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6. Retribuição-Noção, Elementos e Modalidades de Retribuição

6.2. Retribuição em Concreto e Retribuição Modular

O problema da aferição do cálculo da prestação retributiva coloca-se em dois patamares: a) determinação em concreto da retribuição, quando a mesma não se encontra fixada pelo contrato de trabalho; b) determinação em abstrato da prestação retributiva.

Ou seja, a questão que se levanta é a de saber “quanto recebe um qualquer trabalhador por mês considerando, em abstrato, determinados pressupostos padronizados”90.

Como explica BERNARDO LOBO XAVIER91, “a retribuição em concreto diz respeito a saber o

quantitativo devido a um trabalhador, que prestou serviços num dado mês, com esta ou aquela assiduidade e faltas, justificadas ou não, com a produtividade apurada, nestas e naquelas condições (tantos dias de turno, tantos dias de trabalho nocturno, etc.). A retribuição em abstrato tem a ver com o montante que o trabalhador ganha num (qualquer) mês e, portanto, com um apuramento médio, padronizado, que se torna necessário fazer para lhe definir direitos no plano do contrato de trabalho”.

Normalmente, o montante retributivo em concreto vem expressamente previsto no contrato de trabalho outorgado, mas pode suceder que as partes não tenham determinado a prestação retributiva no mesmo. Neste caso, o montante retributivo, direta ou indiretamente, pode resultar de cláusula prevista em convenção coletiva para a categoria ou função que o trabalhador exerce no seio da empresa, isto é, as partes podem, aquando da celebração do contrato de trabalho, não determinarem o quantum retributivo, acordando (ainda que tacitamente) fazer equivaler a prestação retributiva devida, ao valor que os trabalhadores da mesma categoria, ou com as mesmas funções, recebem de acordo com convenção coletiva que fixa a tabela salarial da empresa, mesmo que a eles não lhes seja aplicada tal convenção, por não serem trabalhadores sindicalizados.

89 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 535 e segs.

90 Preto, Sónia, op. cit., pág. 258.

Se não houver fixação expressa do valor da retribuição no contrato de trabalho, nem resultar de normas aplicáveis ao contrato, pois não vigora qualquer convenção coletiva no seio da empresa em questão, sempre pode o montante retributivo em concreto ser determinado judicialmente, nos termos do art. 272.º, n.º 1 do CT.

Por outro lado, além da dificuldade de determinação do quantum retributivo nos casos que referimos, é também difícil a aferição em concreto do montante retributivo nos casos em que os critérios consagrados no contrato de trabalho ou na lei, para a determinação da retribuição não são suficientemente claros. Porquanto, as mais das vezes, a terminologia utilizada nos mesmos parece afastar-se da retribuição base, cuja principal função é a fixação de um critério para o cálculo dos complementos remuneratórios, os quais são calculados com recurso a percentagens do “valor hora”, “valor dia” ou “valor mês”.

Considera BERNARDO LOBO XAVIER92 que a retribuição base e diuturnidades, previstas no

art, 262.º, n.º 1 do CT, deverão ser consideradas como a base de cálculo para a determinação dos complementos remuneratórios, uma vez que se corre o risco de se utilizar um método que implique uma “duplicação”, isto é, “não se pode, por exemplo, computar o subsídio de turno (ou subsídio por trabalho nocturno) com base na «retribuição» e depois dizer-se que esse mesmo subsídio integra a «retribuição»”. No entanto considera o referido autor que, a título excecional, existem prestações complementares cujos cálculos serão feitos após a determinação de outros complementos remuneratórios, dependendo da previsão legal ou convencional aplicável que estabeleça tais prestações complementares. Em suma, a determinação em concreto do montante da retribuição, depende da previsão legal ou convencional a determinação da forma de cálculo dos complementos remuneratórios, uma vez que, em certos casos recorre-se à “retribuição base” e, noutros casos, à “retribuição base integrada com complementos”.

