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R ELAÇÃO RETÓRICA DE INTERJEIÇÃO VOLITIVA (RRIV )

O BA ! RELAÇÃO RETÓRICA DE INTERJEIÇÃO

5.1 R ELAÇÃO RETÓRICA DE INTERJEIÇÃO (RRI) E SEUS SUBTIPOS

5.1.3 R ELAÇÃO RETÓRICA DE INTERJEIÇÃO VOLITIVA (RRIV )

Soma-se às contribuições de Wierzbicka (1991), Rebello (2002), Caixeta (2005) e demais autores citados nos capítulos anteriores esta definição de Ferreira (1986, p. 1788): “volição. [Do lat. escolástico volitione, calcado em vol, raiz do lat. volo, ‘querer’.] S. f. Ato pelo qual a vontade se determina a alguma coisa. [...]”. O componente que subjaz às interjeições volitivos é Eu (não) quero algo.

(47) Doc. eu não sei a pre/ [

Inf. agora o:: o:: eu não sei bem porque que chamavam colonos... mas os empregados aqui em Campinas eles eram quase todos... descendentes de... colonos italianos...

Doc. sim

Inf. todos de... mesmo:: nomes italianos... sotaque de italiano... e:... até com termos italianos também

Doc. Agora não não sei se o senhor poderia... se lembrar... -- tomara que se lembre -- ahn::... a terra como é que era preparada?... manualmente ou ou... com algum instrumental... ou... mecanicamente? (CE11).

QUADRO 23: Restrições e argumentos para definição de RRIV — enunciado interjetivo tomara

RESTRIÇÕES E ARGUMENTOS PARA DEFINIÇÃO DE RRIV— tomara

RESTRIÇÕES

SOBRE N

Porção N Agora não não sei se o senhor poderia... se lembrar... [...] ahn::... a terra como é que era preparada?... manualmente ou ou... com algum instrumental... ou... mecanicamente?

Caracterização A possibilidade de Inf. não se lembrar do modo como a terra era preparada, manual ou mecanicamente, desencadeia em Doc. uma reação emotiva.

RESTRIÇÕES

SOBRE S

Porção S O enunciado interjetivo tomara

Caracterização

O enunciado interjetivo tomara apresenta: 1) comportamento parentético;

2) autonomia comunicativa por caracterizar-se como uma unidade informacional completa;

3) significado específico: desejo

RESTRIÇÕES

SOBRE N + S

Estado mental Eu quero saber qual o modo como a terra era preparada.

Julgamento complexo

Eu quero saber qual o modo como a terra era preparada, manual ou mecanicamente, mas você pode ter se esquecido. Eu espero que você se lembre e me diga.

EFEITO Ato social

performatizado

Desejar que o Inf. se lembre do modo como a terra era preparada.

ARGUMENTOS

1) O observador considera plausível que Doc. considere plausível que Inf. perceba a reação emotiva de desejo de que Inf. se lembre do modo como a terra era preparada.

2) O observador considera plausível que Doc. considere plausível que a sua reação emotiva de desejo desperte em Inf. um esforço para que lembre do modo como a terra era preparada. 3) O observador considera plausível que a reação emotiva de desejo desperte no Inf. uma avaliação sobre o modo como Doc. se posiciona na construção do diálogo.

4) O observador considera plausível que L ou O considerem que a ausência de S não altera o conteúdo informativo do questionamento feito por Doc.

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(Continuação do Quadro 23):

5) O observador considera plausível que L ou O considerem que, por meio de S, Doc. constrói uma face de bom ouvinte que contribui com a coconstrução do diálogo.

6) O observador considera plausível que Doc, por meio de S, revele, emotivamente e de modo experiencial, o desejo de que o Inf. se lembre do modo como a terra era preparada, manual ou mecanicamente.

Veja-se este texto para análise:

(48) Quero políticos ótimos, interessados no bem de seus eleitores, quando forem eleitos, pois muitos conseguem seu lugar sem um voto sequer, por artes de regras bizarras que tanta coisa regem no Brasil. Quero os melhores policiais, bem preparados, bem armados, psicologicamente bem orientados, e apoiados pela sociedade e pela Justiça, para poderem cumprir o seu dever. Mas na medicina, ah, na medicina, é que eu quero os melhores profissionais: depois do árduo curso de seis anos, mais uma residência de dois, eventualmente mais especialização, e mestrado, e quem sabe doutorado, para saberem mais e cuidarem melhor de nós, seus pacientes. Mas que sejam valorizados em sua carreira, e que tenham locais onde seja possível trabalhar: outro dia um profissional atuando em uma área menos privilegiada se queixava na imprensa de que não havia nem aspirina nem água no local de trabalho, e foi embora. (AO1).

