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4 DIÁRIOS DE VIAGEM: AS NARRATIVAS DOS ENCONTROS DO

4.1 CONHECENDO UM POUCO SOBRE A GRÉCIA QUE QUEREMOS

4.2.8 Reiniciando o ciclo

O oitavo encontro ocorreu no dia 1 de agosto de 2017 quando, da escrita do projeto de pesquisa, estavam previstos oito encontros, e a dinâmica do campo requereu maior vínculo com os participantes. Havíamos programado que o oitavo encontro deveria ser na perspectiva da cogestão/coprodução do grupo, quando nos demos conta de que estávamos apenas reiniciando o ciclo para a imersão no participativo.

Iniciamos nosso encontro tratando justamente de compartilhar, em grande grupo, as narrativas do sexto e sétimo encontro. O foco maior destas narrativas foi a experiência da atividade física, realizada no encontro anterior. Todos os participantes reforçaram quão prazerosa fora a experiência. Alguns relataram ter sido o primeiro contato com uma academia

ou com diferentes opções para exercitar-se, ressaltando a importância de os participantes do grupo estarem juntos, motivando-se e apoiando-se em atividades coletivas.

Os participantes ficaram motivados com a possibilidade de aquela oferta ocorrer rotineiramente. Com isso, novamente, repensei o papel do pesquisador no campo e as limitações existentes. Eu não poderia dar continuidade ao grupo por muito tempo, esta não era a intenção. Por outro lado, estar implicado com o grupo, com os participantes e a saúde pública, fez-me pensar em como garantir a continuidade daquele espaço, e este assunto foi destacado neste encontro, o qual contou com 11 participantes.

Antes de abordarmos o aspecto da cogestão/coprodução, passamos para o segundo tema. No sexto encontro, ficamos com a responsabilidade de discutir algumas questões relacionadas ao uso do álcool associado à diabetes, por solicitação de um dos participantes. O debate foi enriquecedor, pois Patras faz uso do álcool e sempre o fez.

Referiu, no entanto, que os profissionais de saúde apenas proíbem o seu uso, não orientando adequadamente, mesmo sabendo que ele continuará utilizando. Neste ponto, o álcool foi entendido como algo que só deveria ser utilizado por quem estivesse com a diabetes controlada, e parece que isto motivou o participante a querer equilibrar ainda mais os índices glicêmicos.

Como estava previsto ser este o último encontro, adotamos uma metodologia de perguntas dentro de bexigas, a fim de que cada participante estourasse uma e respondesse o que ali era solicitado. A intenção era dar voz a todos, em um momento de transição do grupo.

As perguntas foram:

1) Algo mudou em relação à atividade física após você participar deste grupo? Relate. 2) Como é a sua rotina, atualmente, em relação à atividade física? Relate

3) Como eu passei a perceber a diabetes após participar deste grupo? Relate.

4) O que mudou em relação ao uso dos medicamentos após participar deste grupo? Relate. 5) O que eu gostaria que acontecesse com o grupo a partir de agora? Relate.

6) O que eu sei sobre os sinais que o corpo produz em relação à diabetes? Relate.

7) O que eu posso compartilhar sobre a diabetes que tenha aprendido com a vida? Relate. 8) O que mudou nas consultas após a minha participação neste grupo? Relate.

9) Como eu passei a me cuidar após participar deste grupo? Relate. 10) O que eu mais gostei neste grupo? Relate.

11) O que mudou na minha casa após participar do grupo? Como está minha relação com a família? Relate.

12) Quais as principais mudanças em meus hábitos de vida após participar deste grupo? Relate.

13) O que mudou em minha alimentação após participar deste grupo? Relate. 14) O que eu faço de diferente depois que estou participando deste grupo? Relate. 15) Como foi conviver e conhecer melhor a vida das pessoas deste grupo? Relate. 16) Após compreender como monitorar a glicose, algo mudou em minha vida? Relate.

Perguntamos quem gostaria de começar, e Véria, imediatamente, foi ao centro da roda, estourou a bexiga, e nós lemos a pergunta. A participante respondeu à pergunta, enquanto os demais complementaram a resposta.

Sucessivamente, cada um foi estourando a bexiga e respondendo à pergunta, sempre contando com a parceria dos demais. Heraklion aproximou-se, estourou, respondeu, e os colegas complementaram; então, foi a vez de Corfu; depois, Rhodes, até que todos estouraram e responderam.

Assim, aquele momento pareceu um “confessionário”. Muitas respostas em relação ao próprio grupo, com apontamentos positivos sobre as mudanças importantes na vida daquelas pessoas, após suas experiências em grupo. Aquilo, certamente, emocionou-me, por poder contribuir, através de uma pesquisa, para aquelas mudanças.

