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RESUMO DO CAPÍTULO

No documento A Origem das Espécies (páginas 144-149)

Se, no meio das condições inconstantes da existência, os seres organiza- dos apresentam diferenças individuais, em quase todas as partes da sua estrutu-

ra, e este ponto não é contestável; se se produz, entre as espécies, em razão da progressão geométrica do aumento dos indivíduos, uma encarniçada luta pela e- xistência numa certa idade, numa certa estação, ou durante um período qualquer da vida, e este ponto não é certamente contestável; tendo, então, em conta a infi- nita complexidade das relações mútuas de todos os seres organizados e das suas relações com as condições da sua existência, o que causa uma diversidade infini- ta e considerável de estruturas, de constituições e de hábitos, seria deveras extra- ordinário que se não produzissem jamais variações úteis à prosperidade de cada indivíduo, da mesma forma como se produzem tantas variações úteis ao homem. Mas, se as variações úteis a um ser organizado qualquer se apresentam algumas vezes, seguramente os indivíduos que disso são o objeto têm a melhor probabili- dade de vencer na luta pela existência; pois, em virtude do princípio tão poderoso da hereditariedade, estes indivíduos tendem a deixar os descendentes tendo o mesmo caráter que eles. Dei o nome de seleção natural a este princípio de con- servação ou de persistência do mais apto. Este princípio conduz ao aperfeiçoa- mento de cada criatura relativamente às condições orgânicas e inorgânicas da sua existência; e, por conseguinte, na maior parte dos casos, ao que podemos consi- derar como um progresso de organização. Todavia, as formas simples e inferiores persistem muito tempo quando são bem adaptadas às condições pouco comple- xas da sua existência.

Em virtude do princípio da hereditariedade dos caracteres nas idades cor- respondentes, a seleção natural pode atuar sobre o ovo, sobre a semente ou so- bre o novo indivíduo, e modificá-los tão facilmente como pode modificar o adulto. Entre um grande número de animais, a seleção sexual vem no auxílio da seleção ordinária, assegurando aos machos mais vigorosos e melhor adaptados o maior número de descendentes. A seleção sexual desenvolve também nos machos ca- racteres que lhes são úteis nas suas rivalidades ou nas suas lutas com outros ma- chos, caracteres que podem transmitir-se somente a um sexo ou aos dois, se- guindo a forma de hereditariedade predominante na espécie.

A seleção natural tem gozado realmente este papel? Tem realmente adap- tado as formas diversas da vida às suas condições e às suas estações diferentes?

É examinando os fatos expostos nos capítulos seguintes que nós os poderemos julgar. Mas já vimos como a seleção natural determina a extinção; ora, a história e a geologia demonstram-nos claramente qual o papel que a extinção tem gozado na história zoológica do mundo. A seleção natural conduz também à divergência dos caracteres; porque, quanto mais os seres organizados diferem uns dos outros sob a relação da estrutura, dos hábitos e da constituição, tanto mais a mesma re- gião pode alimentar um grande número; temos tido a prova disso estudando os habitantes de uma pequena região e as produções aclimatadas. Por conseqüên- cia, durante a modificação dos descendentes de uma espécie qualquer, durante a luta incessante de todas as espécies para crescer em número, quanto mais dife- rentes se tornam estes descendentes, tanto mais probabilidades têm de ser bem sucedidos na luta pela existência. Também, as pequenas diferenças que distin- guem as variedades de uma mesma espécie tendem regularmente a aumentar até que se tornem iguais às grandes diferenças que existem entre as espécies de um mesmo gênero, ou mesmo entre os gêneros distintos.

