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CAPÍTULO III – TRAMITAÇÃO

1.8. REVOGAÇÃO DA EXONERAÇÃO

Mesmo que a exoneração do passivo restante haja sido concedida, o insolvente não pode pensar que a extinção dos créditos se manterá sempre e em quaisquer circunstâncias. Na verdade, o art. 246º, do CIRE prevê a possibilidade de, em determinados casos, ser revogada a exoneração. Por força dessa revogação tem lugar a reconstituição dos créditos extintos, ou seja, de todos os créditos extintos, de acordo com o art. 246º, n.º4, do CIRE285286. Deste modo, estão em questão os créditos que, nos termos do art. 243º, n.º 1, do CIRE, se

282 Cfr. FERNANDES, Luís A. Carvalho/ LABAREDA, João, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas: Anotado, op. cit., p. 914.

283 Cfr. MARTINS, Alexandre de Soveral, op. cit., p. 615.

284 Cfr. FERNANDES, Luís A. Carvalho, A Exoneração do Passivo Restante na Insolvência das Pessoas Singulares no Direito Português in Coletânea de Estudos sobre a Insolvência, op. cit., pp. 292-293.

285 Cfr. MARTINS, Alexandre de Soveral, op. cit., p. 616.

286 Cfr. FERNANDES, Luís A. Carvalho/ LABAREDA, João, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas: Anotado, op. cit., p. 921, entendem que, não obstante da redação do art. 246º, n.º 4 e do art. 245º,

consideraram antes extintos como efeito da exoneração, isto é, aqueles que ainda existam à data em que a exoneração foi concedida. A reconstituição consente que os credores da insolvência exerçam os seus direitos contra o devedor, nos termos do art. 233º, n.º 1, alínea c), do CIRE.

A revogação da exoneração do passivo restante aparenta pressupor um requerimento nesse sentido. No mínimo, é o que dá a entender a redação do art. 246º, n.º 1, do CIRE, uma vez que exige a prova do que ali é exigido. De mais a mais, o art. 246º, n.º 2, do CIRE, admite o requerimento por um credor da insolvência. Contudo, deve admitir-se que o requerimento seja apresentado também por um administrador da insolvência que ainda permaneça em funções ou pelo fiduciário que tenha sido incumbido de fiscalizar o cumprimento das obrigações do devedor, devendo aplicar-se, por analogia, o art. 243º, n.º 1, do CIRE287.

Segundo, CARVALHO FERNANDES, o art. 246º, n.º 2, do CIRE, não é claro ao fixar o regime da legitimidade para requerer a revogação da exoneração do passivo restante.

No entanto, da segunda parte do referido preceito resulta que os credores da insolvência têm legitimidade para requerer a exoneração. Para além disso, não é menos verdade que, ao estabelecer um regime particular para esses requerentes, quando requerida por um credor da insolvência, sugere evidentemente que a legitimidade pode caber a outras entidades, no entanto, questiona-se a quais entidades e se poderá o Juiz decretar a revogação ex officio.

A cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante, figura jurídica semelhante à revogação, pode ser requerida, não apenas pelos credores, como também pelo administrador da insolvência, quando ainda esteja em funções, e pelo fiduciário, mas somente se este estiver encarregado, pela assembleia de credores, de fiscalizar a atuação do devedor no cumprimento das suas obrigações, em conformidade com o art. 243º, n.º 1, do CIRE.

Entretanto, verificados estes requisitos, não se vê o motivo pelo qual não se atribuirá legitimidade a essas mesmas entidades para requerer a exoneração do passivo restante.

Desta forma, o fundamento de proximidade que justifica esta resposta conduz-nos a não reconhecer ao Juiz o poder de oficiosamente decretar a revogação da exoneração, na medida em que a lei não lha reconhece nos casos de cessação antecipada correspondentes à revogação, de acordo com o art. 243º, n.º 1, do CIRE. Este entendimento retira-se da comparação com o art. 243º, n.º 1, e n.º 4, do CIRE288.

Contudo, a legitimidade cabe aos credores e às pessoas compreendidas no art. 217º, n.º 4, do CIRE. Este entendimento retira-se da comparação com o art. 243º, n.º 1, e n.º 4, do CIRE289.

ambos do do CIRE, a reconstituição apenas compreende os créditos sobre a insolvência que tenham sido reclamados ou verificados, sendo total a extinção dos créditos sobre a insolvência não reclamados e verificados.

287 Cfr. MARTINS, Alexandre de Soveral, op. cit., p. 616.

288 Cfr. FERNANDES, Luís A. Carvalho, A Exoneração do Passivo Restante na Insolvência das Pessoas Singulares no Direito Portuguêsin Coletânea de Estudos sobre a Insolvência, op. cit., p. 305.

289 Cfr. FERNANDES, Luís A. Carvalho/ LABAREDA, João, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas: Anotado, op. cit., p. 921.

A revogação da exoneração do passivo restante pode ser requerida até ao termo do ano subsequente ao trânsito em julgado do despacho de exoneração, conforme resulta do disposto no art. 246º, n.º 2, do CIRE290.

