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2.2 Avaliação de Desempenho

2.2.3 Situação Financeira

Segundo Assaf Neto (2006, p. 209) “O capital de giro constitui-se no fundamento básico da avaliação do equilíbrio financeiro de uma empresa”. Isso significa que quaisquer alterações na estrutura de capital de giro poderá conduzir a empresa à uma situação de insolvência ou comprometer a sua rentabilidade econômica.

O dimensionamento da necessidade de capital de giro é imprescindível para o adequado e tempestivo planejamento das escolhas das melhores opções para captação ou aplicação de recursos excedentes. As causas de variações nas necessidades de capital de giro devem ser rigorosamente monitoradas visando a garantir tomada de decisões preventivas para reduzir os seus impactos negativos. Para Matarazzo (2003, p. 337) “Os prazos médios são elementos administráveis pelos dirigentes. A análise dos prazos médios e seu impacto financeiro é também uma análise da administração do capital de giro.”

O termo capital de giro surgiu provavelmente nos Estados Unidos da América, conforme contado por Brigham:

O termo capital de giro teve origem com os antigos mascates ianques, que carregavam suas carroças com mercadorias e percorriam suas rotas vendendo seus artigos. A mercadoria era chamada de capital de giro porque era o que o mascate vendia, ou “girava”, para produzir seus lucros. A carroça e o cavalo eram os seus ativos fixos. Como o mascate em geral era o proprietário da carroça e do cavalo, estes eram financiados com “capital próprio”, mas os fundos para comprar a mercadoria costumavam ser provenientes de empréstimos de capital de giro e tinham de ser liquidados a cada viagem, para demonstrar ao banco que o crédito do mascate era bom [...]. (BRIGHAM, 1999, p. 561 apud BATISTELLA, 2003, p. 6)

Nesse sentido, qualquer empresa precisa financiar suas atividades seja por capital próprio ou de terceiros. Parte do financiamento das suas atividades deverá ser destinado para capital de giro e os recursos gerados pelas atividades é que irão remunerar os seus financiadores. Assim, a melhor administração do capital de giro é aquela que consegue repousar sobre uma situação de equilíbrio financeiro. Batistella (2003, p. 7) destaca que “é importante notar que não existe um nível ótimo de política de capital de giro, pois cada setor específico da economia tem um padrão e, dentro de um mesmo setor, há diferenças em função do porte da empresa, históricos de relações de crédito, etc.”

Para Gitman (2010) uns dos principais elementos da estrutura financeira de uma empresa é o capital circulante líquido, mais conhecido como capital de giro. Ele relata que o assunto é tão importante que requer a maior parte do tempo de trabalho do administrador financeiro.

Nas industrias norte-americanas, o ativo circulante responde por cerca de 40% do ativo total; o passivo circulante representa aproximadamente 26% do financiamento total. Portanto, não deve surpreender que a administração

financeira de curto prazo – gestão do ativo e do passivo circulantes – seja

uma das atividades mais importantes e que mais consome tempo do administrador financeiro. (GITMAN, 2010, p. 546, grifo do autor)

Berk e Demarzo (2009, p. 61, grifo do autor) definem que “a diferença entre ativos circulantes e passivos circulantes é o capital de giro líquido da empresa, o capital disponível no curto prazo para dirigir a empresa.”

Assaf Neto (2006) destaca que o capital de giro tem um comportamento dinâmico com alterações diárias, portanto, o planejamento de administração financeira requer modelos eficientes que possam prover avaliações rápidas da situação financeira.

Nos anos de 1975 a 1978 a Fundação Dom Cabral em conjunto com empresas brasileiras desenvolveram trabalho que resultou no Modelo Fleuriet, que leva o nome de um dos seus autores, o francês Michael Fleuriet.

O trabalho foi desenvolvido a partir do entendimento da dinâmica financeira das empresas brasileiras, mais especificamente da análise dinâmica do capital de giro. Para Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003, p. 3) “Em geral, certas contas do ativo e passivo renovam-se constantemente a medida que se desenvolvem as operações na empresa [...] que enfatiza os ciclos econômicos e financeiros de uma empresa, fornecendo dados para uma análise dinâmica em oposição à análise estática[...]”.

