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Segurança versus insegurança 76 

A segurança é um conceito de múltiplos sentidos inicialmente associado apenas às condições de defesa contra os inimigos externos (conceito de segurança nacional) e que agora se entende como um direito básico de cidadania. Tanto a Declaração Universal dos Direitos Humanos no seu artigo 3.º (“Todo o individuo

tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”) como a Constituição da

República Portuguesa, no seu artigo 27º. (“Todos têm direito à liberdade

segurança”) consagram este princípio basilar. Como direito universal e coletivo a

segurança é uma condição de garantia das escolhas possíveis para o exercício pleno das condições de vida que as circunstâncias económicas, sociais, politicas e culturais permitem para que se torne possível uma crescente e sustentável qualidade de vida.

A criminalidade não tem fronteiras e neste pressuposto foi criada a Rede Europeia de Prevenção da Criminalidade (em 28 de maio de 2001), definida no n.º

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abranger “todas as medidas destinadas a reduzir ou a contribuir para a redução

da criminalidade e do sentimento de insegurança dos cidadãos, tanto quantitativa como qualitativamente, quer através de políticas e intervenções destinadas a reduzir as potencialidades do crime e as suas causas. Inclui o contributo dos governos, das autoridades competentes, dos serviços de justiça criminal, de sectores privados e voluntários, bem como de investigadores e do público, com o apoio dos meios de comunicação” (JOCE, 2001).

Neste contexto, a segurança é um conceito que se associa às condições sociais e culturais de cada momento e às condições em que decorre a vida das diferentes sociedades. Não é, por isso, uniforme o seu entendimento, ainda que o seja nas sociedades de matriz ocidental, como a nossa. Razão porque, em muitas situações a segurança mais que um direito ainda é, apenas, uma expectativa (Sarmento, 2010).

Sendo a segurança um conceito e uma realidade que muito depende das condições de vida, da cultura, da organização espacial dos territórios e dos espaços habitados, urbanos e rurais, é ao nível dos comportamentos individuais e coletivos que a sua presença se manifesta. Com mais ou menos evidencia consoante o modo como cada sociedade ou grupo social a assume como parte integrante da sua identidade e do papel que desempenha na criação dos níveis de conforto e da qualidade de vida que são desejáveis e expectáveis. Nas cidades, especialmente nas de maior dimensão, onde a multiplicidade social é mais evidente e os comportamentos mais diversificados a segurança urbana é uma questão essencial na definição da sua coesão interna e na sua funcionalidade.

A insegurança urbana, situação que decorre da ausência de segurança, é, por isso, um dos mais importantes problemas urbanos, não só pelo que significa de desconforto mas também de ocorrência elevada de incivilidades, atos delituosos ou criminais (Machado, 2006).

Disto surgem os medos, nem sempre objetivados, assentes na ameaça, ou suspeita dela, de probabilidade de ocorrência de crimes ou outros atos delituosos.

Como refere, Ascher (2010, p. 75) “as cidades sempre foram ambivalentes do

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suscitando igualmente toda a espécie de perigos.” Esta dualidade implícita na

natureza da cidade no conforto e insegurança comprovada pela realidade dos fenómenos e vivências, que pode transformar em riscos, o que são oportunidades, afeta significativamente as relações sociais e a coesão interna da cidade.

A segurança na cidade está associada a um diferente leque de fatores, associados ao uso que dela se faz; tomando como seguros os espaços e as ações que fazem parte do uso e da vida quotidiana. Deste modo, a mudança de trajetos, horários, uso dos espaços públicos e forma de lazer são exemplos das alterações de comportamento frequentes que podem criar insegurança. Com o que, simultaneamente se origina um novo fenómeno, gerador de novos modelos de relações pessoais e espaciais que conduzem à segregação social e espacial.

A segurança deve ser considerada um direito de cidadania porque significa liberdade (respeito ao indivíduo) e ordem (respeito às leis e ao património), que são fundamentais para o desenvolvimento económico e social e para a coesão interna da sociedade. Por seu lado, a violência é todo ou qualquer ato ou omissão praticada individual ou institucionalmente contra o ser humano, que viole a sua integridade e individualidade física, moral, psicológica, emocional, sexual, étnica, cultural e social. A violência é um comportamento que causa dano a outra pessoa, ser vivo ou objeto; invade a autonomia, a integridade física ou psicológica e mesmo a vida de outro. Corresponde a um uso excessivo de força, além do necessário ou esperado. A insegurança urbana, como situação própria, entende-se como o resultado de uma forma ou perceção do meio que o identifica como inadequado ao uso confortável e pleno em condições que estimulam a sua apropriação integral.

A insegurança representa hoje um fator determinante de qualidade de vida urbana e, como tal, a investigação urbana tem-lhe dedicado uma atenção crescente, nas mais diversas perspetivas. (Roché, 1994; Fernandes & Neves, 1999; Canhoto, 2010; Machado & Neves (Coord.), 2011; Freitas, 2011). O direito à segurança coletiva e individual no espaço urbano é um direito cujo exercício pode ser limitado sempre e quando o espaço público se organiza e funciona sem atender à

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segurança pública está associado à forma e às condições de proteção contra riscos de perigo, perda ou ausência da fruição do bem comum que o espaço público é.

A segurança urbana constitui, por isso, um desafio aos urbanistas para encontrarem soluções que revelem a capacidade do ambiente construído em impedir ou mitigar o sentimento de insegurança e as ocorrências delituosas, criminais ou não, que agravam este sentimento (Machado, 2006). Têm a ver com essas soluções o conhecimento das características sociais e físicas dos espaços por forma a que se reduza a possibilidade de serem entendidos como espaços perigosos ou de risco.