• Nenhum resultado encontrado

Reformas educativas em Portugal: da gestão democrática ao “Novo Gerencialismo” e “Nova

CAPITULO I – Avaliação Institucional no âmbito das políticas neoliberais

2. Reformas educativas em Portugal: da gestão democrática ao “Novo Gerencialismo” e “Nova

Com a revolução, ocorrida em 25 de abril de 1974, as escolas adotaram “práticas autogestionárias […] que conduziram ao afastamento de alguns reitores e directores (até então nomeados pelo governo) e à sua substituição por comissões directivas ou de gestão, quase sempre na sequência de decisões tomadas por assembleias de escola ou por outro tipo de reuniões plenárias” (Lima, 2009,

26

p. 227). Estas práticas foram, mais tarde, legitimadas com a publicação do Decreto-Lei nº 221/74 de 27 de Maio do Ministério da Educação e Cultura. Neste Decreto-Lei é determinado que “a direcção dos estabelecimentos de ensino possa ser confiada pelo Ministro da Educação e Cultura a comissões democraticamente eleitas ou a eleger depois de 25 de Abril de 1974” (Decreto-Lei no 221/74, de 27 de

Maio, do Ministério da Educação e Cultura, 1974, p. 1). Na realidade a publicação deste Decreto-lei representou uma importante transferência de poderes do Ministério para as escolas, na sequência de uma “deslocação de poder” (Stoer, 1985, p. 55) realizada anteriormente pelos atores escolares através de processos de participação ativa. Esta “apropriação de poderes por parte das periferias escolares e de ingerência no governo, até então heterónomo, de cada estabelecimento de ensino” (Lima, 2009, p. 229) é designada por Licínio Lima como “a primeira edição da gestão democrática” (Lima, 1998, pp. 281– 282).

De acordo com várias investigações realizadas26 “as escolas registavam durante o período

revolucionário uma situação de acentuada e generalizada heteropraxia” (Lima, 2009, p. 228), procurando regras próprias de funcionamento, diferindo da legislação publicada em Maio de 1974. Nesta fase é praticada uma democracia direta, privilegiando uma participação ativa e informal, especialmente entre professores e alunos (Lima, 1998), deixando para um plano muito reduzido o papel dos alunos, encarregados de educação e comunidades locais (Sá, 2004). O poder de decisão esteve, temporariamente, nas escolas, podendo as práticas ser identificadas com as metáforas da anarquia organizada (Cohen et al., 1972) e do sistema de decisão caixote do lixo27 (Cohen et al., 1972). Tal como

refere Rui Grácio:

“O mesmo sucede em relação às escolas. Mas, em muitas delas, emerge, […] a busca de um novo ordenamento estrutural e normativo. São os ‘saneamentos’ políticos e pedagógicos – ou a ‘depuração’ do sistema; a procura de novos planos e conteúdos de ensino e de formas de avaliação – ou a reformulação política, cultural e pedagógica dos objectivos educacionais; a procura de novas estruturas de governo, administração e participação – ou a gestão democrática das escolas. […] A partidarização da vida escolar não é mais clandestina, e alarga-se e aprofunda-se.” (Grácio, 1995, p. 475, aspas no original).

26 De entre as investigações realizadas sobre este período específico, pós revolução, destacamos: (Stoer, 1986; Lima, 1988, 1998, 1999; Teodoro, 2004; Torres, 2005a).