De acordo com Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003) o trabalho para preposição do modelo teve a intenção de criar um modelo de análise de capital de giro moldado para as características das empresas brasileiras. O modelo surgiu considerando 3 variáveis: capital de giro (CDG), necessidade de capital de giro (NCG) e saldo em tesouraria (T). Pelo modelo as contas patrimoniais encontradas nas demonstrações financeiras são classificadas em três categorias: erráticas5, cíclicas e não cíclicas.

O capital de giro (CDG) é representado pela diferença entre os passivos e ativos não cíclicos. A necessidade de capital de giro (NCG) é representada pela diferença entre os ativos e passivos cíclicos. O saldo em tesouraria (T) é representado pela diferença entre os ativos e passivos erráticos ou também pode ser obtido pela diferença entre o CDG e a NCG.

O ativo e passivo cíclicos representam as contas que estão vinculas às operações da empresa, como por exemplo duplicatas a receber, estoques, fornecedores e salários a pagar. Representam uma ligação direta com a demonstração de resultados na apuração do lucro operacional. São contas que se renovam de modo contínuo no transcorrer das operações das empresas. Essas contas são as que devem ser incluídas na determinação da necessidade de capital de giro (NCG).

O ativo e passivo erráticos são representados por contas circulantes que não estão diretamente vinculadas à operação da empresa e seus valores alteram de forma aleatória. As contas caixa, bancos conta movimento, aplicações financeiras do

5

Errático, do latim erraticu. Errante, vadio, erradio, aleatório, andando fora do caminho, ou seja, implica a não-ligação dessas contas ao ciclo operacional da empresa (FLEURIET, 2003, p. 7).

lado do ativo circulante e empréstimos de curto prazo do lado passivo circulante são exemplos de contas erráticas.

Os ativos e passivos não cíclicos são representados pelas contas do ativo não circulante composto pelo realizável a longo prazo, investimentos, imobilizado e intangíveis e pelas contas do exigível a longo prazo e patrimônio líquido. No Quadro 1 está demonstrado os ciclos no balanço patrimonial classificados pela forma tradicional e pelo Modelo Fleuriet.

Quadro 1 – Os Ciclos no Balanço Patrimonial

ATIVO PASSIVO ATI VO C IRC U LA N TE ERR ÁT IC AS ERR ÁT IC AS PA SS IV O C IRC U LA N TE

Ativo Circulante Passivo Circulante

Numerários em caixa Contas bancárias garantidas

Bancos conta movimento Empréstimos bancários

Títulos e valores mobiliários Outras obrigações

CL

IC

AS Duplicatas a receber Fornecedores de matéria prima

CÍ CL IC AS Estoques ATI VO N ÃO C IRC U LA N TE N ÃO C ÍC LI CA S

Ativo Não Circulante Passivo Não Circulante

N ÃO C ÍC LI CA S PA SS IV O N ÃO C IRC U LA N TE

Realizável a longo prazo Exigível a longo prazo

Empréstimos a terceiros Empréstimos bancários

Títulos a receber Financiamentos

Investimentos Patrimônio Líquido

Capital social

Imobilizado Reservas de lucro

Intangível

Com base no Modelo Fleuriet, Braga (1991) classificou as possíveis combinações e relações entre os indicadores CDG, NCD e T e identificou e elaborou uma escala de classificação da saúde financeira das empresas que refletem 6 tipos básicos de estrutura de balanços, conforme demonstrado a seguir:

Quadro 2 – Configuração da Situação Financeira da Empresa

Fonte: Adaptado pelo autor com base em (BRAGA, 1991; OLIVEIRA e BRAGA, 2003)

Empresas Tipo 1 – Situação Excelente: Apresentam excelente liquidez e sobra financeira. Possuem recursos permanentes aplicados no ativo e passivo circulantes operacionais maiores que os ativos circulantes operacionais. Características encontradas em empresas comerciais por apresentarem ciclo financeiro reduzido ou negativo. São empresas com alto grau de sensibilidade às flutuações de vendas.

