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3 “SER UMA PESSOA COM ESTUDOS , PARA ESTAR BEM NA VIDA ”

0 Ricardo é um jovem de 18 anos que se encontrava a frequentar o segundo ano de uma acção de formação de Aprendizagem de nível 2, na área de Serralharia Mecânica. Foi encaminhado para esta acção na sequência de um processo de orientação profissional realizado em articulação entre o Centro de Emprego e a escola onde frequentava o 7o ano.

A ESCOLA, O INSUCESSO ESCOLAR, O ABANDONO ESCOLAR...

O Ricardo integrou o 1o ano do 1o ciclo com 5 anos, depois de já ter frequentado o ensino pré-escolar desde os 3 anos. Refere que nunca se interessou muito pela escola, contudo terminou o 1o ciclo sem reprovações. A partir do 2o ciclo começou a ter algumas dificuldades que o conduziram a reprovar algumas vezes nos 5o e 6o anos. O Ricardo abandonou o 7o ano, com cerca de 16 anos, a fim de frequentar formação profissional.

Quando se refere às causas do seu insucesso escolar, o Ricardo não aprofunda muito as suas razões mas coloca ênfase na sua desmotivação o que o conduzia a não estudar com a frequência desejável e a ocupar-se de outras formas: "na brincadeira", como refere. Por outro lado, admite que sentia dificuldades de aprendizagem em algumas disciplinas, contudo, não é claro se tal seria, sobretudo, atribuível ao facto de não ter hábitos de estudo, ao facto de faltar ou a dificuldades de compreensão dos conteúdos escolares. O jovem não entra em grandes pormenores quanto ao estilo da sua relação com professores e colegas mas conclui que, de um modo geral, a escola nunca lhe interessou muito. Apesar de tudo, o jovem atribui álguma importância ao grau de escolaridade e considera que deveria de se ter empenhado mais na escola.

Mas entrou para a escola com que idade? - Com 5.

*

- E antes jâ tinha estado nalgum ensino pré-primârio ou não?

- Jâ, jâ. -Jâ ?

- Jâ desde pequeno que ando.

- Que idade que...?

- Desde os três anos, mais ou menos. ”

Jâ tem uma carreira escolar até longa. Desde os três anos. (Risos) - Sim.

- E sempre foi assim complicado ir para a escola?

- Não. Havia dias que, pronto, gostava mais, outros que gostava menos. Depende, depende do dia".

Sim, prontos, eu estudava, eu estudo, não é. E eu...tinha algumas dificuldades na escola - Que dificuldades eram essas que o Ricardo sentia na escola? Em que ano estava? - Estava no 7o ano.

- Estava no 7o. Portanto, e concluiu o 7°ano? - Não. Ainda estava a frequentar.

- Estava a frequentar. Pela 1a vez?

- Sim.

- Que dificuldades eram essas que sentia?

- Não eram propriamente dificuldades. Era mais por faltar e ...

- Faltava à escola?

- Sim, mas era pouco. Depois havia várias matérias, prontos, que tinha alguma dificuldade mas

não era assim...

- Que matérias é que tinha dificuldade?

- Algumas, assim tipo Ciências, Matemática. Algumas, não eram assim muitas. Inglês

- Achava difícil? - Sim, um bocadinho."

Então quer dizer que o Ricardo quando olha para trás acha que devia ter estudado mais, é? - Sim, um bocado.

- Por que é que acha que não o fez na altura?

- Sei lâ. Na brincadeira. Depois. Sei lá. Na brincadeira, mais. Mais na brincadeira. Depois, outras vezes não estudava.

- Mas gostava da escola?

- Ah, mais ou menos. (Risos) Não foi assim... - 0 que é que não gostava da escola, então?

- Sei là. Das matérias. Não me recordo muito bem. Devia ser das matérias. Alguns professores.

- Lembra-se de algum professor que não gostasse?

- Já pôs isso tudo para trás das costas?

- Já não me lembro.

- E o que è que gostava da escola? Havia algumas coisas que gostava, não? Disse que era mais ou menos.

- Sim, algumas disciplinas, por exemplo, como as que ainda gosto, de Português. Algumas

disciplinas assim...”

O “ CURSO”

O Ricardo integrou a acção de formação de Aprendizagem (nível 2) na área de Serralharia Mecânica, sem ter concluído o 7o ano de escolaridade. Tomou conhecimento da referida acção através da sua escola e mostrou-se interessado, em parte, porque supôs que a área de Serralharia Mecânica estivesse relacionada com a área de Mecânica de Automóveis. O jovem já havia tido contacto com esta última, uma vez que o seu avô trabalha no ramo da venda de automóveis.

“ (...) Não era bem isso que eu queria. Mas, pronto, já que estou, não vou desistir. Agora

acabo. Depois se me der bem na empresa, continuo. Se não der, vou tentar um outro curso, que seja de Mecânica, prontos, de automóveis."

Apesar de ter, entretanto, percebido as diferenças entre as duas áreas manteve o seu interesse na conclusão da acção de formação de Serralharia Mecânica pois acabou por se sentir, igualmente, interessado por esta área. Contudo, não desconsidera a possibilidade de vir a candidatar-se a uma acção de formação na área de Mecânica de Automóveis, caso não obtenha uma colocação imediata enquanto Serralheiro Mecânico, após a conclusão da acção de formação.

