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DEMOCRÁTICO MULTIPARTIDÁRIO

9. A Fiscalização da constitucionalidade na CRDSTP de 1990 e os conflitos político jurídico-constitucionais

9.3. Resolução dos conflitos político jurídico-constitucionais

Já tivemos oportunidade de referir que, em São Tomé e Príncipe, a competência objetiva para a fiscalização da constitucionalidade, cabia à AN que tinha a competência de apreciar, modificar ou anular os diplomas legislativos, ou quaisquer medidas de carácter normativo adotadas pelo órgão do poder político que contrariasse a constituição (art.º 86.º, al. p) CRDSTP-1990), e também decidia por via incidental em casos de questões em que os Tribunais aplicassem normas inconstitucionais (art.º 111.º da CRDSTP-1990).

Embora tendo a competência para decidir as questões de inconstitucionalidade, a AN nunca se pronunciou formalmente sobre questões de inconstitucionalidade quer nos termos do art.º

(136) SEIBERT, Gerhard - O Semipresidencialismo e o Controlo da Constitucionalidade em São Tomé e Príncipe.

In Revista dos Negócios Estrangeiros. [Em linha]. Vol. 4, nº 11, Especial Setembro de 2007. [Consult. 20 de Dezembro de 2012]. Disponível em http://idi.mne.pt/images/rev_ne/2007_09_n_11_4.pdf. pp. 51-52. Ver também SEIBERT, Gerhard - Instabilidade Política e Revisão Constitucional: semipresidencialismo em São Tomé e Príncipe. in LOBO, Maria Costa e NETO, Octávio Amorim, Organização - O Semipresidencialismo nos Países de Língua Portuguesa. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais. 2009, p. 211.

(137) Sobre a dissolução, Jorge Bacelar Gouveia, vem aludir que «(...) a fundamentação da dissolução

parlamentar costuma ser normalmente equacionada no âmbito da prática política, através da comunicação ao país das razões da dissolução, mas ela não integra o decreto de dissolução, nem sequer está prevista no respectivo tipo de formulário.

(...) Aspectos que também não está directamente resolvido no texto constitucional é o da revogabilidade do acto de dissolução da Assembleia da República» (GOUVEIA, Jorge Bacelar – A Dissolução da Assembleia da

República: Uma Nova Perspectiva da Dogmática do Direito Constitucional. Coimbra: Almedina, 2007, p. 81). Acresce o autor, no rodapé n.º 139, da obra e página citada que «Não tendo havidos exemplos destes na

história da III República, não podemos esquecer um recente episódio ocorrido em São Tomé e Príncipe, no qual a dissolução da Assembleia Nacional de 2003, publicada no Diário da República, n.º 1, de 28 de Janeiro de 2003 – foi revogada pelo Chefe de Estado na sequência da assinatura de um Memorando de Entendimento com todas as forças políticas e partidárias – acto consubstanciado no Decreto Presidencial n.º 3/2003, de 24 de Janeiro de 2003, publicado no Diário da Republica, n.º 1, de 28 de Janeiro de 2003 (número do jornal oficial onde, curiosamente, foram simultaneamente publicados os decretos de dissolução e de revogação da dissolução da Assembleia Nacional)» (GOUVEIA, Jorge Bacelar – A Dissolução da Assembleia da República: Uma

