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Relação entre liderança, cultura organizacional e gênero

2. A LIDERANÇA FEMININA NAS ORGANIZAÇÕES

2.2 Relação entre liderança, cultura organizacional e gênero

Pesquisar sobre o tema liderança deve necessariamente relacionar uma questão de alto impacto e relação que se trata da cultura organizacional que tem sido um campo vasto à teoria e à pesquisa.

Deal e Kennedy (1983, p. 501) definem de forma sucinta, simples e pratica a cultura organizacional, baseado em depoimentos de gestores: “É o jeito que nós fazemos as coisas por aqui”.

A partir da observação de como as atividades e comportamentos são realizados dentro da organização capta-se de uma forma prática o significado e compreensão da cultura.

A cultura organizacional é uma “programação coletiva da mente que distingue os membros de uma organização dos de outra” (HOFSTEDE,1997, p.210).

Entende-se cultura organizacional como o conjunto de pressupostos básicos que um determinado grupo inventou, descobriu ou desenvolveu ao aprender a lidar com os problemas de adaptação externa e de integração interna, e que funcionou bem o bastante para serem considerados válidos e ensinados aos novos membros como a forma correta de perceber, pensar e sentir em relação a esses problemas (SCHEIN, 1992, p.23).

Fleury (1987, p.10) apresenta o seguinte conceito:

A cultura, concebida como um conjunto de valores e crenças compartilhados pelos membros de uma organização, deve ser consistente com outras variáveis organizacionais como estrutura, tecnologia, estilo de liderança. Da consistência destes vários fatores depende o sucesso da organização.

Para Schein (1992) entre outros autores os fundadores e os principais líderes da empresa são os maiores influenciadores da cultura organizacional. Por deterem o poder máximo da empresa são aqueles que impõem crenças, valores, convicções, um jeito pessoal de fazer a empresa funcionar, definindo então o modelo de gestão predominante.

Líderes que seguem as pegadas dos fundadores comumente veem seu papel como o de mantenedores e reforçadores da cultura inicial (BRYMAN, 2012, p. 269).

Segundo Bryman (2012), o papel dos líderes e sua implicação na cultura precisavam ser problematizados, pois essa visão era simplista, em que os líderes eram tidos como construtores de culturas e sendo assim impactavam o pensamento e no comportamento dos membros da organização.

A liderança foi, aparentemente, marginalizada como foco de análise. Sugeriu-se que temas específicos de estudo poderiam ser os processos, pelos quais os líderes ditam os padrões, dentro dos quais os membros concebem as questões organizacionais, e como a cultura subjacente anula discursos alternativos e modela o pensamento. Quando tais temas foram levantados, mostrou-se que, mesmo quando a cultura – e a visão que a sustenta – é tratada como ceticismo, continua a ser importante na determinação da maneira como as pessoas apreendem as questões organizacionais (BRYMAN, 2012, p.274).

Outro importante problema, segundo Spector (2005), diz respeito às diferenças culturais na eficácia de comportamento dos diferentes líderes.

A maneira como os líderes são avaliados não é regra para todos os países. O que pode ser considerado como eficiência em determinado lugar poderá ter uma conotação negativa em outro. Seria ingênuo acreditar que há um modelo cartesiano que defina o que é ser um líder eficaz válido para todas as culturas, tanto considerando a geografia (países) ou diversidades organizacionais, desta forma uma “boa liderança” pode estar culturalmente definida.

[...] ser inteligente e confiável eram características vistas universalmente como positivas. Entretanto, ser individualista (concentrar-se em si mesmo e não nos outros) e desejar assumir riscos era visto de forma positiva em alguns países e de forma negativa em outros (SPECTOR, 2005, p. 525).

Hofstede (1991) apresenta que a questão cultural é complexa e apresenta várias dimensões de impacto, são elas: Distância Hierárquica, Coletivismo/Individualismo, Sociedades Femininas/Masculinas, Controle da Incerteza. No que tange ao tema desta pesquisa vale elucidar a dimensão que se refere as características culturais de sociedade femininas e sociedades masculinas, conceituadas por Hofstede (1991):

[...] serão ditas masculinas as sociedades onde os papeis são nitidamente diferenciados (o homem deve ser forte, impor-se e interessar-se pelo sucesso material, enquanto a mulher deve ser mais modesta, terna e preocupada com a qualidade de vida) (HOFSTEDE, 1991, p.103).

