fazer outra medição dessa autopromoção a fim de verificar que fatores de autopromoção estão sendo empregados pelos deputados via Twitter (Tabela 3). A análise dos tweets vai ser feita com base nas condutas e indicadores da Tabela 3, mas as evidências de autopromoção ajudarão a perceber como essa conduta em especial é percebida nos perfis dos parlamentares e tirar conclusões sobre a personalização da figura dos políticos através das mensagens no Twitter.

Tabela 4 – Evidências de Autopromoção

Categoria Medição

Detalhe da vida pessoal (família e atividades cotidianas de natureza não- política)

Sim/Não Identifica os interesses pessoais, tais como esportes, música, filme ou

lazer

Sim/Não

Exibe senso de humor Sim/Não

Promoção do partido Sim/Não

Fonte: Lilleker e Jackson (2011)

Por tratar-se de uma ferramenta de comunicação direta, também analisam-se as interações estabelecidas através do Twitter. Por “interação”, Rafaeli (1988, p.111) define como “uma expressão de qual nível, num encadeamento de trocas comunicacionais, uma terceira – ou posterior – transmissão (ou mensagem) está relacionado com o grau de ligação entre troca de mensagens (ou transmissões) que lhe são prévias”. Para discussão das interações em ambientes digitais como o Twitter, procurou-se analisar as interações do eu com a coletividade através dos perfis na rede social (PRIMO, 2007). Tendo em vista que essa definição de interação oferecidas pro Rafaeli e Primo são muito amplas e qualquer publicação no tweet pode ser encarada como interação, já que é um meio de transmissão da mensagem para uma coletividade. Mais precisamente, dá-se ênfase às interações em que há um feedback por parte dos outros usuários aos quais o político faz contato.

Escolheu-se essa metodologia por conta da proximidade entre a análise de gestão de imagem e o fenômeno da personalização da política. Fatores como a diferenciação entre categorias que teriam aspectos mais voltados para a atuação parlamentar e outras para detalhes da vida pessoal, ajudam a compreender a centralização da figura do agente político na forma de se comunicar através do Twitter.

Sabe-se que outras pesquisas utilizam diferentes métodos para se analisar tweets (MARQUES e SAMPAIO, 2013; MARQUES et al., 2013; CERVI e MACHUSSIN, 2013). Porém, para esse estudo específico, viu-se a necessidade de uma categorização dos tweets mais voltada para gestão de imagem dos parlamentares, pois realizar uma classificação temática das mensagens não ajudaria na percepção de uma comunicação que caracterizasse uma personalização da política.

Faz-se também um estudo detalhado sobre os retweets e as menções a outros usuários, onde estão as mensagens com conversas do parlamentar com outros usuários do Twitter (o fato de ser um retweet não assegura que o deputado está respondendo ou concordando com o outro usuário. Por isso, opta-se por caracterizá-los como interação direta e, muitas vezes, individualizada com outro usuário da Rede de microblog, preferindo-se, aqui, analisá-los de forma diferenciada a fim de perceber o caráter dessas interações e quantificá-las). Uma leitura prévia do material mostrou que os deputados analisados utilizam o retweetpara expor mensagens postadas por outros usuários, mas que o político achou adequada para os seus seguidores por vários motivos, como por serem interessantes, inteligentes ou simplesmente engraçadas.

A seguir, são apresentados os dois deputados que são objeto dessa pesquisa, os deputados Marco Feliciano e Jean Wyllys. Primeiro, apresenta-se uma breve biografia do parlamentar. Seguido por uma contextualização política e tecnológica de ambos os deputados e suas relações com os media digitais.