27

2.1- “Normalização” das Políticas Educativas

Este processo revolucionário de tentativa de deslocação de poder da administração central para o contexto escolar, fomentando a autonomia, rapidamente foi alvo de retração por parte dos governos provisórios. Logo em dezembro de 1974 o III Governo Provisório, presidido por Vasco Gonçalves, aprovou legislação com vista a garantir que o afastamento de “formas autocráticas de direcção de escolas passasse a ser convenientemente regulado” (Lima, 2009, p. 229), salvaguardando o processo democrático de gestão das escolas bem como a eficácia do seu funcionamento. É desta forma, apenas

consolidada em meados de 1976 com a aprovação da Constituição da República Portuguesa28, que a

gestão democrática das escolas entra na sua segunda fase29 (Lima, 1998, pp. 281–282). Esta nova fase contrasta com a primeira através da introdução da democracia representativa, participação e colegialidade, regras eleitorais precisas, apresentação de listas e eleição por voto secreto. De todas as decisões e reuniões eram lavradas atas que seguiam para homologação do ministério, contrastando com a informalidade da fase anterior.

Este período de “normalização” da educação em Portugal é, segundo Stephen Stoer:

“principalmente um processo pelo qual o Estado reconquistou e reassumiu o controle da educação, definindo e limitando aquilo que poderia considerar-se como educação. Todo o sistema de ensino foi atingido por esse processo de

definição e limitação que foi impulsionada pelo desejo de substituir a política pelo planeamento.” (Stoer, 1986, p. 64).

A aprovação da Constituição da República em abril 1976 apontava para uma democratização normalizada da sociedade portuguesa subordinada à Lei Fundamental, também no domínio da educação (Grácio, 1995, pp. 371–377). Segundo António Teodoro “a revolução normalizava-se” (2001b, p. 343), na medida em que a Constituição pressupunha que a educação fosse o pilar da democracia. Nesse sentido o Estado recupera o papel regulador, assumindo que “o lançamento de um esquema de gestão democrática nas escolas pelo Ministério da Educação […] tinha como objectivo a construção de uma escola nova que fosse o alicerce de uma nova sociedade” (Stoer, 1986, p. 130). Segundo Stephen Stoer (1986, pp. 64–70) este período de “normalização” implicou uma desvalorização da sociedade civil, também ao nível da educação. Esta fase além de assegurar a legitimidade interna (consolidação da

28 A constituição da República Portuguesa, no seu texto original de 2 de abril de 1976, prevê, no capítulo IV, artigo 73º, número 2: “O Estado promoverá a democratização da educação e as condições para que a educação, realizada através da escola e de outros meios formativos” (Constituição da República Portuguesa, texto original de 2 de abril de 1976, 1976, p. 17)

29 Licínio Lima defende que a segunda fase da gestão democrática permitiu reforçar o poder dos serviços centrais ao mesmo tempo que permitiu manter a escola isolada e isenta de influências a nível local (Lima, 1998, p. 281). Além deste aspeto, esta segunda fase, reforçou a defesa de certos interesses dos docentes, tais como: gestão de conflitos disciplinares entre docentes e entre estes e os alunos, horários, distribuição de serviço, etc. (Lima, 1998, p. 282)

28

democracia política) foi igualmente importante para conseguir a futura legitimação externa (visando a recuperação económica), atendendo à adesão à CEE que abordamos anteriormente.

Com a tomada de posse do I Governo Constitucional, presidido por Mário Soares e com a nomeação para o Ministério da Educação de Mário Sottomayor Cardia, pretende-se “repor o clima de normalidade no funcionamento das escolas e na condução da política educativa, remetendo para mais tarde as primeiras medidas de reforma global” (Teodoro, 2001b, p. 388), algo que Licínio Lima cataloga como “o retorno do poder e a reconstrução do paradigma da centralização” (Lima, 1998, pp. 258–275). Estes propósitos conduziram à publicação do Decreto-Lei n.º 769-A/76, de 23 de outubro, que foi capaz, segundo Stephen Stoer, sobretudo de clarificar deveres e competências de órgãos específicos e constituir assembleias de representantes em vez dos plenários, sendo estas acusadas de terminarem com a democracia direta (Stoer, 1986, pp. 147–154). Para Licínio Lima este normativo foi capaz de instituir “relações de maior e mais clara subordinação das escolas ao Governo e respectiva administração central” (Lima, 2009, p. 232). Nesse sentido as práticas democráticas são bastante formalizadas e os órgãos de gestão passam a assumir um papel de “execução institucional das políticas e orientações dimanadas de cima e de fora” (Lima, 2009, p. 232, itálico no original). Para Stephen Stoer este Decreto- lei é ambíguo na medida que:

