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A Análise do Risco Ecológico (ARE) é um método para o planejamento espacial de bases ecológicas e tem, como referencial teórico, a Teoria do Planejamento Ecológico, desenvolvida em 1972 por pesquisadores alemães da Akademie für Raumforschung und Landesplanung de Hannover, motivados pelo que Odum denominara “funções do equilíbrio ecológico”, em 1969 (FARIA, 1996).

A Teoria do Planejamento Ecológico apresenta-se como base conceitual para viabilizar as recomendações de um planejamento espacial comprometido com a idéia do ecodesenvolvimento, que orienta as discussões na Conferência de Estocolmo, em 1972. Propõe que o planejamento regional e local “passe a ser dotado de uma orientação ecológica, com a inserção de componentes ecológicos nos seus sistemas de objetivos e deixando clara a ordem de valor desses componentes, ao definir os objetivos e suas inter-relações” (FARIA, 2004a, p. 10). O método Análise do Risco Ecológico foi estruturado, entre 1974 e 1975, por Aulig, Bachfisher, David, Kiemstedt e Müller, da Universidade de Munique, com uma aplicação prática no planejamento da região da Média Francônia. Em pesquisa realizada entre 1979 e 1983, Faria introduz novos condicionantes de planejamento à concepção original, em resposta a críticas da comunidade científica alemã ao método. Uma aplicação prática da nova versão do método foi realizada na Região Metropolitana de Belo Horizonte, em 1981, com o objetivo de demonstrar suas possibilidades de utilização na realidade brasileira (FARIA, 2004b).

Salas (2002, p. 43) afirma que:

El Análisis de Riesgo Ecológico (ARE) es una metodología para la evaluación ambiental. Esta metodología puede ser utilizada tanto para la evaluación ambiental del territorio en el marco de la planificación ecológica, como también en la evaluación de impacto ambiental (EIA) de proyectos y en la evaluación ambiental estratégica (EAE) de programas y planes.

Sankoh (2003, p. 187) ressalta que a Análise do Risco Ecológico é um método que identifica alternativas para o processo decisório:

The AER method is an EIA approach that is appropriate for modeling area sensitivity, identifying route (in general, project) alternatives, and for assessing the environmental compatibility of the identified alternatives. The approach supports GIS application in environmental assessment. The method produces several maps useful in the decision-making process […]. It therefore makes room for arguments to be presented based on the collected data.

Segundo Faria (2004b), o método Análise do Risco Ecológico possibilita avaliar as inter-relações entre os usos existentes e os fatores naturais que caracterizam um determinado espaço, a partir da análise das relações de troca entre o sistema das atividades antrópicas (causador de efeitos negativos) e o sistema dos fatores naturais (receptor e difusor desses efeitos negativos), conforme pode ser observado na Figura 1. Trata-se, portanto, de operacionalizar a relação Uso (causa) - Efeito

ecológico desencadeado - Usos atingidos. Na ARE, entende-se risco ecológico

como risco de danos aos fatores naturais, no sentido de se expressar a insegurança de que esses danos ecológicos venham a ocorrer, de fato.

O Risco é obtido pela combinação da Sensibilidade dos Fatores Naturais a Danos potencialmente causados por usos antrópicos e a Intensidade de Danos Potenciais causados aos fatores naturais pelos mesmos usos. A Sensibilidade dos Fatores Naturais a Danos é dada “pelo potencial de uso dos fatores naturais e pela capacidade desses fatores de difundir efeitos negativos”. A Intensidade de Danos Potenciais refere-se aos efeitos esperados nos fatores naturais pelo desenvolvimento de usos (existentes e planejados). É influenciada pelo tipo e dimensão dos efeitos desencadeados pelos usos, assim como pelas condições dos fatores naturais na área objeto de planejamento e na área de dispersão dos efeitos negativos (FARIA, 2004b, p. 101).

Figura 1 Esquema básico da Análise de Risco Ecológico. Fonte: FARIA, 1996, p. 15.

Como a ARE utiliza-se de um modelo de indicadores, é importante minimizar os problemas típicos de tais modelos, que são basicamente os aspectos de conteúdo e de quantificação. No que se refere ao conteúdo, é preciso que a escolha dos indicadores baseie-se no conhecimento científico disponível (Física, Química, Biologia, etc.) para que realmente venham a ser considerados os elementos mais importantes dos sistemas ecológicos a analisar. Por exemplo, é preciso conhecer como cada um dos fatores naturais se comporta em relação a cada um e ao conjunto dos poluentes gerados pelas atividades humanas existentes ou previstas no espaço tomado como referência para o planejamento, já que a intensidade dos

efeitos da poluição vai depender das características dos fatores naturais nesse mesmo espaço. Todavia, a complexidade do modelo não deve ser aumentada pela consideração de um número cada vez maior de indicadores, sob pena de se ter os erros de medição potencializados. Além do mais, o modelo deve permanecer sempre transparente (FARIA, 2004b).

