• Nenhum resultado encontrado

3.1 INSTRUMENTOS DE DEMOCRACIA SEMIDIRETA

3.1.2 Referendo

O referendo é, normalmente, considerado como um mecanismo de consulta popular que permite que os cidadãos ratifiquem ou rejeitem um projeto já existente, ou seja, os cidadãos adquirem “o poder de sancionar leis”168, na medida em que o parlamento elabora a norma, mas ela só se torna eficaz se o povo aprová-la.

Esse instituto tem origem na expressão “ad referendum” que indica a ideia de ratificação e sugere a existência de “uma norma que instituição representativa propõe, e um povo soberano, que dispõe”169.

O termo remete às antigas Dietas das Confederações Helvéticas, que permitiam aos cantões suíços, a aprovação por todos os cidadãos das decisões tomadas em Assembleia.170

A teorização deste mecanismo ocorreu na França, como um modo de defesa da democracia direta. Contudo, por ser confundido com o plebiscito, os franceses repudiaram sua utilização. Denise Auad, explica que o referendo passou a ser muito empregado no século XX, na América do Norte e Europa e que países ocidentais garantiam este mecanismo em suas Constituições, embora sem muita utilização

167

AUAD, Denise. Mecanismos de participação popular no Brasil: plebiscito, referendo e iniciativa

popular. Disponível em:

<http://www.unibero.edu.br/download/revistaeletronica/Set05_Artigos/DIR_PROF%20DENISE_OK.pd f>. Acesso em: 5 jun. 2013; SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 33. ed. rev. e atual. até a EC n. 62/09. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 142; BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A cidadania ativa: referendo, plebiscito e iniciativa popular. 2. ed. São Paulo: Ática, 1996, p. 40.

168

BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 282. 169

SGARBI, Adrian. O referendo. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 108. 170

GARCIA, Alexandre Navarro. Democracia semidireta: referendo, plebiscito, iniciativa popular e legislação participativa. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 42, n. 166, p. 9-22, abr./jul. 2005, p. 11.

prática. A autora cita exemplos, em que o referendo foi utilizado para decidir questões importantes:

Podemos citar a França, que em 1962 recorreu ao referendo para reformar

a Constituição da Quinta República e implementar o regime

semipresidencialista, bem como eleições diretas para a escolha do presidente da República. Na década de 1990, os cidadãos franceses foram novamente consultados, dessa vez por François Miterrand, para se pronunciarem sobre a ratificação do tratado de Maastricht, sustentáculo para o sucesso da União Europeia. Por pouco o Tratado não foi ratificado pelos franceses, pois apenas 51% dos votos foram favoráveis. Em 1991, Gorbatchov propôs um referendo na ex-União Soviética para a criação da Comunidade de Estados Independentes (CEI). Com a posterior acensão de Yelstin ao poder e o consequente abandono da CEI por dezessete Repúblicas, transformando-a na atual Rússia, foram propostas, em 1993, outras duas consultas populares: a primeira para a legitimação de Yelstin e de sua política econômica de cunho mais liberal; e a segunda para a

aprovação de um novo texto constitucional.171

Considerando que o referendo pode apresentar diferentes definições, dependendo do sistema em que está vinculado172, Bonavides173 apresenta quatro modalidades mais frequentes do instituto.

A primeira se refere à matéria ou objeto do referendo, podendo ser constituinte, se tratar de lei constitucional ou legislativo, se referir a leis ordinárias.

A segunda modalidade abrange os efeitos do referendo, que será constitutivo, quando a norma jurídica passar a existir (no caso de ratificação dos cidadãos) ou ab-rogativo, se a lei deixar de existir (em caso de rejeição pela população). Nesse sentido, Alexandre de Moraes174 explica que o referendo possui condição suspensiva, quando a norma é ratificada pelos indivíduos, ou condição resolutiva, quando o povo retira sua eficácia, rejeitando-a.

A terceira modalidade do referendo relaciona-se com a sua natureza jurídica, sendo obrigatório, quando a Constituição exige que a lei elaborada pelo parlamento seja aprovada pela população ou facultativo, quando determinados membros do poder ou os eleitores podem requer a consulta popular. Para Alexandre Navarro

171

AUAD, Denise. Mecanismos de participação popular no Brasil: plebiscito, referendo e iniciativa

popular. Disponível em:

<http://www.unibero.edu.br/download/revistaeletronica/Set05_Artigos/DIR_PROF%20DENISE_OK.pd f>. Acesso em: 5 jun. 2013.

172

SGARBI, Adrian. O referendo. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 113. 173

BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 282-283. 174

Garcia175 o referendo facultativo é muito parecido com o mecanismo do veto popular, onde os cidadãos, dentro de um período de tempo, podem opor-se a uma lei.

Por fim, a última modalidade do referendo, diz respeito ao tempo, sendo anterior ou posterior a lei. No primeiro, a população é consultada antes da sua realização e, no segundo, a norma já existe quando ocorre a consulta popular. O referendo anterior a lei, não existe no Brasil, mas é parecido com o mecanismo do plebiscito.

Para Bonavides a utilização do referendo é importante por uma série de fatores, mas, principalmente, para permitir que o povo deixe de ser passivo em relação às questões políticas e possa controlar os atos dos seus representantes. Por outro lado, o autor aponta algumas desvantagens que, geralmente, são atribuídas à utilização do referendo:

O desprestígio das câmaras legislativas, consequente à diminuição de seus poderes; os índices espantosos de abstenção; a invocação do argumento de Montesquieu acerca da incompetência fundamental do povo e seu despreparo para governar; a cena muda em que se transforma o referendum pela ausência de debates; os abusos de uma repetição frequente ao redor de questões mínimas, sem nenhuma importância, que

acabariam provocando o enfado popular; o afrouxamento da

responsabilidade dos governantes (ao menor embaraço comodamente transfeririam para o povo o peso das decisões); o escancarar de portas à mais desenfreada demagogia; em suma, o dissídio essencial da instituição

com o sistema representativo.176

O âmago dessas críticas geralmente se relaciona a ideia de que a utilização do referendo, ou de outros instrumentos de participação, representa um enfraquecimento ou tentativa de abandono da representação política. Esse é o principal temor dos opositores da democracia semidireta. Contudo, conforme já observado, a utilização dos mecanismos de participação cidadã pode ser uma forma de diminuir o desgaste do sistema representativo, sem a pretensão de extingui-lo, mas sim, de complementá-lo.

175

GARCIA, Alexandre Navarro. Democracia semidireta: referendo, plebiscito, iniciativa popular e legislação participativa. Revista de Informação Legislativa, Brasília, ano 42, n. 166, p. 9-22, abr./jul. 2005, p. 11.

176