A lei impõe que seja provado: a) que o devedor incorreu num dos fundamentos de indeferimento liminar conjeturados no art. 238º, n.º 1, alínea b) a g), do CIRE291; ou b) que o devedor violou dolosamente292

as obrigações a que este está sujeito durante o período da cessão do rendimento disponível; c) em qualquer dos casos, que pelo motivo invocado o devedor tenha prejudicado de forma importante a satisfação dos credores da insolvência. Por sua vez, quando a revogação da exoneração for requerida por algum credor da insolvência, este terá que alegar, bem como provar que não teve conhecimento dos fundamentos da revogação até ao momento do trânsito em julgado do despacho de exoneração, de acordo com o art. 246º, n.º 2, do CIRE. A nossa opinião vai no mesmo sentido de ALEXANDRE SOVERAL, visto que tendo em consideração o momento tardio em que a questão se coloca, faria mais sentido exigir-se que o não conhecimento dos fundamentos da revogação até ao momento do trânsito em julgado do despacho de exoneração, por parte de algum credor da insolvência fosse desculpável. Em conformidade com o art. 246º, n.º 3, do CIRE, o Juiz não pode decidir se revoga ou não a exoneração do passivo restante sem antes ouvir o devedor e o fiduciário.

290 Segundo este preceito, a revogação da exoneração do passivo restante pode ser «decretada» e não requerida no prazo de um ano posterior ao trânsito em julgado do chamado despacho de exoneração. Contudo, segundo FERNANDES, Luís A. Carvalho, A Exoneração do Passivo Restante na Insolvência das Pessoas Singulares no Direito Português in Coletânea de Estudos sobre a Insolvência, op. cit., p. 306, a interpretação rigorosa do texto da lei conduziria a considerar, na fixação do limite do prazo nele estabelecido, à data da emissão da decisão de revogação ou, até mesmo, do seu trânsito em julgado. Todavia, este entendimento leva à solução, inteiramente desrazoável, de não se saber quando o respetivo requerimento havia de ser apresentado para estar em tempo, na medida em que tudo dependeria da rapidez do Juiz ao emitir a decisão sobre o pedido de revogação. Do exposto resulta que apenas se pode entender que o prazo previsto no n.º 2, do art. 246º, do CIRE, é dirigido ao respetivo momento de apresentação do requerimento de revogação e não ao do seu decretamento.

291 SERRA, Catarina, op. cit., p. 165, entende que se faz sentido que o elenco de causas da cessação antecipada seja no mínimo tão amplo como o da revogação da exoneração do passivo restante, não se compreende que este último se reconduza à quase totalidade das causas do indeferimento liminar do pedido de exoneração – às alíneas b) e ss. do n.º 1, do art. 238º, do CIRE. Rigorosamente, o elenco de causas de revogação deveria até ser menos amplo do que propriamente o da cessação antecipada. No entanto, trata-se de uma política legislativa, a considerar no contexto e para efeitos de uma lei futura.

292 O art. 243º, n.º 1, alínea a), do CIRE basta-se com a grave negligência. Segundo CRISTAS, Maria Assunção, Exoneração do Devedor pelo Passivo Restante, in “Themis, Revista da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, setembro de 2005, Edição Especial, Novo Direito da Insolvência, p. 173, anteriormente o art. 243º n.º 1, alínea a), do CIRE, se referia a violação dolosa ou com negligencia grave. Contudo, atualmente, por meio da passagem do tempo e por razoes que se prenderão com a segurança jurídica apenas releva a violação dolosa das imposições do art. 239º, n.º 4, do CIRE. Pelos mesmos motivos, também no que concerne ao prejuízo que tal violação tenha originado, a lei faz uma qualificação adicional, na medida em que é necessário provar que o devedor, por força dessa circunstância, prejudicou de forma relevante a satisfação dos credores da insolvência, de acordo com o art. 246º, n.º 1, parte final, do CIRE.

Por sua vez, segundo FERNANDES, Luís A. Carvalho/ LABAREDA, João, Coletânea de Estudos sobre a Insolvência, op. cit., p. 920, o n.º 1, do art. 246º, do CIRE, faz depender a revogação de a violação ser dolosa, ao passo que a alínea a), do n.º 1, do art. 243º, do CIRE, determina a cessação antecipada, quer quando há dolo, quer quando há culpa grave. Tal diferença justifica-se, na verdade, no facto de a revogação ser mais grave nas suas consequências, por fazer cessão efeitos jurídicos já produzidos.

Em suma, a revogação da exoneração do passivo restante tem lugar por meio de despacho, que está sujeito a publicação e registo, nos termos dos arts. 247º do CIRE, art. 9º, alínea m), do CRCom., e o art. 1º, n.º 1, alínea o), do CRCiv293.

Nos termos do n.º 2, do art. 248º, do CIRE, sendo concedida a exoneração do passivo restante, volvidos os cincos anos, aplica-se automaticamente o disposto no art. 33º do RCP, ou seja, o pagamento das custas pode ser efetuado em prestações mensais sucessivas e dentro dos limites e condições previstos no regulamento.

Contudo, de acordo com o art. 248º, n.º 3, do CIRE, se a exoneração for posteriormente revogada, caduca a autorização do pagamento em prestações, e para além disso, aos montantes em divida acrescem juros de mora calculados como se o benefício previsto no n.º 1, do art. 248º, do CIRE, não tivesse sido concedido, à taxa prevista no n.º 1, do art. 33º do RCP.