A operacionalização das relações entre usos antrópicos e fatores naturais implica realizar análises de impacto ambiental com base em informações deficientes. Assim, a disponibilidade de dados é o fator determinante na operacionalização da Análise do Risco Ecológico. Faria (2004b) ressalta que a vantagem do modelo de quantificação utilizado na ARE, quando comparado com outros métodos de planejamento ecológico (p. ex.: Análise do Potencial de Uso). As funções de agregação pela lógica matemática (álgebra booleana), representadas na forma de diagramas do tipo “árvore” (FIGURA 2), garantem a transparência do método, passo a passo.

Figura 2- Estrutura formal de uma árvore de avaliação. Fonte: FARIA, 1996, p. 22.

De acordo com Salas (2002), a ARE parte de uma base metodológica de caráter qualitativo, que fundamenta os resultados por meio da intersubjetividade2, possibilitando, assim, uma abordagem mais adequada às situações de incerteza na avaliação. O autor descreve como principais elementos metodológicos da ARE:

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“Por intersubjetividad se entiende, en este contexto, una aproximación a la evaluación que, sin pretender ser objetiva, se sustenta en juicios de valor - que reclaman para sí una validez social y pretenden ser orientadores de comportamiento - que sobrepasan las opiniones subjetivas individuales” (SALAS, 2002, p. 42).

a) Baseia-se em um modelo conceitual que define uma ação, uso ou atividade que origina um efeito ambiental relevante, que resulta em risco ecológico para o componente afetado.

b) Refere-se ao risco como probabilidade quantitativa de ocorrência de algum efeito adverso.

c) Utiliza, geralmente, uma escala ordinal com três níveis: alto, médio e baixo. d) A sensibilidade é o resultado da integração da importância ecológica dos componentes ambientais e sua vulnerabilidade ou susceptibilidade aos efeitos negativos.

e) Os efeitos negativos de certas ações, usos ou atividades são avaliados pelos níveis de intensidade.

f) O resultado da integração entre sensibilidade e intensidade é o risco ecológico (FIGURA 3).

Figura 3 - Matriz de integração para obtenção do Risco Ecológico. Fonte: SALAS, 2002, p. 48.

Os passos metodológicos para a realização da Análise do Risco Ecológico são os seguintes (Faria, 2004):

• Input: informações sobre condicionantes básicos para o planejamento na região a ser analisada (inclusive o espaço natural a preservar) e sobre a estrutura atual do espaço regional.

• Primeiro passo: Decomposição do sistema “Usos - Fatores Naturais” em subsistemas independentes, embora inter-relacionados. No centro desses subsistemas está, ou um fator natural (p. ex.: Água, Ar, Solo), ou uma

qualidade natural básica (p. ex.: potencial natural para lazer). Esses subsistemas são considerados complexos de causa-efeito e denominados Áreas de Conflito.

• Segundo Passo: Agregação dos indicadores representativos dos efeitos negativos provenientes dos usos, formando a grandeza complexa Intensidade dos Danos Potenciais, dentro de cada Área de Conflito.

• Terceiro Passo: Agregação dos indicadores da aptidão para receber um determinado uso e da interdependência entre efeito negativo e recursos naturais, formando a grandeza complexa Sensibilidade a Danos, dentro de cada área de conflito.

• Quarto passo: Combinação da Intensidade dos Danos Potenciais com a Sensibilidade a Danos, formando a grandeza agregada Risco de Danos.

Na operacionalização da ARE, Faria (1996, 2004a, 2004b) utiliza-se de um

modelo de indicadores baseado no conhecimento científico disponível, o que se justifica não só pela deficiência de dados, mas principalmente pela dificuldade de se medirem os efeitos negativos, a capacidade de difusão e o potencial de uso. Os indicadores de Sensibilidade dos fatores naturais e da Intensidade de Danos Potenciais devem ser considerados os elementos mais importantes dos sistemas ecológicos a serem analisados no espaço tomado como referência para o planejamento. Diferentemente de Salas (2002), a autora não restringe a três (alto - médio - baixo) a quantidade dos níveis de avaliação utilizados na ARE. Na agregação de indicadores pela lógica matemática (álgebra booleana), a quantidade de níveis irá depender da disponibilidade de informações quantitativas e qualitativas sobre os processos envolvidos na situação analisada, como pode ser depreendido da Figura 2, apresentada anteriormente.

