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Requerentes de asilo na Dinamarca

3.3. E STRATÉGIA METODOLÓGICA

Apesar de ser adotada uma metodologia predominantemente qualitativa, assente em entrevistas em profundidade e semiestruturadas, complementadas por observação participante, a mesma não respondia unicamente aos objetivos propostos. Nesse sentido, optou-se por uma abordagem mista que envolvesse, para além dos métodos qualitativos numa perspetiva longitudinal (em alguns casos), a triangulação com os dados obtidos através dos métodos intensivos como a recolha documental e os dados estatísticos, cuja representatividade é essencial para uma contribuição no campo das políticas públicas. Esta triangulação permite relacionar e articular os planos macro e micro, numa proposta metodológica que responde de

66 forma mais efetiva ao impacto das políticas nas práticas adotadas nos países de acolhimento, assegurando a generalização e a representatividade, assim como dos trajetos das refugiadas nos processos de integração, permitindo um aprofundamento através das narrativas pessoais, considerando as especificidades do género e da idade.

Nesse sentido, os métodos quantitativos tornam-se indispensáveis para a consecução dos objetivos. A análise de dados secundários e a recolha documental sobre variáveis de contexto, nomeadamente as disposições legais e jurídicas de asilo e integração e dados sobre requerentes de asilo nos últimos 10 anos na União Europeia, em Portugal e na Dinamarca e os respetivos mecanismos de acolhimento; os discursos políticos e mediáticos sobre os refugiados; os indicadores de resultados de integração e as representações coletivas das populações de acolhimento sobre os refugiados, demonstram-se cruciais para assegurar a representatividade da análise e responder aos objetivos estabelecidos.

Para uma análise mais aprofundada foram comparadas as variáveis de contexto e dados quantitativos e qualitativos da União Europeia, quando aplicável, e dos dois países em estudo, Portugal e Dinamarca.

A articulação teórica e a pesquisa empírica sobre as experiências e processos de integração numa perspetiva de género são pertinentes no contexto migratório atual, com um cenário político, cultural, religioso e social de elevada complexidade no mundo e, em particular, na Europa.

A metodologia estabelecida inicialmente foi mantida no que concerne à sua estrutura, que previa a recolha, análise e comparação de dados quantitativos, recolha e análise documental e articulação e confrontação dos dados quantitativos e qualitativos recolhidos através da pesquisa de campo. No entanto, o tipo de análise qualitativa foi ajustado. As entrevistas a meninas e mulheres refugiadas em cada um dos países a serem estudados, foram realizadas em profundidade uma única vez, em vez de uma análise longitudinal ao longo de oito meses como inicialmente previsto. Esta alteração deveu-se ao facto de ser incomportável logística e financeiramente a deslocação aos países de dois em dois meses e do conteúdo que se pretendia aprofundar ser passível de ser alcançado com uma entrevista em profundidade, complementadas com observação participante e incluindo a informação extraída dos contactos prévios e continuados com algumas refugiadas, espelhando, em alguns casos alterações nos

67 seus processos de asilo e de integração. Apesar das entrevistas ocorrerem singularmente com a utilização de um guião, foi possível manter o contacto com algumas das participantes ao longo da investigação, com períodos variáveis entre os dois e os 16 meses, permitindo acompanhar alguns processos e recolher dados relevantes de forma longitudinal.

A definição dos campos de análise e dos participantes13 da pesquisa foi submetida a algumas reformulações, nomeadamente os países a serem estudados. Inicialmente foi prevista a análise comparativa entre três Estados Membros da União Europeia, Portugal, Dinamarca e Alemanha. Os critérios considerados para a seleção dos países foram os diferentes quadros de intervenção no que diz respeito ao acolhimento, os dados relativos ao número de requerentes de asilo em cada um deles e o país onde está baseada a investigação. No decorrer da investigação considerou-se que, para além de justificações de âmbito mais prático, uma análise entre dois países poderia beneficiar de um maior aprofundamento, colocando em comparação dois contextos demográficos mais similares e com uma influência no foro da UE mais idêntica, mas com disposições jurídicas e legais mais distintas e contextos socioeconómicos demarcados. Deste modo, Portugal foi um dos países analisados, por ser um dos Estados membros da União Europeia com quadros de intervenção multidisciplinares mais recetivos ao acolhimento de refugiados e por, simultaneamente, ser um destino preterido nos projetos de migração, ainda que tenha vindo a verificar uma tendência de crescimento nos últimos anos. O segundo país foi a Dinamarca, por apresentar disposições e mecanismos cada vez mais repressivos e continuar a ser um país de objetivo de destino dos refugiados. Adicionalmente revelou-se pertinente a representação geográfica do Norte e Sul Europeus.

A seleção das participantes e das instituições teve ainda em consideração a diversidade de âmbito nacional, privilegiando contactos em centro urbano, nas capitais Lisboa e Copenhaga e em cidades no interior como Castelo Branco e Fundão, em Portugal e Roskilde na Dinamarca, gerando outro nível de análise nos processos de integração.

