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ANO OBJETO DE ESTUDO ÁREA DE PESQUISA

4 O MERGULHO EM CAMPO: DESCRIÇÃO DOS

4.2 A FORMALIZAÇÃO INSTITUCIONAL DO ESTUDO E A DESCRIÇÃO DE CAMPO E PARTICIPANTES DA PESQUISA

4.3.1 Rodas de conversa: interagindo com professores e alunos

Conforme já mencionado, após contato com Supervisão e Orientação Escolar e conversa com os docentes a fim de convidá-los a participarem da pesquisa, realizamos, junto com Tomazoni (2016), uma roda de conversa com as três professoras que aderiram ao convite, acompanhada da aplicação de um questionário (APÊNDICE F), a fim de delinear sua caracterização genérica; a roda foi gravada em áudio, com as devidas anuências das participantes de pesquisa e transcrita para análise. Em consonância com os focos orientadores disponíveis no Apêndice G, nosso intuito, neste primeiro contato com as professoras, foi que elas nos informassem sobre seus trabalhos com leitura – objeto deste estudo – e a escritura – objeto de estudo de Tomazoni (2016) –, o ensino de gramática – entendido, aqui, como análise linguística, atividade esta que perpassa leitura e produção de textos –, além de suas relações com o livro didático utilizado na escola, bem como o processo de escolha desse material, tendo em vista que nossa pesquisa busca compreender a configuração do espaço destinado à leitura em aulas de Língua Portuguesa, em que se lance mão de propostas do livro didático ou não, resultado de parte de dados gerados em Catoia Dias (2012), como mencionado. Entendemos a importância de um diálogo aberto acerca da aula de Língua Portuguesa em geral e não somente sobre aquelas aulas em que a formação de leitores é o foco, pois assim vislumbramos a ação didático-pedagógica em sua totalidade, compreendendo representações que subjazem a ela.

No que diz respeito ao instrumento de geração de dados selecionado para esta etapa, as rodas de conversa constituem um processo

que vem sendo utilizado com certa frequência em estudos de caráter qualitativo, mas que ainda não possui um embasamento teórico consolidado, uma vez que não há muitas reflexões sobre esse assunto na literatura da área, ou seja, trata-se de um instrumento que carece de teorizações mais efetivas. Entendemos, contudo, que, do modo como se constituem contemporaneamente, as rodas de conversa estão profundamente imbricadas com o que estudos qualitativos têm chamado de grupo focal, conforme indicam abordagens de nosso grupo de pesquisa (PEDRALLI, 2014; GIACOMIN, 2013).

As rodas de conversa, em nosso entendimento, convergem com os grupos focais no tocante a ambos constituírem interações em que sujeitos são reunidos a fim de dialogarem acerca de um assunto partindo de suas vivências (DE ANTONI et al., 2001; GATTI, 2005). Em nossa compreensão, entretanto, a distinção dos dois instrumentos está na ação empreendida pelo pesquisador: no grupo focal, o estudioso desenvolve uma ação sobre os sujeitos, enquanto nas rodas de conversa o enfoque parece ser uma ação com os sujeitos (com base em PEDRALLI, 2014). Nosso compartilhamento com a percepção de ação com se assenta no aporte teórico sobre o qual se sustenta nosso estudo; reconhecemos, no entanto, como já afirmamos, a ausência de bases teóricas específicas sobre rodas de conversa, o que nos leva a vinculá-las, aqui, com o grupo focal.

Intentamos a proposição de rodas de conversa, pois as compreendemos como um instrumento de geração de dados mais aproximado das concepções de sujeito e de língua, tanto quanto de leitura que fundamenta o presente estudo – encontro de. Assim, baseados em nosso Grupo de Pesquisa e corroborando Pedralli (2014) e Giacomin (2013), tomamos as rodas de conversa como um instrumento que emerge da proposta de grupos focais com ressignificações tais que o tornem um instrumento mais adequado para os objetivos desta pesquisa, visto que, em nossa opinião, o possível espaço conferido à leitura, a configuração de tal espaço, o uso do livro didático, as representações dos sujeitos acerca de tais usos, das aulas de Língua Portuguesa, bem como sobre o ato de ler podem ser inferidos em interações nas quais os sujeitos verbalizem essas mesmas representações. É de nosso interesse, dessa forma, conceber rodas de conversa o mais proximamente possível da perspectiva do encontro da outra palavra e da palavra outra, de que trata Ponzio

(2010a), entendendo os professores e os alunos participantes das rodas80 como sujeitos singulares que interagem na tensão do encontro de.

