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Repressão Política e Controle Social na Revolução Industrial 

Introdução à Parte II: Exploração e os Meios Políticos 

C.  Repressão Política e Controle Social na Revolução Industrial 

 

Mesmo após a expropriação de sua terra, a classe trabalhadora não estava        suficientemente impotente. O estado ainda tinha que regular o movimento do trabalho, servir        como um intercâmbio do trabalho em favor dos capitalistas, e manter a ordem. E historicamente,        esta função era mais vital quando o poder de barganha do trabalho ameaçava aumentar:        "​podia­se esperar que os esforços do Estado em uma sociedade capitalista para controlar os                            salários e para restringir a liberdade de movimentação do trabalhador seriam maiores quando a                            reserva de trabalho estivesse esgotada do quando ela estivesse inchada​                  "​65​. Thorold Rogers     

descreveu a lei a partir do período Tudor até a revogação dos Atos das Associações​                            NT25 em 

1824, como   

uma conspiração... para enganar o trabalhador inglês sobre seus salários, para atá­lo ao                          solo, para privá­lo de esperança, e para degradá­lo à pobreza irremediável... Por mais                          de dois séculos e meio, a lei inglesa e aqueles que administraram a lei estavam                              engajados em triturar o trabalhador inglês à mais baixa insignificância, em erradicar toda                          expressão ou ato que indicasse qualquer descontentamento organizado e em multiplicar                      as penalidades sobre ele quando ele pensasse sobre seus direitos naturais.​66 

 

Como vimos anteriormente, a liquidação do sistema da Igreja de assistência aos pobres        deixou um vazio a ser preenchido pela dura regulamentação da classe trabalhadora pelo estado        Tudor. O ato de Henry VIII em 1530 lincenciou pedintes que eram velhos ou enfermos,        enquanto previa o chicoteamento e aprisionamento de "vagabundos fortes o suficiente para        trabalhar". O Ato 27 de Henry VIII reforçava o estatuto com corte de orelha para segundas        infrações, e execução para terceiras. O Ato I de Edward VI (1547) condenava qualquer um que        se recusasse trabalho como sendo um escravo para quem quer que o denunciasse. O ato de        1572 de Elizabeth I prescrevia a execução de pedintes não licenciados na segunda infração, ao        menos que alguém os "levasse em serviço". Os estatutos só foram revogados ao final do        século XVI, pelo Ato 12 de Anne, cap. 23, quanto eles haviam feito seu trabalho. "​       Desta maneira    as pessoas agrícolas foram primeiro forçosamente expropriadas do solo, expulsas de suas                        casas, transformadas em vagabundos e então chicoteadas, marcadas, torturadas por leis                      grotescamente terríveis, até que tivessem a disciplina necessária para o sistema de salários​"​67​

 

A revogação da Rainha Anne da legislação Tudor não pôs, de maneira alguma, um fim à        regulamentação imposta pelo estado do movimento da classe trabalhadora. As leis de        assentamento​NT26 haviam sido criadas nesse meio tempo, e foram mais tarde suplementadas                     

pelas Leis das Associações e pelo estado policial de Pitt​                  NT27​. O governo continuou a estabelecer           

salários máximos também.   

O Ato de Assentamento data de 1662. Tinha havido uma boa quantidade de        movimentação da classe inferior durante o Interregno, caracterizada pela tendência das        "​pessoas pobres... de se assentarem naquelas paróquias em que há o melhor estoque, as                           

maiores terras comuns ou baldias para construir casas e os maiores bosques para eles                            queimarem ou destruírem​    ". Como essa citação do preâmbulo poderia sugerir, o Ato tinha a        intenção de remediar tal mobilidade excessiva. Sob seus termos, dois juízes de paz em cada        condado tinham poderes para expulsar qualquer recém­chegado a uma paróquia sem recursos        independentes, e para devolvê­lo a sua paróquia de origem. A legislação era explicitamente        direcionada contra camponeses e ocupadores​        NT28 nas terras comuns, e foi evidentemente           

seguida "​pela destruição das casas erguidas nos tempos livres do interregno​"​68​

 

Em uma citação anteriormente neste capítulo, Marx se referiu às "leis dos        assentamentos" como análogas ao "édito de Tartar Boris Godunov" em seus efeitos sobre a        população trabalhadora inglesa. Tivesse ele estado mais familiarizado com os eventos nos        Estados Unidos à época em que escreveu, ele poderia ter se referido aos Códigos Negros​                            NT29 

como uma analogia melhor. Tivesse ele vivido até o século XX, ele poderia ter citado os        sistemas de passaportes internos da África do Sul ou da União Soviética. Os controles do        estado britânico sobre a movimentação da população durante a Revolução Industrial eram um        sistema de controle totalitário comparável a todos estes. 