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86.º, al. p), quer do art.º 111.º, ambos da CRDSTP de 1990(138). Contudo, isso não significa que não tivesse havido questões que levantasse problema de constitucionalidade ou inconstitucionalidade que devesse ser analisada. Temos exemplos apresentados por Gerhard SEIBERT, de casos de arguidos que ficaram detidos em prisão preventiva fora do prazo estabelecido pela lei. Estas questões de violações dos direitos civis não foram levadas a AN para serem analisadas e declaradas inconstitucionais(139). Um outro exemplo, também, apresentado pelo citado Gerhard SEIBERT, era a constante violação do art.º 119.º da CRDSTP de 1990, no qual definia-se que o órgão do poder local tinha um mandato de três anos. Houve violação deste preceito, na medida em que as eleições autárquicas tinham sido realizadas desde 1992, e eram passados mais de 3 anos que não se realizaram eleições. Esta violação também aconteceu com as eleições regionais, em que houve eleições em Março de 1994 e também passaram mais de 3 anos sem realizarem uma nova eleição. Na altura destas violações da Constituição, vários políticos, deputados e população chamaram a atenção, porém, a AN nunca tomou uma decisão formal relativamente a esta anomalia, nos termos do art.º 86.º, al. p) da CRDSTP de 1990(140).

Possíveis explicações para a inércia da AN em matéria da fiscalização da constitucionalidade, eram as suas fracas capacidades institucionais e a sua relativa fraqueza política perante os outros órgãos de soberania(141).

Não obstante, a AN atuou uma vez numa questão constitucional, relativamente ao caso terceiro do ponto 9.2 quando impediu um vazio de poder, aprovou uma legislação que prorrogava o mandato presidencial até a investidura do próximo PR, ou por um período de cinco meses. Antes da tomada da posição da AN, que evitou um vazio de poder referenciado nos círculos próximos do poder e das oposições, discutia-se aberta e insistentemente na possibilidade de uma nova dissolução da AN. Para resolução do conflito, tomou-se em conta a opinião informal de jurisconsultos portugueses ventilados por meios de comunicação social e abundantemente esgrimida no arquipélago, a questão foi resolvida pacificamente.

138 SEIBERT, Gerhard - O semipresidencialismo e o Controlo da Constitucionalidade em São Tomé e Príncipe. In Revista dos Negócios Estrangeiros. [Em linha]. Vol. 4, nº 11, Especial Setembro de 2007. [Consult. 20 de Dezembro de 2012]. Disponível em http://idi.mne.pt/images/rev_ne/2007_09_n_11_4.pdf. 55 p.

(139) SEIBERT, Gerhard - O semipresidencialismo e o Controlo da Constitucionalidade em São Tomé e Príncipe.

In Revista dos Negócios Estrangeiros. [Em linha]. Vol. 4, nº 11, Especial Setembro de 2007. [Consult. 20 de Dezembro de 2012]. Disponível em http://idi.mne.pt/images/rev_ne/2007_09_n_11_4.pdf. 55 p.

(140) Idem. (141) Idem.

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O PR Miguel Trovoada manteve-se no poder até a sua reeleição(142).

Enquanto que no quarto caso do ponto 9.2, conflito jurídico-constitucional relativamente a diminuição dos poderes do PR e à mudança do sistema político semipresidencial de pendor presidencial para um sistema semipresidencial de pendor parlamentar, foram resolvidos sem recurso a AN, que, aliás, esteve ativamente envolvida em todo este litígio. O conflito foi resolvido por conversações realizadas entre as partes com mediação da então PM da época, Maria das Neves, (MLSTP-PSD), e da Presidente do Supremo Tribunal da Justiça da época, Alice Carvalho.

No primeiro caso do ponto 9.2, quando o PR Miguel Trovoada, demitiu o PM de então, Daniel Daio (PCD-GR), argumentando que as instituições do Estado não estavam a funcionar bem e que houve um rompimento de dialogo entre o PR e o chefe de Governo sem perspetiva de consenso. Na altura, o partido no poder PCD-GR, que tinha uma maioria absoluta no parlamento, só aceitou a decisão do PR Miguel Trovoada, depois dos constitucionalistas portugueses Marques Guedes e Vital Moreira, se terem deslocado a São Tomé a pedido do PR, e interpretado a Constituição em favor da sua posição(143).