Devemos deixar claro que estamos cientes de que nosso percurso metodológico não nos faculta partir da singularidade do sujeito – o que nos levaria a uma posição subjetivista –, tampouco sobrevalorar macrocategorias, com base no que discute Ponzio (2014). Na busca pelo zelo de evitar ambos os extremos, o delineamento de nossas questões buscou conjugá-los em um tensionamento, fazendo nos movimentarmos da categoria ‘grupo de professores’ (por meio das rodas de conversa) para a singularidade de cada qual (por intermédio da realização da observação de suas aulas e das entrevistas individuais), assim como empreender o movimento inverso, sem, contudo, perder de vista tal tensionamento inter- relacional. Essa movimentação, sob nosso ponto de vista, justifica-se em virtude de compreendermos o sujeito como datado, situado social e historicamente, cuja constituição se dá, a todo tempo, também no tensionamento entre a sociogênese (o que nos remete ao sujeito inserido em um grupo num determinado contexto ou no que denominamos intersubjetividade) e a microgênese (o que nos remete às particularidades do sujeito sob o escopo da intrassubjetividade), segundo apontam estudos vigotskianos (VYGOTSKI, 2012 [1931]). É nosso intuito, portanto, promover tal tensão em duas direções: da sociogênese para a microgênese, em um processo de contingenciamento das ações docentes; da microgênese para a sociogênese, em representações singulares materializadas nas enunciações – reiteramos, porém, não termos a análise microgenética como orientadora do percurso de pesquisa. Com isso, admitimos a ressignificação do encontro de Ponzio (2010a), haja vista estarmos tratando de um encontro que é inerentemente funcional (o sujeito em sua condição de labor – professor), o que nos afasta da infuncionalidade a partir da qual o filósofo italiano concebe o encontro. De todo modo, como vimos fazendo em nosso Grupo de Pesquisa (CERUTTI-RIZZATTI; IRIGOITE, 2015; IRIGOITE, 2015), concebemos que essa ressignificação do encontro que propomos para o plano das relações educacionais justifica-se porque a esfera escolar, diferentemente de outras esferas da atividade humana, lida com a funcionalidade no plano da formação do sujeito, o que confere ao funcional outros contornos; voltaremos a essa discussão por ocasião da análise dos dados.

80 Lembrando que, após imersão nas aulas, foram realizadas rodas de conversa também com

No que concerne aos tópicos sobre os quais se intentou discutir, há propostas de eixos orientadores para a interação com as professoras (APÊNDICE G). Tais eixos relacionam-se com aqueles eixos que sustentam as questões de pesquisa, porém tomados na perspectiva do encontro e, assim, distanciam-se de uma busca por um diálogo em que não haja digressões e em que se suponha exauribilidade. Coube, é certo, a construção de um roteiro de apoio às interações em convergência com as questões de pesquisa, abordando situações de vivência em sala de aula e com o livro didático a fim de buscar compreender as representações, os valores atribuídos a tais momentos, as ressignificações, enfim. Compreendemos tais eixos como um roteiro que funciona como base em um processo que transcenda respostas a questionamentos, mas na assunção de que do encontro de outras questões emerjam, afastando-se do conceito de técnica e aproximando-se do conceito de ausculta, de mútuo deslocamento com os sujeitos que participam do estudo (PEDRALLI, 2014).

Quanto à realização de rodas de conversa com os alunos, após finalização do processo de observação das aulas e passadas as entrevistas individuais, realizamos com cada um deles, dois momentos de interação – um com alunos do sétimo ano (eixos norteadores no APÊNDICE L), outro com alunos do nono ano (eixos norteadores no APÊNDICE M) – também gravados em áudio, com permissão dos participantes de pesquisa. Com a realização de tais rodas, foi-nos possível compreender com maior clareza as representações discentes acerca do ato de ler, do espaço destinado a tal ato nas aulas de Português, do uso de livro didático, bem como das demais atividades empreendidas em sala de aula, com um aprofundamento maior em relação à abordagem que empreendemos por ocasião das entrevistas individuais pregressas, questões que serão discutidas à frente, quando da análise dos dados gerados.

4.3.2 Observação participante com notas de campo: experienciando a