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vocálicos

2.2.1 O molde silábico

A estrutura máxima da sílaba em Negarotê é (C)(C)V(V)(C)(C), em que C é consoante e V é vogal. Os segmentos que aparecem entre parênteses são opcionais. Assim, temos até duas consoantes opcionais em onset, núcleo ramificado com duas vogais, sendo uma delas o único elemento obrigatório da sílaba, e duas posições de coda, também opcionais, apenas licenciadas a consoantes. A vogal obrigatória no núcleo silábico pode formar sílaba sozinha ou com outros segmentos.

Esta estrutura é a mesma encontrada na língua-irmã Mamaindê (Eberhard, 2009). Já as línguas do mesmo ramo, Latundê e Lakondê apresentam uma estrutura um pouco menor, licenciando apenas uma posição no onset silábico.

Na figura 17, apresentamos molde silábico e os segmentos licenciados para ocupar cada posição na sílaba.

49 Na língua Negarotê, compreendemos que os ditongos são sequencias do tipo VV e não VG. Esta decisão, puramente teórica e sem implicações fonéticas, foi tratada na seção 2.1.3.3 Ditongos.

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Figura 17. Molde silábico

2.2.1.1 O onset

Na sílaba Negarotê, são licenciadas duas posições de onset, que podem ser ocupadas por consoantes e glides. Quando apenas uma posição é ocupada, qualquer segmento consonantal, exceto a oclusiva laringal /ʔ/, pode aparecer. Já quando as duas posições são ocupadas, há maior restrição: na primeira posição, só são permitidas as oclusivas /t, k/ e fricativa /s/; na segunda posição, apenas os glides

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são permitidos. Nos nossos dados, foram observadas as seguintes sequências50: /tw/, /tj/, /kw/, /sj/51.

Embora a presença do onset ocupado não seja obrigatória, ele aparece assim na maior parte das sílabas da língua. Esta é uma característica comum às línguas Nambikwára do Norte. Em sua tese sobre o Mamaindê, Eberhard (2009, p.129) afirma “Mamaindê

seems to prefer syllables which begin with consonants, to syllables that begin with vowels, and it prefers syllables that begin with one consonant to those which begin with two consonants”. Já Telles

(2002, p.107-108) não explicita a baixa ocorrência dos tipos silábicos iniciados sem onset, entretanto, ressalta que eles só ocorrem em início de palavras. Em Negarotê, sílabas iniciadas por vogal, de maneira geral, são realizadas em início de palavras, podendo, porém, aparecer — embora com menor frequência — em meio e final de palavra.

2.2.1.2 O núcleo

O núcleo silábico Negarotê é composto por duas posições que podem ser ocupadas apenas por vogais. O único elemento obrigatório da sílaba é a primeira posição nuclear, licenciada a qualquer vogal — laringal, oral ou nasal. Na segunda posição, opcional, só são permitidas vogais altas.

A assunção de um núcleo ramificado, constituído por duas vogais, segue o modelo adotado por Eberhard (2009) para a língua

50 Na superfície, há outros grupos consonantais que podem formar o onset silábico, decorrentes de processos fonológicos. As sequências aqui apresentadas são apenas aquelas que se confirmam fonologicamente. Sobre os grupos consonantais em

onset no nível fonético, ver seção 2.2.4 Considerações sobre a sílaba fonética e ressilabificação.

51 Outras sequências de Consoante + Glide são possíveis, porém, só foram observadas no nível fonético.

Fonologia Segmental | 103 Mamaindê e tem implicações teóricas, e não fonéticas. Consideramos aqui a sequência fonológica Vogal + Vogal alta, ao invés de Vogal + Glide, sobretudo, em função do comportamento distinto observado entre as duas classes de segmentos (vogal e

glide). Apenas glides podem sofrer processo de fortalecimento,

realizando-se como consoantes diante de vogais (exemplos 221 e 222). Além disso, os traços laringal e nasal, constantes nas vogais, quando ocorrem, atingem os dois segmentos que compõem o ditongo, o que também indica a existência de duas vogais nessa posição (e não de uma vogal e um glide).

(221) /ta-ˈwḭ-tu/ [taˈʋḭːɾu] “meu dente”

(222) /ˈjoh-tu/ [ˈʒoːɾu] “abelha mandaguari” (223) /wiˈhãĩ-tu/ [wiˈhãj ɾu] “bicho-preguiça” (224) /ˈnãũ-tu/ [ˈnãw ˌdu] “ariranha”

Os ditongos, mesmo em sílabas acentuadas, podem ser fusionados (exemplo 225) ou ainda ter a segunda parte apagada, realizando-se como um único segmento (exemplos 226 e 227). Em ambos os casos, o segmento resultante é realizado como uma vogal longa.

(225) /ˈkaut-tu/ [ˈkɔːptu] “cuia” (226) /ˈdeun-tu/ [ˈdeːbmdu] “pelota”

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2.2.1.3 A coda

Sílabas fechadas compõem a maioria dos tipos silábicos em Negarotê, bem como os mais recorrentes. São também os tipos mais elegíveis a receber o acento, sendo poucos os casos em que formam sílaba átona52. Dentre todos os tipos silábicos fechados possíveis, os padrões com uma posição de coda ocupada, /CVC/ e /CVVC/, são os que ocorrem com maior frequência. Também é a posição da coda que desengatilha a maior parte dos processos fonológicos, sendo este o elemento da sílaba mais suscetível à mudança ou apagamento.

A coda silábica na língua Negarotê pode ser formada por um segmento apenas, que pode ser uma consoante coronal, /t, n, s/ ou uma consoante laringal, /h, ʔ/, ou ainda por duas consoantes, formando uma coda ramificada. Na segunda posição da coda, apenas a oclusiva laringal, /ʔ/, é permitida.

Diferentemente do que ocorre na língua-irmã Mamaindê, em que há proibição quanto à realização fonética de segmentos [+contínuo] na posição de coda silábica (Eberhard, 2009), no Negarotê todas as consoantes que se confirmam fonologicamente nesta posição são realizáveis na superfície. Na língua Latundê, Telles (2002) afirma que também é possível a realização fonética de consoantes [+contínuas] em coda silábica. Nesta língua, a fricativa laringal /h/ é a única consoante com essa característica licenciada para a coda. No Negarotê, entretanto, temos duas consoantes [+contínuo] permitidas para esta posição, as fricativas coronal, /s/, e laringal, /h/, e que, embora sejam frequentemente apagadas na fala, podem ser realizadas foneticamente.

52 Apenas observamos sílabas fechadas átonas em raízes com mais de uma sílaba fechada (cf. 4.1 O Acento).

Fonologia Segmental | 105 (228) /nusˈtah-tu/ [nusˈtaːɾu] “barriga”

(229) /ˈhos-ˈta-kuh-tu/ [ˈhoːsˌdaːkuɾu] “aldeia do macaco (nome da aldeia Nova Geração)”

Figura 18. Espectrograma "aldeia do macaco"