“por um lado, com as inevitáveis modificações, representavam a aceitação de um processo educativo iniciado ‘fora’ do Estado, processo esse que, particularmente com a ‘normalização’ (procedendo à alteração das leis) foi em grande medida deslocado para a esfera do Estado; por outro lado, significava que o Estado era obrigado a aceitar uma nova forma de escolarização não criada por ele. A revolução impôs ao Estado a gestão democrática nas escolas. […] A gestão democrática nas escolas trouxe uma significação adicional à democracia no ensino em Portugal” (Stoer, 1986, pp. 152–153, aspas e parêntesis no original).

Esta segunda edição da gestão democrática das escolas, vigorará, durante mais de duas décadas nas escolas básicas e secundárias em Portugal, substituindo o sistema de governo autocrático centralizado, bem como as práticas autogestionárias de tipo descentralizado (Lima, 2009, p. 234). Segundo António Teodoro e Graça Aníbal a revolução de abril proporcionou a “afirmação da cidadania”, conduzindo à construção de um Estado-Providência30 pouco sólido que “só foi possível por uma desvinculação das políticas sociais das exigências da acumulação, durante o curto período de crise

30 Para Boaventura Sousa Santos o Estado-providência “é a forma política dominante nos países centrais na fase de ‘capitalismo organizado’, constituindo, por isso, parte integrante do modo de regulação fordista. Baseia-se em quatro elementos estruturais: um pacto entre o capital e o trabalho sob a égide do Estado, com o objectivo fundamental de compatibilizar capitalismo e democracia; uma relação constante, mesmo que tensa, entre acumulação e legitimação; um elevado nível de despesas em investimentos e consumos sociais; e uma estrutura administrativa consciente de que os direitos sociais são direitos dos cidadãos e não produtos de benevolência estatal” (Santos, 1992, p. 47, aspas no original). Este autor defende que Portugal apenas se aproximou de um Estado-providência no período de 1974-1976, coincidindo com a primeira fase da gestão democrática das escola, quando o investimento em despesas sociais e a participação dos cidadãos aumentou de forma exponencial (1992, p. 48). Excluindo esse período temporal o autor defende que Portugal é, antes, um semi-Estado-providência ou um lumpen-Estado-providência.

29

revolucionária, em 1974 e 1975” (Teodoro & Aníbal, 2008, p. 78). Segundo João Barroso este período temporal, compreendido entre 1976 e 1986, servirá para:

“recuperar o poder e o controlo do Estado e sua administração sobre a educação, eliminando as ‘derivas revolucionárias’, afastando os que eram considerados seus principais agentes no aparelho do Ministério da Educação e introduzindo critérios de ‘racionalidade técnica’ na decisão política, nomeadamente, por meio do reforço das estruturas e dos processos de planeamento” (Barroso, 2003, p. 68, aspas no original).

Apenas com a provação da Lei de Bases do Sistema Educativo, Lei n.º 46/86, de 14 de outubro, e com os trabalhos produzidos no âmbito da Comissão de Reforma do Sistema Educativo (1986- 1988) se entra numa nova fase das políticas educativas em Portugal. Nesta nova fase “ocorre uma crítica crescente à burocracia centralizada do Ministério da Educação que, em alternativa, propõe uma administração descentralizada e a “autonomia da escola”” (Lima, 2009, p. 235). Segundo António Teodoro a publicação desta Lei “permitiu fechar o ciclo da normalização da política educativa e abrir uma nova fase, centrada novamente no propósito de realizar a reforma educativa, enquanto transformação global (e coerente) do sistema de ensino, interrompida pela crise revolucionária de 1974- 1976” (Teodoro, 2001b, p. 399).

