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SUPORTE SOCIAL

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A constatação da mudança de padrão na etiologia das doenças – uma drástica redução das doenças infecciosas e um aumento significativo das doenças com outras etiologias que requerem mudanças de comportamento em termos de aderência a tratamentos ou de prevenção, tais como câncer, doenças cardiovasculares, distúrbios e doenças decorrentes de hábitos e comportamentos como o alcoolismo e dietas inapropriadas, comportamentos de risco de acidentes de carro e moto, resultou na necessidade de um novo enfoque sobre os

fatores de saúde. Esse novo enfoque consistiu da maior atenção ao modelo biopsicossocial de saúde (MATARAZZO, 2002).

O modelo biopsicossocial, segundo Marks (2002), que teve maior desenvolvimento e aplicação no último quartel do século XX, considera que a saúde e a doença são o resultado da contribuição de fatores biológicos, psicológicos, sociais e ambientais inter-relacionados, compostos por predisposição genética; fatores comportamentais relativos ao estilo de vida e ao nível de estresse, fatores relativos às crenças sobre saúde e relativos às condições sociais que envolvem influências culturais, relações familiares e o suporte social.

No mesmo período em que se deu maior atenção e maior aplicação ao modelo biopsicossocial de saúde, Cohen e Syme (1985) destacaram que ocorreu um grande aumento de interesse sobre o conceito de suporte social e sobre como ele afeta a saúde e o bem estar. Disso, segundo esses autores, resultou uma grande expansão do número de pesquisas e de programas de tratamento e de intervenção que utilizaram o suporte social como uma assistência terapêutica.

Na linha de pesquisa de fatores relativos às condições sociais que influenciam a saúde, Cohen e Mckay (1984) citaram os estudos, entre outros, de Cobb (1976) que considerou o papel das relações interpessoais na proteção da saúde das pessoas contra os efeitos patogênicos que resultam de situações estressoras. O suporte social, nesse sentido, faz parte da gama de variáveis que compõem o modelo biopsicossocial de saúde.

Quanto à importância de se estudar o conceito de suporte social, Cohen e Syme (1985) relacionaram três razõ es principais. A primeira delas refere-se ao fato de que o suporte social estaria associado à possibilidade de melhor compreensão das causas das doenças não infecciosas tais como câncer, doenças cardiovasculares, doenças mentais e artrite. Uma segunda razão para o estudo do suporte social seria a melhor compreensão dos seus efeitos benéficos nos programas de reabilitação de saúde que requerem mudanças de hábitos, de comportamentos e de características emocionais. A terceira razão para o aumento de interesse nos conceitos de suporte social seria a possibilidade de maior compreensão dos fatores que podem afetar primariamente a saúde e o bem estar causados por impactos de ruptura na rede social de uma pessoa, tais como experiências de morte de pessoa querida, de migração, de mudança de residência e de mudança e perda de trabalho.

Cobb (1976) destacou o caráter de abrandamento do suporte social sobre os efeitos das situações de estresse que ocorrem durante a vida. Definiu que o suporte social corresponde ao conjunto de informações que uma pessoa recebe que a fazem acreditar que ela é objeto de cuidados, que é amada, estimada e valorizada e que pertence uma rede social de interações

que envolvem compromissos e favores mútuos. Cohen e Syme (1985) acrescentaram que o suporte social corresponde aos recursos informacionais ou concretos potencialmente úteis providos por outras pessoas.

O suporte social, considerado deste modo, pode proteger as pessoas que passam por crises em uma ampla variedade de estados psicológicos e de comportamentos, entre eles, a depressão, o alcoolismo e síndromes resultantes de separações sociais com conseqüências sobre a redução da medicação exigida para cada caso. Além disso, o suporte social pode acelerar a recuperação da saúde e aumentar a facilidade para aceitar regimes médicos prescritos. As ações de suporte social podem também prevenir as conseqüências desastrosas resultantes de crises e mudanças (COBB, 1976).

