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Redução das taxas de juro bancárias e aumento do crédito à economia real

4. A redução das taxas de juro levada ao limite

4.1. Fatores impulsionadores e consequências positivas

4.1.5. Redução das taxas de juro bancárias e aumento do crédito à economia real

O aumento do crédito a famílias e sociedades não financeiras foi um dos principais objetivos do BCE com a redução das taxas de juro diretoras para valores historicamente baixos, tendo, obviamente, um impacto positivo na concessão de crédito à economia real. Esse impacto não se deveu apenas ao facto de os bancos obterem liquidez em muito melhores condições junto do BCE (transmissão, em certo grau, dessas condições aos empréstimos a famílias e empresas), mas também devido a efeitos indiretos das medidas implementadas pelo BCE na atividade bancária, como é o caso da redução do crédito malparado ou do aumento, ao longo dos últimos anos, da procura de crédito por parte das sociedades não financeiras (BCE, 2017c). Na AE, os bancos, ao contrário de outros países como os EUA, são os principais financiadores das sociedades não financeiras. Dessa forma se percebe o foco nas instituições bancárias das medidas implementadas pelo BCE (BCE, 2016c). Apesar da transmissão da política monetária se ter apresentado ineficiente e heterogénea (entre os vários países da AE) em alguns momentos, algo que também foi sendo progressivamente resolvido pela ação de diversas medidas tomadas pelo BCE (ver subsecção 4.1.6), houve uma significativa melhoria das condições de financiamento para

0 5 10 15 20 25 30 35 40 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016

Alemanha Área do Euro Espanha França

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famílias e sociedades não financeiras e o um consequente aumento no volume de empréstimos, ao longo dos últimos anos.

Vários são os fatores que determinam o valor da taxa de juro aplicável a uma empresa ou a um particular na concessão de um empréstimo bancário, nomeadamente um prémio do risco de crédito, a compensação dos custos de capital da entidade bancária, uma margem de intermediação e, como é óbvio, a taxa a que os bancos obtêm liquidez (BCE, 2017b). As taxas de juro praticadas nos mercados interbancários servem de base inicial para a determinação das taxas ativas bancárias, sendo adicionadas várias outras margens. Os bancos dos países periféricos da AE sofreram bastante com esta particularidade. Num período de crise económico-financeira, como vivenciamos ao longo dos últimos anos na AE, algumas destas margens incrementam (por exemplo, o risco de crédito é superior num período de crise), pelo que, mesmo que as taxas a que os bancos se financiam se mantenham inalteradas, há um aumento das taxas praticadas para concessão de crédito à economia real. Nesse sentido, uma redução de determinado grau nas taxas de juro diretoras não implica uma redução semelhante nas taxas de juro praticadas pelos bancos (BCE, 2017b).

No caso da AE, tendo como referência as taxas ativas bancárias aplicadas a sociedades não financeiras e famílias, verificamos pelas figuras 3.7 e 4.4 que os valores mais elevados foram atingidos no final de 2008 (valores próximos de 6% no custo de financiamento médio para sociedades não financeiras e próximos de 5% para crédito à habitação), tendo decrescido rapidamente até 2010 (foi alcançado um valor próximo dos 3% para empréstimos a sociedades não financeiras e um valor próximo de 4% para crédito à habitação) por ação da redução dos custos de financiamento dos bancos nos mercados interbancários, como consequência das medidas de política monetária implementadas pelo BCE (Szczerbowicz, 2015). Em média, os bancos financiavam-se nos mercados interbancários a taxas8 de aproximadamente 5,5% em finais de 2008, ao passo que em

2010 já se financiavam a taxas próximas de 1% (BCE, 2017b).

Durante o final de 2010 e até aos últimos meses de 2011 a taxa média de financiamento da economia real da AE voltou a subir, em resultado da subida dos custos de financiamento dos bancos para valores próximos de 2% (BCE, 2017b). Houve um

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incremento no custo de financiamento das sociedades não financeiras (para quase 4%), embora o custo para empréstimos à habitação se tenha mantido relativamente estável. Esta evolução refletiu, em primeiro lugar, uma ligeira subida da taxa das operações principais de refinanciamento, e posteriormente também um novo período de forte turbulência nos mercados, em grande parte relacionada com o eclodir da crise das dívidas soberanas na AE (BCE, 2017b). Os investidores duvidavam cada vez mais da sustentabilidade das dívidas públicas de alguns países, nomeadamente da Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha e Itália. Em resposta, o BCE foi progressivamente implementando novas medidas de política monetária e reduziu ainda mais as taxas de juro diretoras. Durante o ano de 2012, as taxas a que os bancos se financiavam nos mercados interbancários já estavam muito próximas de zero, tendo passado para valores negativos em 2015 (BCE, 2017b). As taxas aplicadas à concessão de empréstimos a sociedades não financeiras e famílias baixaram a um ritmo inferior, mas no final de 2017 já se fixavam, em média, em valores próximos de 1,7% e próximos de 2,5%, respetivamente.

Figura 4.4: Taxas de juro médias em novos contratos de crédito à habitação, 1:2007- 3:2018 (%)

Fonte: BCE (2018).

As taxas às quais os bancos concederam crédito à economia real variam de país para país, dentro da AE. No entanto, foi a partir do eclodir da crise das dívidas soberanas que a dispersão aumentou para valores históricos desde a criação da UEM, sendo que se

0 1 2 3 4 5 6 7 jan /07 ju n /07 n o v/07 ab r/ 08 se t/0 8 fev/09 jul/09 dez/09 mai /10 o u t/10 mar/11 ago /11 jan /12 ju n /12 n o v/12 ab r/ 13 se t/13

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verificou o período mais crítico entre 2010 e 2014. A título de exemplo, em grande parte deste período crítico, a diferença entre as taxas de juro ativas para sociedades não financeiras da França e Grécia chegou a atingir valores próximos de 3%. A partir de 2014, esta heterogeneidade começou a diminuir progressivamente, essencialmente em resultado do pacote de medidas que o BCE implementou em 2014, sendo que atualmente ainda se verifica uma dispersão superior à do período anterior a 2007. Essas medidas foram essenciais, entre outros, para reduzir o “risco país” na obtenção de liquidez por parte dos bancos nos mercados. Um banco que atue ou tenha fortes interesses num país com elevado risco terá um spread relativo ao “risco país” mais elevado (Szczerbowicz, 2015). As diferenças remanescentes entre os diversos países da AE refletem diferenças ao nível do risco de crédito, ao nível da solidez dos balanços e rentabilidade dos bancos, entre outros. São sobretudo problemas estruturais que estão na base destes diferenciais (BCE, 2016b).

No que toca ao volume de crédito concedido durante a última década à economia real da AE, verifica-se que só nos últimos meses houve uma recuperação para valores semelhantes aos existentes antes da crise do subprime (figura 3.8). Durante a última década, muitos foram os períodos onde se registaram taxas de crescimento homólogas negativas, nomeadamente entre finais de 2008 e início de 2009 e entre meados de 2012 e meados de 2014. No início de 2014, a taxa de variação homóloga do crédito ao setor privado era inferior a -2% (BCE, 2017c). Ainda assim, é de realçar o crescimento constante do crédito ao setor privado desde a segunda metade de 2014 e o facto de a evolução deste indicador poder ter sido muito pior caso o BCE não tivesse intervido da forma e na escala em que o fez.

4.1.6. Garantir a eficácia dos mecanismos de transmissão da política monetária