“ (...) Se me derem emprego, já não vou tirar outro curso. Mas se não derem, tenho de

procurar. Vejo se arranjo qualquer coisa. Se não arranjar, então sigo outro curso. ”

“Já desde pequeno que mexo em carros. O meu avô, pronto, tem stands de automóveis. Desde pequeno que mexo, gosto. Não sei. Vou tentar. Pode ser que um dia mais tarde consiga, não sei. Ou arranje emprego. ”

O processo de orientação e encaminhamento para a acção de formação aconteceu em articulação entre a escola que frequentava, o Centro de Emprego do e o Centro de Formação Profissional. A acção tem decorrido em alternância, em sala (no Concelho do Barreiro, já que se trata de uma acção externa do Centro de Formação) e numa Metalúrgica onde o jovem tem contacto com as tarefas da profissão de Serralharia Mecânica, sob orientação de um profissional da área. A acção de formação tem, também, uma componente escolar já que tem como objectivo a progressão até ao 9o ano de escolaridade.

Nós todos os meses mudamos de horário. Nós não, os professores mudam. Por exemplo, temos uma semana de, pronto...uma semana...uma semana de aulas normais em que entramos à s 8 e meia. Depois vamos almoçar ao meio dia e meio. Voltamos à 1 e meia. Depois saímos às 4 e meia. Depois nesses tempos, durante a semana temos uma vez ou duas oficinas. Depois temos Desenho, temos Matemática, Português, Mundo Actual. Assim, várias disciplinas. Eu também desenvolvi um pouco, pronto.

- E o estágio quando é que começou? O Ricardo já fez estágio?

- Já, já. Há um mês e meio. Agora neste 2o período é dois meses e meio. Agora voltamos para a escola no final do estágio. Estamos lá mais um tempinho. Depois voltamos para o estágio outra vez mas já são 3 meses. E depois é que vemos se ficamos lá se não.

- Vão sempre ao longo dos 3 anos de curso, não é? - Sim.

- Ao longo dos 3 anos de curso vão sempre alternando entre o estágio e...

E um detemiinado... determinado tempo vai aumentado para ver se nós aprendemos melhor. Como é que a gente está. Para ver se depois no final de estágio. Depois de fazer os exames. Não sei qual é os exames. (Pequeno riso) Depois do estágio, para ver se ficamos aprovados, se passamos.

- Então, disse-me que estava na Metalúrgica. - De Alhos Vedros.

- De Alhos Vedros. O que é que está lá a fazer no seu estágio?

- Agora estou a fazer uns contentores, prontos, entre aspas, em ferro. A fazer isso, a rectificar, a soldar. A mexer com várias máquinas.

- E vai estando com a orientação de alguém no estágio?

- Sim, sim. Nós temos... cada um de nós tem um oficial ao pé, ao pé de nós. A explicar-nos. A ensinar-nos. A dizer como é que as coisas funcionam. Máquinas. Como é que a gente deve trabalhar.”

Quanto à percepção do Ricardo em relação à experiência de frequência da acção de Serralharia, ela parece ser positiva embora o jovem não se alongue nos pormenores. Valoriza o facto de te r tido a oportunidade de conhecer novas pessoas e de aprender coisas novas, nomeadamente, a lidar com máquinas, como refere. O ambiente geral é de algum desinteresse por parte dos formandos já que tem havido um grande número de desistências. Ainda assim, no caso do Ricardo mantém-se o seu interesse em concluir a acção de formação apesar de ter tido, até ao momento, resultados de avaliação dentro de valores mínimos.

(...) Encontrar novos amigos, aprender também outras coisas, aprender a lidar com máquinas...pronto, coisas assim.”

- Tem tido bons resultados? Como é que foi o 1o ano? - Foi bom, mais ou menos. Não foi lá grande coisa, mas... - Não foi lá grande coisa, então?

- Quer dizer, não foi assim, notas muito altas. Mas, prontos, deu para passar minimamente. ”

É uma turma de quantos formandos? - Éramos 19 mas estamos reduzidos a 9.

(...) O que é que aconteceu aos outros?

- Era mais nas aulas, brincadeira e... coisas assim.

- Foram desistindo.

- Brincadeira, muitas faltas, outros foram desistindo.”

Em suma, o Ricardo parece valorizar a oportunidade de viver uma experiência de contacto com o meio laborai e considera que tem adquirido competências na área de Serralharia Mecânica e que poderá vir a ter uma carteira profissional, o que o tem levado a alimentar a expectativa de integração nesta mesma área, após a conclusão do curso. A conclusão do 9o ano, também é um aspecto valorizado pelo jovem.

“ - Sente que tem aprendido? O que é que tem aprendido?

- Sim. Sim, tenho aprendido muito. Ao nível de, prontos, ao nível do curso que eu estou a tirar como formação. “

-(...) É importante porque, como já disse, prontos, fico sempre com algum estudo, e aprendo sempre mais alguma coisa e fico sempre com uma carteira profissional para que algum dia precise, prontos, precise. Sempre tenho mais esse papel que ajuda, essa carteira, pronto. ”

(...) Para si o mais importante de tudo realmente e o principal na decisão de ter ido para a formação foi mais o ser mais fácil e o conhecer novos colegas?

- Foi mais também por fazer o 9o ano e ficar também com a carteira profissional. ”