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Ao se discutir as relações intersubjetivas na atualidade é preciso que se faça referência a alguns conceitos da psicologia do desenvolvimento adotados,

posteriormente, pela psicologia social (PICHON-RIVIÈRE, 1991) como o de apego e o de vínculo, já que estes determinam diretamente como se constituem e se agrupam as pessoas. Entretanto esta posição difere daquela citada anteriormente por Ortega, já que apresenta uma visão mais familialista dos grupos sociais na modernidade quando se utiliza das descrições do grupo familiar como ponto de referência e base para o funcionamento dos demais grupos sociais, nos quais o indivíduo moderno se insere ao longo de sua existência. Essa abordagem tem seu valor para o entendimento do imaginário coletivo da sociedade contemporânea, quando nos deparamos com um grupo de pessoas que trabalham e partilham um mesmo ideal na sua vida profissional, num trabalho de equipe.

Sabe-se que uma das características mais primitivas do homem é sua necessidade imperiosa de estar em permanente comunicação com as outras pessoas.

Segundo Bowlby (1984, p. 209) o comportamento de apego foi definido como a busca e a manutenção da proximidade de um outro indivíduo, tendo sido repetidamente afirmado que este tipo de comportamento não desaparece com a infância, mas persiste durante a vida inteira. Com isso figuras antigas e novas são selecionadas e mantêm-se com elas a proximidade e/ou a comunicação. O comportamento de apego é uma característica da criança, que nasce apta a apegar- se em contato com o meio, ou melhor, com os cuidadores primários (pai, mãe ou substitutos). A partir daí desenvolve-se o que outros autores, chamam do Sistema

de Apego, que é mais do que o comportamento de apego, é um sistema de

interações que são protótipos das relações sociais futuras que serão estabelecidas. Além disso, o desenvolvimento satisfatório do sistema de apego é tão importante para a saúde mental, sendo algo que deve ser preservado nas relações pessoais.

Na sociedade moderna, adultos se apegam, em certa medida, não só com pessoas fora da família, mas também com outros grupos e instituições além dela, como por exemplo: equipe de trabalho, grupo religioso ou político, instituições filantrópicas, etc. Isso gera nestes sujeitos um senso de finalidade e pertencimento, uma vez que cria oportunidades de aprendizagem com o outro de várias atividades necessárias à sobrevivência, tais como: lidar com o desconhecido, lidar com a morte, com a doença no cotidiano, ou seja, lidar com os mais diversos aspectos

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ligados a existência humana.

Segundo Bowlby (1984, p. 222) parece provável que o desenvolvimento do apego a um grupo seja mediado, pelo menos inicialmente, pelo relacionamento com uma pessoa que detém uma posição de destaque nesse grupo e que constitui para muitas pessoas uma “figura” de apego subordinada e para algumas pessoas, até mesmo a “figura” de apego principal.

Os comportamentos de apego plenamente funcionais que os indivíduos estabelecem ao longo de sua existência amadurecem cedo no ciclo vital, e na idade adulta são ativados em baixos níveis de intensidade e precedem o estabelecimento e a renovação de vínculos.

Para Pichon-Rivière (1991, p. 24) o vínculo é definido como: “a maneira particular pela qual cada indivíduo se relaciona com outro ou outros, criando uma estrutura particular a cada caso e a cada momento”. Para o autor o conceito de vínculo é operacional configurando uma estrutura de relação interpessoal que inclui: um sujeito, um objeto, a relação do sujeito frente ao objeto e a relação do objeto frente ao sujeito, cumprindo os dois uma determinada função. Por ser considerado um conceito instrumental em psicologia social, o vínculo é sempre considerado um vínculo social, mesmo quando ocorre com uma só pessoa; através da relação com esta repete-se uma história de vínculos determinados em um tempo e em espaços específicos. Por essa razão que o vínculo se relaciona posteriormente com a noção de papel, de status e de comunicação assinalando relações múltiplas, tornando assim, compreensível à vida em grupo.

Os integrantes de um grupo são considerados como estruturas que funcionam em um determinado nível com determinadas características. Cada integrante do grupo tem uma função e uma categoria determinadas. A função, o papel e a categoria do nível dessa função configuram o status. O status está relacionado com o prestígio, estando estreitamente relacionado com o conceito de papel.