QUADRO 24: Restrições e argumentos para definição de RRIV — enunciado interjetivo ah

RESTRIÇÕES E ARGUMENTOS PARA DEFINIÇÃO DE RRIV— ah

RESTRIÇÕES

SOBRE N

Porção N Mas na medicina [...] na medicina, é que eu quero os melhores profissionais: depois do árduo curso de seis anos, mais uma residência de dois, eventualmente mais especialização, e mestrado, e quem sabe doutorado, para saberem mais e cuidarem melhor de nós, seus pacientes.

Caracterização A possibilidade de não se formarem bons profissionais na medicina desencadeia em A o desejo contrário: de que na medicina se tenham os melhores profissionais.

RESTRIÇÕES

SOBRE S

Porção S O enunciado interjetivo ah

Caracterização

O enunciado interjetivo ah apresenta:

1) comportamento parentético, sem marcas grafofonêmicas;

2) autonomia comunicativa por caracterizar-se como uma unidade informacional completa;

(Continuação do Quadro 24):

RESTRIÇÕES

SOBRE N + S

Estado mental Eu quero que, na medicina, se tenham bons profissionais.

Julgamento complexo

Eu quero que, na medicina, se tenham bons profissionais, com boa formação acadêmica, graduação, residência e especialização, para que possam cuidar bem de nós, seus pacientes.

EFEITO Ato social

performatizado

Desejar a formação de bons profissionais na medicina.

ARGUMENTOS

1) O observador considera plausível que A considere plausível que L perceba a reação emotiva do desejo de que, na medicina, se tenham os melhores profissionais.

2) O observador considera plausível que A considere plausível que a sua reação emotiva de desejo desperte em L o mesmo desejo de que, na medicina, se tenham os melhores profissionais.

3) O observador considera plausível que a reação emotiva de desejo desperte em L uma avaliação sobre o modo como A apresenta os fatos e se posiciona sobre eles

4) O observador considera plausível que L considere que a ausência de S não altera o conteúdo informativo de N.

5) O observador considera plausível que A considere plausível que S contribui com a construção e com a recepção do esquema argumentativo.

6) O observador considera plausível que A, por meio de S, revele, emotivamente e de modo experiencial,o desejo de, na medicina, sejam formados bons profissionais.

Observe-se este texto para análise:

(49) Os black blocs foram o grande desastre de 2013. Grupos formados por pessoas de índole duvidosa que destruíram, agrediram e desrespeitaram autoridades policiais e os cidadãos de bem. Cadeia neles! (CL5).

QUADRO 25: Restrições e argumentos para definição de RRIV — enunciado interjetivo Cadeia

neles!

RESTRIÇÕES E ARGUMENTOS PARA DEFINIÇÃO DE RRIV— Cadeia neles!

RESTRIÇÕES

SOBRE N

Porção N Toda a porção textual anterior ao enunciado interjetivo Cadeia neles!.

Caracterização As ações praticadas pelos black blocs desencadeiam em A uma reação emotiva.

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(Continuação do Quadro 25):

RESTRIÇÕES

SOBRE S

Porção S O enunciado interjectivo Cadeia neles!.

Caracterização

O enunciado interjetivo Cadeia neles! apresenta: 1) marca grafofonêmica em virtude do sinal de exclamação;

2) autonomia comunicativa por caracterizar-se como uma unidade informacional completa;

3) significado específico: desejo.

RESTRIÇÕES

SOBRE N + S

Estado mental Eu quero que os black blocs sejam presos.

Julgamento complexo

Eu quero que os black blocs sejam presos, porque eles provocaram destruição, agrediram e desrespeitaram autoridades policiais e cidadãos de bem.

EFEITO Ato social

performatizado

Desejar que os black blocs sejam presos.

ARGUMENTOS

1) O observador considera plausível que A considere plausível que L perceba a reação emotiva do desejo de que os black blocs sejam presos.

2) O observador considera plausível que A considere plausível que a sua reação emotiva de desejo desperte em L o desejo de que os blacks blocs sejam presos.