 

Sob as Leis dos Pobres​        NT30   e as Leis dos Assentamentos, um membro da classe               

trabalhadora inglesa estava restrito à paróquia de seu nascimento, ao menos que um oficial de        outra paróquia o concedesse uma autorização para residir lá. O estado mantinha a disciplina de        trabalho impedindo os trabalhadores de votar com seus pés. Era difícil persuadir as autoridades        paroquiais a conceder a um homem um certificado lhe dando o direito de se mudar para outra        paróquia para buscar trabalho. Mesmo na rara ocasião em que tal certificado era concedido,        equivalia a um sistema de peonagem em que a residência contínua do trabalhador na nova        paróquia estava condicionada à manutenção da boa vontade de seu empregador. Os        trabalhadores eram forçados a ficarem quietos e a venderem seu trabalho num mercado de        compradores. Adam Smith ousou dizer que havia "​      raramente um homem pobre de quarenta            anos na Inglaterra... que não tenha em alguma parte da sua vida se sentido oprimido da maneira                                  mais cruel por esta mal­planejada lei dos assentamentos​"​69​

 

À primeira vista, isto pareceria também ser inconveniente para os empregadores em        paróquia com uma escassez de trabalho.​          70 As fábricas eram construídas em fontes de energia               

hidráulica, geralmente distantes de centros de população. Eram necessários milhares de        trabalhadores a serem importados de longe. Mas o estado resolveu o problema colocando a si        mesmo como intermediário, e fornecendo às paróquias pobres de trabalho um excedente barato        de trabalho de outros lugares, privando os trabalhadores da capacidade de barganhar por        melhores termos por si próprios. Esta prática equivaleu, em praticamente todos o sentidos do        termo, a um mercado de escravos: 

 

Sem dúvida, em certas épocas de atividade febril, o mercado de trabalho                        demonstra lacunas significantes. Em 1834, por exemplo. Mas então os fabricantes                      propuseram aos Comissários da Lei dos Pobres que eles deveriam mandar a                        "população excedente" dos distritos agrícolas para o norte, com a explicação de "que os                           

fabricantes a absorveriam e a esgotariam". "Agentes eram apontados com o                      consentimento dos Comissários da Lei dos Pobres... Um escritório foi estabelecido em                        Manchester, ao qual listas eram enviadas daqueles trabalhadores nos distritos agrícolas                      que desejavam emprego, e seus nomes eram registrados em livros. Os fabricantes                        compareciam a estes escritórios e selecionavam tais pessoas como escolhessem;                    ...eles davam instruções para tê­las despachadas a Manchester, e elas eram enviadas,                        etiquetadas como fardos de mercadorias, através de canais, ou com transportadores,                      outras vagando pela estrada, e muitas delas eram encontradas no caminho perdidas e                          quase mortas de fome. Este sistema havia crescido até se tornar um comércio regular.                            Esta Casa dificilmente acreditará, mas eu os direi que este tráfico de carne humana era                              tão bem mantido, elas eram tão normalmente vendidas a estes... fabricantes quanto                        escravos são vendidos ao algodão cultivado nos Estados Unidos".​71 

 

Aí está: o estado Tudor sem os chicoteamentos, cortes de orelha e execuções; os Códigos        Negros sem os linchamentos. 

 

Crianças trabalhadoras, que não estavam em nenhuma posição para barganhar em todo        caso, eram uma mercadoria popular nestes mercados de escravos pobres. De acordo com        John Fielden ("The Curse of the Factory System", 1836). 

