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3 PSICOLINGUÍSTICA EXPERIMENTAL

3.3 Revisitando Viegas

Pesquisas sobre aquisição de L2 fundamentam-se em análises estatísticas de dados obtidos através de testes experimentais on-line ou off-line. Neste sentido dentre os trabalhos cuja investigação baseia-se na interferência da L1 sobre a L2, destacamos e utilizamos como referência o de Viegas (2014), que propõe uma averiguação sobre a interferência do PB no aprendizado de inglês como L2 durante processo de aquisição da segunda língua. A pesquisadora utiliza-se dos pressupostos gerativistas no âmbito do programa minimalista de Chomsky (1995), utilizando a metodologia da psicolinguística experimental para apresentar as possíveis interferências que o parâmetro do sujeito nulo do PB, considerando-se como LSN parcial, conforme citado em (HOLMBERG, 2010; MODESTO, 2000 apud VIEGAS, 2014) teria sobre os aprendizes de inglês, uma língua de sujeito pleno. Viegas (2014) baseia-se na investigação de Kim (2007) sobre a influência do coreano, língua de tópico, na aquisição de inglês como L2 e replica parcialmente o seu experimento, chamando-o de piloto.

Para este experimento piloto, Viegas utilizou o método off-line de julgamento de gramaticalidade e contou com 10 participantes aprendizes de inglês como L2 distribuídos em dois grupos, 10 do nível básico e 10 do nível avançado. Cada participante realizou o experimento off-line dentro da sala de aula de um curso de idiomas, com o tempo livre para a realização do mesmo e tal tarefa consistia em responder a um questionário que continha 5 sentenças de tipo 1 e 5 (abaixo) sentenças de tipo 2 (abaixo), somando um total de 10 sentenças agramaticais. Além disso, havia 6 sentenças gramaticais com o sujeito referencial ou expletivo it e 12 sentenças distratoras (10 gramaticais e 2 agramaticais). Além disso, as sentenças distratoras continham erros como inversão da ordem entre substantivos e adjetivos. Veja abaixo exemplos dos tipos 1 e 2 retirados do experimento piloto de Viegas (2014).

Tipo 1 – estrutura sem tópico de sujeito nulo de tipo expletivo ou referencial. I saw Sandy at a school party. *was a beautiful girl.

(Eu vi Sandy numa festa da escola. Era uma menina bonita.) *Rained very hard when Peter came home.

(Choveu muito forte quando Peter chegou em casa.)

Tipo 2 – estrutura com tópico – locativo ou temporal- de sujeito nulo referencial ou expletivo. Tom had lots of fun yesterday. *Today is busy with many things to do.

(Tom se divertiu muito ontem. Hoje está ocupado com muitas coisas pra fazer.) *Yesterday rained a lot in this city.

(Ontem choveu muito nesta cidade.)

Os dados obtidos por Viegas foram submetidos ao pacote estatístico ANOVA. De acordo com os dados, a autora sugere que há interferência de L1 na L2 nos níveis mais baixos, visto que os aprendizes de nível avançado mostraram melhor desempenho que os aprendizes de nível básico e, ainda, julgaram como mais agramaticais as sentenças do tipo 1 do que as do tipo 2. De acordo com Viegas (2014), tal comportamento sugere que a possibilidade de um locativo ou temporal poder satisfazer a exigência de EPP no PB estaria sendo transferida para o inglês, e tais resultados confirmariam as suas previsões de que, no processo de aquisição do parâmetro do sujeito nulo em inglês, existe a construção de uma interlíngua na qual é possível identificar aspectos da L1 influenciando a aquisição de L2.

O seu segundo e último experimento, também de julgamento de gramaticalidade com escala (yes, probably yes, probably no, no), dispôs de 45 participantes divididos em três níveis de proficiência (15 nível básico, 15 intermediário e 15 avançado) e ainda contou com 15 nativos que constituíram o grupo controle. Este experimento teve como variável dependente o número de respostas corretas: (no, probably no) e como variável independente o nível de proficiência, (o tipo de sentença e o tipo de sujeito pronominal). As sentenças foram de três tipos:

Tipo1 - Com sujeito nulo expletivo ou referencial sem tópico; I saw Sandy at the school party. *Was a beautiful girl.

Tipo 2 - Com sujeito nulo referencial ou expletivo com tópico locativo ou temporal na periferia esquerda;

Tom had lots of fun yesterday. *Today is busy with many things to do.

Tipo 3 - Com sujeito nulo referencial ou expletivo, com conjunção na periferia esquerda. *The children didn’t want to eat anything, when were sick.

(As crianças não queriam comer nada, quando estavam doentes.)

Os participantes responderam aos questionários da mesma maneira como responderam no experimento piloto.

