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Recursos de linguagem televisiva: edição e filmagem

Cap 3 Credibilidade: modos e mecanismos

3.1 Tipos de modos e mecanismos de credibilidade

3.1.3 Recursos de linguagem televisiva: edição e filmagem

As imagens muitas vezes não são tal e qual como as pessoas veem no ecrã da televisão, e muito menos foram filmadas naquela sequência. Todavia, isso não significa distorcer a realidade, mas torná-la mais percetível e “forte”. “Os factos que foram retirados do seu contexto na rua agora são organizados de acordo com a lógica de produção do telejornal.” (Vizeu, 2002a, p. 101) É na edição de imagem que existe todo o processo de montagem de uma peça jornalística, sendo esta de curta ou longa duração, como as peças diárias, a Grande Reportagem, a Reportagem Especial, ou outro qualquer formato.

“A variedade de imagens oferecidas aparece também como um forte apelo para a audiência e, de modo a manter o telespectador no fluxo televisivo, no telejornalismo as imagens são estruturadas de acordo com a estética de produção de mercadoria.” (Gomes, 2006, p. 13) A edição de imagem é o backstage da notícia e das imagens que as pessoas visualizam na televisão, é na edição que se forma o seguimento das imagens, de modo a que elas não percam importância, e assim, como diz Itânia Gomes, o telespectador mantem-se no fluxo televisivo.

A montagem tem tanto poder que pode ser considerada um dispositivo de credibilidade. Isto porquê? O jornalista e o editor vão selecionar as melhores imagens de acordo com o trabalho que queiram fazer, e fazer a sequência que mais lhes agrade. Desta forma eles vão fazer com que as pessoas acreditem no que (eles) “querem”, pois é a sequência por eles montada que as pessoas vão ver e assimilar como verdadeira e concreta. Pode haver uma manipulação da peça jornalística, para o bem ou para o mal, embora no que diz respeito à informação não haja transformações, apenas sequências trabalhadas. “A decisão de mostrar umas imagens e ocultar outras, a distribuição das imagens ao longo da peça e a sua própria sequência permitem uma infinidade de possibilidades para explorar a vertente espetacular da notícia.”

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(Canavilhas, 2001, p. 7) Assim, os jornalistas fazem as pessoas acreditar no que eles querem, porque há todo um processo que pretende dar forma e valor à peça noticiosa para que seja percetível, informativa, credível e inesquecível. No mesmo sentido, afirma Nuno Brandão (2010) que, “Nos atuais telejornais, a instantaneidade da imagem é «vestida, montada, encenada, promovida a espetáculo.»”(p. 20) Apesar de não haver transformações, há obviamente a necessidade de tornar a notícia mais clara e “apetitosa”.

A «realidade» torna-se então menos vigorosa que a «imagem», pois vivemos segundo uma permanente «telerrealidade». Ou seja, um «universo» principalmente construído pela televisão, onde se chocam e se misturam as imagens com maior carga emotiva, dramática e espetacular. (Brandão, 2010, p. 132)

Juntamente com a imagem, também o som pode ser editado: “o som ambiente é o maior aliado da montagem, já que consegue ligar imagens captadas em situações distintas e construir com estas uma única cena.” (Godinho, 2011, p. 78) Quando as pessoas não se dão conta do som ambiente isso é bom sinal, é sinal que ele existe e está perfeito, que não “choca”5 ou não impede a pessoa de se concentrar no que está a ver e a ouvir. Por outro lado, quando o comum telespectador se dá conta de que o som ambiente tem, por exemplo, “carros”, e depois só “passarinhos”, isso é mau sinal, é sinal de que a sua passagem não está perfeita e fez com que o telespectador perdesse tempo a pensar no que estava a ouvir, por trás das imagens e da voz do jornalista, podendo perder assim informação fulcral.

Acredito também que a montagem pode ter dois significados muito distintos: a realidade ou a invenção. Com isto quero dizer que pode ser muito fiel aos factos e representar a verdade nua e crua, ou então pode ser totalmente manipulada e só mostrar o que se pretende, não respeitando assim a totalidade da verdade dos factos.

A filmagem também pode ser considerada uma forma de transmitir credibilidade, pois escolher um ângulo e não outro pode influenciar a mensagem transmitida pelo jornalista. Uma imagem fixa ou uma imagem a “tremer” pode também contribuir para a credibilidade junto do telespectador. Por exemplo: quando o pivô está a apresentar o telejornal a câmara tem de estar fixa, pois só assim transmite uma imagem de segurança e veracidade às pessoas; mas, por outro lado, se um jornalista vai no meio da confusão ou se está entre manifestantes, os planos da câmara não podem ser fixos, pois isso dá a ideia de que é mentira e que ele (jornalista) não estava lá, mas sim, possivelmente, no cimo de uma colina com o zoom no máximo. Nesta segunda situação o próprio auditório pede que as imagens tremam q.b.. Aqui, quer nas escolhas do jornalista/repórter de imagem, quer no desenvolvimento, é muito importante o fator filmagem. O repórter de imagem tem de ser capaz de mostrar com as suas imagens o que realmente aconteceu na ocorrência para a qual está a colher imagens. Ele tem de ser capaz de fazer um plano estável, de modo a que o telespectador não perceba que há

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movimento, como tem de ser capaz de ter um plano em movimento, para mostrar que, de facto, a situação não era calma.