2.2- A Democratização das Escolas e a Reforma Educativa

A Lei n.º 46/86 pressupõe um reforço da democratização das escolas, com a adoção de estruturas e processos participativos na definição e desenvolvimento de políticas educativas, na administração escolar e nas práticas pedagógicas quotidianas, integrando todos os intervenientes nesse processo, com especial destaque para docentes, alunos e famílias, na medida que previa “descentralizar, desconcentrar e diversificar as estruturas e acções educativas de modo a proporcionar uma correcta adaptação às realidades, um elevado sentido de participação das populações” (Lei n.o 46/86, de 14 de

outubro, 1986, p. 3068). Com a Lei de Bases do Sistema Educativo o Estado propõe uma “administração descentralizada e a ‘autonomia da escola’” (Lima, 2009, p. 235, aspas no original), algo que iremos abordar num capítulo seguinte. Para António Teodoro “a larga base social e política de apoio à Lei de Bases do Sistema Educativo tornou-se o ponto de partida para a tentativa de construção de um consenso nacional em torno da reforma educativa [...] Finalmente, estava terminada a normalização da política educativa e reunidas todas as condições para realizar a reforma educativa” (2001, pp. 408–409, itálico no original).

30

Este enquadramento legislativo surge num período marcado pela integração na Europa comunitária e pela governação dos X31, XI32 e XII33 Governos Constitucionais, presididos por Aníbal Cavaco Silva, do Partido Social Democrata. Relativamente a esta reforma, entre 1985 e 1995, António Teodoro afirma que “através da reforma educativa, o sistema educativo é apresentado como estando a responder ao desafio da integração na CE e da construção do mercado único, dando o seu contributo à modernização da economia portuguesa através da qualificação dos recursos humanos” (1995, p. 67). De facto a competitividade, a eficácia e o rigor económico são apontados como os principais objetivos a atingir pelo país. Nesse sentido os discursos dos políticos sobre a educação, bem como as “novas ‘necessidades’ económicas exprimem, de facto, uma subordinação da política educativa às preocupações conjunturais das políticas industrial e económica e o consequente abandono de preocupações democratizantes” (Stoer et al., 1990, p. 2, aspas no original).

Segundo Almerindo Afonso (2000b) a reforma educativa levada a cabo neste espaço temporal assentou em diversas ambiguidades, na medida em que, as suas orientações assentavam em valores emergentes no pós-25 de abril de 1974, mas por outro lado estava condicionada à redefinição do papel de Portugal numa economia cada vez mais global e em particular na integração do país na Comunidade Europeia, que conduziram à integração de influências de cariz neoliberal. Assim, “a reforma educativa não é apenas associada ao projecto modernizador, como a sua suposta contribuição para a modernização do país é transformada na sua principal base de legitimação” (Afonso, 2000, p. 18).

A necessidade de aumentar os níveis educacionais do país passou a ser a principal prioridade e estratégia do sistema educativo, através da subordinação da educação a uma lógica gestionária, onde predominam os conceitos de responsabilização, otimização, racionalização, inovação, eficiência, eficácia, qualidade e avaliação. A este propósito Licínio Lima (1994, p. 122) enfatiza que estes conceitos são nucleares dos programas de modernização, onde é privilegiada a atividade económica assim como a organização produtiva, trazendo os ideaisdas empresas para o interior da administração pública. Nessa perspetiva “mesmo as empresas mal sucedidas constituem um bom exemplo, a reter, para as organizações públicas não produtivas, no sentido em que fica mais claro que quem não é eficaz não sobrevive” (Lima, 1994, p. 123). Esta visão “empresarial” da administração pública, e por conseguinte da educação, contrastava com a gestão democrática das escolas, visto neste momento como “lenta, irracional e corporativa, face à almejada modernização das instituições e da sua gestão” (Lima, 2009, p.