Nesse sentido, Cohen e Mckay (1984) formularam hipótese de um modelo de suporte social em que o estresse psicossocial seria responsável pela produção de efeitos deletérios sobre a saúde e o bem estar naquelas pessoas que têm um grau de suporte social pequeno ou que não tem nenhum apoio, enquanto que os efeitos deletérios seriam diminuídos ou eliminados naquelas que têm um suporte social mais forte. Em contrapartida, ele supôs que as patologias não sujeitas ao controle de estresse não seriam afetadas por níveis de suporte.

Este modelo está baseado em mecanismos por meio dos quais as relações interpessoais poderiam proteger alguém de uma patologia induzida por estresse. É baseado numa visão multidimensional do suporte social que foca a relação funcional entre o enfrentamento requerido por uma situação e os recursos providos por alguém do sistema de suporte para ajudá-lo no enfrentamento. Considera que o estresse surge quando alguém é chamado a responder a uma situação para a qual não está habituado a dar respostas e que as conseqüências de falha na resposta à situação são efetivamente importantes. Além disso, este modelo considera o evento estressor como sendo um potencial de deflagração de respostas de estresse, e considera a experiência de estresse como sendo os afetos negativo s que resultam de comportamentos de adaptação que não se configuram como respostas adequadas (COHEN E MCKAY 1984).

Cobb (1976) distinguiu duas formas de suporte social uma de ordem psicológica e outra de ordem material. O suporte psicológico foi definido como sendo composto pelos suportes cognitivo e emocional.

Cohen e Mckay (1984) consideraram que os mecanismos responsáveis por um efeito moderador de suporte sobre as reações a um estressor seriam divididos em três tipos: tangível, de avaliação cognitiva e de avaliação emocional, a seguir especificados:

1. O suporte tangível ou material é um protetor de estresse que consiste de ajuda financeira, cuidados e outras formas de assistência material. Destaca-se que esse tipo de ajuda somente é efetivo quando não cause constrangimento ou perda de liberdade que acentue o estresse.

2. O suporte de avaliação cognitiva é um mecanismo que enfatiza a avaliação dos aspectos externos da situação. Consiste das informações que podem ajudar uma pessoa a avaliar o evento estressor de forma menos ameaçadora e mais benigna. Quando um evento é avaliado como ameaçador e uma resposta de enfrentamento apropriada não é disponível ocorre uma reação de estresse.

3. O suporte emocional é um mecanismo que enfatiza a avaliação que as pessoas fazem de seus sentimentos a respeito de si próprios e consiste de informações relativas à melhoria da auto-estima e do sentimento de pertencer a um grupo.

Para os autores Cohen e Mckay (1984) o suporte cognitivo para o evento estressor pode ser efetuado em grupo. Em grupo a redução dos efeitos do estresse é o resultado também da comparação e de trocas de informações de problemas e de soluções entre os seus integrantes. A informação em grupo pode ajudar uma pessoa a acreditar que ela também tem uma resposta adequada para sua situação ou que a falha em responder adequadamente não é tão importante. O suporte de avaliação cognitiva em grupo somente tem efeito redutor do estresse quando:

• O estressor é socialmente aceitável e não resulta em sent imentos de culpa ou vergonha;

• A discussão do estressor não resulte em comparação de uma pessoa em detrimento de outra;

• O suporte é provido por pessoas que têm informações acuradas num grupo com interesses em comum;

• O grupo de suporte expressa uma reação relativamente calma ao estressor.

Segundo o modelo proposto por Cohen e Mckay (1984), o suporte material serviria para situações em que há necessidade de enfrentamento que incluem doenças e falta de habilidades que acompanham a perda de renda; corresponderia a recursos de qualquer natureza material apropriados para suprir a perda de renda. O suporte de avaliação cognitiva

serviria àqueles estressores socialmente aceitos que não envolvam sentimentos de vergonha ou culpa e corresponderiam a recursos que vêm de pessoas que têm conhecimentos e experiências semelhantes. O suporte emocional diria respeito a estressores relacionados a auto-estima e à necessidade de pertencimento.