 

Nos condados de Derbyshire, Nottinghamshire, e mais particularmente em                  Lancashire, as máquinas recentemente inventadas eram usadas em grandes fábricas                    construídas às margens de córregos capazes de girar a roda d'água. Milhares de mãos                            foram repentinamente necessárias neste lugares, afastados das cidades... Os dedos                    pequenos e ágeis de criancinhas sendo de muito longe os mais necessários,                        instantaneamente surgiu o costume de se obter ​             aprendizes vindos das casas de          trabalho​NT31​ paroquiais de Londres, Birmingham, e outros lugares.​72 

 

A ajuda "​    raramente era conferida sem a paróquia reivindicar o direito exclusivo de                      dispor, ao seu bel prazer, de todas as crianças da pessoa recebendo a ajuda​                          ", de acordo com o          Comitê sobre Aprendizes Paroquiais, 1815.​        73 Frances Trollope estimou que 200.000 crianças,           

no total, foram forçadas ao trabalho fabril.​            74 Mesmo quando os comissários da Lei dos Pobres               

encorajavam a migração para paróquias pobres em trabalho, eles desencorajavam os homens        adultos e a "[p]​      referência era dada às 'viúvas com grandes famílias de crianças ou artesãos...                        com grandes famílias'​    ". Além disso, a disponibilidade de trabalho barato através dos        comissários da lei dos pobres era deliberadamente usada para deprimir os salários; fazendeiros        demitiam seus próprios diaristas e em vez disso solicitavam ajuda aos superintendentes.​75 

 

Embora as Leis das Associações teoricamente se aplicassem aos mestres assim como        aos operários, na prática elas eram impostas apenas contra os últimos.​                    76 "Um Trabalhador   

Fiador de Algodão"­­um panfletista citado por E. P. Thompson​                77​­­descrevia "​  uma abominável   

combinação existente entre os mestres​        ", na qual os trabalhadores que haviam deixado seus        mestres por causa de discordâncias sobre salários eram efetivamente colocados na lista negra.       

As Leis das Associações exigiam que os suspeitos respondessem a interrogatórios sob        juramento, autorizava os magistrados a dar julgamento sumário, e permitia o confisco sumário        de fundos acumulados para ajudar as famílias dos grevistas.​                76 Em outras palavras, os       

trabalhadores sujeitos aos magistrados da Lei das Associações eram privados de todas as        proteções de devido processo do direito comum. Os trabalhadores, longe de possuírem os        muito proclamados "direitos do homem inglês", eram jogados em cortes de prerrogativa tão        arbitrárias quanto a ​Star Chamber​NT32​

 

Ao mesmo tempo, as leis estabelecendo as taxas máximas de pagamento equivaliam a        um sistema estatal forçado de combinação para os mestres. Nas palavras imortais de Adam        Smith, "[q]​  uando quer que a legislatura tente regular as diferenças entre mestres e seus                          trabalhadores, seus conselheiros são sempre os mestres​"​79​

 

No meio do século XIX, um examinador superficial poderia concluir, as reformas        "progressistas" do estado finalmente começaram a remediar todos estes males. Mas como os        historiadores do liberalismo social corporativo nos mostraram a respeito das reformas        "progressistas" do século XX, estas "reformas" foram, na verdade, empreendidas no interesse        da classe dominante. Seu efeito atenuante sobre as condições de trabalho, na medida real mas        limitada em que elas ocorreram, foram um efeito colateral de seu propósito principal de        aumentar a estabilidade política e de colocar a classe trabalhadora sob um controle social mais        efetivo.​80 

 

A respeito da legislação do dia de dez horas, por exemplo, Marx a descreveu como uma        tentativa dos capitalistas de regular a "​      ganância por trabalho excedente​      "; elas serviam para        regular a economia no interesse da classe capitalista como um todo, de uma maneira que só        poderia ser realizada agindo através do estado. Com a concorrência não limitada pelo estado, a        questão das condições de trabalho apresentam um dilema do prisioneiro para o capitalista        individual; é do interesse da classe capitalista como um todo que a exploração do trabalho seja        mantida em níveis sustentáveis, mas é do interesse do capitalista individual ganhar uma        vantagem imediata sobre a concorrência usando sua própria força de trabalho até o ponto de        ruptura. Como veremos no Capítulo 6 adiante sobre a ascensão do capitalismo monopolista, o        real efeito de tais regulamentações é coordenar as práticas de trabalho através de um cartel        imposto pelo estado, de maneira que estas práticas não mais sejam uma questão de        concorrência entre as firmas. 