3) O observador considera plausível que a reação emotiva de desejo desperte em L uma avaliação sobre o modo como A apresenta os fatos e se posiciona sobre eles.

4) O observador considera plausível que L considere que a ausência de S não altera o conteúdo informativo de N.

5) O observador considera plausível que A considere plausível que S contribui com a construção e com a recepção do esquema argumentativo.

6) O observador considera plausível que A, por meio de S, revele, emotivamente e de modo experiencial, o desejo de que os black blocs sejam presos.

A seguir, um fragmento de poema para análise: (50) Como tudo sempre acaba

oxalá seja bem cedo! A esperança que falava tem lábios brancos de medo. O horizonte corta a vida isento de tudo, isento... Não há lágrima nem grito: apenas consentimento. (P5)

QUADRO 26: Restrições e argumentos para definição de RRIV — enunciado interjetivo oxalá

RESTRIÇÕES E ARGUMENTOS PARA DEFINIÇÃO DE RRIV— oxalá

RESTRIÇÕES

SOBRE N

Porção N Como tudo sempre acaba

Caracterização A possibilidade de que tudo não acabe cedo desencadeia no eu lírico uma reação emotiva.

RESTRIÇÕES

SOBRE S

Porção S O enunciado interjectivo oxalá

Caracterização

O enunciado interjetivo apresenta:

1) baixo (ou ausência de) relevo emocional;

2) autonomia comunicativa por caracterizar-se como uma unidade informacional completa;

3) significado específico: desejo.

RESTRIÇÕES

SOBRE N + S

Estado mental Eu quero que tudo acabe bem cedo.

Julgamento complexo

Eu sei que tudo acaba, por isso manifesto meu desejo de que seja bem cedo.

EFEITO Ato social

performatizado

Desejar que tudo acabe bem cedo.

ARGUMENTOS

1) O observador considera plausível que A considere plausível que L perceba a reação emotiva de desejo do eu lírico de que tudo acabe bem cedo.

2) O observador considera plausível que A considere plausível que L perceba na reação emotiva de desejo do eu lírico uma estratégia poética de A para indicar o desejo do eu lírico de que tudo acabe bem cedo.

3) O observador considera plausível que A considere plausível que L perceba, na reação emotiva de desejo do eu lírico, uma estratégia de A para caracterizar o modo como o eu lírico se comporta diante do fato de que tudo sempre acaba.

4) O observador considera plausível que L considere que a ausência de S não altere o conteúdo informativo de N.

5) O observador considera plausível que A considere plausível que S contribui com a montagem do esquema poético.

6) O observador considera plausível que A, por meio de S, revele, emotivamente e de modo experiencial, o desejo do eu lírico de que tudo acabe bem cedo.

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(51) Inf. [...] esses dois ano separado ele saiu::… da cadei::a e voltô(u) de novo… só que eu já num morava no mesmo local:: me distanciei… né? e:: depois de:: mais ou menos uns três anos ele preso... eu peguei e:: quis voltá(r) o relacionamento com ele… foi aonde que eu engravidei de novo… da minha filha... só que aí a gente já tava jun::to né? eu fui visitá(r) e::le tudo... e até hoje a gente tá assim... só que ele do/ de dois anos pra CÁ… ele mudô(u) mui::to hoje ele é uma outra pessoa a gente tem pla::nos... a gente tem plano de casá::(r) plano de vivê(r) junto plano de criá(r) nossos filho juntos... inclusive assim a/ faz po(u)co tempo né? ele tá pra saí(r) já… então ham:: agora parece que a história tá se revertan(d)o/ se reverten(d)o po lado bom… né? Porque a gente::... vai vivê(r) jun::to hoje eu tenho minha casa meu apartamento… né? então tô meio que mobilian(d)o agora... então se Deus quisé(r) Deus abençoá(r) a gente vai ficá(r) junto… se Deus abençoá(r)… né? e a gente vai... criá(r)… os nossos dois filho que hoje é um casal… vai criá(r) e:: vivê(r) feliz

Doc.: que bom:: (CE27).