Vimos que são as espécies comuns muito espalhadas e tendo um habitat considerável, e que, ademais, pertencem aos gêneros mais ricos de cada classe, que variam mais, e que estas espécies tendem a transmitir aos descendentes mo- dificados esta superioridade que lhes assegura hoje o domínio no próprio país. A seleção natural, como acabamos de fazer observar, conduz à divergência dos ca- racteres e à extinção completa das formas intermediárias e menos aperfeiçoadas. Partindo destes princípios, pode explicar-se a natureza das afinidades e as distin- ções ordinariamente bem definidas entre os inumeráveis seres organizados de cada classe à superfície do Globo. Um fato verdadeiramente admirável e que nós demasiado desconhecemos, porque estamos talvez muito familiarizados com ele, é que todos se encontram reunidos por grupos subordinados a outros grupos da mesma forma que observamos em todos, isto é, que as variedades da mesma espécie mais próximas umas das outras, e as espécies do mesmo gênero, menos estreitamente e mais desigualmente aliadas, formam seções e subgêneros; que as espécies de gêneros distintos ainda muito menos próximos e, enfim, que os gêne- ros mais ou menos semelhantes formam subfamílias, famílias, ordens, classes e

subclasses. Os diversos grupos subordinados de uma classe qualquer não podem ser dispostos em uma única linha, mas parecem agrupar-se em volta de certos pontos, e estes em volta de outros e assim seguidamente em círculos quase infini- tos. Se as espécies fossem criadas independentemente umas das outras, não po- deria explicar-se este modo de classificação; explica-se facilmente, pelo contrário, pela hereditariedade, e pela ação complexa da seleção natural, produzindo a ex- tinção e a divergência dos caracteres, assim como o demonstra o nosso diagrama.

Têm-se representado algumas vezes sob a figura de uma grande árvore as afinidades de todos os seres da mesma classe, e creio que esta imagem é assaz justa sob muitas relações. Os ramos e os gomos representam as espécies exis- tentes; os ramos produzidos durante os anos precedentes representam a longa sucessão das espécies extintas. A cada período de crescimento, todas as ramifi- cações tendem a estender os ramos por toda a parte, a exceder e destruir as rami- ficações e os ramos circunvizinhos, da mesma forma que as espécies e os grupos de espécies têm, em todos os tempos, vencido outras espécies na grande luta pela existência. As bifurcações do tronco, divididas em grossos ramos, e estes em ramos menos grossos e mais numerosos, tinham outrora, quando a árvore era nova, apenas pequenas ramificações com rebentos; ora, esta relação entre os velhos rebentos e os novos no meio dos ramos ramificados representa bem a classificação de todas as espécies extintas e vivas em grupos subordinados a ou- tros grupos. Sobre as numerosas ramificações que prosperavam quando a árvore era apenas um arbusto, duas ou três unicamente, transformadas hoje em grossos ramos, têm sobrevivido, e sustentam as ramificações subseqüentes; da mesma maneira, sobre as numerosas espécies que viviam durante os períodos geológicos afastados desde longo tempo, muito poucas deixaram descendentes vivos e modi- ficados. Desde o primeiro crescimento da árvore, mais de um ramo deve ter pere- cido e caído; ora, estes ramos caídos, de grossura diferente, podem representar as ordens, as famílias e os gêneros inteiros, que não têm representantes vivos e que apenas conhecemos no estado fóssil. Da mesma forma que vemos de onde aonde sobre a árvore um ramo delicado, abandonado, que surgiu de qualquer bi- furcação inferior, e, em conseqüência de felizes circunstâncias, está ainda vivo, e

atinge o cume da árvore, da mesma forma encontramos acidentalmente algum animal, como o ornitorrinco ou a lepidossercia, que, pelas suas afinidades, liga, sob quaisquer relações, duas grandes artérias da organização, e que deve prova- velmente a uma situação isolada ter escapado a uma concorrência fatal. Da mes- ma forma que os gomos produzem novos gomos, e que estes, se são vigorosos, formam ramos que eliminaram de todos os lados os ramos mais fracos, da mesma forma creio eu que a geração atua igualmente para a grande árvore da vida, cujos ramos mortos e quebrados são sepultados nas camadas da crosta terrestre, en- quanto que as suas magníficas ramificações, sempre vivas e renovadas incessan- temente, cobrem a superfície.

CAPITULO V

Leis da Variação

No documento A Origem das Espécies (páginas 144-149)

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