 

Estes atos refreiam a paixão do capital por uma drenagem ilimitada da força de trabalho,                              ao forçosamente limitar o dia de trabalho através de regulamentações estatais, feitas por                          um estado que é governado pelo capitalista e pelo senhorio. Afora o movimento da                            classe trabalhadora que diariamente se tornava mais ameaçador, a limitação do trabalho                        fabril era ditada pela mesma necessidade que espalhou guano sobre os campos                        ingleses.​81 

 

Staffordshire, incluindo Josiah Wedgwood​      NT33​, peticionando o Parlamento em 1863 por "​              algum 

decreto legislativo​  "; a razão era que a concorrência prevenia os capitalistas individuais de        voluntariamente limitar o tempo de trabalho das crianças, etc., tão benéfico quanto fosse para        eles coletivamente: "​    Tanto quanto deploremos os males antes mencionados, não seria possível                    previni­los através de qualquer esquema de acordo entre os fabricantes... Levando todos estes                          ponto em consideração, chegamos à convicção que algum decreto legislativo é necessário​                      ".  Tentativas por parte dos empregadores de limitar o dia de trabalho voluntariamente para nove        ou dez horas, em seu interesse coletivo, sempre chegavam a nada porque o empregador        individual achava do seu interesse violar o acordo.​82 

 

Quanto aos sindicatos: mesmo após as Leis das Associações terem sido revogadas em        1825, a posição dos trabalhadores era diferente daquele dos mestres em relação ao contrato.        "​As provisões dos estatutos trabalhistas quanto aos contratos entre mestres e operários,                        quanto a notificação e afins, que apenas permitem uma ação civil contra o mestre que quebre o                                  contrato, mas, ao contrário, permitem uma ação criminal contra o operário que quebre o                            contrato, estão até esta hora (1873) em pleno vigor​"​83​

 

Em 1871, os sindicatos foram oficialmente reconhecidos por Ato do Parlamento. Mas        outro ato da mesma data (o Ato para emendar a Legislação Penal relativa à Violência, às        Ameaças e ao Molestamento)​      NT34 teve o efeito de que "​         os meios que os trabalhadores poderiam           

usar em uma greve ou ​         lock­out​NT35 foram retirados das leis comuns a todos os cidadãos e                   

colocados sob uma legislação penal de exceção, a interpretação da qual cabia sobre os                            próprios mestres, em sua qualidade de juízes de paz​                "​84​. Assim, o estado ao mesmo tempo             

permitiu a negociação coletiva e proibiu a negociação coletiva fora das avenidas prescritas e        reguladas pelo estado. Da mesma maneira, a grande "vitória do trabalho" do Wagner Act​                          NT36   foi

seguida, em pouco tempo, pelo Taft­Hartley​          NT37​, que criminalizou a maioria das táticas pelas               

quais as vitórias do CIO​        NT38 no começo dos anos trinta foram ganhas independentemente do                 

estado. E, no processo, como Hilaire Belloc tão brilhantemente explicou, para o trabalhador, o        contrato foi substituído pelo status­­um passo na retrógrada grande marcha em direção à        servilização industrial da população assalariada.​        85 Vale a pena citar novamente um comentário             

de Adam Smith um século mais cedo: "​      Quando quer que a legislatura tente regular as                diferenças entre mestres e seus operários, seus conselheiros são sempre os mestres​"​86​

 

O estilo de vida da classe trabalhadora sub o sistema fabril, com suas novas formas de        controle social, era uma quebra radical com o passado. Ele envolvia uma drástica perda de        controle sobre seu próprio trabalho. O calendário de trabalho do século XVII ainda tinha sido        fortemente influenciado pelo costume medieval. Embora houvessem surtos de trabalho árduo        entre a plantação e a colheira, períodos intermitentes de trabalho leve e a proliferação de dias        santos se combinaram para reduzir a média de tempo de trabalho bem abaixo daquela de        nossos próprios dias. E o ritmo de trabalho era geralmente determinado pelo sol e pelos ritmos        biológicos do trabalhador, que levantava após uma noite decente de sono, e se sentava para        descansar quando tinha vontade. O camponês que tinha acesso à terra comum, mesmo        quando queria uma renda extra do trabalho assalariado, poderia aceitar trabalho de forma       

ocasional e então voltar a trabalhar para si mesmo. Isto era um grau inaceitável de        independência, de um ponto de vista capitalista. 

