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musicalização de adultos, buscou-se que os colaboradores respondesses a respeito dos pontos positivos e negativos da musicalização em idade adulta. Professores e alunos entrevistados responderam e caracterizaram de forma semelhante as dificuldades e facilidades da iniciação de alunos que se iniciam em música na infância.

No entanto, apenas os alunos ou professores, que se iniciaram em uma idade que os próprios considerassem mais avançada em relação a idade ideal, identificaram vantagens ou pontos positivos na iniciação de um aluno mais velho.

Esse dado parece ter relação com o ponto acima que se refere à percepção dos colaboradores a respeito da iniciação musical na idade adulta. Da mesma forma que os entrevistados que haviam se iniciado em idade considera por eles como a mais adequada (ou próximo a essa idade) tendem a ter dificuldade de perceber a iniciação de alunos mais velhos que essa idade, esses colaboradores também tendem a não enxergar nenhum ponto positivo na iniciação de um aluno mais velho. Analisando a transcrição do colaborador P4, citado acima:

_Você percebe alguma vantagem em se iniciar o instrumento numa idade mais madura?

P4 _Não.

_É mais pesado mesmo? P4_É mais pesado.

_Geralmente você tem esse tipo de aluno?

P4_Não. Porque aqui é por conta também do perfil do curso que nós temos, né?

De forma complementar, os professores e alunos entrevistados que percebiam a sua iniciação musical fora da idade ideal para o instrumento, apontaram tanto dificuldades quanto facilidades da iniciação de um aluno mais maduro. Entre os colaboradores foram apontados como principais vantagens da iniciação musical de um aluno maduro o foco nos estudos, foco nos objetivos de estudo e a consciência do processo pelo qual estavam passando. Nota-se

As vantagens...eh...uma das poucas vantagens que tem é que você já está com a sua personalidade, sua parte mental desenvolvida, e você já tem seu senso crítico. Isso pra mim é uma faca de dois gumes, eu já tive muitos alunos mais velhos que questionavam demais e não conseguiam tocar direito por causa disso. E eu acho também que a pessoa – isso eu acho que foi uma das coisas também que me ajudou muito... como eu

comecei muito tarde eu estava muito consciente do meu processo de aprendizagem. Eu acho que isso me possibilitou depois me tornar um bom professor. Porque eu sei como eu aprendi. Eu não aprendi com oito anos de idade e aquilo não sei se parte da minha memória consciente, entendeu? Então, eu acho que tem a ver com isso. (P1). _o que você achou que foi vantagem de ter começado no [instrumento] com vinte e um anos?

A2_ “O foco. Eu comecei focado em evoluir pra ser profissional. Ainda tô no caminho, lógico, mas...”

Qual foi a vantagem grande? Eu quando eu comecei eu já tinha quinze, ai eu fiz dezesseis anos, já perto do vestibular eu sabia o que queria. Então não fiquei mais perdendo tanto tempo, eu queria estudar eu queria ser [instrumentista]. Coisa que é muito difícil você exigir de uma criança de sete, oito anos, ainda mais nessa realidade brasileira. (P5)

Outra desvantagem no que diz respeito a musicalização de alunos que começaram em uma idade mais tardia é com relação ao “tempo” ou a “falta de tempo” associada a vida adulta. Um ponto unânime nos discursos dos colaboradores foi com relação à falta tempo para o estudo do instrumento, no caso de alunos adultos esse “tempo” tem duas implicações: a curto prazo as demandas da família, trabalho e responsabilidades que pesam sobre o adulto reduzem a prática necessária a dedicação ao instrumento; a longo prazo o adulto teria menos anos de estudo necessários para adquirir a as habilidades necessárias a uma prática considerada de excelência e sua iniciação tardia é apontada diversas vezes no meio musical como um impedimento à profissionalização.

Na próxima seção, será retomado esse tópico, não mais apenas como uma desvantagem, mas como um ponto central no discurso dos colaboradores, que é determinante para a formação da representação social da musicalização para adultos.

6 TEMPO E TEMPORALIDADE

Ao longo da pesquisa, o tempo assumiu um papel de valor que se expressa no campo da educação musical na sua dimensão medida em horas e em outra dimensão medida em anos. Essa última dimensão em anos aparece sempre associada ao o ideal de formação profissional definido pelo campo e buscado por professores, alunos e instituições. Tais ideais e valores se impõe no campo modelando suas representações e as atitudes como se verá a seguir.

