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A RMAAD nas tramas da WEB: o uso da Internet e das novas tecnologias

CAPÍTULO 5. “VOZES” Red de mujeres afrolatinoamericanas, afrocaribeñas y de la diaspora:

5.2. A RMAAD nas tramas da WEB: o uso da Internet e das novas tecnologias

De acordo com Lévy (1999) as tecnologias da informação e da comunicação são verdadeiros instrumentos da democratização porque permitem um tipo de interação de todos-para-todos. Se nos meios de comunicação clássicos havia a “separação nítida entre centros emissores e receptores passivos isolados uns dos outros”, o mesmo não acontece com a comunicação mediada por tecnologias num espaço qualitativamente diferenciado, não fixo, disposto pelos participantes, explorável, denominado de ciberespaço. Nesse “lugar” as pessoas se encontram segundo centros de interesses, numa paisagem comum do sentido ou do saber. (Ibid., p.113)

Castells (1996) também apontou as tecnologias da informação como centrais para a compreensão da sociedade contemporânea. O autor argumenta inclusive que foi graças às tecnologias da informação que a configuração de rede, uma das concepções mais interessantes para o objeto de análise dessa tese, ou seja, a lógica de redes está implícita na era da sociedade da informação, colocada inclusive em prática em muitas organizações e processos. Essa morfologia específica poderia dar conta de explicar a complexidade cada vez maior nas relações de interação social e dos resultados (imprevisíveis) dessas relações. (PRUDÊNCIO, 2008; 2006)

160 Os conflitos inerentes a este modelo societário impõem também a luta pelos significados construídos por aparatos informacionais, e é nesse sentido que os movimentos sociais contemporâneos promovem lutas pela possibilidade de construção e definição desses significados por meio de discursos públicos.

A RMAAD parte do pressuposto de que o acesso à informação, à sua produção e distribuição são elementos-chave para se avaliar as relações de poder nas sociedades democráticas. A liberdade de expressão, a pluralidade de canais de informação e a sua respectiva independência, o acesso amplo de diferentes estratos sociais à informação e aos novos meios de comunicação são, para a Rede, elementos relevantes para a construção de novas relações de poder.

De acordo com relatório do PNUD (2009), 70% das 161 organizações afrodescendentes que foram investigadas na região da América Latina e do Caribe, tem acesso à Internet.

Figura 4: Organizações Afrodescendentes da América latina e Caribe e o acesso à INTERNET Fonte: Relatório do PNUD – Atualidade Afrodescendente na Ibero-América (2009)

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Figura 5: Organizações Afrodescendentes da América latina e Caribe com websites e blogs Fonte: Relatório do PNUD – Atualidade Afrodescendente na Ibero-América (2009)

Todas as organizações consideram o uso das tecnologias da informação e da comunicação como fundamental para a ação.

Ainda, segundo o PNUD (Ibid.), em termos de formação requerida pelas organizações de afrodescendentes da região da América Latina e do Caribe, a formação em “Tecnologias da Informação e Conhecimento (TIC)” aparece como prioridade, seguida de “gestão empresarial”, “elaboração de projetos de desenvolvimento” e “desenvolvimento comunitário”:

Figura 6: Organizações Afrodescendentes da América latina e Caribe – prioridades de formação e

capacitação.

Fonte: Relatório do PNUD – Atualidade Afrodescendente na Ibero-América (2009).

A Internet, nesse sentido é concebida como um mecanismo que aumenta o escopo das possíveis práticas que podem ou não favorecer a legitimidade do sistema democrático. Se a vinculação à democracia passa não apenas por pressupostos racionais, mas também através das práticas cotidianas (MOUFFE, 2000) o uso desta tecnologia, como instrumento de propagação da informação e como meio de comunicação, passa a ser um elemento colaborativo importante para esse processo. A Internet, para a RMAAD, oferece as condições para que um processo reflexivo de recepção das

162 mensagens aconteça diferentemente das mídias tradicionais. Tal compreensão emana das possibilidades que a Internet oferece.

Em vídeo-entrevista, Dorotéa Wilson (2010b), ressaltou as múltiplas possibilidades de interação oferecidas: um para um, um para muitos, muitos para muitos, muitos para um, no qual as informações e comunicações podem circular nos níveis local, nacional ou global e, comparativamente, com baixas barreiras de entrada. A ideia de produção e circulação da contrainformação, tão importante para os movimentos sociais, porque alcança espaços e indivíduos a custos mais baixos, põe a Internet em destaque nas ações da Rede.

