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4.4 AS POLÍTICAS PÚBLICAS NO CONTEXTO BRASILEIRO

4.4.1 Reflexão sobre a gestão: 1995-2002

O tópico fundamental da pesquisa gira em torno desta gestão e o comportamento do governo frente às vicissitudes do mercado turístico, mas especificamente do turismo receptivo, e que providências em termos de políticas públicas o Estado tomou para dirimir as dificuldades do turismo brasileiro durante este período.

Cabe então fazer uma retrospectiva sobre a conduta do poder público junto à sociedade, analisando e compilando os aspectos positivos e negativos que nortearam esta administração. Desta forma, alguns autores assistidos pela mídia, serão fundamentais na análise dos principais tópicos (des)favoráveis sobre este momento.

Skidomore (2003) fez em seu livro fez várias considerações a respeito deste período, que ele próprio chamou de governo da estabilização. Para o autor, a principal preocupação durante os primeiros anos de gestão foi à estabilização da inflação, que em 1993 havia alcançado a marca astronômica de 2,489% e ao final de 1997 caiu para 4%, contabilizando o pleno sucesso do plano reaI134. A grande

preocupação da equipe econômica era manter a inflação a níveis baixos, pois a população brasileira estava exausta de planos econômicos, troca de moedas, congelamento de preços, confisco de poupança, cujos resultados se mostraram desastrosos.

Na opinião de Skidmore (2003), o governo herdou uma vasta burocracia federal de governos anteriores, acumulando excesso da despesa federal, o qual precisava ser sanado. Uma das estratégias encontrada foi diminuir o tamanho da máquina pública através da privatização de estatais, o que se mostrou uma saída

134 Plano de estabilização econômica implantado no Brasil no início de 1994, para conter a inflação

viável para empresas ligadas a áreas de aço, fertilizantes e minério de ferro, em que quase todos os casos, a eficiência aumentou consideravelmente.

Segundo Abruccio135 o êxito do plano real foi fortalecer o governo federal,

promovendo a descentralização e favorecendo as transferências intergovernamentais com os estados, promovendo ações mais efetivas com relação às políticas públicas:

A coordenação de políticas públicas foi muito importante nas áreas de saúde e educação, com o PAB (Piso de Atenção Básica) e o Fundef136 respectivamente. Os mecanismos coordenadores aqui utilizados passaram pela combinação de repasse de recursos com o cumprimento de metas pré-estabelecidas ou adoção de programas formulados para todo o território nacional. Trata-se de um modelo indutivo que transfere verbas segundo metas ou políticas padrão estipuladas nacionalmente, procurando assim dar um perfil mais programado e uniforme à descentralização, sem retirar a autonomia dos governos subnacionais em termos de gestão pública. No caso do Fundef, ocorreu ainda uma redistribuição horizontal de recursos, experiência inédita na federação brasileira. A partir do final do primeiro mandato e início do segundo, foram adotadas políticas de distribuição de renda direta à população. O primeiro deles foi o PETI137, depois veio o Programa de Renda Mínima e, mais adiante o Programa Bolsa-Escola, a que se juntaram os programas Bolsa-Alimentação e o Vale-Gás138.

Conforme o autor139, estas medidas visavam atacar diretamente a pobreza em parceria com outros organismos nacionais, pois: “o pressuposto dessas ações era que em problemas de origem redistributiva, particularmente em uma federação, é necessária a atuação do governo federal para evitar o agravamento das desigualdades”.

A reportagem do Jornal Zero Hora140 de agosto de 1996 veiculou uma matéria sobre o “Plano de Metas” do Governo Fernando Henrique Cardoso, que estabeleceu 42 metas prioritárias cujos recursos públicos e privados atingiram o montante de R$ 79 bilhões, com prazo estipulado para as obras até o final de 1998. Das obras, 26 responderam por investimentos na infra-estrutura, tendo sido o Norte e Nordeste do país as regiões mais beneficiadas. A matéria destaca o ponto de vista do governo

135 ABRUCIO, Fernando Luiz. A coordenação federativa no Brasil: a experiência do Governo FHC e

os desafios do Governo Lula. Revista de Sociologia e Política. 2005, p, 53.