A escolha das cidades teve por base o critério acima referido, convocando contextos mais urbanos e cidades de menor dimensão no interior dos países. O conhecimento prévio da cidade de Copenhaga e de Roskilde, por via de uma participação numa conferência na

13 A designação de ‘participantes’, de ‘informantes’, em estudos de natureza etnográfica, ou de

‘respondentes’, em estudos quantitativos tipo inquérito, tem sido amplamente adotada, substituindo a palavra ‘sujeitos’ (Coutinho, 2015: 254).

68 Universidade de Roskilde, facilitou os contactos para o desenvolvimento do trabalho de campo nas duas cidades da Dinamarca. Em Portugal as escolhas versaram as cidades de Castelo Branco e Fundão, baseadas em contactos prévios e em alguma informação veiculada pelos media durante a recolocação de refugiados resgatados pelo navio Aquarius. A partir das notícias difundidas sobre o destino destes migrantes - o Fundão, foram estabelecidos contactos com a autarquia, a partir da qual foram facilitados também, contactos com outras instituições do mesmo distrito que lideraram programas de acolhimento e integração como a CARITAS e a Associação de Desenvolvimento Amato Lusitano, ambas em Castelo Branco, fazendo corresponder os perfis das cidades ao desenho da pesquisa.

Relativamente à pesquisa de terreno, foram realizadas mais entrevistas do que as 10 inicialmente previstas por país. Foram desenvolvidos guiões de entrevista aplicados a meninas e mulheres refugiadas em Portugal e na Dinamarca, considerando as especificidades dos dois grupos. Foram definidos instrumentos específicos orientados para responsáveis políticos e técnicos de diferentes instituições nos dois países, por forma a assegurar a obtenção de dados qualitativos que respondessem e se articulassem com os dados quantitativos recolhidos e analisados.

Foram revistos e detalhados os perfis das meninas entrevistadas e definida a alteração ao seu intervalo etário, fixando a faixa etária dos 10 aos 19 anos, que designa os adolescentes, de acordo com a definição das Nações Unidas. Após análise aprofundada e iniciados os contactos para identificação das participantes da pesquisa, foi definido o limite mínimo de 12 anos e o máximo de 19 anos, por forma a assegurar autonomia suficiente no discurso exigido para uma entrevista em profundidade e uma correspondência relacional como prevista.

As características dos perfis das meninas mantiveram-se à exceção da categoria de menor desacompanhada, pela dificuldade em identificar, por um lado, e por outro, pela impossibilidade de estabelecer o contacto com as meninas menores, após a sua identificação. Relativamente às demais categorias foi possível identificar e entrevistar sete meninas, cinco familiares das mulheres entrevistadas e uma menina sem relação familiar com as mulheres entrevistadas; com permanência no país entre seis meses a 10 anos. Neste grupo foram sempre consideradas metodologias com crianças e jovens.

69 No total foram conduzidas 36 entrevistas em profundidade a meninas e mulheres refugiadas e representantes de instituições que trabalham com refugiados. Foram entrevistadas 17 mulheres com diferentes categorias jurídicas: refugiadas, requerentes de asilo e beneficiárias de proteção subsidiária; com permanência no país entre dois meses a 10 anos; de sete nacionalidades diferentes; adultas sem especificidade de idade, entre os 21 e os 45 anos; com diferentes contextos familiares (com filhos e sem filhos, casadas, divorciadas e solteiras); e com percursos de trânsito acompanhadas e sozinhas, de acordo com os perfis previamente estabelecidos. Sete adolescentes refugiadas nos dois países, com perfis mediante as tabelas apresentadas, também participaram no estudo.

As entrevistas semiestruturadas foram conduzidas, na sua maioria, em inglês, nestes casos diretamente com a investigadora e as participantes. Nos casos em que as participantes só dominavam a língua nacional e/ou local do seu país de origem ou região, as entrevistas foram realizadas com recurso a um intérprete. Em Portugal seis entrevistas foram feitas com tradutor, do sexo feminino, e uma entrevista com um intérprete do sexo masculino, por indisponibilidade de uma mulher, fator que foi solicitado previamente e por via telefónica aos serviços de tradução do ACM, resultando numa menor interferência e constrangimento para as participantes. Uma adolescente foi entrevistada e traduzida pelo irmão, por opção da participante, relevando-se informação relevante para o conteúdo da investigação. As entrevistas foram realizadas em espaços públicos previamente combinados, em salas disponibilizadas pelas instituições e em casa das próprias mulheres refugiadas.

Em Portugal, foram entrevistadas em profundidade 10 mulheres, cinco meninas e 10 responsáveis políticos, técnicos de instituições e representantes da sociedade civil (ver tab.4).

Na Dinamarca, das 12 entrevistas realizadas, apenas em quatro foi necessária tradução, sendo a mesma feita por uma das participantes, também ela, elo de ligação entre as refugiadas e devidamente considerado e mencionado na análise dos discursos, quando justificável. As entrevistas foram conduzidas em casa de algumas refugiadas, em espaços públicos acordados previamente e na Trampoline House, organização de apoio a requerentes de asilo em Copenhaga. Foram entrevistadas seis mulheres com diferentes categorias, requerentes de asilo e beneficiária de proteção internacional, três adolescentes com estatuto de refugiadas e autorização de residência temporária (ver quadro 5).

70 As entrevistas foram realizadas entre maio de 2018 e novembro de 2019.

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