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SAÚDE E EDUCAÇÃO NO COMBATE À DENGUE

grande desafio enfrentado pela sociedade tem sido colocar em prática ações eficazes de combate à dengue e promoção da saúde.

Os programas essencialmente centrados no combate químico, com baixíssima ou mesmo nenhuma participação da comunidade, sem integração intersetorial, entre outros fatores, mostraram-se incapazes de conter um vetor com altíssima capacidade de adaptação ao novo ambiente criado pela urbanização acelerada e pelos novos hábitos (BRASIL, 2002). Em 1996, o Ministério da Saúde propôs a criação do PEAa, após revisão das ações anteriores sem sucesso. Durante o desenvolvimento, o PEAa, mesmo não atingindo seus objetivos, teve méritos ao propor algumas necessidades como: atuação multissetorial e descentralização de combate à doença. Os resultados obtidos no Brasil levaram o Ministério da Saúde a fazer uma nova avaliação dos avanços e das limitações, com o objetivo de estabelecer um novo programa de controle da dengue que incorporasse elementos como a mobilização social e a participação comunitária, indispensáveis para responder de forma adequada a um vetor altamente domiciliado (BRASIL, 2002).

Os autores GONÇALVES et al. (2015), ao analisarem a situação, ⁠ relataram que apesar do PEAa ter abordado a descentralização e a participação da comunidade, o modelo desenvolvido na prática baseou-se em métodos verticais que buscavam a eliminação do mosquito por meio de inseticidas. Nesta perspectiva a comunidade ficou, na maioria das vezes, como expectadora e na dependência de ações previamente definidas. Entretanto, mais tarde com o PNCD (BRASIL, 2002), o Ministério da Saúde apresentou diferentes estratégias de controle, incluindo ações para o fomento da participação comunitária direcionada à redução de criadouros domiciliares do vetor.

A publicação do PNCD reconheceu a população brasileira como atora das ações de promoção da saúde e educação no combate à dengue, ou seja, a conscientização da população passou a ser uma das principais formas de redução do número de casos. Devido à percepção de que as ações sanitárias implantadas no PEAa, sem colaboração da comunidade, não surtiram os efeitos idealizados, este programa instituiu um conjunto de ações integradas de educação em saúde, comunicação e mobilização social. O principal objetivo do programa na área das ações integradas de educação, o qual vigora até hoje, é fomentar o desenvolvimento de ações educativas para a mudança de comportamento e a adoção de práticas para a manutenção do ambiente domiciliar preservado da infestação por Aedes aegypti. A partir deste momento, a educação em saúde e ambiental passaram a ter um papel fundamental nas ações de combate e prevenção à doença.

O PNCD elencou ações como a elaboração de um programa de educação em saúde e mobilização social em todos os municípios, contemplando estratégias para

promoção da remoção de recipientes nos domicílios que possam se transformar em criadouros de mosquitos. Dentre as ações, foi implantada também a promoção de orientações dirigidas a imóveis especiais, incluindo as escolas, as unidades básicas de saúde, os hospitais, as creches, entre outros. Foi determinada a organização do dia nacional de mobilização contra a dengue, em novembro, incentivo da participação da população na fiscalização das ações de prevenção e controle da dengue executadas pelo Poder Público e a constituição de Comitês Nacional e Estaduais de Mobilização com participação dos diversos segmentos da sociedade. Entretanto, a implantação de ações educativas contra a dengue na rede de ensino básico e fundamental foram importantes e corroboraram com o Projeto Saúde e Prevenção nas Escolas (SPE), o qual é uma das ações do Programa Saúde na Escola (PSE) que visa a contribuição para a formação integral dos estudantes por meio de ações de prevenção, promoção e atenção à saúde. Entre as principais medidas do SPE, está elencando o combate ao mosquito transmissor da dengue.

Para SALES (2008), o papel do cidadão longe de ser mero cumpridor de ações ditadas por técnicos e autoridades públicas é também de um 'sujeito sanitário' crítico e responsável pelos processos coletivos de construção da saúde. Também, segundo a autora, o cidadão está longe de ser um repetidor de técnicas, mas para que isso possa acontecer, um diálogo de fácil compreensão, trabalhar estratégias para que o processo de ensino-aprendizagem se torne eficaz, é como uma mão de duas vias, vai e volta, com isso as pessoas são instigadas a refletir seus atos e poder mudá-los.