O suporte emocional quanto à auto-estima estaria relacionado à auto-avaliação sobre falhas em dar respostas à situação estressora. Quanto à necessidade de pertencimento o suporte emocional estaria relacionado àqueles estressores que surgem com a separação de relacionamentos próximos e associado a recursos que vêm de pessoas que podem promover oportunidades de aproximação por meio de relações relativamente intimas e efetivas (COHEN E MCKAY 1984).

Quanto aos meios práticos Cobb (1976) considerou que o suporte social inicia-se no útero materno com o apoio à maternidade, ao nascimento, à vida que se inicia, e continua durante todo o desenvolvimento das transições dos ciclos de vida. Entre as situações que necessitam de suporte social, destacou a necessidade de apoio nas hospitalizações, nas fases de recuperação de doenças e de vícios, nas situações de estresse, particularmente nas situações de perdas de trabalho e privações. Cobb (1976) ressaltou também que a maior crise da vida para a maioria dos homens, sobretudo os que têm dependentes, é o término de emprego estável.

Kessler, Turner e House (1987) apresentaram um estudo sobre os processos de intervenção nas relações entre desemprego e saúde com foco na condição financeira. O objetivo do trabalho era melhor compreender as variações de saúde e doença que ocorrem entre desempregados. Participaram do estudo 146 desempregados, 162 com previsão de demissão e 184 com emprego estável. Utilizaram medidas indicadoras da condição financeira, da condição conjugal, das relações sociais e afiliações a grupos e de eventos gerais da vida que poderiam ter mudado com o desemprego. Os resultados mostraram que a condição financeira tem grande importância nos impactos do desemprego sobre o estado de saúde. Esses impactos acontecem por meio de dois mecanismos: 1) o desemprego resulta em decréscimo da condição financeira que por sua vez resulta em efeitos negativos sobre a saúde; 2) o desemprego deixa o individuo mais vulnerável ao impacto de outros eventos da vida não relacionados diretamente com o desemprego. Além disso, verificaram que com intervenções sobre o controle financeiro as pessoas desempregadas pesquisadas não tiveram o estado de saúde mais alterado do que as que estavam em empregos estáveis.

Caplan, Vinokur, Price e Van Ryn (1989) desenvolveram um estudo experimental com 928 desempregados da cidade de Michigan, com representatividade de uma ampla gama de

características demográficas. Ressaltaram os autores que com a perda de trabalho há um acréscimo de risco de empobrecimento da saúde mental, tais como aumento de risco de depressão, de ocorrência de problemas psiquiátricos de ordem menor e outras conseqüências negativas, além da ocorrência de diminuição da auto-estima e da satisfação com a vida. Essas constatações levou-os a adotar um experimento que investigou os efeitos de um modelo de intervenção social que influenciasse a motivação e a perícia para determinar um comportamento de procura mais eficaz por trabalho. Esse experimento aliou técnicas para o restabelecimento de confiança e auto-estima e o desenvolvimento de habilidades e motivação para busca de uma melhor recolocação no trabalho. Todos os processos do experimento foram conduzidos por treinadores experimentados nos assuntos que abordariam. Foram acompanhados, longitudinalmente, dois grupos: um grupo experimental e um grupo de controle com medidas específicas para avaliação do processo de intervenção do suporte social, da motivação para procurar emprego, de comportamentos de procura de emprego e de saúde mental. O alvo era prevenir a precariedade de saúde mental e perda de motivação além de promover alta qualidade do novo emprego. Um pré-teste foi administrado seguido de pós- testes de um a quatro meses depois do experimento. Os resultados mostraram que a condição experimental rendeu recolocação de alta qualidade em termos de salário e de satisfação com o trabalho e motivação mais alta entre aqueles que continuaram desempregados.