Para Pichon-Rivière (1991, p. 131) o vínculo é uma estrutura e a comunicação se estabelece dentro desta estrutura. Para que se estabeleça uma boa comunicação entre dois sujeitos, ambos devem assumir o papel que o outro lhe adjudica, caso contrário, produz-se um mal-entendido entre ambos e dificulta-se a comunicação.

Deve-se lembrar que na vida de relação as pessoas sempre assumem papéis e adjudicam papéis aos outros. Todos, em condições cotidianas, assumem vários

papéis ao mesmo tempo no estabelecimento permanente de um inter-jogo entre o assumir e o adjudicar. Isso pode ser evidenciado em todas as relações interpessoais que ocorrem em um grupo social ou de trabalho, já que cria a coerência entre o grupo e os vínculos dentro de tal grupo.

Assim para Pichon-Rivière (1991, p. 83) se explicam vários aspectos da conduta social no sentido de que todos os dias o indivíduo tem contato com pessoas a quem adjudica papéis e, evidentemente, a realidade vai se tornando mais tolerável na medida em que este indivíduo encontra pessoas que cumprem suas consignas (atribuição de expectativas ao outro, formulação de instruções, manifestação de esperança e prognóstico em relação a conduta do outro, código secreto de identificação do in group, que o frustram menos em relação àquelas pessoas de sua história anterior.

Todos os indivíduos na sua vida diária desempenham papéis múltiplos, quer dizer, manejam diversos modos de lidar com os problemas. Os papéis que assumem e os papéis que o adjudicam podem ser muito contraditórios; por essa razão, uma pessoa atua de diversas maneiras.

O homem por ser gregário por natureza convive ao longo de sua existência em diferentes grupos sociais. Conviver em grupos, para Minuchin (1982, p. 52) é inerente a condição humana. Entretanto essas agregações se diferenciam em seu nível de organização e de diferenciação.

Na sociedade moderna industrial pode-se afirmar que um grupo/uma equipe de trabalho exerce nos indivíduos uma tarefa desenvolvimental na constituição de seus membros.

A família é considerada o primeiro grupo social no qual o indivíduo começa a fazer parte sendo considerada a menor unidade grupal. Na vida adulta diferentes grupos passam a substituir este papel da família na inserção social, assumindo muitas funções antes reservadas apenas a vida privada. Entretanto esta imagem familialista nas relações intersubjetivas permanece internalizada em muitos indivíduos, que só conseguem se relacionar e conviver na presença da figura de um pai, de um chefe, de um líder.

No mundo contemporâneo com a introdução e o acesso de novas tecnologias e formas inovadoras de organização do trabalho, tarefas antes consideradas deveres familiares, passaram a ser assumidas e exigidas no contexto extra-familiar,

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em virtude da necessidade de sobrevivência sócio-econômica das pessoas. Isto significou que os indivíduos, independente do gênero, passaram a permanecer a maior parte do seu dia no contexto profissional, aumentando drasticamente o tempo de convivência com indivíduos ou grupos extra-familiares.

Desta forma, a sociedade moderna passou a exigir dos indivíduos a capacidade de desenvolver novas habilidades técnicas e pessoais para adaptar-se as mudanças rápidas num mundo constantemente em transição. Isso provocou consequências pessoais no contexto profissional decorrente da mudança da relação do indivíduo com o mundo pela falta de orientação provocada neste.

Esta desorientação dos sujeitos de acordo com Sennett (2001, p. 17) cria nos ambientes profissionais dificuldades transicionais entre aquilo que se tem como conjunto de valores e aquilo que a sociedade impõe para a manutenção e continuidade do trabalho individual e/ou grupal. Assim para lidar com essa flexibilidade do mundo do trabalho e não se desorientar, o sujeito moderno busca nos grupos sociais um espaço para construir narrativas coerentes da sua vida pessoal e profissional resgatando o elo entre o mundo do trabalho e os seus valores morais e éticos.

Desta forma observa-se na sociedade contemporânea uma continuidade e transposição dos valores do grupo familiar para o grupo de trabalho, como se fossem contextos relacionais coincidentes e contíguos. Essa familialização das relações profissionais aparece em diferentes campos de conhecimento pelo fato de que diferentes grupos sociais apresentam aspectos coincidentes em seus funcionamentos e dinâmicas, bem como no papel que exercem na vida de cada individuo.