No Quadro 6 podemos observar as características e ou comportamentos esperados de cada gênero.

Quadro 6. Diferenças individuais entre sociedades femininas e masculinas

Sociedades femininas Sociedades masculinas

Valores dominantes: atenção e cuidado pelos outros.

Valores dominantes: o sucesso e o progresso material.

Homens e mulheres poder ser ternos Mulheres devem ser ternas e ocupar-se das relações.

Trabalhar para viver. Viver para trabalhar. Gestores apelam para a intuição e a

qualidade de vida no trabalho.

Gestores devem ser decisivos e auto afirmativos.

Acentua-se a igualdade, solidariedade e qualidade de vida no trabalho

Enfatiza-se a competição entre colegas e o desempenho.

Conflitos são resolvidos por meio de negociação e compromisso.

Conflitos são resolvidos por meio de confronto.

Todos devem ser modestos. Homens mostram autoconfiança, ambição e dureza.

Importância das pessoas e relações calorosas.

Importância do dinheiro e dos bens.

Para Bryman (2012), as organizações modernas apresentam uma vasta complexidade e heterogeneidade e tende a apresentar culturas cujos elementos não contribuem mais na formação de valor que agreguem “significado”, característica fortemente atribuída por gerações anteriores de pesquisadores de cultura.

Muitas foram as mudanças que impactaram no ambiente organizacional tais como a evolução tecnológica, processo de globalização e novos modelos de gestão e diversas empresas flexibilizaram suas ações engendrando esforços no sentido de valorizar a diversidade na formação e composição de suas equipes e líderes.

As mudanças dos valores e das normas que regem as condutas dos indivíduos e da sociedade estão favorecendo e contribuindo com o progresso no desenvolvimento da diversidade nas organizações (BARBOSA, 2012, p.17).

Dubrin (2006) afirma que são diversas as diferenças entre os colaboradores conforme experiência ou características demográficas, podendo em certos momentos afetar o comportamento e, consequentemente, seu desempenho.

As fontes-chave da diversidade demográfica incluem gênero, idade, raça, etnia e deficiências físicas. [...] compreender as diferenças demográficas entre os funcionários pode ajudar o gerente a capitalizar a diversidade e evitar estereótipos negativos (DUBRIN, 2006, p.27).

Os valores culturais de uma organização são moldados por aqueles que a controlam, a estes princípios básicos fornecem um bom senso de direcionamento a todos os funcionários. Os valores moldam o sistema de crenças básicas usado para guiar as atividades de uma organização, para estabelecer metas e determinar padrões adequados de comportamento (LODEN, 1988, p.29).

Homens e mulheres passam a ser rotulados pela cultura e pela sociedade, na definição de papéis e comportamentos esperados definidos por questões de ordem biológica. Quando se analisa o cenário organizacional, a questão da habilidade e as diferenças de competência no desempenho da função deveria ter maior relevância na disputa entre cargos e avaliação no processo de seleção, bem mais que os aspectos biológicos.

“[...] os debates hoje acalorados sobre qualificação/competência deveriam levar em conta a diversidade real (por exemplo, a diferença homens/mulheres; ou as diferenças entre países desenvolvidos/em desenvolvimento)” (HIRATA, 1997, p.31).

Antes de se discutir as problemáticas relacionadas aos estereótipos sociais e organizacionais de gênero, é necessário elucidar a diferenciação entre gênero (masculino e feminino) e sexo (homem/mulher).

Para Giddens (2005), o sexo é relacionado a parte física que define as características genéticas e anatomofisiológicas dos seres humanos e gênero está relacionado a construção social do sexo, advindo das Ciências Sociais nos anos 70.

Mais tarde, a teorização distinguiu objetivamente que o sexo é aquele biologicamente definido e gênero é aquele que foi sociologicamente construído, ou seja, um produto da socialização e vivência (CALÁS; SMIRCICH, 2014, p.274).