As habilidades sociais e o papel protetor do suporte social com relação ao estresse foram pesquisados por Cohen, Clarck e Sherrod (1985) com uma amostra de 609 estudantes universitários, dos quais foram selecionados 188 estudantes para pesquisa longitudinal sobre os mesmos dados em 11 e 22 semanas após a primeira pesquisa. O estudo teve a finalidade de responder a três questões. A primeira era se a percepção de disponibilidade de suporte social protege as pessoas do estresse induzido pelo afeto depressivo. A segunda era saber se as habilidades sociais medidas pela competência social, anseio social e auto-abertura seriam responsáveis pelo efeito protetor da percepção de suporte social. A terceira questão era saber se essas medidas de habilidades sociais seriam capazes de discriminar para quem o suporte social poderia ajudar, para quem ele impediria a ajuda ou não produziria efeito em face do estresse. As evidências de pesquisa apontaram para um papel protetor da percepção de disponibilidade de suporte social com relação ao estresse. O efeito protetor com relação ao estresse não se mostrou afetado por controles de influências das habilidades sociais. E finalmente, as habilidades sociais não discriminaram para quem o suporte social poderia ajudar, impedir a ajuda ou torná- lo sem efeito.

Por se tratar de um recurso de apoio que provem de outras pessoas a participação em grupos religiosos pode estar associada ao suporte social. Ellison e Levin (1998) quanto a isso afirmaram que vários pesquisadores propuseram que, independentemente de religião, certos tipos ou modos de expressão religiosa particulares poderiam ser associados com determinados construtos psicológicos e comportamentos. Esses modos de expressão religiosa estariam relacionados à saúde de forma negativa e positiva. Assim sendo, os mecanismos de saúde associados à religiosidade incluem a regulação dos estilos de vida individual e dos comportamentos de saúde; a promoção de auto-percepção positiva; a provisão de recursos de enfrentamento específicos; a geração de emoções positivas – amor e perdão; mecanismos adicionais hipotéticos tais como a existência de uma bioenergia curadora; e a provisão de recursos sociais – vínculos sociais e de suporte social formal e informal.

Destacaram Ellison e Levin (1998) que as comunidades religiosas por meio de programas congregacionais freqüentemente oferecem vários tipos de suporte social, o tangível ou instrumental (bens materiais e serviços) e a assistência sócio-emocional. Essa integração social tem implicações sobre os resultados de saúde, sobre as percepções subjetivas de suporte – satisfação com as relações suportivas e o fato de poder contar antecipadamente com o grupo quando precisar podem ser preditores importantes dos riscos de mortalidade e da saúde mental e física.

Nesse sentido, Salsmans, Brown, Brechting e Carlson (2005) elaboraram um estudo a respeito dos vínculos entre religião e espiritualidade e ajuste psicológico e os respectivos papeis mediadores do otimismo e do suporte social sobre esses vínculos. Afirmaram os autores que apesar de que o otimismo, o suporte social, a religiosidade e a espiritualidade serem importantes preditores do ajustamento considerando o estresse (distress) e satisfação com a vida, são raros os estudos que levam em conta essas variáveis simultaneamente. Deste modo, eles elaboraram um estudo que investigou se o otimismo e o suporte social mediavam as relações entre religiosidade e ajustamento e entre espiritua lidade e ajustamento. Eles encontraram dados que indicaram que as relações entre religiosidade intrínseca (espiritualidade) e satisfação com a vida e entre o suprimento advindo da prece e a satisfação com a vida eram mediadas pelo suporte social e pelo otimismo. Além disso, eles verificaram que as relações entre religiosidade e ajustamento variaram dependendo de como a religiosidade era operacionalizada e se os indicadores de ajuste positivo às situações em contraste aos negativos eram usados. Os pesquisadores destacaram que a religiosidade intrínseca (espiritualidade) e o suprimento pela prece associaram-se a um maior grau de satisfação com a vida, mas a religiosidade extrínseca não se associou com a satisfação com a

vida. Ressaltaram que esses resultados foram significantes até mesmo depois de computar as covariâncias em função de idade, gênero, grupo étnico e atratividade social. Afirmaram que os dados sugerem que religiosidade e espiritualidade estão relacionadas, mas que correspondem a construtos distintos e estão associados ao ajustamento através de fatores tais como suporte social e otimismo.

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