Empresas Tipo 2 – Situação Sólida: O investimento operacional em giro positivo significa que os passivos circulantes operacionais são insuficientes para atender às necessidades de financiamento a curto prazo, sendo que os recursos permanentes suprem essa deficiência e geram saldo positivo na tesouraria. O saldo de tesouraria positivo indica uma situação financeira sólida, enquanto for mantido determinado volume de vendas. Empresas com essa estrutura normalmente são sensíveis a elevados e constantes aumentos no volume de vendas, pois isso irá aumentar a necessidade de capital de giro fazendo que os recursos disponíveis

1 > 0 < 0 CDG > NCG > 0 Excelente 2 > 0 > 0 CDG > NCG > 0 Sólida 3 < 0 < 0 CDG > NCG > 0 Arriscada 4 > 0 > 0 CDG< NCG < 0 Insatisfatória 5 < 0 < 0 CDG< NCG < 0 Ruim 6 < 0 > 0 CDG< NCG < 0 Péssima Situação Tipo CDG NCG Condição T

sejam consumidos requerendo empréstimos de curto prazo, e consequentemente desestabilizando a estrutura financeira da empresa.

Empresas Tipo 3 – Situação Arriscada: Os passivos circulantes operacionais permitem o financiamento dos ativos circulantes operacionais, contribuindo também para manutenção de um saldo positivo em tesouraria. Quedas nos volumes de atividades podem consumir os excedentes do passivo circulante operacional, tornando a necessidade de investimento em giro positivo e saldo de tesouraria negativo.

Empresas Tipo 4 – Situação Insatisfatória: Empresas nesta classificação são bastante dependentes de empréstimos a curto prazo para financiar suas operações. Encontra-se em uma situação de solvência mais frágil.

Empresas Tipo 5 – Situação Ruim: Os passivos circulantes operacionais permitem o financiamento dos ativos circulantes operacionais, diminuindo os efeitos negativos provocados sobre o saldo de tesouraria, sendo que eventuais problemas nas renovações das linhas de curto prazo podem prejudicar a continuidade de suas operações. Verifica-se a existência de risco de insolvência.

Empresa Tipo 6 – Situação Péssima: O CDG negativo indica que a empresa está financiando ativos permanentes com dívidas de curto prazo, sendo que a expansão dos negócios traria possibilidade de agravamento desta situação, em função do crescimento do saldo negativo de tesouraria. Empresas nessa situação apresentam grande risco de insolvência.

Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003) estudando a estrutura financeira das empresas asseveram que é importante que a administração acompanhe a evolução do saldo em tesouraria evitando que permaneça constantemente negativo. Nessa circunstância, saldo negativo em tesouraria, conforme demonstrado no Quadro 2, a empresa está enquadrada numa situação financeira de baixa solvência. A característica da empresa nessa situação é a necessidade de empréstimos de curto prazo oferecidos por taxas de juros mais elevadas.

Um fenômeno apresentado e estudado por Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003) é a ocorrência do que eles denominaram como efeito tesoura, quando os saldos em

tesouraria tornam-se cada vez mais negativos com o crescimento das vendas. Explica que isso pode ocorrer no período em que as vendas crescem, requerendo aumento do capital de giro e o resultado das vendas são aplicados no ativo não circulante para suprir as necessidades operacionais de produção. No Gráfico 1 está demonstrado o efeito tesoura.

Gráfico 1 – Efeito Tesoura

Fonte: Adaptado pelo auto com base em (Fleuriet, Kehdy e Blanc, 2003, p. 39)

Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003) afirmam que para evitar o efeito tesoura o autofinanciamento da empresa deve ser suficiente para financiar, pelo menos, os aumentos de sua necessidade de capital de giro (NCG).

A utilização do modelo Fleuriet, na conclusão de Marques e Braga (1995) pode auxiliar na avaliação da liquidez e solvência das empresas, e na identificação do tipo de estrutura financeira utilizada ou a característica do segmento de interesse, e ainda observar suas tendências relativas.