Segundo Scott (1990), por ser o gênero um elemento constituído pelas relações sociais tratar esse assunto significa falar em diferenças de atributos sociais masculinos e femininos, não apenas os reportando a questões biológicas, mas sim baseadas nas diferenças perceptíveis entre homem e mulher.

O gênero está de acordo com as imagens do que cada um deve ser construído em cada sociedade e em cada época (STREY, 1998, p.183).

Vários autores discutem que a problemática relacionada ao gênero está embasada no sistema patriarcal, onde encontramos a valorização dos homens, em detrimento as mulheres, que é transmitida de geração em geração, delimitando-se os papéis definidos pela própria sociedade.

Os estereótipos de gênero são frequentemente definidos como o conjunto de crenças estruturadas acerca dos comportamentos e características particulares do homem e da mulher (SANTOS; ANTUNES, 2013, p.41).

Para Mendell (1997), na fase adulta homens e mulheres expressam uma visão de mundo, de acordo com as concepções construídas desde a infância.

Para os homens, o mundo gira em torno de ações e dos resultados dessas ações. Os relacionamentos, em si e por si, não são importantes. O que importa é como esses relacionamentos afetam os resultados (MENDELL, 1997, p.29).

Enquanto para as mulheres:

[...] o mundo gira em torno de pessoas e relacionamentos. Elas aprendem a ser sensíveis às relações entre pessoas e a prezar e manter esses relacionamentos [...] estão conscientes de como os seus atos afetam outras pessoas (MENDELL, 1997, p.28).

A definição do estereótipo do comportamento masculino traça características como agressividade, decisão estratégica, racionalidade, analise crítica, enquanto que o feminino apresenta características como a bondade, carinho, delicadeza, atenção e relacionamento interpessoal.

No âmbito organizacional, analisando especificamente os cargos de liderança, essas definições permanecem, mas serão impactadas por outros fatores.

Primeiro, em um ambiente organizacional, existem limitações e exigências ambientais que podem forçar supervisores homens e mulheres a adotar estilos parecidos. Segundo, as organizações podem selecionar mulheres que tenham estilos de liderança parecidos com os dos homens (SPECTOR, 2005, p.524).

Conforme Spector (2005), os estilos de liderança entre os gêneros são diferentes, sugerindo que as mulheres são mais voltadas aos sentimentos e o bem- estar emocional de seus liderados (consideração), enquanto os homens voltados com a conclusão das tarefas, ou seja, foco em resultados (estrutura de iniciação).

Nas organizações e nas relações de trabalho, masculinidade é definida em termos de controle, desempenho e intenções instrumentais, enquanto feminilidade se associa a “qualidades softs” como as atitudes de colaboração e de suporte (FOURNIER; SMITH, 2006).

Dubrin (2006, p. 289) compartilha deste pensamento:

Vários pesquisadores afirmam que as mulheres apresentam certos traços e comportamentos adquiridos que as capacitam para a liderança volta para o relacionamento. [...] as mulheres líderes apresentam com mais frequência um estilo cooperativo, de empoderamento, que inclui cuidar dos membros da equipe. [...] tem uma tendência maior do que os homens de elogiar os integrantes do grupo e, mais frequentemente, suavizam a crítica com pequenas doses de elogio.

De acordo com a mesma perspectiva, os homens se inclinam mais para um estilo de liderança de comando e controle, militarista (DUBRIN, 2006, p.289).

Até que ponto esses estereótipos de homens e mulheres são verdadeiros é de difícil julgamento. Uma questão mais importante diz respeito ao modo como capitalizar sobre as tendências masculinas e femininas de liderança. Connie Glaser acredita que a melhor forma de liderança tira vantagem dos traços positivos considerando homens e mulheres. Ela vê um novo estilo de gerenciamento que combina os lados masculinos e femininos (DUBRIN, 2006, p.290).

Para os estilos de liderança relacionados ao gênero os homens apresentam um comportamento mais autocrático em contraposição das mulheres onde predomina a democracia.

Cada empresa seleciona os administradores com base em critérios próprios. Durante suas práticas gerenciais, a capacidade de liderança pode ou não se revelar (NOGUEIRA, 2007, p.145).