No entanto, há casos, como o previsto no art. 393.º, n.º 2 al. a), que se refere às prestações a que o trabalhador tem direito por ilicitude do despedimento, em que surge a necessidade de determinar o valor da “retribuição”, consagrando a estrutura remuneratória que integra o “estatuto” do trabalhador93. Essa determinação só pode ser aferida a posteriori, e diz

respeito ao conjunto de atribuições patrimoniais pagas pelo empregador durante um determinado período de tempo ao longo do contrato de trabalho. Trata-se de determinar a

92Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 568.

estrutura retributiva de um trabalhador, de forma a criar critérios de cálculo para aferir o valor padrão, ou o módulo, do esquema remuneratório do trabalhador, em referência a uma unidade de tempo. Assim, a legislação laboral refere bastantes vezes, para a determinação do montante indemnizatório, um período temporal padrão de retribuição, sendo esse montante, portanto, abstrato (mas determinável), a retribuição modular.

Como explica MONTEIRO FERNANDES94, “o critério legal constitui, assim, o instrumento de

despiste dos valores que, no seu conjunto, têm como nexo de correspectividade com a posição obrigacional do trabalhador, encarada também na sua globalidade. Ele serve, então, para definir a posteriori uma base de cálculo para certos valores derivados”.

O art. 258.º do CT considera, assim, que a “retribuição” se reporta a períodos padrão de duração recorrendo, nomeadamente, a unidades de tempo (hora, dia, mês) cujo valor seja devido ao trabalhador. Importa, então, não considerar a retribuição devida num certo mês pelo trabalho prestado naquele período, mas antes considerar um módulo, um valor teórico, padronizado (abstrato) que se refere a um hipotético período de duração (hora, dia ou mês).

Na opinião de BERNARDO LOBO XAVIER95, a legislação laboral concede os elementos

essenciais, no art. 258.º, n.º 2 do CT, para se aferir da retribuição abstrata. O autor diz que a ideia de regularidade e periodicidade é um “elemento necessário para definir sem distorção o que é retribuição-tipo ou modular durante um período padrão de tempo (dia ou hora) e que constitui medida ou base de cálculo de inúmeros direitos consignados nas normas de trabalho”. Ou seja, são excluídas do cálculo do módulo ou padrão retributivo, isto é, da retribuição abstrata ou modular, todas as prestações que são esporádicas, extraordinárias ou atípicas, como sejam as que decorrem de exclusões diretas da lei, as atribuições que não têm caráter temporal, nomeadamente a atribuição de telemóvel ou uso de carro da empresa e prestações que têm a sua atribuição dependente de regras próprias.

No que concerne à determinação da retribuição abstrata, ou retribuição modular, o Supremo Tribunal de Justiça96 entende que mesmo “o facto das prestações periódica e

regularmente recebidas pelo trabalhador integrarem, em princípio, o conceito de retribuição não significa que linearmente tenham de ser levadas em conta para efeitos de cálculo das prestações

94 Fernandes, António Monteiro, op. cit., pág.401.

95 Xavier, Bernardo da Gama Lobo, in “Manual...”, pág. 570.

cujo montante se encontra indexado ao valor da retribuição, como, por exemplo, acontece com a retribuição de férias e os subsídios de férias e de Natal. A retribuição a atender para esse efeito não é a retribuição global, mas sim a chamada retribuição modular ou padrão, da qual devem ser excluídas aquelas prestações cujo pagamento não é justificado pela prestação de trabalho em si mesma, mas por outra razão de ser específica”.

Em suma, se se atendesse a um regime “homogéneo” da retribuição para qualquer circunstância retributiva, sem mais, surgiriam soluções bastante injustas e desajustadas, quanto ao cálculo da prestação retributiva97. Por um lado, as prestações complementares iam ser

calculadas em função da retribuição e, por outro lado, essas mesmas prestações complementares integravam a atribuição retributiva. Pelo que, a qualificação de certa prestação como integrante do padrão da prestação retributiva do trabalhador, definido pelo art. 258.º do CT, “não afasta a possibilidade de se ligar a essa atribuição patrimonial uma cadência própria, nem a de se lhe reconhecer irrelevância para o cálculo deste ou daquele valor derivado da «retribuição». O «ciclo vital» de cada elemento da retribuição depende do seu próprio regime jurídico, cuja interpretação há-de pautar-se pela específica razão de ser ou função desse elemento na fisiologia da relação de trabalho” 98.