136 Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério. 137 Programa de Erradicação do Trabalho Infantil.

138 Ibid., p. 53. 139 Ibid., p. 53.

sobre o Nordeste, que está relacionado a melhoria da condição de vida da população e a formação de capital humano.

Skidmore (2003, p. 321) reconhece o esforço despendido pelo governo em prol da educação, comentando a opinião de observadores da área de que o grande empecilho continuava “sendo o desperdício, o desvio e o mau uso dos recursos disponíveis, o que estava muito relacionado com a corrupção e os incentivos perversos existentes em nível estadual e local”.

Uma crítica corrente desta gestão foi à tentativa de imprimir ao Estado brasileiro um caráter regulador, onde as instituições públicas atuassem parecidas com o mercado em termos gerenciais. Esta reforma não se concretizou a contento, segundo os autores:

• Apesar de ter um projeto bem definido para a mudança institucional, a reforma acabou causando uma fragmentação do aparelho de Estado, pois os novos formatos organizacionais sugeridos pela reforma não substituíram os antigos: há uma convivência de ambos. Nem todas as autarquias e fundações públicas se transformaram em agências executivas e várias entidades da sociedade civil iniciaram o processo de conversão em organizações sociais, mas acabaram optando pelo antigo status institucional (PAULA, 2005).

• A reforma gerencial baseou-se numa concepção que alienou o processo de formulação de políticas públicas de suas fontes, confundindo-o com o processo de sua implementação. Sendo a primeira responsabilidade do núcleo estratégico do governo, na prática, as estruturas criadas para desempenhar o papel de formulador – na sua grande maioria sob a forma de conselhos -, pouco ou nada desempenharam desse papel, por falta de quadros, por falta de orientação e priorização políticas, por falta de capacidade decisória e por um conjunto de outras razões. Como conseqüência, as estruturas criadas para implementar as políticas públicas, como no caso das agências reguladoras, começaram a exercer superpoderes, dentro de um complexo marco jurídico-legal que dificulta muito as políticas do presente governo (CAVALCANTI; PECI, 2005).

A crítica feita às agências reguladoras é rebatida com veemência pela Revista Veja141ao escrever que o modelo implantado pelo Governo Fernando Henrique

buscou modernizar a gestão federal, com intuito de regular o mercado a despeito

das ações governamentais. O preceito fundamental que rege as agências é a autonomia administrativa, garantindo aos setores envolvidos que o preço final seja justo ao consumidor, na relação entre Estado, investidor privado e sociedade. A revista ainda cita os benefícios adquiridos com as agências para o mercado brasileiro e relata o bom exemplo deste paradigma que vem de fora, que é o caso da Inglaterra onde elas existem há vinte anos e atuam de forma independente e ética para com o mercado inglês.

A despeito das críticas Bresser-Pereira (2003, p. 334) é pragmático:

[...] não se pode falar em fracasso geral do governo FHC142. Grandes avanços ocorreram na área social e na área política. Embora, obviamente, o problema de alta concentração de renda não fosse resolvido, jamais os pobres contaram com uma cobertura social tão ampla. Os padrões éticos do governo nunca foram tão altos. A democracia foi respeitada e reafirmada.

Entretanto, talvez pela excessiva fragmentação político-partidária existente no país, o governo lançou mão por diversas vezes do “decreto executivo que permitia ao presidente contornar provisoriamente o congresso devido à paralisia existente em Brasília que parecia tornar o país ingovernável” (SKIDMORE, 2003, p. 314), popularmente conhecida como medida provisória. O que caracterizou esta gestão, de certa forma, dentro dos parâmetros descritos por O’Donnell (1991), como uma democracia delegativa ao governar por decretismo sem esperar por uma pronta resposta do congresso brasileiro. Mas como o governo pode atuar para implementar mudanças previstas em seu projeto de governo, com um Congresso pulverizado por partidos políticos inoperantes e com ideologias distintas? A realidade aponta para uma falta de compromisso e seriedade de alguns partidos políticos brasileiros.