No segundo caso do ponto 9.2 existia de facto um problema de omissão e naquele caso como a AN não tinha poderes de fiscalização sobre Decreto Presidencial e não havendo uma instância jurisdicional que pudesse sindicar tais atuações, apenas o juramento prestado pelo Chefe de Estado de acatamento da Constituição, o bom senso político, e a vontade expressa do povo, serviram de algum modo como base de fundo para a resolução do conflito jurídico- constitucional em causa(144).

Como podemos observar do acima exposto, não existia um Tribunal Constitucional para eventual fiscalização da constitucionalidade ou inconstitucionalidade dos atos políticos ou normativos dos órgãos detentores do poder político.

(142) GUEDES, Armando Marques - O Estudo dos Sistemas Jurídicos Africanos. Coimbra: Livraria Almedina,

2004, p. 168.

(143) SEIBERT, Gerhard - Instabilidade Política e Revisão Constitucional: semipresidencialismo em São Tomé e

Príncipe. In LOBO; Maria Costa e NETO, Octávio Amorim, Organização - O Semipresidencialismo nos Países de Língua Portuguesa. Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais. 2009, p. 205.

(144) Cf. GUEDES, Armando Marques [et al] - Litígios e Legitimação: Estado, Sociedade Civil e Direito em S.

Tomé e Príncipe. Coimbra: Almedina, 2002, p. 149; e cf. GUEDES, Armando Marques - O Estudo dos Sistemas Jurídicos Africanos. Coimbra: Livraria Almedina, 2004, p. 171.

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Na Constituição de 1990, a instância objetiva para resolução dos conflitos jurídico- constitucionais pertencia a AN, quer nos termos dos artigos 86.º, al. p) e 111.º da CRDSTP- 1990.

Devido a falta de resposta da instância objetiva de resolução de conflitos jurídico- constitucionais, muitos dos conflitos desta natureza foram resolvidos ou solucionados pelas instâncias subjetivas de resolução de conflitos jurídico-constitucionais. Dentro destas há que destacar: Os recursos ao diálogo, e o bom senso político, como vimos no caso dois, a pacificação ocorreu por via política. De facto, o diálogo, ainda que difícil, entre o PR, a AN, o PCD-GR, e os restantes partidos políticos, bem como a omissão de certos comportamentos políticos por parte do PCD-GR, foi sem dúvida o caminho para resolução de conflito gerado no caso acima mencionado; No quarto caso, a resolução do conflito também passou por bom senso, onde a mediação do conflito jurídico-constitucional esteve a cargo de duas mulheres, a PM da época, Maria das Neves (MLSTP-PSD), e da Presidente do Supremo Tribunal da Justiça da época, Alice Carvalho; Quanto ao terceiro caso, tomou-se em conta a opinião informal dos jurisconsultos portugueses ventiladas pelos meios de comunicação social, e o PR Miguel Trovoada, através de diálogo político, resolveu a questão ou conflito jurídico- constitucional em termos institucionais com a AN, e diretamente com o Presidente da Assembleia Nacional, Dr. Francisco Fortunato Pires; Em relação ao primeiro caso, o conflito jurídico-constitucional foi resolvido mediante recurso a interpretação da Constituição por parte de constitucionalistas portugueses Marques Guedes e Vital Moreira.

No essencial os conflitos jurídico-constitucionais em São Tomé e Príncipe eram resolvidos das duas formas acima mencionadas, uma dentro e no âmbito da constituição sendo por nós definidas como instâncias objetivas de resolução de conflito jurídico-constitucional. Estava prevista formalmente na Constituição de 1990 nos artigos 86.º, al. p) e 111.º da CRDSTP- 1990. Outra forma de resolução, que apelidamos de instâncias subjetivas, vistos não estarem formalmente prevista na Constituição, e depender dos vários agentes da sociedade, sendo eles PM, AN, Presidente AN, Presidente do Supremo Tribunal da justiça, constitucionalistas estrangeiros e nacionais, bem como toda a sociedade civil.

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PARTE IV

A ORGANIZAÇÃO DO PODER POLÍTICO APÓS A REVISÃO CONSTITUCIONAL