O local onde pisamos, nadamos ou voamos não é mais somente um objeto de estudo, é algo mais complexo do que um tema. A educação relacionada ao meio ambiente e a saúde pública, faz com que uma população consciente possa tomar medidas adequadas contra diferentes doenças, sendo capaz de combatê-las e/ou preveni-las (SOUZA et al., 2017). A Educação Ambiental (EA) integra a cultura de uma nação e tornou- se indispensável por dizer respeito a uma enorme soma de interações pessoais e sociais que ela engloba. Através dos conhecimentos que a área da EA aborda podemos perceber o nosso papel no ecossistema e quais as possibilidades de contribuirmos para o pleno funcionamento do todo, nós seres humanos devemos perceber que não somos donos da natureza, estamos somente de passagem e que podemos elaborar formas de melhor aproveitar o espaço de maneira sustentável. Nesse sentido, trabalhar o sentimento de pertencimento é imprescindível ao abordar a EA e a saúde. Um exemplo é a visão dos povos originários da América Latina, o Buen Vivir ou Sumak Kawsay, é um projeto político de vida que propõe a vida em harmonia entre todos os seres e elementos da natureza

(COCHOY et al. 2014). Traz a ideia de tornar a sociedade responsável pela maneira como produz e reproduz suas condições de existência. Essa nova concepção parte da ideia de que todos somos natureza, compreendendo que somos interdependentes, e que tudo está interconectado. O fundamento principal é o pertencimento: o ser humano sentir-se parte da natureza e interconectado com todos os seus elementos. Essa forma de organização da vida desses povos, corrobora em partes com o que é preciso desenvolver nas escolas para iniciar uma mudança de hábitos e posturas com relação ao meio ambiente (FRANCO et al. 2020).

Atualmente, estamos vivendo em um planeta globalizado com muitos problemas de cunho social, ambiental, econômico, os quais têm influência direta no processo saúde/doença da população. Neste cenário global, onde o meio ambiente está em segundo plano, existe uma enorme degradação da natureza em detrimento de ações que propulsionam a economia. Quando pensamos em como reverter esse quadro, precisamos abordar a EA baseada em preceitos e ideologias que visem iniciar um debate e consequentemente uma mudança de atitudes. Ainda, neste sentido, o Buen Vivir destaca que a lógica do bem-estar de uma pessoa não se constrói sobre os demais, mas sim baseado no respeito aos outros, isto é, meu bem-estar pessoal depende do bem-estar dos demais. É por meio de uma lógica de relacionamento social baseada no respeito, incluindo o respeito à natureza, que a sociedade poderá recriar as condições da sua história e recuperá-la (SBARDELOTO, 2010). O estudo da EA é amplo e engloba vários outros segmentos, como os efeitos da globalização que podem ser vistos além do viés da EA, como da Geografia, da Economia ou da História. Os termos “educação” e “saúde” trilham caminhos juntos, e a escola é um local de grande relevância para alcançar parte importante da população na abordagem deste tema. Neste contexto, o trabalho em conjunto de EA nas escolas focando nas ações para amenizar os impactos ao meio ambiente e a educação em saúde dentro do ambiente escolar é facilitar as didáticas empregadas para que os indivíduos que compõem a comunidade possam encontrar uma maneira eficiente de cuidar da saúde e prevenir doenças como a dengue, zika, dentre outras.

Segundo Freire (1981), o diálogo é uma exigência existencial não pode reduzir-se a um ato de depositar ideias de um sujeito no outro, nem tampouco tornar-se simples troca de ideias a serem consumidas pelos permutantes. Ainda, neste lugar de encontro, não há ignorantes absolutos, nem sábios absolutos: há homens que em comunhão, buscam saber mais, o diálogo se faz numa relação horizontal (FREIRE, 1981, apud. SALES, 2008). Diante do exposto por Freire, uma abordagem adequada da EA relacionada com a saúde deveria ser sustentada na prática do diálogo entre os indivíduos (discentes e docentes). A

abordagem do tema “dengue” deve seguir alinhada com a EA, de maneira que possibilite a assimilação do que é estudado de acordo com a faixa etária, isto resultará na criação de uma aprendizagem significativa. Se faz importante que o estudante tenha conhecimento do meio onde vive, que conheça a vegetação a sua volta e que o professor relacione o meio onde o estudante vive com o que é ensinado. Ferreira et al. (2019) relatam que as campanhas de combate ao Aedes aegypti são prioritariamente feitas pela atuação de agentes comunitários, porém, outras metodologias devem ser agregadas para reforçar o seu impacto. Neste sentido, os autores concluíram que os alunos do Ensino Fundamental II demonstraram ser um público altamente interessado e potencialmente capaz de adotar medidas de combate ao mosquito, além de atuarem como agentes multiplicadores intervindo na conscientização de seus familiares e amigos.