Os resultados deste experimento final foram submetidos a um modelo de regressão logística de efeitos mistos e a testes de comparações múltiplas com os contrastes de Tukey14 e, ainda, ao cálculo dos percentuais de acerto para as condições avaliadas. O modelo de regressão lógica de efeitos mistos não apresentou resultados significativos para o teste de proficiência como efeito fixo, contudo, o teste de comparações múltiplas com os contrastes de Tukey apresentou diferenças significativas para os níveis de proficiência básico e avançado, intermediário e avançado, básico e nativo, intermediário e nativo, tendo ainda um efeito marginal entre avançado e nativo. Para os níveis básico e intermediário não houve diferença significativa. O nível de proficiência mostrou que os aprendizes do nível básico possuem desempenho abaixo da média, os aprendizes do intermediário estão na média e os aprendizes do nível avançado têm um desempenho bastante satisfatório (VIEGAS, 2014, p. 84).

Ainda sobre os dados, os tipos de sentenças 2 e 3 foram comparados e verificou-se que a ausência do expletivo não é facilmente reconhecida como agramatical em nenhum desses dois tipos, fato que, segundo Viegas (2014), contraria os dados obtidos no experimento piloto no qual houve maior dificuldade de percepção de gramaticalidade no tipo 2. De acordo com a autora os dados sugerem que há interferência da L1 sobre a L2, mas a caracterização do PB como língua de tópico não parece ser a responsável direta pela dificuldade em julgar os tipos de sentença, e sim, tal dificuldade parece ter natureza mais ampla. Como sentenças possíveis em inglês, aceitas pelos aprendizes, aparecem as com tópicos e expletivos omitidos e as iniciadas por uma conjunção, visto que a presença de uma conjunção parece dificultar a percepção de que o tópico está ausente.

A comparação entre o tipo de sentença vs. nível de proficiência não apresentou efeitos significativos para os níveis básico e intermediário, mas houve um efeito marginal entre as sentenças do tipo 3 do nível básico se comparadas as do nível intermediário, fato que segundo Viegas (2014) indica maior dificuldade dos aprendizes de nível básico em perceber a agramaticalidade de sentenças iniciadas por conjunção. E, ainda, os dados de sujeito gramatical sugerem que o nível básico reconheceria mais facilmente as sentenças do tipo 1 como agramaticais. Para os dados de sujeito expletivo, os resultados indicaram que os aprendizes estariam atentos à necessidade do expletivo, sem, contudo, perceber a sua ausência nas sentenças do tipo 2 com tópico locativo ou temporal, fato que para Viegas (2014) deve-se à interferência da possibilidade de preenchimento de EPP por tópico como ocorre no PB.

14

Quanto à percepção da agramaticalidade dos sujeitos nulos em inglês, os aprendizes de nível básico parecem estar mais atentos à impossibilidade de sujeito nulo referencial do que meteorológicos, de outro lado, estão os aprendizes de nível intermediário, que se mostraram menos atentos aos pronomes referenciais e mais atentos ao preenchimento do sujeito expletivo com verbos meteorológicos e de alçamento. Isso, de acordo com Viegas, parece indicar que os aprendizes de nível básico são mais sensíveis às restrições básicas do inglês, mas ainda não estão atentos aos verbos meteorológicos, por outro lado, os aprendizes de nível intermediário já estão familiarizados com o fato de os pronomes referenciais possuírem necessidade de estar explícitos, mas não voltam sua atenção a este aspecto e sim, dedicam sua atenção ao preenchimento do sujeito expletivo em verbos meteorológicos e de alçamento. No entanto, este comportamento não se apresenta em sentenças do tipo 2, o que parece indicar que a possível interferência do PB não permite que o aprendiz perceba a omissão do expletivo.

Os resultados deste experimento indicam então que os aprendizes são mais sensíveis aos pronomes referenciais e que existe uma tendência maior em perceber a agramaticalidade em sentenças nas quais o elemento a periferia esquerda não existe. Além disso, opostamente ao experimento piloto, não houve maior dificuldade em julgar sentenças com sujeito referencial e expletivo nulo com presença de tópico – locativo ou temporal – como agramaticais, já que os aprendizes mostraram um comportamento semelhante em relação às sentenças do tipo 3. E, ainda, não foi confirmada a satisfação de EPP por tópico. Neste sentido, tais resultados parecem confirmar a Hipótese da Transferência e Acesso Total (Full

Transfer and Full Acess) apresentada por White (2003) e servem como base para esta

pesquisa, pois indicam que valor do parâmetro do sujeito nulo é transferido de L1 para a L2, que há interferência de restrições gerais da gramática de L1 na L2, que a interferência da L1 se mostra mais evidente em relação aos sujeitos expletivos e, ainda, que diminui com o aumento da proficiência em L2 (VIEGAS, 2014 p. 87).

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