3 DESCRIÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO: SUB-BACIA DO CÓRREGO GUARÁ

A sub-bacia do córrego Guará (FIGURA 4), no Distrito Federal, abriga a Região Administrativa do Setor de Indústria e Abastecimento (RA XXIX), grande parte das Regiões Administrativas do Guará (RA X) e da Candangolândia (RA XIX), e a parte da Região Administrativa de Brasília (RA I) correspondente ao Setor Policial (SPO). Nela se encontram a Reserva Ecológica do Guará, onde se localizam as nascentes do córrego, bem como o Parque Ecológico Ezechias Heringer e parte do Jardim Zoológico de Brasília, que são atravessados pelo córrego, em seu caminho rumo ao ribeirão Riacho Fundo.

Figura 4- Mapa da sub-bacia do córrego Guará, Distrito Federal Fonte: GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL. SEMARH, 2006.

Ribeirão Riacho Fundo Córrego Guará

Lago Paranoá

A Figura 5 mostra uma imagem satélite da sub-bacia do córrego Guará, onde pode ser observada a sua configuração espacial, com destaque para o trajeto percorrido pelo córrego.

Figura 5- Imagem satélite da sub-bacia do córrego Guará, Distrito Federal Fonte: Google ,2007.

3.1 CÓRREGO GUARÁ

JZB

O córrego Guará, com extensão aproximada de 7,5 km e declividade média do leito de 8,9 m/km, tem suas nascentes na Reserva Ecológica do Guará, que se situa entre o Guará I e o Setor de Indústria e Abastecimento (SIA). Contribui para a grande bacia Paraná/Paraguai por pertencer à sub-bacia do ribeirão Riacho Fundo, uma das cinco sub-bacias que compõem a bacia hidrográfica do Lago Paranoá,

representada na Figura 6 em cor azul claro. Sua bacia de drenagem, com uma área de 31,1 km², representa 13,6% da sub-bacia do ribeirão Riacho Fundo (GDF/CODEPLAN/COORDENAÇÃO ESPECIAL DO METRÔ & HIDROGEO, 1993).

Figura 6 - Unidades hidrográficas da bacia do Lago Paranoá. Fonte: FONSECA, 2001, p. 50.

A bacia de drenagem do Lago Paranoá tem área total de 1.034,07 km², área superficial de 37,50 km² e volume total de 498 x 106 m³ (FONSECA, 2001). Totalmente inserida no território do Distrito Federal, tem como principais corpos d’água: lago Paranoá, ribeirão do Gama, ribeirão Riacho Fundo, ribeirão Canjerana, ribeirão Antas, ribeirão do Bananal, ribeirão do Torto, ribeirão Taquari, ribeirão Jerivá e ribeirão Palha. O córrego Guará alcança o ribeirão Riacho Fundo pouco antes da desembocadura deste, no lago Paranoá, conforme é indicado na FIGURA 7.

Figura 7– Localização do córrego Guará na bacia do Lago Paranoá. Fonte: FONSECA, 2001, p. 50.

O ribeirão Riacho Fundo, com curso principal de 13 km de extensão, é um dos principais contribuintes do lago Paranoá e sua bacia possui uma área de 225,4 km². Tem como afluentes, na margem esquerda, os córregos Guará e Vicente Pires, e na margem direita, o córrego Ipê. Os cursos d’água que compõem a sub-bacia do Riacho Fundo apresentam a pior qualidade de água dentre as cinco sub-bacias que compõem a bacia do lago Paranoá, dado que ali se encontra também a maior densidade e diversidade de ocupação (SANTOS et al., 2004).

A Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (CAESB) enquadra o córrego Guará na Classe 3, conforme os critérios estabelecidos pela Resolução CONAMA nº 357/05 (BRASIL, 2005), ou seja, sua água destina-se ao abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional; irrigação de culturas arbóreas, cerealíferas e forrageiras; pesca amadora; recreação de contato secundário; e dessedentação de animais (STARLING, 2005)

O entorno do córrego é ocupado, à direita, por Guará I, Guará II, Candangolândia e Setor de Postos e Motéis; e à esquerda, pelo Setor de Inflamáveis (SIN), Setor de Indústria e Abastecimento SIA), Setor de Oficinas Sul (SOF-SUL) e Jardim Zoológico de Brasília (FIGURA 4). Na área predominam: o uso residencial unifamiliar e multifamiliar, o comércio de bens e serviços, e prédios e instalações de uso coletivo e institucional. Embora o esgoto dessa área seja coletado e levado por emissários até à Estação de Tratamento de Esgotos da Asa Sul (ETE-SUL), o córrego recebe esgoto de ligações clandestinas, bem como detergentes, óleos e graxas, que são lançados na rede de águas pluviais pelos postos de lavagem de veículos e lubrificação, do Setor de Oficinas Sul.