31 O X Governo Constitucional teve como Ministro da Educação e Cultura João de Deus Pinheiro (1985-1987).

32 No XI Governo Constitucional o Ministro da Educação foi Roberto Carneiro (1987-1991) que, segundo António Nóvoa (2002), marcou o seu mandato por romper com a tradição dos ministros minimizarem os problemas e as dificuldades. Pelo contrário Roberto Carneiro “rompe com esta tradição e, de forma corajosa, dirige-se ao país expondo a situação inaceitável do sistema de ensino. Na altura, a preocupação principal eram os índices altíssimos de “insucesso escolar” e o custo que representavam para o país” (Nóvoa, 2002, p. 241).

33 O XII Governo Constitucional (1991-1995) teve três Ministros da Educação: Diamantino Durão (1991-1992), António Couto dos Santos (1992-1993) e Manuela Ferreira Leite (1993-1995).

31

236). Estas características pejorativas da gestão democrática legitimavam a introdução de novos sistemas de governo, com maior grau de autonomia face ao poder central, mas orientados segundo padrões racionais de “cânone gerencial” (Lima, 2012a), inspirados no “novo gerencialismo” (Lima & Afonso, 2002) e “nova gestão pública” (Ferlie et al., 1996).

2.3- Da “Nova Gestão Pública” e “Novo Gerencialismo” à descentralização e modernização

A “nova gestão pública”, como modelo de gestão, é um conceito difícil de ser definido e surge como um desafio à administração pública tradicional. É um modelo de gestão que procura organizar e operacionalizar, de maneira diferente, a administração pública e os seus agentes, de maneira a melhorar o seu desempenho, aumentar a eficiência, aumentar a preocupação com os cidadãos, evitar o desperdício e definir e identificar competências e responsabilidades (Rodrigues & Araújo, 2005, p. 2).

A “nova gestão pública” baseia-se na introdução de mecanismos de mercado e na adoção de ferramentas de gestão privada, com o objetivo de solucionar os problemas de eficiência da gestão pública. No seu livro intitulado “Reinventing government – how the entrepreneurial spirit is transforming the public sector”, David Osborne e Ted Gaebler (1993) apresentam dez princípios para uma “nova gestão pública”, “not as the final word about reinvented government, but as a rough draft” (Osborne & Gaebler, 1993, p. XVII). Segundo os referidos autores, o modelo tradicional de administração pública (burocrático) funcionou, “not because it was efficient, but because it solved the basic problems people wanted solved” (Osborne & Gaebler, 1993, p. 14), na medida em que garantia segurança no emprego, estabilidade bem como um sentimento de justiça e equidade. David Osborne e Ted Gaebler consideram que um novo tipo de administração iria emergir e substituir omodelo burocrático, sistematizado por Max Weber (1978).

Em termos sintéticos podemos referir que os dez princípios propostos assentam na competição entre os prestadores de serviços públicos; transferência do controle das atividades para a comunidade; avaliação dos órgãos governamentais dando especial enfoque aos resultados e não aos processos; orientação por objetivos em vez de regras e regulamentos; redefinição dos utilizadores como clientes; pronta atuação na prevenção e resolução de problemas; prioridade ao investimento na produção dos recursos e não nos fatores; descentralização da autoridade; primazia aos mecanismos de mercado e conjugação dos setores público, privado e não-governamental (Osborne & Gaebler, 1993).

