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CAPÍTULO III A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE

3.1 RESILIÊNCIA: da origem do termo a sua incorporação à bibliografia que trata do desenvolvimento regional

3.1.3 Resiliência no Espaço Rural

Como vimos, a noção de resiliência tem sido adaptada e incorporada em diferentes áreas da ciência através de um processo repleto de indefinições. Contudo, uma vez superada a efervescência inicial é natural que o novo conceito passe a ser lapidado pelos diferentes campos da ciência na qual foi introduzido. Fato que vem ocorrendo com a resiliência no desenvolvimento regional. Neste processo, as regiões industrializadas foram as primeiras a serem estudas. Em geral, os trabalhos que envolviam estudos de caso se dedicavam a

pesquisas comparativas entre regiões nas quais, invariavelmente, as regiões mais industrializadas e dinâmicas eram identificadas como as primeiras a superar processos de crises e, consequentemente, as mais resilientes.

Nestes estudos, também, se evidenciavam variações nos limites espaciais delimitados para pesquisa em que, muitas vezes, os mesmos se limitavam ao comparativo entre regiões metropolitanas, ou até mesmo, cidades (FOXÀ et al., 2011). Ou seja, os primeiros e principais trabalhos que tratam da resiliência no desenvolvimento regional, publicados a partir do ano de 2008, eram praticamente exclusivos aos espaços urbanos. Este fato evidenciava a existência de uma importante lacuna a ser preenchida que era, justamente, a falta de estudos sobre os espaços rurais19 (EXTERCKOTER e SILVA, 2014; EXTERCKOTER et al., 2015).

Atualmente, segundo Darnhofer (2014), o estudo da resiliência em regiões rurais é uma corrente emergente na qual o principal enfoque deve estar na flexibilidade produtiva e na capacidade adaptativa dos agricultores e das comunidades rurais. Afinal, as crises fazem parte do cotidiano dos agricultores. Estes sempre tiveram de encontrar soluções para enfrentar eventos inesperados de ordem ambiental (granizos, geadas, secas), bem como, de ordem econômica, como as incertezas de mercado. Entretanto, segundo Glover (2012), o aumento da concorrência, a globalização e as mudanças ambientais têm exigido dos agricultores respostas adaptativas cada vez mais complexas, de maneira que a melhor compreensão da resiliência dos sistemas produtivos pode significar um caminho promissor para auxiliar nas políticas de desenvolvimento rural.

Contudo, na prática, a validação da ideia de resiliência depende, dentre outras coisas, da capacidade de medi-la, questão que continua sendo um grande desafio conforme discutem Christopherson et al. (2010), Foxà et al. (2011), Mendéz (2012), dentre outros. Darnhofer et al. (2010), ao discutirem a resiliência de sistemas agrícolas, afirmam que estes são muito complexos e variáveis no tempo e no espaço, o que dificulta que a resiliência seja medida de forma objetiva e precisa. Cabell e Oelofse (2012) concordam com Darnhofer et al. (2010) e apontam que abordagens alternativas (qualitativas) que permitam

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Só depois, especialmente a partir de 2011, começaram a surgir, embora de forma ainda tímida, trabalhos dedicados a estudar regiões rurais a partir da perspectiva da resiliência. Este processo encontra-se bem caracterizado no Capítulo II, através da revisão bibliométrica.

identificar a capacidade adaptativa dos agricultores e suas organizações são, por hora, as mais promissoras, uma vez que a teoria da resiliência ainda carece de indicadores quantitativos mais confiáveis.

Darnhofer (2014) lembra que a capacidade adaptativa deve ser entendida como uma característica latente do sistema que deve ser ativada para efetuar mudança e não como uma resposta automática. Já, para Paniagua (2013), a resiliência de uma comunidade agrícola corresponde à soma de todas as estratégias adaptativas adotadas pelos agricultores. Além disso, Foxà et al. (2011) concordam com Darnhofer et al. (2010) e Cabell e Oelofse (2012) quanto às dificuldades metodológicas para medir resiliência e quanto à importância de métodos qualitativos. Tanto que, estes autores sugerem a adoção da técnica de “estudos de caso” quando em pesquisas aplicadas. Tais estudos têm sido realizados tanto como uma visão histórica do território, analisando os processos adaptativos ao longo do tempo, quanto como uma visão a curto prazo que enfatiza aspectos comparativos.

Também, existe um esforço de muitas bibliografias sobre o tema em apontar elementos teóricos que ajudam a explicar o que diferencia as regiões resilientes, dentre os quais se destacam: o “capital social” – que envolve dimensões culturais e organizativas, e relaciona-se aos recursos específicos locais (CHRISTOPHERSON et al., 2010; MENDÉZ, 2013; CABELL e OELOFSE, 2012); a “diversidade” – que reduz a vulnerabilidade das economias locais aos choques externos (DARNHOFER, 2014; FOXÀ et al., 2011); a “inovação” – que permite que uma região/território seja mais capaz de usar recursos estratégicos, se ajustar e se adaptar ao longo de tempo (CHRISTOPHERSON et al., 2010; MENDÉZ, 2012 e 2013); e a “conectividade” – entendendo que territórios com mais conexões internas podem resistir melhor a choques (SIMMIE e MARTIN, 2010; DARNHOFER, 2014; CABELL e OELOFSE 2012).

Conforme argumenta Cabell e Oelofse (2012), as comunidades rurais que apresentam elevado grau de conectividade interna tendem a desenvolver ativos específicos que contribuem para a resiliência das mesmas e da região em que estão inseridas. Também, o sentimento de pertencer a um lugar, uma comunidade, somado ao capital social é apontado por McManus et al. (2012) como um atributo comumente presente em comunidades rurais que ajudam a fortalecer a resiliência. Com isso, queremos apontar que, aparentemente, a resiliência pode ser um elemento chave nas dinâmicas locais presentes nas comunidades rurais e, como tal, viria a contribuir para que estas comunidades construam diferentes estratégias de reprodução social, respondendo de

forma criativa às crises e às perturbações geradas num mundo globalizado. Neste contexto, a resiliência também passa a ser entendida como um processo social dinâmico e determinado, em parte, pela capacidade das comunidades rurais em agir coletivamente e resolver problemas comuns (NORRIS et al., 2008, MAGIS, 2010; SMITH et al., 2012). Ou, conforme argumenta Magis (2010), a pesquisa sobre a resiliência em comunidades rurais traz à tona a questão da existência de agência individual e coletiva. A agência individual engloba como premissa a confiança entre os membros autônomos e capazes da sociedade rural de que a mudança é possível, e agência coletiva é expressa através dos recursos culturais, de infraestrutura, e de comunicação que permitam uma ação coletiva.

Enfim, os trabalhos até então realizados sobre o tema, em maior ou menor grau, estão preocupados em ajudar a compreender os efeitos causados por um processo de crise no espaço rural e como as comunidades locais atingidas têm reagido e se adaptado a estes contextos. A ideia de adaptação pode ser apontada como o principal fio condutor entre tais trabalhos. Também, chama a atenção o predomínio de estudos de caso, nos quais o uso de dados secundários e entrevistas se configuraram como as principais estratégias metodológicas.

3.2 BASES TEÓRICAS QUE SUSTENTAM A RESILIÊNCIA