No mundo do trabalho, as mulheres têm se transformado em novos atores sociais que buscam não só a igualdade entre os sexos, mas também a transformação da ordem social e do sistema político, fazendo com que o espaço laboral passe a ser um campo de disputas acirradas, de lutas por condições igualitárias para assumirem cargos e posições hierárquicas e para ganhar destaque e reconhecimento profissional (SANTOS; ANTUNES, 2013, p.42).

E assim [...] para se manterem no jogo, as mulheres se “masculinizam” e, ao fazê-lo, são criticadas por “tentar desempenhar um papel de homem” (MOTTA, 2000, p.10).

Mas também podemos notar que a discriminação se mantém para as executivas que se comportem com traços masculinos na liderança.

Para Mill (2006), a natureza instrumental dos negócios reforça as desigualdades de gênero, por imporem uma forte diferenciação entre o mundo do trabalho e o mundo da vida privada [...] tudo o que se desvie da relação de sujeição das mulheres aos homens passa a ser visto como uma anormalidade.

Motta (2000) apresenta que existe uma vantagem na maioria das organizações para os homens que se identificam com os estereótipos masculinos tradicionais, sendo que o mesmo não se aplica as mulheres que ainda se deparam com várias dificuldades na ascensão da carreira.

Munhoz (2000) afirma em sua pesquisa ter notado uma grande variedade de literatura voltadas as mulheres que buscam desenvolvimento e ascensão na carreira profissional na área de negócios. Em geral objetivam oferecer diretrizes e aconselhamentos do comportamento adequado para um crescimento mais ágil e com melhor adaptabilidade nestas organizações que como tradição predomina a cultura masculina.

A maioria dos conselhos é emitida para minimizar as diferenças entre homens e mulheres. [...] sugerem que as mulheres tenham mais estratégia, sejam mais

agressivas e competitivas [...] as mulheres querem progredir no ambiente profissional, devem mudar (MUNHOZ, 2000, p.172).

Muraro (1990) comenta que muitas mulheres acreditam na conquista do sucesso profissional, e para atingir este objetivo optam por mudar seus comportamentos, adotando posturas inspiradas em modelos masculinos, isto é, tentam agir com maior assertividade, agressividade, deixando-se levar pela competitividade, deixando para trás as características de cooperação e solidariedade no domínio privado.

Querer fazer as mesmas coisas que faz o homem e do mesmo modo é substituir uma dominação por outra. A mulher tem que viver primeiro, profundamente, as características que lhe são próprias, e isso de modo maior, maduro, consequente e em todos os planos: nas ciências, nas técnicas, no trabalho manual, no campo, em casa (MORAIS et al., 2007, p.5).

Vale ressaltar que diante deste contexto não se pretende aqui reforçar ou defender um ou outro comportamento como correto e/ou adequado, mas sim ampliar a visão sobre as situações e ambientes vivenciados pelos gêneros na organização e na liderança.

Kark (2004) apresenta uma possível solução e complementaridade de características quando se refere a gestão andrógina, uma alternativa de igualdade para homens e mulheres em relação as oportunidades para se tornarem e crescerem como líderes. O estilo andrógino de gestão pode ser considerado, no que diz respeito ao papel social do gênero, uma mudança cultural e de comportamento.

Para Loden (1988), ao contrário de se definir objetivos inatingíveis para si mesmos, ao tentarem se tornar executivos andróginos, os homens e mulheres se potencializam e reconhecessem seus próprios estilos, diferenças e similaridades entre si.

Cada um com seu estilo, concentrando-se nos pontos fortes que a natureza lhe deu. É lógico que isso não pode ser encarado de modo absoluto. Há muitos homens emotivos e mulheres cartesianas. Há homens que comandam com brandura e mulheres que dão ordens como tiranas. Há homens com características femininas e mulheres com um pronunciado lado masculino. Há homens tímidos e mulheres dominadoras. Isso tudo é verdade, mas não invalida o fato de que, sim, há diferenças e elas podem e devem ser complementares (SOMOGGI, 2000, p.14).

Administrar a diversidade de gênero permite, a todos os empreendedores, alcançar o largo espectro de habilidades necessário ao desenvolvimento dos negócios, [...] cada gênero traz contribuições significativas (MUNHOZ, 2000, p.174).