Apesar da prioridade dada às soluções de mercado e consequentemente às privatizações, reconhecem que a privatização é apenas uma das alternativas, nem sempre possível ou desejável. Mesmo valorizando a competição, destacam como principal problema o monopólio e não o caráter

32

público ou privado das organizações, na medida em que “the issue is not public versus private it is competition versus monopoly” (Osborne & Gaebler, 1993, p. 76). A questão da avaliação toma também para estes autores uma enorme preponderância, na medida em que a avaliação da eficiência não pode ser dissociada da avaliação da efetividade. Assim, se a eficiência mede o custo do que foi produzido, a efetividade mede a qualidade dos resultados (Osborne & Gaebler, 1993, pp. 351–352). Dessa forma, “when we measure effectiveness, we know whether our investment is worthwhile. There is nothing so foolish as to do more efficiently something that should no longer be done” (Osborne & Gaebler, 1993, p. 351). David Osborne e Ted Gaebler (1993) tentam definir a relação entre eficiência e efetividade a partir dos objetivos do governo, concluindo que “the public certainly wants efficient government, but it wants effective government even more” (Osborne & Gaebler, 1993, p. 352).

Alguns autores entendem prematuro considerar a “nova gestão pública” e o “novo gerencialismo” como um novo tipo ideal de administração (Abrucio, 1997). Ewan Ferlie, Lynn Ashburner, Louise Fitzgerald e Andrew Pettigrew (1996) apresentam a “nova gestão pública” como um sistema ideológico e para desenvolver a sua tese caraterizam quatro modelos que se apresentam como propostas de “tipo ideal” para melhor se compreender a evolução do conceito nas últimas décadas. Estes quatro modelos são apresentados de forma cronológica, desde a década de setenta, representando as diferentes fases de implementação do modelo na administração pública inglesa, em especial na área da saúde 34. Assim, os quatro modelos apresentados são: modelo 1, orientação/motivos para a eficiência; modelo 2, downsizing e descentralização; modelo 3, procura da excelência; modelo 4, orientação para o serviço público. Os três primeiros modelos correspondem a uma simples importação de métodos de gestão privada para o setor público, enquanto que o quarto modelo representa uma orientação mais específica para o serviço público. Segundo Rui Santiago, António Magalhães e Teresa Carvalho (2005, pp. 8–12) “as diferentes componentes destes quatro modelos têm um forte potencial heurístico para ajudar a balizar com mais precisão o campo político e institucional em que os elementos ideológicos, narrativos e práticos […] da nova gestão pública, podem ser inscritos” (Santiago et al., 2005, p. 9).

Lester Salamon (2000) enfatiza a necessidade de um novo paradigma que possa responder à emergência de novos instrumentos de ação pública, bem como das novas oportunidades para adaptar essa ação à natureza dos problemas públicos. Esse novo paradigma, designado como “New Governance” (Salamon, 2000) assenta em cinco conceitos chave: “tool, network, public & private, negotiation and persuasion, enablement skills” (Salamon, 2000, p. 1624). A mudança de ênfase público vs privado para público + privado é notória do ponto de vista da “New Governance”, representando uma oportunidade

34 Apesar de a maioria dos dados serem provenientes do setor da saúde, Ewan Ferlie, Lynn Ashburner, Louise Fitzgerald e Andrew Pettigrew (1996) também utilizam o setor público da educação no seu estudo.

33

colaborativa, na medida em que representa “a desirable byproduct of the important complementarities that exist among the sectors, complementarities that can be built upon to help solve public problems” (Salamon, 2000, p. 1633). Esta ênfase no público+privado nas estruturas de governação torna-se evidente na importância atribuída aos stakeholders35, “for a common end in a situation of interdependence” (Salamon, 2000, p. 1636). Apesar deste facto nem sempre os interesses externos convocam dimensões empresariais, podendo também tratar-se de representação de interesses culturais, sociais ou políticos.

Licínio Lima (1997) refere-se ao gerencialismo como sendo um modelo:

“sustentado por políticas públicas de inspiração neoconservadora e neoliberal que anunciam e concretizam cortes nas despesas públicas com a educação, assim apostando num aumento da qualidade através de ganhos de eficiência interna e do crescimento da produtividade das instituições, o modelo institucional gerencialista emerge vigorosamente, entre discursos políticos, atos legislativos, medidas aparentemente avulsas de administração e gestão, ganhando adeptos entre setores conservadores e tecnocráticos, […] e também mesmo no seio de alguns