“Claro que errar uma tomada, esquecer o foco ou o diafragma, perder o motivo, acionar a câmara no momento errado são acidentes que podem acontecer no trabalho com qualquer média.” (Machado, 2000, p. 133) É devido a esta situação que a SIC, como as outras estações televisivas, têm vários repórteres de imagem. Em todos os canais há repórteres de imagem com mais idade e com menos idade, com mais experiência e com menos experiência. Quando se trata de acontecimentos de última hora é impossível prever qual é o câmara que vai, pois é o que estiver “mais à mão” que é destacado para o serviço. No entanto, quando são situações de agenda, é tudo pensado. Um exemplo: num europeu de futebol, quem vai cobrir o evento é certamente um jornalista de desporto e um câmara que perceba de desporto, ou então que já tenha feito vários trabalhos nessa área, pois o jornalista vai pedir, por exemplo, “capta um plano do Miguel Veloso” ou “apanha o golo do Coentrão”, e aqui o repórter de imagem tem de saber quem são estes jogadores para fazer o seu trabalho o melhor que pode, e com a rapidez pretendida.

3.1.4 Pivô

O jornalismo televisivo concentra-se cada vez mais na figura do pivô, que tem o papel principal no percurso informação – telespectador.

O pivô encontra-se no centro das atenções, pois é ele que dá a cara e, ao dar a cara, responsabiliza-se por todo o jornal em si. E, “a credibilidade do telejornal é influenciada diretamente pela confiança que os espectadores depositam nos seus apresentadores”. (Fechine, 2008, p. 69)

São muitas as pessoas que, ao terem alguém em quem depositam confiança à frente do ecrã, desde logo acreditam no que está a ser transmitido. Já houve casos, no dia-a-dia, em que nos deparámos com “ahhhh… foi a Maria João Ruela que deu a notícia, ela não ia inventar”, ou com “se foi a Maria João Ruela a dizer eu acredito”. Estes pequenos exemplos permitem perceber que o pivô é fundamental, é ele que deve conseguir que as pessoas acreditem nele, pois só depois de acreditar nele é que vão acreditar na informação que ele vai transmitir. Quando se fala em pivô, fala-se na sua apresentação, na sua expressão, no seu modo de estar e no cenário que o envolve. Para João Canavilhas (2001, p. 7), todos estes pontos são retratados na palavra “fachada”. Para ele, “fachada” tem duas partes padronizadas: o cenário e a fachada pessoal. O cenário é todo o ambiente que envolve o pivô, e esse é preciso ser cuidado pois tem muita influência no telespectador; já a fachada pessoal é tudo o que diz respeito ao pivô enquanto pessoa, todas as suas expressões, o seu tom de voz, os gestos e a

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própria forma como divulga a informação. A meu ver, um bom exemplo de pivô é o Bento Rodrigues, que na SIC é conhecido como o “Golden Voice”.

Ainda dentro da fachada pessoal, Canavilhas (2001, p. 7) refere a aparência e a maneira. Isto é, o pivô tem de ter cuidado como seu aspeto físico, pois isso transmite muito dele enquanto pessoa; no entanto, existe todo o processo de caracterização, que permite ao pivô tornar-se o “pivô perfeito” aos olhos do público. A maneira implica a forma como ele reage ao dar uma notícia engraçada ou uma notícia triste, pois é necessário que haja uma boa coerência expressiva entre a fachada pessoal e a notícia em si, para que os telespectadores depositem nele a máxima confiança.

A aparência e a maneira são extramente importantes já que, “Em televisão, o que a pessoa diz não representa senão 7% do que realmente comunica; 38% da mensagem é transmitida pela sua maneira de se exprimir (voz, vocabulário, ritmo do discurso) e 55% pelas expressões da face e movimentos do corpo”. (Canavilhas, 2001, p. 6)

O pivô funciona – quase – como um ator, interpretando temas da vida real. “O apresentador do telejornal «coloca-se no lugar geométrico adequado a propiciar a identificação do espectador, é ele a instância de credibilização».” (Brandão, 2010, p. 21) A posição onde o pivô é colocado através da câmara é uma posição estudada que permite ao telespectador apenas identificar o pivô no plano principal, criando assim uma maior empatia. Também ajuda na credibilização o cenário que envolve o pivô, pois embora ele seja o plano nítido, central e em maior escala, por trás, no caso da SIC, é possível observar-se parte da redação de informação. Uma redação em pleno trabalho e movimento.

Todavia, um pivô é, acima de tudo, um jornalista, por isso, não pode descuidar os seus ideais. Ser opinativo e revelar a sua vida privada à frente da câmara não faz parte desses ideais - exceto em situações em que os telespectadores estejam à espera de algum comentário ou reação, porque por vezes são necessários para haver familiaridade entre o pivô e o telespectador, de maneira a atribuir-lhe a credibilidade pretendida.

A presença visual de um apresentador, de uma voz autorizada e uma face familiar, é outro aspeto importante para a configuração da notícia televisiva, porque afeta toda a situação comunicativa instaurada por um telejornal, quer ela seja limitada à leitura da notícia, quer ela tenha sua função ampliada para os comentários. (Gomes, 2006, p. 9)

O pivô “olha o telespectador nos olhos, oferecendo-se à identificação, através da simulação de uma atitude semelhante à do recetor face às notícias e reportagens televisivas que apresenta.” (Brandão, 2010, p. 21) Só desta forma ele permite ao público familiarizar-se com ele e com o que ele diz. Apesar de direto e sério, o pivô tem de transmitir uma sensação de carinho, pois as pessoas também procuram isso.

O pivô consegue fazer com que o público se sinta acompanhado, e interessado, pois ao utilizar tons de voz e expressões diferentes, consegue captar a sua atenção, impedindo o telespectador de vaguear no seu consciente e inconsciente.

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Contudo, há quem afirme, como é o caso de Ignacio Ramonet, que o pivô tem um lugar de pouco valor, pois o valorizado são as imagens das notícias: “o comentário torna-se então mínimo, e o papel do apresentador discreto.” (Ignacio Ramonet como referido em Brandão, 2010, p. 21)