Quando pensamos em saúde e educação na prevenção de doenças, precisamos ter em mente que o aluno/ comunidade que recebe as informações deve estar consciente de todo o processo que envolve esse binômio. Considerando que a maioria dos criadouros utilizados por Aedes aegypti são produzidos pelo próprio homem e geralmente localizam- se no ambiente domiciliar ou peridomiciliar. Não terá efeito ideal, se somente dissermos para a população que não podem armazenar água por causa da dengue. O indivíduo como ser que aprende e crítico deve ser orientado sobre os motivos que levam a essa ação ser danosa para a saúde coletiva. Desta forma ele terá capacidade de decidir pelas ações corretas e entender que estamos em um meio em que cada ação irá influenciar no todo.

Nas áreas biológicas, esse ser pensante precisa ter noções teóricas acerca de como essa doença se dissemina, para que ele possa construir seus conhecimentos baseados em fatos e desta forma entender os processos de prevenção e de controle da dengue. O professor precisa atuar como facilitador demonstrando o ciclo biológico do vetor. Este processo vai proporcionar ao aluno o conhecimento necessário para saber como ele e a sua família podem evitar a proliferação dos ovos. Impedir a reprodução de Aedes aegypti é impedir a transmissão de doenças como dengue, zika e chikungunya. Por isso, é importante que a comunidade escolar seja orientada sobre a limpeza das bordas das caixas d’água e de outros recipientes para remoção dos ovos. Também é importante eliminar ou não permitir o acúmulo de água em qualquer objeto, como: garrafas, pneus e galões. A identificação e eliminação de criadouros de larvas e de pupas é fundamental para o controle dos mosquitos, pois impede que eles cheguem à fase adulta e possam transmitir doenças. Aí entra um papel muito importante da escola e dos professores, devemos orientar para que esse indivíduo consiga ter noção e raciocinar para criar suas próprias conclusões. E esse papel não deve ser somente do docente das ciências e da biologia, cabe aqui ter uma

educação baseada na transdisciplinaridade onde todos os docentes falem a mesma língua e reforcem a importância de cuidar e pensar no meio ambiente. E principalmente aquele sentimento de pertencimento, de fazer parte do meio em que está inserido e pensar no Buen vivir, no bem estar coletivo. Analisar se as ações individuais não estão prejudicando o coletivo, acarretando prejuízos para a comunidade na qual estes indivíduos estão inseridos.

Portanto, trabalhar doenças transmitidas por vetores de maneira com que a população participe é necessário que os primeiros passos sejam abordados dentro do âmbito escolar, pois é através desse ambiente que a informação vai chegar de forma lúdica, com uma linguagem popular, assim os alunos do fundamental e até mesmo do ensino médio, saberão como agir ao diagnosticar em sua residência ou até mesmo na de um terreno baldio quais os passos a serem seguidos e quem chamar para solucionar o problema.

E, essas abordagens preventivas não devem ficarem apenas nas mãos dos professores de ciências, especificamente na área de biologia, mas ser abordado também em geografia, matemática, história, filosofia e dentre as demais matérias, fazendo com que o processo de ensino-aprendizagem se torne significativo às vidas que englobam o meio.

Referências

BRASIL. Ministério da Saúde. Programa Nacional de Controle da Dengue. Brasília-DF. 2002.

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FERREIRA, V. et al. Um mosquito e três doenças: ação de combate ao Aedes aegypti e conscientização sobre dengue, chikungunya e zika em Divinópolis/MG, Brasil. Revista

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FRANCO, C. A. G. dos S. et al. Saúde mental e relacional. Curso EAD sobre Saúde

Planetária, módulo 6, Núcleo de Telessaúde do Rio Grande do Sul (TelessaúdeRS-

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MACIEL, I. et al. Epidemiologia e desafios no controle da dengue. Revista de Patologia

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SALES, F. M. S. Ações de educação em saúde para prevenção e controle da dengue: um estudo em Icaraí, Caucaia, Ceará. Ciência e Saúde Coletiva, [S. l.], v. 13, n. 1, p. 175– 184, 2008. Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1413-81232008000100022. Acesso em: 20 maio. 2020.

SBARDELOTTO, M. Entrevista com Simón Yampara. O bem-viver como perspectiva ecobiótica e cosmogônica. IHU online. 2010 Ago 23; 340: 19-22. Disponível em: http://www.ihuonline.unisinos.br/media/pdf/IHUOnlineEdicao340.pdf. Acesso em: 3 Jun 2020.

SOUZA, J. P. et al. Ações interativas no combate a dengue e chikungunya em Divinópolis/MG, Brasil. Revista Ciência em Extensão, v. 13, n. 4, p. 10-19, 2017.

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