Esse tempo aqui é apreendido por um sujeito que, consciente da sua existência, dá sentido à sua percepção de passado e futuro, criando um tempo que não é absoluto, mas ao contrário é relativo e pensado a partir das representações de mundo de cada sujeito. Deste modo, essa percepção define a existência, não de um tempo único, tempo físico, independente, mas uma temporalidade a partir da percepção desse sujeito e de sua organização da realidade. Esse conceito é expresso de forma mais clara por Marques (2008):

Se o tempo físico independe de nós, pois é o tempo da natureza, ele na verdade sequer precisaria ou mesmo poderia ser por nós percebido. É o presente absoluto da ação, já que não é passado nem futuro. O passado não existe, pois já se foi; o futuro também não existe, pois ainda não acontece. Assim, estes dois conceitos apenas fazem sentido dentro da experiência vivida, dentro da racionalização e consciência do seu decorrer – constituem, portanto, o valor da memória e da projeção, causa e consequência do momento presente, medido pelo ser humano –, ou seja, o tempo psicológico. Isso significa, em primeiro lugar, que só o presente é real, mas também que qualquer tempo por nós vivido só tem sentido se comparado com o tempo que ainda não é, ou não mais existe – o que se constitui no processo fundamental da consciência humana e, num plano mais restrito e aqui relevante, da apreensão da história. Este tempo é, em suma, a temporalidade. (MARQUES, 2008, p. 45)

Heidegger (2005) vai chamar esse sujeito que interpreta a sua realidade como o ser da

pre-sença (um conceito ontológico que pressupõe o ser estando em jogo com o próprio ser)

que perfaz o movimento de compreensão de si mesmo a partir da temporalidade.

Nesse trabalho essa distinção se faz necessária porque a percepção de tempo, que é central nos discursos dos colaboradores, se dá na articulação que esses sujeitos fazem entre o passado, presente e futuro conforme interpretam a si mesmos e a realidade que os cerca. Nota- se:

É a questão do desenvolvimento, porque o [instrumento], pra que você venha a tocar, fazer as coisas ...significa que você vai ter que desenvolver sua técnica, de [técnica] por exemplo e sua [técnica], que é um dos aspectos mais importantes pra gente. Pra você desenvolver isso, isso vai levar tempo. Vai levar muito tempo. Vai levar anos as vezes, dependendo da pessoa também. Mais de dois anos até pra você adquirir consistência. Então é por isso que leva desvantagem, né? Porque, por exemplo, o cara que começou com vinte anos...o que começou com doze anos ele já tem mais estrada aí... já tá mais desenvolvido. S7

Esse tempo é percebido aqui, não a partir de sua dimensão linear, mas a partir da articulação entre passado, presente e o porvir. A expressão “vai levar muito tempo” faz referência a experiência que é relativa porque varia conforme os alunos e suas condições. Em contraste com a fala: “Mais de dois anos até pra você adquirir consistência”.

Se por um lado, dois anos, não parece “muito tempo”, esse tempo é expresso aqui a partir de uma articulação feita entre a experiência de administrar os esforços diários necessários para a aquisição de uma determinada técnica e o resultado futuro desse esforço. Não são “dois anos” lineares, mas dois anos nos quais o tempo é empregado de determinada maneira e que faz parte de um processo mais amplo, nesse caso o processo de formação musical.

Esse tempo é a “racionalização e consciência do seu decorrer – (..) o valor da memória e da projeção, causa e consequência do momento presente, medido pelo ser humano –, ou seja, o tempo psicológico” (MARQUES, 2008, p. 45), ou seja, é temporalidade. De maneira semelhante percebemos no colaborador P3:

Quanto o aluno é criança, eu...geralmente você adota até o próprio ritmo de estudo, né? Se for com doze, treze anos de idade, dez anos...então há uma expectativa diferente, né? Em relação aquele que tem dezoito. Que aí com vinte anos, ele não tem mais aquela expectativa de tempo que se espera para construir um profissional. Mas quando você tem doze, treze anos, você tem mais...uma metodologia que eu vou dizer assim, sem pressão, né? Pelo menos é a maneira como eu vejo. [...] Quem tem mais idade o tempo vai ser sempre contra. Contra que eu digo, vai trabalhar sempre contra ele. Em relação ao cara que é mais novo e tem mais tempo, para decidir, tomar decisões. (P3)

No exemplo acima notou-se como as expectativas com relação ao desenvolvimento são moldadas conforme a articulação entre o que é representado para formar, “construir um profissional” e os recursos necessários para a sua formação, dos quais o tempo em suas

dimensões em anos e em horas de estudo se torna um recurso decisivo. Também a metodologia aparece aqui em função desse tempo, como elemento que o estrutura.