A RMAAD concebe a Internet como um importante meio, capaz de fornecer as condições necessárias para a criação de canais informativos e comunicativos alternativos aos grandes meios de comunicação de massa. Para a Rede, os espaços eletrônicos permitem que os diversos atores da sociedade civil que compõem o movimento interajam por meio da troca de informações, percepções e conhecimento sobre as questões do racismo e temas correlatos, trazendo por consequência para a esfera pública questões que até então estavam silenciadas.

A Internet, nesse sentido, torna-se outro espaço para que tais questões sejam tematizadas, articuladas e publicizadas. É importante ressaltar que a RMAAD tem plena consciência de que as mudanças de relações de poder que a Internet possibilita são limitadas e só poderá acontecer se esta estiver situada em uma configuração mais ampla, fora da Internet, que esteja favorável à mudança. Com relação à página eletrônica da RMAAD (http://www.mujeresafro.org/), lançada ao ar no ano 2000, um ano antes da III Conferência de Durban, podemos destacá-la como um instrumento de comunicação da Rede bastante importante.

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Figura 7: Página eletrônica da RMMAD. Fonte: (http://www.mujeresafro.org/).

Por meio de diferentes softwares os usuários podem acessar arquivos multimídia diversificados como vídeos, áudios e fotografias. Estão disponibilizados também muitos documentos, artigos, textos e pesquisas referentes aos temas de luta da Rede. Nele é possível conhecer quem são as mulheres da RMAAD, seus objetivos, a agenda, notícias, publicações, assim como as formas de contato e os seus vínculos.

O site também faz enquetes sobre as ações que a Rede desenvolve. No ar atualmente está a enquete sobre o mapeamento das organizações e pessoas que compõem a RMAAD.

O ativismo online desenvolvido pela RMAAD assume a Internet como apoio e forma de fortalecer as suas outras formas de ação política, que já ocorrem fora do ambiente virtual, como por exemplo, o uso de emails e de plataformas sociais para informar os militantes sobre eventos, manifestações, campanhas, etc.. A Internet, nesse caso, não é assumida como o único espaço onde as ações são realizadas, mesmo porque as redes existentes entre as entidades não são fruto somente da conexão à Internet, já que a maioria é anterior a ela. Neste aspecto, o papel da comunicação online é o de potencializar estas redes e de promover um conjunto de ligações que não residem

164 exclusivamente na proximidade territorial, nem nas relações verticais entre as dimensões de uma organização. (GRANJON, 2001)

Trata-se de uma combinação entre indivíduos e artefatos que permite a realização das atividades desejadas, criando assim um dispositivo, que publiciza determinados fatos que não estejam sendo veiculados nas mídias tradicionais, e que também atua como mecanismo para aplacar ou diminuir os riscos que muitos ativistas sofrem ao desenvolverem suas ações em campo.

A diminuição dos custos da mobilização é também pontuada pela RMAAD como algo relevante, já que não possui, tradicionalmente, muitos recursos financeiros. A Internet, nesse sentido, colabora com o processo de mobilização, através de boletins, emails, listas de discussão e por meio da construção de um espaço cooperativo que oferece informações vindas das mais variadas fontes, enriquecendo as práticas coletivas. A imediaticidade, a capacidade de atingir indivíduos nos mais remotos locais e a construção de redes faz com que esta tecnologia seja particularmente útil no processo de mobilização para as suas ações políticas.

Diante de todos os benefícios que a utilização das novas tecnologias traz para a Rede, a RMAAD tem evidente que a Internet não resolve a questão da participação igualitária, basicamente em função da exclusão digital, realidade que impera de formas distintas em todo o mundo. Para a Rede, é necessária muita cautela ao propor a Internet como mecanismo de aperfeiçoamento democrático, pois uma grande parcela da população mundial ainda está fora do processo de apropriação de novas tecnologias. (WILSON, 2010)

Há muitas entidades e organizações sociais que fazem parte da Rede que não possuem recursos financeiros para terem uma sede, uma linha telefônica, quanto mais uma conexão para a Internet. Por isso, o acesso aos afrodescendentes às novas tecnologias, assim como com relação ao tratamento e produção da informação, são reinvidicações e pauta de luta da RMAAD, visto que a ruptura espaço-temporal promovida pela Internet é compreendida como um importante mecanismo de articulação das ações contra-hegemônicas dos movimentos sociais em diferentes escalas.