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3. HIDROGEOLOGIA

3.5. Sistema Aquífero Guarani (SAG)

Um dos maiores sistemas aquíferos do mundo, o sistema aquífero Guarani (SAG) apresenta 1.194.000 km2 de área e se estende pelo Brasil, Paraguai, Argentina e Uruguai. No Brasil, o sistema apresenta 839.800 km² e está localizado nos estados de São Paulo, Paraná, Minas Gerais, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás

(Araújo et al. 1995). No Estado de São Paulo, o SAG ocupa a porção oeste deste, em 76% de seu território(155.800 km²) (Araújo et al. 1995, DAEE/IG/IPT/CPRM 2005, Iritani & Ezaki 2012).

O SAG é um sistema do tipo sedimentar, localmente livre na porção aflorante (número 6 da Figura 3.1), mas predominantemente confinado. Sua porção livre possui pequena extensão, se comparada a sua área total, e, para o Estado de São Paulo, no geral, não ultrapassa os 100 m de espessura (DAEE/IG/IPT/CPRM 2005, Iritani & Ezaki 2012). Silva (1983), todavia, identificou um espessamento da porção livre na região do Baixo Tietê que ultrapassa os 400 m. A porção confinada, por sua vez, mergulha em sentido oeste, com 200 a 400 m de espessura no estado (Silva 1983, DAEE/IG/IPT/CPRM 2005, Iritani & Ezaki 2012). Essas variações de espessura são atribuídas ao controle estrutural durante a deposição, à variação faciológica ambiental e ao controle erosional do ambiente desértico reinante (Araújo et al. 1995). O topo do sistema aquífero se encontra a profundidades cada vez maiores em sentido oeste, passando da cota 600 m no extremo leste a -1.500 m em Fernandópolis (Silva 1983).

O SAG é formado pelas rochas de idade triássica das Formações Pirambóia e Rosário do Sul, na base, e pelas rochas de idade jurássica da Formação Botucatu, no topo (Araújo et al. 1995, DAEE/IG/IPT/CPRM 2005, Iritani & Ezaki 2012). A Formação Rosário do Sul tem ocorrência restrita ao Rio Grande do Sul. A Formação Pirambóia é constituída por arenitos finos a médios avermelhados e esbranquiçados intercalados a finas camadas de argilitos e siltitos e, localmente, por arenitos conglomeráticos, com estratificação cruzada planar e acanalada. A Formação Botucatu é composta de arenitos finos a médios avermelhados com grãos de alta esfericidade e bem selecionados e estratificações cruzadas de grande porte, e localmente, na sua poção basal, podem ocorrer arenitos argilosos mal selecionados (Schneider et al. 1974, Caetano-Chang & Wu 1992, Milani et al. 1994). Os estratos da Formação Pirambóia foram depositados em ambiente flúvio-lacustre/eólico, enquanto os da Formação Botucatu foram formados em ambiente predominantemente eólico (Milani et al. 1994, Araújo et al. 1995).

A porção basal (Formação Piramboia) apresenta menor maturidade textural, marcada pela presença de argila nos poros. A porção superior (Formação Botucatu) é pobremente cimentada e com arcabouço de grãos de quartzo bem selecionados, exibindo maior maturidade textural. No entanto, no Estado de São Paulo foram observadas características que indicam a ausência de argilas para a unidade inferior e que, portanto, conferem melhor capacidade permo-porosa para o sistema na região (Araújo et al. 1995).

Pela natureza mais uniforme dos arenitos, que constitui um pacote sedimentar contínuo por toda sua extensão, o SAG é um sistema homogêneo, caracterizando-se como um excelente reservatório. Sua porção aflorante atua como zona de recarga para a porção confinada. A porção confinada apresenta uma capacidade geotermal, a qual forma um gradiente para oeste, chegando a exibir nos locais mais profundos temperaturas de até 60ºC (DAEE/IG/IPT/CPRM 2005, Iritani & Ezaki 2012). Esse confinamento proporciona a 90% da extensão do sistema aquífero características artesianas (Silva 1983).