 

No mundo moderno, a maioria das pessoas tem que se adaptar a algum tipo de                              disciplina, e observar os horários de outras pessoas, ...ou trabalhar sob as ordens de                            outras pessoas, mas temos que lembrar que a população que foi arremessada no ritmo                            brutal da fábrica havia ganhado sua vida em relativa liberdade, e que a disciplina das                              primeiras fábricas era particularmente selvagem... Nenhum economista da época, ao                    estimar os ganhos ou perdas do emprego fabril, jamais admitiu a tensão e a violência                              que um homem sofria em seus sentimentos quando ele passava de uma vida em que ele                                podia fumar ou comer, ou cavar ou dormir como lhe aprouvesse, para uma em que                              alguém virava a chave sobre ele e por quatorze horas ele não tinha sequer o direito de                                  assoviar. Era como entrar na vida sem ar e sem riso de uma prisão.​87 

 

Como Oppenheimer sugeriu na citação anteriormente neste capítulo, o sistema fabril não        poderia ter sido imposto sobre os trabalhadores sem primeiro ter­se lhes privado das        alternativas, e forçosamente lhes negado o acesso a qualquer fonte de independência        econômica. Nenhum ser humano intacto, com um senso de liberdade e dignidade, teria se        submetido à disciplina da fábrica. Steven Marglin comparava a fábrica têxtil do século XIX,        formada por crianças pobres compradas no mercado de escravos das casas de trabalho, às        fábricas Romanas de tijolos e cerâmica que eram operadas por escravos. Em Roma, a        produção fabril era incomum nas manufaturas dominadas por homens livre. O sistema fabril,        através da história, tem sido possível apenas com uma força de trabalho privada de qualquer        alternativa viável. 

 

Os fatos sobreviventes... fortemente sugerem que se o trabalho era organizado                      ao longo de linhas de fábrica era, em tempos Romanos, determinado não por                          considerações tecnológicas, mas pelo poder relativo das duas classes produtoras.                    Homens livres e cidadãos tinham poder o suficiente para manter uma organização de                          guilda. Os escravos não tinha poder algum­­e acabavam nas fábricas.​88 

 

O problema com o velho sistema de "doméstico"​              NT39​, em que os trabalhadores         

camponeses produziam têxteis em regime contratual, era que ele eliminava apenas o controle        do trabalhador sobre o produto. O sistema fabril, ao também eliminar o controle do trabalhador        sobre o processo de produção, introduziu as vantagens adicionais da disciplina e da        supervisão, com os trabalhadores organizados sob um fiscal. 

 

...a origem e o sucesso da fábrica jaziam não na superioridade tecnológica, mas na                            substituição do controle do trabalhador pelo do capitalista sobre o processo e sobre a                            quantidade de produção, na mudança da escolha do operário de uma sobre quanto                          trabalhar e produzir, baseada em suas preferências por lazer e bens, para uma sobre                            trabalhar ou não absolutamente, que, claro, dificilmente é muito uma escolha.​89 

Marglin tomou o clássico exemplo de Adam Smith da divisão do trabalho na fabricação        de alfinetes, e o virou de ponta­cabeça. A maior eficiência resultava não da divisão do trabalho        como tal, mas da divisão e sequenciamento do processo em tarefas separadas a fim de reduzir        o tempo de montagem. Isto poderia ter sido realizado por um único trabalhador camponês        separando as várias tarefas e então efetuando­as sequencialmente (isto é, esticando o fio para        toda uma operação de produção, depois endireitando­o, depois cortando­o, etc.). 

 

sem a especialização, o capitalista não tinha qualquer papel essencial a desempenhar                        no processo de produção. Se cada produtor pudesse ele mesmo integrar as tarefas                          componentes da manufatura de alfinetes em um produto comercializável, ele logo teria                        descoberto que ele não tinha nenhuma necessidade de lidar com o mercado de alfinetes                            através da intermediação do botador para fora. Ele poderia vender diretamente e se                          apropriar para si mesmo do lucro que o capitalista derivava da mediação entre o                            produtor e o mercado.​90 

 

Este princípio está no centro da história da tecnologia industrial pelos últimos duzentos        anos. Mesmo dada a necessidade de fábricas para algumas formas de manufatura em larga        escala e intensivas em capital, normalmente há uma escolha entre tecnologias produtivas        alternativas dentro da fábrica. A indústria tem consistentemente escolhido tecnologias que        desqualificam os trabalhadores e deslocam a tomada de decisão para cima na hierarquia        gerencial. Já em 1835, o Dr. Andrew Ure (o pai ideológico do Taylorismo), argumentava que        quanto mais qualificado o trabalhador, "​      mais obstinado e... um componente menos adaptado de                um sistema mecânico​    " ele se tornava. A solução era eliminar processos que exigiam "​       destreza  e firmeza peculiares da mão... do ardiloso operário​              " e substituí­los por um "​      mecanismo tão