Abrucio (2005) contrapõe os aspectos positivos expostos anteriormente aos negativos existentes no governo Fernando Henrique Cardoso, descrevendo o que ele considera como prioritários:

• A fragmentação de uma mesma política em vários órgãos e ministérios, como é o caso do saneamento básico;

• A pulverização das políticas de renda, a despeito da ação coordenadora do projeto Alvorada;

• A falta de uma avaliação consistente na maior parte das áreas descentralizadas;

• A existência de poucos ou fracos fóruns intergovernamentais, a partir dos quais as políticas nacionais poderiam ser mais bem controladas e legitimadas;

• A adoção de uma visão tributária perversa do ponto de vista federativo, seja pela recentralização de recursos, seja pela negligência em relação à hamornização tributária do ICMS143;

• A deterioração das políticas regionais com o fim da SUDAM144e da

SUDENE145;

• O fracasso das políticas urbanas, afetando setores como habitação, saneamento, segurança pública e transportes metropolitanos.

De acordo com Bresser-Pereira (2003) esta gestão se consolidou como um governo social-democrata, aumentando a carga tributária (passou de 27,9% para 33,4% do PIB) para gastar com as demandas sociais, próprio deste paradigma político. Destacam-se como suas principais mudanças positivas para a sociedade brasileira os seguintes fatos:

• Estabilização econômica através do equilíbrio da inflação a taxas consideradas “normais”;

• A mortalidade infantil caiu de 48 para 30 por mil nascidos vivos; • A taxa de analfabetismo caiu de 19% em 1991 para 13% em 2000;

• Sistema de educação nacional (Enen, Provão, etc.), figurando como um marco na avaliação do ensino no país;

• A abertura comercial propiciou a entrada de investimento estrangeiros diretos na ordem de U$ 2 bilhões por mês (até 1994 o país recebia U$ 2 bilhões por ano);

• A democracia brasileira consolidada (como as eleições de 2002 deixaram claro).

Em matéria veiculada pelo Jornal Zero Hora146 o próprio presidente destacou o que ele considerou como resultados econômicos positivos em sua gestão “a inflação em 1997 ficou entre 4,1% e 4,6%, e a estabilidade traz benefícios sociais,

143 Imposto sobre circulação de mercadorias e serviços. 144 Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia. 145 Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste.

além de oferecer maior eficiência para o setor produtivo, a renda per capita cresceu, de 1994 a 1997, 2,8%, enquanto entre 1980 e 1993 o crescimento foi de 0,1%”.

Destaque também foi à alta taxa de desemprego registrada no mês de março de 1998, atingindo a marca de 7,25%, o que ascendeu a luz vermelha nos bastidores do governo. Segundo a reportagem do Jornal Zero Hora147, uma

preocupação constante é a morosidade da máquina administrativa em um país burocrático como o Brasil. A verba estava aprovada para os projetos envolvendo a geração de empregos, mas a liberação não saiu do papel.

Esta gestão se ocupou com freqüência em fortalecer a democracia e incrementar a capacidade produtiva brasileira, buscando formular e implementar as bases para uma qualidade melhor do setor de produção nacional, abrangendo diversas áreas, desde a educação, setor industrial, habitação, saúde, exportação e serviços, com a inclusão do turismo. Desta forma, o governo relançou em maio de 1998148 um plano de metas através do PBQP149. Outro avanço conquistado foi à aprovação da lei n° 11.079 em 2004150, que regulamenta as parcerias público- privadas, ampliando a relação com o sentido de contar com investimentos da iniciativa privada em áreas importantes, aonde o poder público é carente de recursos.