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Recuperação de ambientes degradados e conservação de recursos naturais são assuntos muito em voga ultimamente, mas parecem ter alta incompatibilidade com a produção da maioria dos bens necessários à humanidade. Os sistemas produtivos distanciaram-se muito dos processos naturais, em geral caminharam para lados opostos, e hoje a tendência da produção agrícola é a redução da biodiversidade e degradação do ambiente em maior ou menor grau, o que

compromete a sustentabilidade desses sistemas. Seguindo esse raciocínio, tem-se buscado o aumento da biodiversidade nos campos de produção e atualmente valorizam-se os consórcios e rotações de cultura como medidas que amenizam os impactos, mas que são principalmente redutoras do custo de produção. A inclusão de culturas arbóreas em consórcios agrícolas reativou uma antiga prática da história da agricultura e hoje alguns tipos de sistemas agroflorestais são utilizados e estudados. A capacidade de conservação aliada à produção é notória nesses

e têm-se vários exemplos de sucesso na recuperação de ambientes degradados com baixo ou nenhum uso de insumos, adicionada a uma produção crescente (Young, 1989).

A simples existência de um componente arbóreo no sistema traz inúmeros efeitos positivos sobre a fertilidade do solo, controle de erosão e reciclagem dos

nutrientes. Por exemplo, as árvores proporcionam ao sistema adição de matéria orgânica, aumento do teor de N, mobilização do P para as culturas, redução da perda de solos e de nutrientes, absorção nas camadas mais profundas do solo e deposição na superfície, liberação dos nutrientes no momento requerido pelas culturas, melhoria das propriedades físicas do solo, retenção de água e melhoria da drenagem, aumento da biomassa de raízes, de substâncias promotoras de

crescimento e de associações microbianas, criação de microclimas favoráveis, moderação dos efeitos maléficos de condições desfavoráveis de solos muito ácidos ou muito alcalinos (Montagnini, 1992; Montagnini et al.; 1997). Essas

características dos sistemas agroflorestais se devem à maior similaridade desses sistemas produtivos com as florestas naturais, seus processos e dinâmicas homeostáticas construídos através dos milhares de anos em evolução, diminuindo a dependência de insumos externos. Fica evidente, assim, maior sustentabilidade da produção em sistemas agroflorestais, em relação a monoculturas ou a cultivos menos biodiversos.

Por essas razões, sistemas agroflorestais são sistemas adequados a locais

estratégicos no planejamento de paisagens. Por exemplo, as bordas de reservas ou de áreas protegidas são ambientes extremamente frágeis, sujeitos a influências do ambiente externo (Fig. 3). Este alcance depende do tempo de isolamento e do tamanho do fragmento, têm dados de até 500 m. Normalmente, essa influência tende à degradação da floresta protegida. O entorno da reserva pode ser utilizado com sistemas agroflorestais, como uma área tamponante da ação deletéria do ambiente intensamente utilizado com monoculturas, aliando a produção agrícola dos sistemas biodiversos à preservação da reserva.

Zona tampão Agricultura

Fragmento Florestal

Fig. 3. Utilização de uma Zona Tampão no entorno de reservas, com sistemas

agroflorestais, com o objetivo de preservar a faixa mais externa da área protegida, sujeita a efeitos deletérios causados pela antropização do ambiente.

Da mesma forma, os sistemas agroflorestais podem contribuir para o fluxo gênico entre fragmentos florestais, facilitando o trânsito de animais polinizadores e dispersores de sementes. Podem ser utilizadas as áreas ciliares, quando as

reservas são ligadas por um rio ou ribeirão. Normalmente, nesse caso, os sistemas agroflorestais, além de servirem como Zona Tampão à mata ciliar, funcionam realmente como corredores, pois diversas espécies de plantas presentes nos dois fragmentos não são capazes de habitar o ambiente diferenciado das matas ciliares (Fig. 4). É importante, portanto, prever esse aspecto e introduzir ao máximo

Mata ciliar Reserva

Corredor de fluxo gênico

Reserva

Fig. 4.

Corredores de fluxo gênico entre dois fragmentos florestais interligados por um rio podem ser feitos com sistemas agroflorestais que incluem espécies dos fragmentos e funcionam como zona tampão da mata ciliar.

Existe enorme variedade de tipos de SAFs, acarretando grande amplitude no número de espécies envolvidas, na disposição das plantas no campo, no manejo, enfim, na complexidade do sistema. Segundo Engel (1999), em OTS/Catie, sistema é definido como "um conjunto de componentes unidos ou relacionados de tal maneira que formam uma entidade ou todo", e os sistemas agroflorestais podem ter seus componentes estreitamente relacionados uns com os outros, bem como ter simplesmente duas espécies intercaladas, formando apenas um

consórcio. Por exemplo, existem SAFs com apenas uma espécie arbórea consorciada a outra agrícola, normalmente dispostas em linhas ou faixas, assim como também existem sistemas envolvendo numerosas espécies integradas entre si e com o ambiente, manejados com base nos processos e fluxos naturais. Apesar de todas essas formas de cultivo serem normalmente denominadas de sistemas

agroflorestais, existem diferenças extremas quanto ao manejo e mesmo quanto à visão do cultivo e do próprio ser humano dentro do ambiente em que vive.

Normalmente, os sistemas agroflorestais mais simples, como o cultivo em aléias (alley cropping), taungya, tornam-se mais facilmente dissemináveis por sua menor complexidade de estrutura e manejo, sendo também de mais fácil administração pela menor diversidade de produtos. Esses sistemas poderiam estar previstos para as áreas dentro das bacias hidrográficas que fossem destinadas à produção, principalmente nas que apresentassem algum pequeno grau de risco de erosão, como uma declividade um pouco mais acentuada, ao passo que as zonas tampão e os corredores de fluxo gênico deveriam contar com maior grau de complexidade. A capacidade de recuperação de áreas degradadas é outra forma de utilização de sistemas agroflorestais que pode ser incorporada no planejamento das bacias hidrográficas, mas deve-se atentar para o detalhe de que a produção, nesses casos, depende muito do grau de degradação encontrado no ambiente.

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