Existiam dezesseis bexigas, cada qual com uma pergunta. Como faltaram cinco participantes ao encontro, os participantes presentes decidiram estourar a bexiga em simbologia aos ausentes. Então, o participante escolhia a bexiga, falava em nome de quem estaria estourando, respondia à pergunta como se fosse para si, mas sempre fazia comentários do tipo “Pelo que eu já conheço de fulana, ela também pensaria assim” (RHODES). E, assim, ocorreu até estourarmos a última bexiga.

Foi um momento interessante, no qual foi possível de, principalmente, garantir voz individual em meio ao coletivo e perceber o quanto o grupo já se consolidava como apoio, inclusive em relação ao respeito à voz do outro, em meio a este espaço singular.

Como era de se esperar, a pergunta Nº 5 gerou um longo debate: “O que eu gostaria que acontecesse com o grupo a partir de agora? Relate”. Os participantes já haviam sinalizado, em outros encontros e no início deste, que desejavam a continuidade do grupo. “(...) em grupo, a gente já sanou muitas dúvidas, coisas que a gente não entendia passou a entender. O grupo nos fortalece mais, a gente tem mais vontade de (...) porque (...), individualmente, a gente fica “inventando” desculpas para não fazer nada e, no grupo, a gente se fortalece mais, um ajuda ao outro. Eu gostaria que continuasse, cada dia mais a gente vai aprendendo e vai melhorando nosso modo de vida” (PATRAS).

Mas, meu maior questionamento enquanto pesquisador era: como operacionalizar esta continuidade? Embora eu tivesse todo interesse e implicação em continuar com os encontros, naquele momento de mergulhar no texto da tese, seria complexo. No entanto, era nossa intenção provocar reflexões sobre a governabilidade do próprio grupo e sua cogestão. Por isso, questionei quanto ao fato de eles poderem manter o grupo, independente do pesquisador.

Naquele momento, surgiram comentários como o de Rhodes: “ninguém pode desistir, poderia ficar alguém te substituindo por enquanto”. Mas, quem? Como? Sugeriu-se, então, que algum membro da equipe pudesse dar continuidade ao grupo. No entanto, durante os diálogos, surgiu um comentário importante e, certamente, este era o que mais esperávamos do grupo:

“Querendo ou não, a gente pode firmar um compromisso aqui de continuar vindo. Vai ter alguém que venha?“ (PATRAS).

“A gente, em casa, também pode pesquisar alguma coisa, para se encontrar um com os outros... Se eles não podem estar vindo, nós assumiríamos a responsabilidade” (VÉRIA).

“Cada um de nós assumiria a responsabilidade de vir, seríamos nós os professores de nós mesmos, aí com certeza nós teríamos como manter o encontro. Mas, a gente tem de ter o compromisso de vir, independente se eles vão vir ou não, trocando experiência, a gente pode pesquisar e, com certeza, vamos conseguir continuar” (PATRAS).

Enquanto pesquisador, aqueles diálogos emocionavam-me, pois no oitavo encontro conseguíamos perceber o sentido de um grupo e o quão aquela intervenção havia me afetado , e afetado aos próprios participantes que, agora, enxergavam-se ainda mais enquanto grupo, assim como a necessidade de sua manutenção.

Obviamente, nem todos os comentários iam de acordo com o que parte do grupo propunha. Houve comentários como o de Meteora: “tem que ser uma pessoa que seja o cabeça” e o de Fira “eu ainda acho que tem que ser uma pessoa mais experiente que a gente” que nos provoca reflexões sobre hierarquia, poder e dependência.

Contudo, comecei a interferir na discussão para que pudéssemos sistematizar melhor as ideias. Coloquei-me à disposição para continuar comparecendo aos encontros, como uma forma de transição, até que o grupo pudesse seguir com mais autonomia. Afinal, este acompanhamento seria muito interessante para o estudo também, para compreender como o grupo continuou, no sentido da cogestão e, aqui, novamente, a questão do “campo enquanto ilha desconhecida” (SOUZA, 2003) e da necessidade de reposicionamento do pesquisador.

Propus que pudéssemos escolher um coordenador para o próximo encontro. Logo, citaram Patras. Provavelmente, por este ter sido o primeiro proponente da continuidade do grupo. Ele manifestou o aceite. Então, passamos a discutir sobre qual seria o tema do encontro, e a maioria sugeriu que poderia ser “cuidado com os pés”, tema não previsto anteriormente. E, assim, ficou pactuado.

Portanto, comprometi-me de contatar Patras, antecipadamente, para organizarmos juntos o momento. Estava ali, apenas iniciando a transição para a cogestão e, talvez, reiniciando o ciclo. Afinal, somos ou não seres inacabados? Como pensar a autonomia frente ao inacabado? Se somos inacabados, não há encerramento de ciclos, mas o reinício de outros. Assim sendo, encerramos nosso encontro às 17:00 horas, com a certeza de que ainda não era o fim de tantas narrativas além de que o ponto final, nem sempre, é necessário...

5 PREPARANDO O REGRESSO DA VIAGEM: OS TRÊS EIXOS TEMÁTICOS E A