QUADRO 27: Restrições e argumentos para definição de RRIV — enunciado interjetivo se Deus

quisé(r) Deus abençoá(r)

RESTRIÇÕES E ARGUMENTOS PARA DEFINIÇÃO DE RRIV— se Deus quisé(r) Deus abençoá(r)

RESTRIÇÕES

SOBRE N Porção N

só que ele do/ de dois anos pra CÁ… ele mudô(u)

mui::to hoje ele é uma outra pessoa a gente tem pla::nos... a gente tem plano de casá::(r) plano de vivê(r) junto plano de criá(r) nossos filho juntos... inclusive assim a/ faz po(u)co tempo né? ele tá pra saí(r) já… então ham:: agora parece que a história

tá se revertan(d)o/ se reverten(d)o po lado bom…

né? Porque a gente::... vai vivê(r) jun::to hoje eu

tenho minha casa meu apartamento… né? então tô

meio que mobilian(d)o agora... então

Caracterização A mudança de comportamento do pai dos filhos de Inf. desencadeia uma reação emotiva.

RESTRIÇÕES

SOBRE S

Porção S O enunciado interjetivo se Deus quisé(r) Deus abençoá(r)

Caracterização

O enunciado interjetivo apresenta:

1) relevo emocional em virtude de uma sequenciação / reiteração emocial;

2) autonomia comunicativa por caracterizar-se como uma unidade informacional completa;

3) significado específico: desejo.

RESTRIÇÕES

SOBRE N + S

Estado mental Eu quero viver com meus filhos e com o pai deles.

Julgamento complexo

Eu sei que o pai dos meus filhos mudou de comportamento, por isso manifesto meu desejo de que Deus nos abençõe para que nós possamos viver juntos e criar nossos filhos.

(Continuação do Quadro 27):

EFEITO Ato social

performatizado

Desejar a vontade de viver com os filhos e com o pai deles.

ARGUMENTOS

1) O observador considera plausível que Inf. considere plausível que Doc. perceba a reação emotiva de desejo de viver com os filhos e com o pai deles.

2) O observador considera plausível que a reação emotiva de desejo de Inf. desperte em Doc. ou em L um sentimento favorável à realização do desejo de viver com os filhos e com o pai deles.

3) O observador considera plausível que a reação emotiva de desejo desperte em Doc. ou em L uma avaliação sobre o modo como Inf. apresenta os fatos e como se envolve com eles. 4) O observador considera plausível que Doc. ou L considere que a ausência de S não altera o conteúdo informativo de N.

5) O observador considera plausível que Inf. considere plausível que S contribui com a descrição, de um lado, e com a recepção, do outro lado, do desejo de viver com os filhos e com o pai deles.

6) O observador considera plausível que Inf., por meio de S, revele, emotivamente e de modo experiencial, o desejo de viver com seus filhos e com o pai deles.

As análises de (47), (48), (49), (50) e (51) permitem algumas observações acerca das manifestações interjetivas volitivas. Se as emocionais sinalizam uma emoção vívida, se as cognitivas sinalizam uma reflexão, as manifestações interjetivas volitivas sinalizam a realização futura de um desejo — tanto a reflexão quanto o desejo advêm das experiências do falante. Nesse sentido, as manifestações interjetivas volitivas são marcas de pressuposição, ou seja, a emissão delas deixa implícito que, se há o desejo de realização de um fato, esse fato não existe.

As manifestações interjetivas volitivas são da ordem do emotivo. A emissão delas requer, de modo geral, uma descrição metalinguística do desejo. Pode ocorrer a emissão de um item não lexical como interjeição volitiva (ah!, por exemplo); porém, o falante interjetivo acrescenta a esse item a descrição de seu desejo. As manifestações interjetivas que invocam proteção divina, por exemplo, enquadram-se no grupo das volitivas, uma vez as invocações

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são manifestações de um desejo ou de uma proteção ou auxílio. O ato de performatização que advém das manifestações interjetivas volitivas pouco ou nada contribui com o conteúdo informativo da porção nuclear. A ausência delas pode interferir no fluxo conversacional ou na progressão textual.

As manifestações interjetivas volitivas, como satélites de uma relação retórica do tipo núcleo-satélite, compreendidas pelo estado mental Eu (não) quero algo., encapsulam emotivamente a porção nuclear. O satélite interjetivo volitivo, na sua relação com a porção nuclear, não exprime, diretamente, o que o falante interjetivo vive, mas informa sua expectativa de realização de um desejo desse sujeito. Nesse sentido, as manifestações interjetivas volitivas são experienciais.