O fluxo regional segue o sentido nordeste-sudoeste, iniciando na porção livre e migrando pela zona confinada até a descarga a sul da bacia sedimentar (Silva 1983). Segundo Araújo et al. (1995), o fluxo subterrâneo do SAG é fortemente controlado pela presença de lineamentos estruturais.

Dados de vazão indicam maiores extrações diárias para a porção confinada, reflexo das maiores espessuras dessa zona (intervalos de 20-40 m³/h e 40-80 m³/h na porção livre, contra 80-120 m³/h, 120-250 m³/h e 250-360 m³/h para a confinada) (DAEE/IG/IPT/CPRM 2005). De acordo com Araújo et al. (1995), os parâmetros hidráulicos variam espacialmente, pois são controlados principalmente pelas características faciológicas dos litotipos locais.

As rochas sedimentares confinadas do SAG estão recobertas pelas rochas da Formação Serra Geral (FSG) e do sistema aquífero Bauru e sotopostas as rochas sedimentares permo-triássicas do Grupo Passa Dois (Araújo et al. 1995). Os derrames basálticos formam um capeamento impermeável por quase toda a extensão do SAG, exceto em algumas circunstâncias como as das bordas da bacia, onde a espessura da FSG é menor e a intensidade de fraturamento permite fluxos descendentes (item 3.6). A base do SAG é classificada como aquiclude (item 3.4), logo é praticamente impermeável (Silva 1983).

Dada sua extensão regional, as águas do SAG passam por fortes modificações desde sua porção livre até a região mais confinada (Silva 1983, Campos 1993, 2004, 2013). Em sua zona livre, as águas do SAG geralmente apresentam temperaturas compreendidas entre 22 e 27ºC, pH entre 5,4 e 9,3 e salinidade inferior a 50 mg/L, sendo o tipo químico predominante as águas bicarbonatadas cálcicas ou bicarbonatadas cálcico-magnesianas. Conforme se avança para as áreas confinadas, as temperaturas variam entre 22 e 58,7ºC, o pH entre 6,3 e 9,8 e a salinidade entre 50 e 500 mg/L, sendo os tipos químicos predominantes as águas bicarbonatadas cálcicas e bicarbonatadas sódicas seguidas das sulfatadas-cloretadas sódicas (Silva 1983, Campos 1993, 2004, 2013).

A água extraída do SAG é considerada de ótima qualidade para consumo humano, sendo utilizada para abastecimento de várias cidades a oeste do estado, como Araçatuba, Presidente Prudente, Ribeirão Preto e São Carlos (Araújo et al. 1995, DAEE/IG/IPT/CPRM 2005, Iritani & Ezaki 2012). Localmente podem ser observados valores de salinidade e flúor mais elevados (Silva 1983, Fraga 1992, Araújo et al. 1995, Sracek & Hirata 2002, Campos 2004). Essas concentrações anômalas de flúor estariam associadas a condicionantes estruturais da Bacia do Paraná e às porções mais confinadas do sistema, com águas estagnadas, bastante concentradas e de alto teor de sódio (Fraga 1992, Campos 2004). Sracek & Hirata (2002) atribuíram os valores elevados de flúor à dissolução de fluorita guiada por troca catiônica, enquanto Fraga (1992) acredita que sua origem estaria na dissolução pós- deposicional de precipitados químicos portadores de flúor, cuja área-fonte estaria relacionada a fluidos residuais, pós-magmáticos, oriundos de magmatismo ácido e alcalino granítico, instalado ao longo de fraturas de tração no fim da orogênese brasiliana. Valores de nitrato indicativos de contaminação antrópica podem ser encontrados na porção aflorante (DAEE/IG/IPT/CPRM 2005). Em algumas regiões de águas mais estagnadas do SAG também pode haver a troca com águas salobras da unidade sotoposta (APD), prejudicando a potabilidade da água (Araújo et al. 1995).